LÍNGUA, LITERATURA E PODER

Ana Lucia de Souza Henriques (UERJ e UVA)

Walter Scott e Irvine Welsh, escritores escoceses dois séculos distantes no tempo, guardam uma relevante semelhança em algumas de suas obras. Trata-se da utilização do vernáculo. Neste ensaio, nosso interesse está voltado para a relação entre os diferentes contextos históricos em que seus romances foram publicados, procurando examinar até que ponto seria possível estabelecer uma relação entre o uso do vernáculo na época da perda da autonomia política escocesa, no início do século XVIII, e sua recuperação na última década de nosso século.

Em romances que escreveu sobre a história da Escócia, Scott atribuiu a muitos de seus personagens um sentimento paradoxal em relação à união entre seu país e a Inglaterra. Esse paradoxo não deve ser considerado apenas fruto da imaginação do escritor, pois representa o que muitos escoceses sentiam sobre a união dos dois países.

Ninguém melhor do que o próprio Scott para ilustrar o paradoxo a que nos referimos. Scott é um nacionalista a favor da União entre os Parlamentos escocês e inglês. Favorável à causa jacobita, mesmo ciente de que tratava de uma causa morta, conservador na política, favorável aos Tories, procurou também manter um bom relacionamento com a oposição, os Whigs. Em muitas de suas obras sobre a história da Escócia, buscou uma maneira de conciliar o progresso - entendido como uma conseqüência da união dos parlamentos - com a tradição. Em sua casa, Abbotsford, construída com o que havia de mais moderno em termos de conforto, objetos antigos ou relíquias do passado estavam presentes em praticamente todos os cômodos. Scott chegou mesmo a afirmar que as compras de valiosas relíquias acabariam por arruiná-lo financeiramente (DAICHES, 1971, p. 90).

Nesse contexto paradoxal, numa Escócia que busca a preservação da tradição após a perda de sua autonomia política, é que devemos examinar o uso do vernáculo em romances de Walter Scott. Em suas obras, o escocês é usado, sobretudo em diálogos. Quando presente na fala do narrador, sua utilização está limitada a algumas palavras que aparecem em destaque, quase sempre grifadas em itálico. Tanto nos diálogos quanto na fala do narrador, os termos em vernáculo aparecem como um colorido especial no texto em língua inglesa. Esse uso, mesmo que esporádico do escocês, serviu para chamar a atenção quanto ao preconceito dos mais intelectualizados contra o vernáculo escrito e falado.

Naquele momento, além de falar a língua inglesa, era preciso tentar apagar ou esconder o sotaque escocês, principalmente quando se tratava de um interlocutor oriundo de classe social privilegiada a quem se queria impressionar. O vernáculo passou a ser considerado uma forma inferior de expressão. Estudantes eram devidamente corrigidos por seus professores ao se expressarem em escocês, mas os menos letrados continuaram utilizando o escocês, o que contribuiu para aumentar ainda mais o preconceito dos mais escolarizados em relação ao vernáculo. Essa preocupação era, muitas vezes, deixada de lado em determinados ambientes onde não se fazia necessário falar inglês como os ingleses.

Ao resgatar o uso do vernáculo em obras escritas em prosa, Scott atribuiu falas em escocês a personagens de baixa escolaridade, geralmente de origem humilde, enquanto os mais favorecidos socialmente utilizavam o inglês. Ciente de que grande parte de seu público leitor teria dificuldades em entender os termos em vernáculo, a solução encontrada por ele para resolver esse problema foi a de combinar palavras inglesas e escocesas, formando palavras compostas, ou de intercalá-las, e, quando necessário, explicá-las por meio de apostos, ou até mesmo de notas apensas ao texto.

Esse procedimento adotado por Scott está presente desde a publicação, em 1814, de Waverly, seu primeiro romance sobre a história da Escócia, onde o vernáculo é utilizado ainda com bastante timidez. Em textos de obras posteriores, o idioma escocês aparece com maior freqüência, sempre acompanhado dos devidos esclarecimentos, quanto ao significado de termos mais relevantes.

Waverly alcançou grande sucesso. Essa obra se reporta ao período da rebelião jacobita de 1745. O personagem Waverly - que dá título à obra - é um jovem inglês cuja família está dividida em suas inclinações políticas. Seu pai acredita que através de seu apoio à Casa de Hanover poderá assegurar para si uma boa posição social. Seu tio, um respeitado proprietário rural, é favorável ao partido conservador e simpatizante da causa jacobita.

Edward Waverly parte da Inglaterra para a Escócia como um soldado do exército inglês. Na Escócia, se deixa impressionar com o movimento dos jacobitas a favor da volta da linha exilada dos Stuarts. Após ser apresentado a Charles Edward Stuart, ou Bonnie Charlie, que reclamava o trono para si, Waverly se torna um membro do exército escocês.

O tema do jacobitismo como símbolo da independência e do orgulho do país, perdidos com a união da Escócia à Inglaterra, não sugere nenhuma ameaça à Casa de Hanover. Outras conspirações não seriam tramadas pela volta da linha exilada dos Stuarts, pois a morte de Bonnie Charlie, em 1788, fez com aqueles que ainda acreditavam no direito divino da linha exilada dos Stuarts acabassem por reconhecer que a causa jacobita estava morta.

A escolha do tema do jacobitismo e a maneira com que o escritor apresenta o resgate do vernáculo como símbolo nacional exemplificam o paradoxo da cultura escocesa no início do século XIX. Walter Scott procura mostrar a coexistência pacífica entre o passado, do qual todos devem se orgulhar, e o presente, que deve promover o progresso sem apagar a tradição. Essa sua maneira de pensar pode ser entendida como uma forma de agradar a todos, principalmente os detentores do poder.

Irvine Welsh não parece ter essa preocupação de agradar as elites dominantes, quando escolhe temas ou utiliza o vernáculo em suas obras. Enquanto Walter Scott buscava resgatar a tradição se reportando ao passado e valorizando o escocês como símbolo de nacionalidade, Irvine Welsh utiliza o vernáculo ao escrever sobre um lado decadente da sociedade escocesa num momento em que a Escócia recuperou sua autonomia política após a volta do parlamento escocês, cuja instauração aconteceu na cidade de Edimburgo no primeiro dia de julho de 1999.

A temática de suas obras gira em torno, principalmente, da vida de escoceses que optam pelas drogas como uma maneira de amenizar fracassos e perdas ou de conviver com a incapacidade de adaptação à vida dentro de uma sociedade pautada pela desigualdade sócio-econômica e pelo conformismo.

Nascido em um subúrbio pobre da cidade de Edimburgo em 1961, Irvine Welsh conhece bem o assunto de que trata. Após ter abandonado os estudos e trabalhado em diferentes locais, Welsh se juntou ao movimento punk em Londres, período em se tornou dependente químico. Sua carreira de escritor começou depois de sua volta para a Escócia no final dos anos oitenta.

O sucesso internacional de seu primeiro romance Trainspotting, publicado em 1993, surpreendeu a todos devido à difícil leitura causada pelo emprego freqüente de palavras em vernáculo e à transcrição do inglês falado com sotaque escocês tanto na fala dos diferentes narradores quanto em diálogos.

Nessa obra, Welsh apresenta um grupo de escoceses de classe média, quase todos dependentes químicos. O mundo em que vivem gira em torno do uso de drogas, principalmente a heroína, e dos problemas que disso decorrem. Em Trainspotting, o escritor também enfoca o problema do alcoolismo - segundo pensa, um dos vícios mais difíceis de curar, porque existe um estímulo ao consumo de bebidas alcoólicas em nossa sociedade, o que não acontece no caso de outras drogas (www.mmkf.com/official/Trainspotting/9htm)

Em Trainspotting, a falta de dinheiro para sustentar o vício muitas vezes leva esses dependentes químicos a recorrer a todo tipo de prática, em especial a freqüentes roubos de lojas. Isso não significa que recorram à violência física. Apenas Begbie, membro do grupo que consome somente álcool, age de forma violenta, sendo seu comportamento agressivo criticado por seus pares que lamentam pelas vítimas. Apesar disso, não ousam enfrentar a fúria desse companheiro descrito como um gato selvagem em meio a inofensíveis bichanos (WELSH, 1993, p. 153).

Welsh também mostra em seu romance a luta pela vida, o sofrimento e a perda causados pelo HIV. Dentre os personagens contaminados pelo vírus, Tommy é um dos que desenvolve a doença. Renton visita o amigo, e ambos conversam sobre a AIDS. Seu caso se torna ainda mais grave por ele ser pobre e ter de viver num dos mal conservados apartamentos cedidos pelo governo para os sem-teto. Renton está ciente de que a vida de Tommy talvez pudesse ser prolongada para além do próximo inverno, desde que ele tivesse condições de, por exemplo, aquecer seu apartamento, de se alimentar bem, de procurar novos desafios, como já acontecera com outros amigos mais bem favorecidos economicamente.

Mark Renton, personagem principal de Trainspotting, demonstra indiferença quanto ao sentimento de nacionalidade, pois afirma não se sentir nem escocês nem britânico. Ironiza a imagem de bravura ainda hoje atribuída à Escócia por muitos que, por diferentes motivos, adotam uma visão romântica do passado do país. Para Renton, o imponente castelo de Edimburgo não passa de mais um prédio, tão importante quanto a loja de discos Virgin, por exemplo. Apesar de pensar dessa forma, Renton deixa transparecer que no fundo sente algo de especial por sua cidade. O jovem reconhece que, após um período de ausência, ao desembarcar em Waverly, estação férrea de Edimburgo cujo nome é uma homenagem ao romance de Scott, o que vê não lhe parece tão ruim assim (WELSH, 1993, p. 228).

Esse cuidado do rapaz em não se deixar levar pela beleza de sua cidade está relacionado ao fato de que o personagem a admira com olhos de quem conhece a dura realidade de muitos seus habitantes. Sua reação, portanto, não poderia ser como a de um turista recém-chegado a Edimburgo, que vê apenas o que está preparado cuidadosamente para lhe ser mostrado. A beleza da paisagem pode sugerir aos visitantes mais ingênuos a impressão de que toda a cidade é um cartão postal. Renton exemplifica essa falsa impressão mencionando o caso da tia de uma amiga, que chega com seus filhos a Edimburgo, vindos de uma pequena e pacata ilha na costa oeste da Irlanda, onde o gaélico ainda é a primeira língua. Ao desembarcar, essa senhora, acostumada a viver em lugar muito pequeno, ficou tão impressionada com a paisagem que a esperava à saída da estação que imaginou que a cidade estava restrita somente àquela parte. Com dificuldades de se expressar em inglês, pede abrigo e trabalho ao órgão público competente, dizendo que gostaria que lhe dessem uma casa para morar com vista para o castelo. Com certa ironia, Renton revela que a irlandesa fora encaminhada para um péssimo emprego e, em vez da vista para o castelo, lhe foi oferecida uma moradia em um dos lugares mais pobres da cidade com vista para o prédio da companhia de gás. Ao concluir seu relato, o jovem afirma: “é assim que funciona essa droga de vida real, se não somos ricos e cheios de grana (WELSH, 1993, p. 116).

Trainspotting já conta com duas diferentes versões teatrais. A primeira foi produzida em 1994 e a segunda em 1998. A versão cinematográfica chegou às telas em 1996, contribuindo para aumentar ainda mais sucesso do romance. O filme teve a direção do escocês Danny Boyle, diretor de sucessos como Cova Rasa, e contou com a presença de atores escoceses como Ewan Mcgregor e Robert Carlyle. Welsh também participa do filme, fazendo pequena aparição no papel de um traficante de drogas. Na película, os personagens se expressam como no livro, o que fez com que fossem acrescentadas legendas em cópias exibidas nos Estados Unidos.

Apesar de o filme não ser uma reprodução fiel do livro, as modificações conservam o que há de essencial no romance: a forma de vida de dependentes químicos, os problemas relacionados à Aids, a rejeição pelo trabalho formal, a incapacidade de adaptação à sociedade em geral.

Danny Boyle também procurou conservar um certo tom de comicidade, de humor negro, presente em alguns momentos do texto de Welsh. A maioria deles gira em torno do efeito da ação das drogas, nas casos em que ela acaba por colocar seus usuários em situações constrangedoras e mesmo humilhantes. Uma das modificações mais marcantes diz respeito à ênfase dada no filme ao sentimento de nacionalidade aos personagens escoceses, que no livro não se manifestam tão enfaticamente a esse respeito.

Welsh não se deixou afetar pelas mudanças, pois diz não acreditar numa interpretação fiel de uma obra quando esta é transposta para uma outra forma de expressão. Para ele, um filme ou qualquer outro meio não oferece a mesma liberdade de uma página em branco. O fato de o filme não ser apresentado a partir de uma abordagem da realidade social agrada ao escritor, pois considera que os personagens em Trainspotting não devem ser tomados simplesmente como vítimas. Segundo pensa, trata-se de pessoas cujas ambições e ideais estão muito além do que a sociedade tem para lhes oferecer (www.mmkf.com/official/Trainspotting).

Essa leitura que faz de seus personagens parece ser compartilhada pelo diretor Danny Boyle, que fez com que a versão do livro para o cinema comece com um longo monólogo, iniciado pela frase Choose life, proferida pelo protagonista Mark Renton, que se questiona a respeito do tipo de vida levado pela classe média numa sociedade capitalista. Suas palavras demonstram total descrédito em relação a um futuro melhor, e nada parece mais deprimente e enfadonho para esse jovem do que viver de acordo com as condições impostas pelo sistema. Ao rejeitar esse modo de vida, Renton se une a amigos que, por motivos não muito diferentes dos seus, também optaram por ficar à margem dessa sociedade em que não conseguem se adaptar.

Os tratamentos de reabilitação a que se submete levam Mark Renton a refletir sobre sua vida e a sociedade em que vive. Para ele, tratamentos de reabilitação significam a rendição do ser (WELSH, 1993, p. 181). Seguir o programa de reabilitação não acontece por sua vontade, mas por uma imposição da lei, sua outra opção seria a cadeia.

O jovem analisa cada modalidade de tratamento que recebe, desde o atendimento psiquiátrico até o trabalho realizado pelos assistentes sociais. Apesar da dificuldade em seguir qualquer um dos tratamentos, reconhece que aprendera com alguns deles um pouco mais sobre o porquê de seu comportamento depressivo, de sua alienação da sociedade. Renton concorda, em parte, com a idéia de que a depressão que o leva às drogas se origina no pensamento de que nada pode ser feito para que a sociedade se torne expressivamente melhor. O jovem reconhece que sua rejeição pela sociedade tem a ver com o fato de se sentir superior a ela, sendo essa a verdadeira razão de sua alienação. Renton critica a lógica social que procura absorver e mudar todos aqueles que não se comportam de acordo com suas regras. Segundo pensa, a sociedade não permite o uso de drogas porque isso é um sinal de sua própria incapacidade de que fazer com que dependentes químicos simplesmente aceitem o que ela tem para lhes oferecer (WELSH, 1993, p. 187). Insistindo em afirmar que se trata de uma opção em rejeitar a vida dentro de padrões pré- estabelecidos, ele diz:

(...) Choose us. Choose life. Choose mortgage payments; choose washing machines; choose cars; choose sitting oan a couch watching mind-numbing and spirit-crushing game shows, stuffing fuckin junk food intae yir mooth. (...)Choose life. Well, ah choose no tae choose life. If the cunts cannae handle that, it’s thair fuckin problem. (...) (WELSH, 1993, p. 187-188)

(...) Escolha-nos. Escolha a vida. Escolha pagar hipotecas; escolha máquinas de lavar; escolha carros, escolha sentar-se num sofá assistindo a emburrecedores e depressivos game-shows, enchendo sua boca de uma porcaria de comida. (...) Escolha a vida. Bem, eu escolho não escolher a vida. Se as pessoas não conseguem segurar isso, é problema delas. (...)

Como dissemos, Welsh utiliza o vernáculo em seu romance como a forma natural de expressão de seus personagens, sem se preocupar em explicar quaisquer termos com vistas a facilitar a tarefa de leitores não escoceses. A inclusão de explicações seria um trabalho de execução bem pouco viável, levando-se em consideração a grande ocorrência do uso do escocês e do inglês transcrito de acordo com a pronúncia escocesa. Seria necessária praticamente a reescritura de quase toda a obra.

No entanto, ciente da necessidade de esclarecimentos de alguns vocábulos presentes no texto, inclusive o título do romance, a editora acrescenta na edição americana do romance um glossário onde estão incluídas definições de palavras em vernáculo, gírias e abreviações. A consulta a esse glossário esclarece, por exemplo, que Trainspotting se refere a uma obsessão relacionada à chegada e à partida de trens.

No romance de Welsh, os personagens oriundos da classe média se expressam em escocês, em inglês com sotaque escocês ou em inglês padrão sem sotaque. O uso do inglês padrão sem a interferência do vernáculo e de falas marcadas pela pronúncia escocesa não é predominante nessa obra. Sua utilização acontece em algumas falas dos narradores e em alguns diálogos marcados por grande formalidade. Como, por exemplo, quando Renton e seu amigo Spud são levados à presença de um juiz por terem roubado uma livraria e se expressam de formas diferentes ao responderem às perguntas do magistrado. Renton utiliza o inglês padrão ao falar com o juiz, seus pensamentos, porém, são expressos em vernáculo. Spud, que não possuiu a mesma desenvoltura e esperteza de seu amigo, continua se expressando em vernáculo, mesmo na presença de uma autoridade, levado, talvez, por sua ingenuidade ou sua incapacidade de se expressar de outra forma (WELSH, 1993, p. 166-167).

A maneira com que o vernáculo é apresentado em Waverly e em Trainspotting está marcada pelos diferentes momentos históricos em que se inserem. Em Waverly, trata-se de um resgate. Daí se poder entender o seu uso comedido e a necessidade de tantas justificativas e explicações por parte de Scott em relação à sua escolha. Em Trainspotting, o escocês aparece no texto sem pedir licença. Junto com ele estão as transcrições do inglês falado com sotaque escocês mais ou menos acentuado.

Se Walter Scott pretendeu abrir caminho para outros escritores, parece ter conseguido mais do que poderia almejar no contexto histórico em que vivera. Para ele, resgatar o uso do escocês na prosa era uma forma de valorização de um dos símbolos nacionais a ser preservado na Escócia não independente. No contexto atual, Welsh utiliza o vernáculo sem reservas, retratando a maneira com que se expressam muitos dos escoceses.

Tanto na obra de Scott quanto na de Welsh, verifica-se que o escocês é substituído pelo inglês padrão por alguns personagens em situações mais formais. Essa troca só acontece quando os falantes têm um nível mais alto de escolaridade, o que pode ser, de certa forma, comprobatório da permanência do preconceito, ainda nos dias de hoje, por parte dos próprios nativos em relação ao vernáculo ou até ao sotaque escocês mais forte.

A respeito do uso do vernáculo e do inglês na Escócia, David Crystal afirma que o escocês como língua não existe oficialmente, pois ainda não foi capaz de substituir o inglês padrão como a língua do poder e do prestígio. Segundo o lingüista, o uso do vernáculo está restrito a determinadas publicações especializadas, a alguns programas de rádio e televisão, a desenhos animados e humor em quadrinhos. Contudo, reconhece que a publicação de obras de maior fôlego, como a tradução do Novo Testamento para a língua escocesa em 1983, dá a essa questão contornos complexos e obscuros. Afirma que os estudiosos que discutem a questão de o vernáculo escocês ser uma língua ou um dialeto acabam com isso conferindo um status especial ao escocês, pois esse dilema não está presente quando se referem ao estado de outras variedades regionais do inglês na Grã-Bretanha (CRYSTAL, 1995, p. 328).

Walter Scott mostra o que seu país tem de melhor, valorizando tudo e todos através de sua ótica romântica. Welsh focaliza um dos problemas mais sérios da sociedade escocesa atual, que é o consumo de drogas. Seus personagens habitam o lado pobre de Edimburgo, lugares pouco conhecidos por turistas e por escoceses mais favorecidos economicamente. Edimburgo, porém, guarda seu castelo, tocadores de gaita de fole vestidos a caráter com seus kilts, ou saiote escocês. E são estes os símbolos que, ainda hoje, os escoceses mantêm como tipicamente nacionais.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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CRYSTAL, David. The Cambridge Encyclopedia of English Language. Cambridge : Cambridge University Press, 1995.

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WELSH, Irvine. Trainspotting. New York & London : W. W. Norton & CO., 1996.

Entrevista de Irvine Welsh sobre a produção do filme Trainspotting concedida durante o Festival Internacional de Moscow: http://www.mmkf.com/official/Trainspotting/9.htm