SÍNCLISE PRONOMINAL: UM CONFRONTO DE CORPORA

Maria da Glória Rocha (FFPA – UNEB)

1. O Ponto de Partida

A motivação para a tarefa que empreendemos é consequência do trabalho de dissertação de mestrado, realizado em 1988 pela UFBA, intitu-lado A colocação pronominal na norma de estudantes pré –universitários, quando pesquisamos a colocação dos clíticos na norma de quatorze estu-dantes de terceiro ano do segundo grau de colégio particular da cidade de Alagoinhas- Bahia com idade entre 16 e 18 anos, objetivando verificar o grau de conformidade daquela norma às prescrições estabelecidas pelas gramáticas tradicionais pedagógicas.
A continuidade da pesquisa – pautada nos princípios da teoria varia-cionista – agora se dá com um outro corpus de língua falada, com infor-mantes de outra faixa etária, de 30 a 45 anos, e outro grau de escolaridade, curso superior completo, todos professores, atuando na comunidade de Alagoinhas.
O confronto dos corpora nos dará subsídios para verificar se o que foi detectado no corpus da primeira pesquisa (corpus I ) se repete em cor-pus de outra procedência (corpus II).
Para o corpus I, a hipótese construída, que se comprovou plena-mente, foi a de que a colocação clítica preferencial dos nossos jovens in-formantes alagoinhenses, tanto na língua falada como na escrita, era a pré-verbal, um uso lingüístico que contraria o que prescrevem as gramáticas pedagógicas – a colocação pós-verbal para o uso normal das pessoas consi-deradas cultas.
Este resultado e os de outros pesquisadores sobre o tema nos condu-ziram no sentido de manter a mesma hipótese para o corpus II – a preferên-cia pela colocação pré-verbal registrada no corpus I, supomos, se repetirá no corpus II, configurando-se a posição como a de uso preferencial dos nossos novos informantes.
Diferenças entre os comportamentos dos corpora se manifestariam no aumento do uso do clítico na posição pós-verbal  no corpus II, dadas as características dos seus informantes com mais escolaridade, mais idade e todos no exercício de uma profissão – a de professor – sem entretanto, comprometer a preferência geral pela colocação pré-verbal.
A continuidade do trabalho tem também como objetivo confirmar ou não tendências verificadas na primeira pesquisa, mas que não puderam ser corroboradas com segurança, vez que os dados empíricos se mostraram insuficientes para explicar determinados aspectos que serão retomados agora.
 

2. Procedimentos Metodológicos

A perspectiva teórica adotada – a teoria variacionista – nos conduz a encarar os fatos lingüísticos como fenômenos sociais passíveis de variação, plurais em sua realização, e a língua não mais como a  idealizou Saussure - sistema homogêneo- mas como fenômeno sistêmico, variável e heterogê-neo, governado por fatores sócio-culturais e lingüísticos.
Dentre as variáveis extra-linguísticas, optamos pelo sexo dos infor-mantes (M x F) ; duas faixas etárias – 16 a 18 anos (corpus I ) e 30 a 45 anos (corpus II ) e  o grau de escolaridade – média no corpus I e superior no corpus II..
As variáveis estruturais ou linguísticas foram elocuções em estilo de entrevista (EE); a forma fonética do clítico; a tonicidade das formas verbais e o contexto lingüístico que precede o verbo.
A escolha destas variáveis objetiva aprofundar  o estudo do com-portamento  dos  clíticos,  iniciado  na  primeira  pesquisa, ( corpus I ) cujos dados foram insuficientes para demostrar com segurança a função exercida por alguns contextos moforssintáticos na sínclise pronominal, inclusive o papel de algumas das chamadas “palavras de atração” estabelecido pelas gramáticas tradicionais. Encontramos outras motivações para a escolha destas variáveis em resultados de pesquisa registrados por lingüistas que buscaram explicar a sínclise pronominal  ( cf. Pereira,1981; Lobo,1992; Monteiro, 1994; Perini, 1996).
Neste trabalho, em virtude de sua própria natureza – relato dos re-sultados parciais de pesquisa  - trataremos apenas das variáveis extra-linguísticas.
 

3.Estudo dos corpora
3.1   O corpus I – relato de resultados

No primeiro trabalho realizado, consideramos que seria produtivo analisar quatro variáveis que supusemos poder exercer influência na esco-lha posicional do pronome por parte do usuário da língua: a modalidade lingüística – língua falada versus língua escrita; as formas verbais simples e locucionais ; o gênero retórico narração – descrição versus dissertação e, finalmente, uma variável extra-linguística – o sexo dos informantes.
Examinamos dez (10) horas de gravação de conversas informais e setenta (70) textos produzidos pelos informantes – narrações-descrições e dissertações. Recolhemos 717 dados dos quais 461 (64,29%) eram de lín-gua falada e 256 (35,70%) de língua escrita.
A análise destes dados nos permitiria talvez responder às perguntas que nos fazíamos no início do trabalho:

- qual a posição dos clíticos na língua falada?
- qual a posição dos clíticos na língua escrita?
- essa posição é preferencial ou obrigatória?
- se a posição é preferencial, o sexo, o estilo, (dissertativo ou narra-tivo), a forma simples ou locucional do verbo tem influência na colocação dos clíticos?
- se a posição é obrigatória, que contextos a  condicionam?
- que outros fatores poderão agir na colocação pronominal desses in-formantes?

Após o tratamento quantitativo dos dados, concluímos sobre as vari-áveis em questão o seguinte:

1. os pronomes oblíquos só se colocam em duas posições: a pré-verbal, a chamada próclise e a pós-verbal a chamada ênclise, qualquer que seja a modalidade lingüística utilizada (cf. Rocha,1988, secção 5.1.2 ). A outra posição recomendada pelas gramáticas pedagógicas, a intra-verbal, chamada de mesóclise pela gramática tradicional foi completamente igno-rada pelos informantes (op. cit., 1988, capítulo 5, T3 );

2. no estudo das variáveis, o sexo foi pouco significativo para de-terminar uma colocação preferencial, pois tanto os homens quanto as mu-lheres usaram sempre mais a colocação pré-verbal ( op. cit., secção 5.1.1, T 4);

3. a variável modalidade lingüística foi muito, senão a mais signifi-cativa das variáveis estudadas, porque embora a posição pré-verbal tenha sido majoritária em ambas as modalidades de língua – a falada e a escrita – foi na língua escrita, onde registramos maior ocorrência de clíticos na posi-ção pós-verbal (op. cit. secção 5.2, T 14). Também esse resultado preen-cheu as nossas expectativas. Pensávamos que, se a chamada ênclise se ma-nifestasse, seria exatamente na língua escrita, que é mais susceptível aos princípios gramaticais, mais rígida na obediência às normas prescritivas ;

4. considerados os gêneros retóricos dissertação e narração, não do-cumentamos nenhuma alteração na preferência dos informantes pela posi-ção pré-verbal, embora tenhamos registrado um número mais elevado de posição pós-verbal nas dissertações que nas narrações (op. cit. secção 5.1.4,T 13). Explicamos esta diferença pelas características da dissertação cujos temas quase sempre emprestam maior formalidade ao discurso;

5. a variável formas verbais simples x locucionais se manifestou pouco pertinente, porque, estivesse o verbo em uma ou em outra forma, a preferência dos informantes foi sempre pela colocação do clítico na posição imediatamente anterior a um verbo nocional. Entretanto, nas formas verbais locucionais, constatamos maior resistência ao uso do clítico na posição pós-verbal  (op. cit. secção 5.1.3, T10 e T11);

6. se, de modo geral, a posição preferencial dos pronomes oblíquos átonos é a pré-verbal, seguindo a orientação de Mattoso Câmara, reconhe-cemos a necessidade de distinguir, no uso dos nossos informantes, os pro-nomes começados por consoante (me, te se) dos constituídos de vogal (o, a). Verificamos que os pronomes começados por consoante, de preferência, se agregam procliticamente ao verbo e os constituídos por vogal se locali-zam preferencialmente depois do verbo, esteja ele nas formas simples ou locucionais (op. cit. secção 5.2.2.1, T 17);

7. considerando que a regra geral de colocação dos pronomes come-çados por consoante era a pré-verbal, os casos de colocação pós-verbal com esses pronomes foram explicados pela preferência favorecedora dos se-guintes fatores:

a) o grau de formalidade do discurso, mais evidente na modalidade escrita e no gênero retórico dissertativo;
b) as formas verbais simples;
c) o início de período na modalidade escrita;

8. considerando que era a posição pós-verbal a regra geral dos pro-nomes constituídos por vogal, os casos de posição pré-verbal com estes pronomes foram explicados pela presença, antes do verbo, do pronome relativo, do advérbio de negação, e talvez do sintagma nominal sujeito (op. cit. secção 5.3, T 23). Acrescentamos ainda a esta explicação, outra relaci-onada com o valor sociolingüístico do pronome, caracterizado como forma própria do estilo formal (op. cit. secção 5.2.2.1, item 1);

9. o caráter variável da regra de colocação dos pronomes é mais evi-dente na modalidade escrita em que o número de casos de posição pós-verbal é maior. No nosso entendimento, isso se explica porque a escrita sofre influência dos conteúdos apreendidos no ensino formal, fornecidos pela escola. Na língua falada, ao contrário, o uso parece conduzir à existên-cia, pelo menos quanto a esta amostra, de uma regra quase categórica, que coincide com a posição pré-verbal dos pronomes começados por consoantes uma vez que os pronomes começados por vogal quase inexistem nessa mo-dalidade.(op.cit. 1988);

3.2   Corpus II – os informantes
Objetivando ampliar os limites da pesquisa, buscamos estudar o uso normal dos clíticos na oralidade – e desta vez apenas na oralidade - de fa-lantes alagoinhenses ( sobre Alagoinhas, cf. Rocha, 1988, cap. I ) com es-colaridade superior e idade entre trinta e quarenta e cinco anos  (corpus II).
Selecionamos quatorze informantes a que chamamos de grupo de controle (GC), sete homens, sete mulheres, todos alagoinhenses e/ou resi-dentes em Alagoinhas há mais de dez anos, além de serem todos professo-res da comunidade com curso superior completo, alguns professores uni-versitários com cursos de especialização, exercendo alguns a profissão de professor  de curso superior e outros de curso médio.
Com a escolha desses informantes, pretendíamos registrar o tipo de colocação clítica que fosse o espelho da norma do grupo social em questão, representantes legítimos da classe média alagoinhense. O critério usado para classificar estes informantes como de classe média foi o fato de terem eles escolaridade superior o que no Brasil  é um indício seguro de que per-tencem às camadas socialmente privilegiadas.
Realizamos então uma entrevista gravada em fita magnética de ses-senta minutos com os informantes aos quais o pesquisador fazia a pergunta e deixava-os falar livremente, havendo intervenções do entrevistador sem-pre que era necessário alimentar a conversa, sem, entretanto, essa interven-ção redundar em diálogo constante. Por este motivo, intitulamos esses re-gistros de – elocuções em estilo de entrevista – (EE), um tipo de interlocu-ção que Vanoye (1973:161) chama de comunicação  em situação  de inter-câmbio .

3.3  As variáveis extra-lingüísticas do  corpus II
Optamos  pelas  variáveis sociais – sexo  dos  informantes (masculi-no x feminino); duas faixas etárias – 16 a 18 anos, faixa etária dos infor-mantes do corpus I; e 30 a 45 anos, faixa etária dos informantes do corpus II.
 

4. Uma leitura dos dados
4.1 Grupo de controle (corpus II )

A frequência de uso dos pronomes, na fala em estilo de entrevista, tomados isoladamente em sua forma fonético-mórfica, é a presente: me (47,36%), te (0,87%), se (40,03%), lhe (2,15%), nos (6,05%), o,a (3,51%).
O dados nos informam que a freqüência de uso dos oblíquos põe em destaque os pronomes me ( 47,36%) e se (40,03%). As freqüências  altas dos pronomes me e se, comparadas às dos outros pronomes, têm similar em trabalhos realizados por Pereira (1981: 183,186,220 ).
 Os pronomes de pouco uso foram em ordem decrescente: nos (6,05%), o (s), a (s) (3,51%), lhe (2,15%)  e o te (0,87%). No corpus I , já havíamos observado a pouca freqüência destes pronomes: o (s) a (s) e lhe 1,99%; nos (1,54%) e te (0,22%).
A leitura destes percentuais nos leva a inquirir: por que foram pouco usados? pelo que foram substituídos? o que a pouca freqüência está a indi-car? Esperamos poder responder estas questões mais adiante em outra etapa da pesquisa, quando analisaremos fatores sociolingüísticos que podem estar atuando na sínclise pronominal dos nossos informantes.
Observemos os dados relativos à  colocação clítica e registremos a frequência maciça e inquestionável da preferência dos falantes pela chama-da próclise. Vejamos os percentuais:

Tabela 1 – A colocação dos clíticos no  corpus II em EE.

Pré-verbal Pós-Verbal Intra-Verbal
 979/1.024  43/1.024  2 / 1.024
( 95,60% ) (4,19 %)  ( 0,19%)

Comparemos agora estes dados do corpus II com os do corpus I – lembremos que estes informantes são representativos da faixa etária de 16 a 18 anos, estudantes pré-vestibulandos – através da tabela dois.
 

Tabela 2 - A  colocação dos clíticos no corpus I em EE

Pré-Verbal Pós-Verbal Intra-Verbal
448 / 461 13 / 461 -
(97,18% ) (2,82%)

Comparando-se os dados, observamos que a posição pré-verbal con-tinua sendo a colocação preferida dos falantes nos corpora pesquisados com percentuais bem altos – 97,18% no corpus I e 95,60% no corpus II, mas nos chama a atenção o aumento da posição pós-verbal no corpus II ( 4,19%) contra (2,82%) do corpus I.

4.2   As variáveis idade e escolaridade

Tabela 3 – Idade e escolaridade dos informantes

Corpus I Corpus II
16 a 18 – escolaridade média 30 a 45–escolaridade superior
Pré-verbal Pós-verbal Intra-verbal Pré-verbal Pós-verbal Intra-verbal
97,18% 2,82% - 95,60% 4,19% 0,19%

A verificação dos dados permite concluir que a variável idade e a escolaridade são significativas na escolha das posições pronominais dos informantes. O percentual da posição pós-verbal aumentou do corpus I para o corpus II com o avanço da idade dos informantes, embora todos usem mais a posição pré-verbal.
 Fenômeno semelhante registra Pereira ( 1981:95 ) na oralidade de falantes cariocas e mineiros da Zona da Mata. Enquanto os seus informan-tes mais jovens não usaram a posição pós-verbal, só se registrando na faixa etária intermediária e na dos idosos, os nossos informantes mais jovens usaram-na no percentual de 2,82% e este percentual cresceu a medida que aumentou a idade.
Também Lobo (1992: 196) verifica que falantes da faixa etária I (25 a 35) e II (36 a 55) usam pouco a posição pós-verbal  no contexto em que as prescrições gramaticais assim a determinam, enquanto os falantes de 56 anos em diante observam mais a colocação recomendada pela tradição gramatical.
Entretanto, outro autor, Monteiro ( 1994:201 ) não detectou  dife-renças entre a colocação das faixas etárias  pesquisadas 25-35; 36-55; 56-70 em corpus do projeto NURC1 e conclui que não há sinais de mudança no tempo aparente, afirmando com relação a sua pesquisa:  “...em tempo apa-rente, não há indícios de que a sínclise seja variável em função da faixa etária”.2
Se analisarmos apenas os dados da posição pós-verbal por outra perspectiva, teremos uma visão mais nítida do fenômeno em questão.

Tabela 4 – A posição pós-verbal no dois corpora

Corpus I
16 a 18 anos 13 / 56
  23,21%
Corpus II
30 a 45 anos 43 / 56
         76,78%

Considerando o total das ocorrências pós-verbais nos dois corpora, percebemos o crescimento significativo do percentual do corpus II  76,78% contra 23,21% do corpus I.

4.3   A variável sexo
Cabe inicialmente explicar que o total de dados da tabela 2 (461) não coincide com o da tabela abaixo (717) porque lá optamos apenas pelos dados de oralidade  e nesta misturam-se dados das duas modalidades lin-güísticas .

Tabela 5 – A variável sexo no corpus I em EE.

 Pré-verbal Pós-verbal Intra-verbal
M 275 / 317
86,75% 42 /  317
 13,25% ----------
F 343 / 400
      85,75% 57 /  400
          14,25% ----------
 
A variável sexo no corpus I foi pouco significativa como demons-tram os dados da tabela acima (Rocha, 1988:65). Entretanto, diferenças de percentuais existem. A posição pré-verbal é sempre majoritária em relação à pós-verbal, tanto em homens como em mulheres, mas a diferença entre uma e outra posição distingue pouco o uso masculino do feminino. Já a posição pós-verbal foi mais usada pelas mulheres, embora a diferença de percentual não seja grande.
Os dados seguintes dizem  respeito à análise da variável sexo no corpus II:

     Tabela 6 – A variável sexo no corpus II em EE

 Pré-verbal Pós-verbal Intra-verbal
M 499 / 531
(93,97%) 30 / 531         (5,65%) 2 / 531
 (0,38%)
F 480 / 493
 (97,36%) 13 / 493
       (2,64%)  ________

Observemos que aqui, na perspectiva horizontal da tabela, os resul-tados se inverteram em relação ao corpus I, pois quem usou mais a posição pós-verbal foram os homens ( 5,65%), tendo as mulheres um percentual de uso menor (2,64%) nesta posição.
Com relação à posição pré-verbal, as mulheres usaram-na mais (97,36%) que os homens (93,97%) embora seja pequena a diferença per-centual.
Analisemos agora os dados por outra perspectiva, a que chamamos de vertical, isto é, dentro do universo de cada posição, os percentuais de homens e mulheres.

Tabela 7 – A variável sexo no corpus II

 Pré-verbal Pós-verbal Intra-verbal
M 499 / 979
 (50,97%) 30 / 43
(69,76%) 2 / 2
(100%)
F 480 / 979
(49,03%) 13 / 43
(30,23%)
  ----------

Os resultados não se alteram em relação à preferência dos falantes pela posição pré-verbal com um percentual um pouco maior para os ho-mens.
Considerando os dados da posição pós-verbal, o seu uso pelos ho-mens foi percentualmente significativo (69,76%) em relação ao das mulhe-res (30.23%) que preferiram mais a posição pré-verbal.
Este resultado difere daquele do corpus I ( vide tabela 5 e 7 ) e por isto cabe a pergunta: por que no corpus I, as mulheres usaram mais a posi-ção pós-verbal e no corpus II, os homens?
Resultado semelhante ao do corpus I com relação à variável sexo foi encontrado também por Pereira (1981: 116). Pesquisando a fala de pescado-res de Lagoa Azeda - Maceió, afirma que parece ser uma tendência as mu-lheres usarem mais cedo que os homens o  chamado enclítico e com índice mais elevado. Reconhece, portanto,  evidências em seus dados, de compor-tamento linguístico diferente entre homens e mulheres.
Estudando o assunto, Monteiro ( 1994:198) afirma que os seus dados indicaram  maior preferência dos homens pela posição pós-verbal, resultado que coincide com o do nossos corpus II . Ele afirma que embora a chamada ênclise seja de emprego reduzido , se ela ocorrer, será preferencialmente usada pelos falantes do sexo masculino.
Outros estudiosos, porém não detectaram a influêcia da variável so-bre a colocação clítica. É o que afirma Silva (1984) citada por Monteiro (1994: 199) a qual declara que o sexo não tem influência sobre a colocação pronominal.
Em tese de mestrado, Lobo (1992: 43)  afirma que não considera em seu trabalho a variável sexo, porque estudos anteriores empreendidos pela própria, Lucchesi e Rapp (1986) e Lucchesi e Mota ( 1991 ) indicaram a não interferência dessa variável sobre o padrão linguístico de colocação dos clíticos.
Comparando-se ainda os dados dos dois copora, um resultado nos chamou atenção: o uso da posição intra-verbal no corpus II. No corpus I, ela não foi registrada, mas remanesceu nos homens do corpus II, mais es-pecificadamente num único informante, resultado que representa 0,19%.
A interferência do fator sexo sobre a colocação dos clíticos nos nos-sos dados é de pouca monta sem evidentemente ser nula. Não queremos em função destes resultados minimizar o papel da variável em questão dentro do quadro teórico sob o qual tratamos nossos dados  - a teoria da variação.

Conclusões parciais
O confronto do comportamento sociolinguístico de dois corpora de falantes alagoinhenses de ambos os sexos com duas faixas etárias, dois diferentes graus  de escolaridade em elocuções no estilo de entrevista nos permitiu concluir preliminarmente que:
- a colocação pré-verbal é amplamente majoritária no corpus II como o foi no corpus I.
- a colocação intra-verbal ocorreu insignificantemente no corpus II e não ocorreu no corpus I;
- a colocação pós-verbal teve crescimento pequeno, mas inegável do corpus I para o corpus II . Ao tomarmos os dados brutos da posição em questão nos dois corpora, vimos que o uso percentual da posição cresceu significativamente do corpus I  para o corpus II, cujos falantes têm mais idade e mais escolaridade, fatores que se mostraram relevantes;
- chama atenção o pouco uso dos clíticos nos, o, a, os, as, lhe, te tanto no corpus I como no corpus II os quais necessitarão de um estudo em busca das causas de tal comportamento;
- a variável sexo em nossos dados aponta a preferência marcante de homens e mulheres pela colocação pré-verbal. Considerada a posição pós-verbal isoladamente, percebemos que enquanto as mulheres a usaram mais no corpus I, no corpus II, foi dos homens o maior percentual;
A pesquisa continuará buscando outras explicações nos condiciona-mentos linguísticos strictu sensu. Na verdade, não apenas linguísticos, mas sociolinguísticos.
 

Bibliografia básica

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LOBO, Lucchesi, Dante e Rapp, Carola. Colocação  dos pronomes átonos na norma culta de Salvador. Atas do Simpósio sobre   a diversidade lingüística no Brasil. Salvador: UFBA, 1986, p. 193 –204.
LUCCHESI e Mota, Jacyra. Análise das variáveis sociolingüísticas na colocação dos pronomes átonos. Estudos lingüísticos e literários. Sal-vador:  UFBA, 1991 n.º 11, p. 159-175.
MONTEIRO,  José  Lemos.    Pronomes    pessoais:    subsídios   para   uma  gramática do português do Brasil . Fortaleza:  UFC, 1994 . 272 p.
PEREIRA, Maria das Graças Dias. A  variação  na  colocação dos prono-mes átonos no Português do Brasil.. Dissertação (Mestrado em Letras). Rio de Janeiro: PUC, 1981. 133 p.
PERINI, Mário.  Gramática Descritiva do  Português.  São Paulo: Ática, 1996.p. 229 -232.
VANOYE, F. Usos da linguagem. Tradução e adaptação Clarisse Sabóia Madureira. 7. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1993,  p. 161.
TARALLO, Fernando. A pesquisa Sociolingüística. 2. ed. São Paulo: Ática 1986. 96 p.