COMUNICAÇÃO, LINGUAGEM E....

Anely Ribeiro (UFPR)

Introdução

Os estudos da linguagem no âmbito organizacional são poucos, em especial na abrangência intercultural, mas a lingüística conta com abordagens consistentes e profundas para a investigação. No tocante à comunicação, referente ao objeto e paradigma, buscam-se definições conceituais aliadas ao campo empírico. Quanto à triangulação lingüística, comunicação e cultura, a última precisa de contribuições referenciais e de correntes teóricas advindas da antropologia, de modo interdisciplinar. Nossa proposta é elaborar reflexões iniciais que possibilitam investigar tal triangulação, sendo o fenômeno da polidez lingüística (BROWN & LEVINSON, 1987) estudado nas ações da comunicação organizacional, considerando diferenças, semelhanças, estereótipos e preconceitos entre culturas do Brasil e Argentina.

Aspectos teóricos
sobre comunicação (organizacional)
e a polidez lingüística

A investigação sobre a comunicação organizacional intercultural associada à abordagem da polidez lingüística remete à necessidade de revisão da literatura quanto aos paradigmas e objeto de estudo da(s) teoria(s) da comunicação.

A polêmica científica sobre o objeto e fundamentos teóricos referentes à comunicação é antiga e produz divisões entre os autores diante da complexa teia de correntes metodológicas. Não há unanimidade em torno do tema. França, na obra organizada por Hohlfeldt, Martino e França (2001: 42 e 58) destaca que “a teoria da comunicação se caracteriza, sobretudo, pela heterogeneidade das correntes e concepções que abriga, e a apresentação de um quadro geral das teorias esbarra na dificuldade de sistematização”. Isso gera um quadro de fragmentação, descontinuidade e até o conflito entre as concepções teóricas. Sobre o objeto da comunicação, a autora refere-se “àqueles que a comunicação, enquanto conceito, constrói, aponta, deixa ver”. Ou seja, o objeto da comunicação é edificado pelo processo do conhecimento, de suas ferramentas e do seu “estoque cognitivo”.

Podemos esclarecer que uma das dificuldades da construção teórica para a comunicação está centrada na exacerbação da prática e nas questões que focalizam a instrumentalização das mídias em detrimento da abstração intelectual aliada à visão empírica dos fenômenos comunicacionais. A comunicação, em sua origem vinculada de modo interdisciplinar com as áreas da sociologia, antropologia, lingüística, psicologia, dentre outras, recebeu múltiplos olhares de tais disciplinas, o que gerou o enriquecimento de explorações metodológicas, por um lado, e dificuldades de integração teórica, por outro lado.

Constatamos que o debate sobre a temática da comunicação e seu objeto de estudo está exposto na coletânea de Motta et alii. (2002), na qual França (2002:13-29) aprofunda a discussão sobre os conceitos que norteiam a pesquisa na área da comunicação ao analisar criticamente o delineamento dos paradigmas informacional, semiótico-informacional, semiótico textual e dialógico. Aponta dois caminhos norteadores das investigações: os meios de comunicação e o processo comunicativo. A autora defende a necessidade de um paradigma mais consistente e complexo para consolidar a área da comunicação a partir de um “processo de troca, ação compartilhada, prática concreta, interação”. A abordagem teórica de França remete aos tópicos que viabilizam este novo paradigma com os elementos dos processos de produção e interpretação de sentidos, em que as interlocuções estejam inseridas em “contextos”, onde ocorra a apreensão dos “processos produzidos situacionalmente”, com manifestações da ação comunicativa em sintonia e inserção no panorama sócio-cultural de uma sociedade. Concordamos com a autora de que os novos ingredientes desse paradigma possibilitariam nortear outra descrição do processo comunicativo como algo vivo, dinâmico e que institui sentidos e inter-relações entre os elementos, capazes de conectar a compreensão sistemática da produção de sentidos, uso da linguagem, relevância do contexto com os interlocutores da ação comunicativa.

A insuficiência do modelo da teoria da informação, confundida, algumas vezes, com teoria da comunicação é discutida por Barros na obra organizada por Fiorin (2004: 25-53) na qual a autora descreve as principais dificuldades do modelo informacional e apresenta a proposta de Jacobson (1969), detalhada por Ignácio Assis Silva (1972). Traz, como principais contribuições, o acréscimo ao modelo anterior ao enfatizar a “relação com o contexto, com a experiência comunicativa ou a ser comunicada e a representação do código e dos subcódigos”. Ou seja, a importância do código comum e dos subcódigos permeando as relações comunicativas no processo do destinador ao destinatário devendo considerar as variações lingüísticas e os contextos. A respeito do modelo circular da comunicação verbal, a autora faz menção aos estudos de Bateson, Hall, Goffman, Benveniste e Bakhtin. Em nossa proposta de investigação da variação da cortesia lingüística no âmbito organizacional intercultural é relevante o aprofundamento em torno aos postulados teóricos de Goffman ao examinar os procedimentos de preservação da “face”, que pode ser positiva ou negativa, é o conceito fundamental da teoria de Brown & Levinson (1987). Nesse enfoque, discutem-se as estratégias para a construção da auto-imagem pública, bem como as ameaças para atingir ou preservar o outro e a si próprio, considerando que as ações comunicativas verbais têm variações de cultura para cultura.

Uma das contribuições da teoria pragmática para entendermos o processo comunicacional encontra-se nas investigações desenvolvidas por Moescheler (s/d:20) ao conceituar que a pragmática “é o estudo dos aspectos inferenciais da comunicação verbal. A relação crucial está entre linguagem e comunicação, e mais precisamente o modelo de comunicação envolvido no uso da linguagem”(trad. nossa). Para o autor, a pragmática define comunicação como um processo mesclado, baseado em dois modelos de comunicação: o modelo de código e o modelo inferencial. Então, a comunicação verbal implica nos processos de codificação e decodificação e na pragmática inferencial.

O reflexo conceitual das abordagens conflitantes sobre a comunicação é transportado quando tratamos da comunicação organizacional, uma vez que as fragilidades e barreiras são também manifestadas nessa área específica, cuja complexidade da disciplina administrativa se mescla à do processo comunicacional, tratada em geral, pelas ações de relações públicas e marketing. No mundo das organizações, a comunicação é vital no seu funcionamento, realimentação e sobrevivência, caso contrário, esse mundo entrará no processo de entropia.

Para Kunsch (2003: 70-71) o processo comunicacional é entendido pelas correntes teóricas da comunicação tradicionais, o que nos leva a compreender que, com freqüência, se confundem com as teorias da informação. No entanto, um dos pontos destacados pela autora é a necessidade de rever o enfoque no “processo relacional entre indivíduos, departamentos, unidades e organizações”, considerando os relacionamentos comunicativos internos e externos, os quais sofrem condicionamentos e interferências variados diante de diferentes tipos de comunicação que atuam em distintos contextos. A referência aos contextos nos aspectos relacionais da comunicação organizacional deve ser entendido dentro da dinamicidade dos fenômenos históricos que interagem no macro e micro sistema empresarial, bem como o reflexo que se operam nas interlocuções organização-públicos. Segundo Chanlat (1996: 49) “contextos são modos de leitura da situação. São as estruturas de interpretação, os esquemas cognitivos que cada pessoa possui e utiliza para compreender os acontecimentos que ocorrem” (grifo do autor), e em particular, nesse estudo, são fundamentais por tratar da variação da cortesia lingüística em processos da comunicação organizacional intercultural.

As barreiras gerais da comunicação são semelhantes no âmbito da comunicação organizacional, tais como apontados por Kunsch (2003: 74) e são: semânticos (uso “inadequado” da linguagem que pode gerar mal entendido); administrativa/burocrática; excesso de informações e informações incompletas ou parciais, credibilidade da fonte; diferenças de status entre níveis hierárquicos e pressão do tempo na rotina empresarial. Nesse sentido, os aspectos da (des)cortesia lingüística podem estar permeando a comunicação verbal, os quais objetivamos analisar e comparar associada às interferências geradas pela cultura societal na relação de convivência com a cultura organizacional de empresas sediadas no Brasil e Argentina.

Como investigadora dos fenômenos comunicacionais que envolvem ações de relações públicas inseridas no composto da comunicação integrada nas organizações, abordagem cunhada por Kunsch (1997), entendemos que a concretude de tais ações parte de uma linha política de comunicação, responsável pela geração de enunciados nos processos de comunicação verbal que otimizam a construção de relacionamentos entre a organização e seus públicos estratégicos. O contexto organizações-públicos contém situações nas quais os falantes organizacionais empregam, constantemente, a polidez lingüística na comunicação verbal escrita e oral visando à preservação da imagem pública (face). Portanto, para o desenvolvimento de nosso estudo de caráter interdisciplinar dependemos dos aportes teóricos da lingüística, com ênfase sobre a cortesia/polidez a ser empregada no âmbito da comunicação organizacional intercultural. Como podemos vislumbrar, o conceito de “contexto” é crucial tanto nos estudos especificamente da comunicação organizacional, como também nos estudos da pragmática lingüística.

Partimos do pressuposto que a interação lingüística é necessariamente uma interação social que leva em consideração diversos fatores, entre os quais estão a distância e aproximação social dos interlocutores e os tipos de relações que se operam entre as pessoas, podendo ser mais ou menos amistosas e/ou mais ou menos profissionais. Portanto, o tratamento polido entre as pessoas é uma condição inerente ao fenômeno comunicativo e variante de cultura para cultura, mesmo tendo regras em sentido universal. O que se entende por polidez/cortesia na lingüística?

O estudo teórico de Brown & Levinson (1987: 61-90) desenvolve os princípios básicos sobre a face/imagem, os fatores que influenciariam a escolha das estratégias da polidez lingüística e os atos de ameaça à face – FTAs-, conforme a denominação original dos autores, bem como as circunstâncias das variáveis sociológicas que afetam o modelo da polidez lingüística proposto. De modo sumarizado, trataremos dos principais conceitos, fundamentais para nossa investigação dos fenômenos da polidez lingüística nos atos comunicacionais de pedidos, desculpas, elogios, reclamações, dentre outros, dos falantes organizacionais, de modo intercultural.

“Face”, entendida como auto-imagem pública, que cada membro deseja reivindicar para si consiste em dois aspectos, segundo os autores mencionados acima: – a imagem negativa – reivindicação básica do território e proteção pessoal, isto é, liberdade de ação e liberdade de imposição; – imagem positiva – auto-imagem positiva ou “personalidade”, incluindo o desejo de que esta auto-imagem seja apreciada e aprovada. A noção de imagem adotada por Brown e Levinson é derivada de Goffman (1967), em termos de que a imagem está vinculada ao princípio de impedimento e humilhação, ou “face perdida”. Nesse sentido, a imagem, algumas vezes, está emocionalmente investida e, pode estar perdida, mantida ou intensificada durante a interação comunicativa. Em geral, as pessoas cooperam na manutenção da imagem, mas a imagem tem vulnerabilidades e ameaças, nas situações cotidianas entre pessoas, nos relacionamentos de negócios no âmbito intra e intercultural.

A linha conceitual da cortesia/polidez lingüística de Brown e Levinson é universal. No entanto, os autores advertem (1987:61) que em cada sociedade particular, a face está sujeita às especificidades culturais, o que torna possível modificar a intensificação ou suavização dos atos de ameaça à imagem, vinculados fundamentalmente às idéias que prevalecem no contexto de vida pessoal social onde os fenômenos da polidez lingüística ocorrem. Para tanto, devemos aprofundar estudos sobre a identidade dos grupos sociais no processo de interação comunicativa. Para nosso estudo é relevante a exposição dos autores a respeito dos três fatores sociológicos que determinam o nível da polidez lingüística, em que o falante usa em relação a um ouvinte (1987: 15): a) o poder relativo (P) do ouvinte sobre o falante; b) a distância social (D) entre falante e ouvinte e c) o grau de imposição (R) envolvendo a realização do ato de ameaça à imagem (FTA). Interessante observar que a visão de tais categorias analíticas dos fatores P, D e R que os autores especificam como determinantes sociais específicos, podem conduzir ao questionamento e percepção de outros fatores que se operam e afetam a relação comunicativa, com variação de cultura para cultura, tais como o nível de (in)formalidade que prevalece em determinados grupos sociais.

A variação do contexto sócio-cultural em que ocorre o fenômeno da cortesia lingüística entre falantes organizacionais situados em dois países distintos e os ouvintes ou públicos estratégicos são elementos fundamentais para um corpus da investigação e, que irão nortear o contexto no qual ocorreram as estratégias empregadas em pedidos, desculpas, agradecimentos e, possivelmente, elogios, no âmbito.

As realizações das estratégias da polidez lingüística desenvolvida por Brown e Levinson (1987) partem da premissa descritiva de superestratégias, que são: polidez positiva, bald on record, polidez negativa e off record como recursos de análise das expressões verbais dos atos de ameaça à imagem, de acordo a uma determinação racional do risco da imagem e as escolhas dos enunciados comunicativos entre os participantes.

As estratégias da polidez positiva envolvem mecanismos em que o falante compartilha conhecimentos de mundo, metas e valores com o ouvinte; o falante e o ouvinte fazem parte do mesmo conjunto de pessoas que possuem os mesmos desejos. Além disso, o falante tem perspectivas e desejos comuns ao ouvinte como membro interno do grupo. Isso possibilita baixa formalidade nos usos das expressões lingüísticas. Exemplos relacionados com possíveis situações da vida organizacional – autoridade superior, dirigindo-se aos funcionários, em forma de “exagero” – “A nossa empresa cresceu, extraordinariamente nesse ano, graças a cada um de vocês”; – uso de marcadores de identidade do grupo – “Este time de funcionários tem os mesmos ideais dos fundadores da nossa empresa”.

Nas estratégias da polidez negativa, o desejo comunicativo do falante é de não se impor ao ouvinte, existindo grande distância social e maior nível de formalidade na interlocução, no qual o falante procura elevar o tratamento em relação ao ouvinte, manifestando deferência, expressões honoríficas e um nível de distância social e poder maior em relação ao ouvinte. Exemplos: – suavização (hedge) – “Eu suponho que o Sr. Poderia desenvolver o plano estratégico...” – “Como você e eu sabemos, a meta é...” – Não forçar o ouvinte: “Devido a nossa coletiva marcada, você poderia contatar a imprensa, antes do meio dia?”.

As estratégias off Record se caracterizam como atos comunicativos realizados de modo que não seja possível atribuir uma intenção comunicativa clara. Os enunciados são essencialmente de uso indireto. Se um falante quer praticar um FTA, mas quer eximir-se da responsabilidade, pode fazê-lo e deixar ao ouvinte/destinatário decidir como interpretá-lo. Tais estratégias devem estar nos contextos dos participantes dos atos comunicativos empregados, tais como a ironia, a insinuação, o uso de contradições, ser vago ou ambíguo, dentre outras. Exemplos: – insinuação – “Amanhã é o dia da inauguração da unidade X” (haverá muito trabalho até lá); – ser irônico – “Como Paulo têm idéias tão criativas para o projeto de...” (depois do tal Paulo ter apresentado várias idéias estúpidas).

O emprego das estratégias bald on record busca a máxima eficiência comunicativa, em conformidade com as máximas de Grice (1975), que caracterizam os princípios conversacionais. Em geral, a razão primária para uso dessas estratégias, está relacionada ao desejo do falante em fazer o FTA com máxima eficiência, mais do que o desejo de satisfazer a imagem do ouvinte. Exemplos: “Ouçam! A reunião é às dez horas. Tragam os relatórios de cada área”; “Envie-me um e-mail do programa X”.

Possibilidades teóricas sob enfoque
intercultural e a cortesia lingüística

Para o estudo da comunicação intercultural, em específico da comunicação organizacional e seus públicos estratégicos situados em diferentes países, é vital aprofundar o entendimento que se opera na relação cultura – linguagem – comunicação – públicos – contexto, cuja influência se refletirá no processo de construção dos enunciados que caracterizam a polidez lingüística.

De modo resumido, enfatizamos alguns exemplos de investigações científicas que vem sendo desenvolvidas sobre o fenômeno da polidez lingüística, com enfoque intercultural. Fukushima (2004: 365-387) introduz o conceito de polidez comportamental, incluindo o ouvinte como um componente na estrutura de trabalho analítica, no âmbito intercultural. A autora destaca que foi dada pouca atenção na pesquisa de polidez lingüística como uma “unidade total do comportamento”, na perspectiva ouvinte e falante, sendo que ambos são necessários na determinação de como a polidez é interpretada e os efeitos da interação para ambos. A exposição teórica de Fukushima (2004: 366-367) parte da base de uma situação comunicativa e os estágios seqüenciais em que a polidez lingüística permeia a relação falante e ouvinte. Os estágios são os seguintes: 1) Enunciado/Ação do falante – estratégico e concreto – no qual o falante diz ou faz alguma coisa → 2) Avaliação do ouvinte – não estratégico e abstrato – avaliação do ouvinte sobre o enunciado ou ação do falante, capturando a situação em que ocorre → 3) Resposta do ouvinte ao Enunciado/Ação do falante – estratégico e concreto, podendo ser um enunciado ou ação. A resposta pode ser verbal ou não verbal em relação ao estágio 1 → 4) Avaliação do falante – não estratégico e abstrato – o falante do estágio 1 avalia a resposta. Portanto, a autora propõe que a pesquisa da polidez comportamental e lingüística esteja imbricada num modelo circular.

No tocante à perspectiva teórica que aborda definição sobre cultura e como é feita a operacionalização em situações interculturais, tendo como base as dimensões que possam analisar manifestações tangíveis do comportamento humano encontram referências nas investigações de Hofstede (1991). As dimensões desenvolvidas pelo autor foram aplicadas em estudos empíricos na empresa IBM, localizada em mais de quarenta países. Ao conceituar cultura, Hofstede (1991: 18-20) utiliza a expressão programação mental, mas não no sentido que as pessoas sejam programadas de forma computacional. O autor especifica:

Cultura é um fenômeno coletivo, uma vez que é, pelo menos em parte, partilhada por pessoas que vivem no mesmo ambiente social onde é adquirida. Podemos defini-la como a programação coletiva da mente que distingue os membros de um grupo ou categoria de pessoas face a outro. (Grifo do autor).

Conforme a abordagem teórica defendida por Hofstede, as programações mentais têm origem nos diversos ambientes sociais onde vivemos, no decurso de nossa existência. A cultura é adquirida e não herdada, ou seja, provém do ambiente social do indivíduo, não dos genes, distinta da natureza humana e da personalidade. A personalidade constitui o “conjunto de programas mentais” e está fundada em traços que são, em parte, herdados com o código genético único e, em outra parte, adquiridos. A aquisição faz-se através da influência coletiva (cultura) e das experiências pessoais. A natureza humana constitui o que todos os seres humanos têm em comum, incluindo os sentimentos, o contato entre seres humanos, capacidade de observar o meio e falar uns com os outros. Tais elementos constitutivos são modificados pela cultura.

As dimensões empregadas por Hofstede nas suas investigações (1991: 29) em países diferentes, revelaram valores, que analisados estatisticamente apresentam problemas comuns, mas de soluções diferentes, conforme a cultura de cada país. Cabe observar que o autor recebeu influência na elaboração das dimensões culturais do sociólogo Alex Inkeles e do psicólogo Daniel Levinson que publicaram estudos da literatura antropológica em língua inglesa em 1954. As dimensões são especificadas como:

a) distância hierárquica – (desigualdade social, incluindo a relação com a autoridade);

b) grau de individualismo/coletivismo – (relação do indivíduo e o grupo);

c) grau de masculinidade/feminilidade – (e suas conseqüências sociais) e

d) controle da incerteza – (formas de gerir a incerteza, relacionadas com o controle da agressão e expressão das emoções).

O autor estabelece cruzamentos analíticos entre as dimensões, conforme os dados obtidos através de questionários aplicados aos empregados da IBM em diferentes países. Além disso, emprega cada dimensão e interpreta suas relações, considerando aspectos da cultura societal dos países investigados, tais como região, religião, classe social, família, ensino, estado, local de trabalho, campo das idéias e projeções futuras. A perspectiva teórica de Hofstede fez parte das investigações de Fukushima (2004) sobre a avaliação da polidez lingüística entre estudantes universitários de origens britânica, japonesa, sueca e alemã, em situações criadas, permitindo analisar o nível de atenciosidade, em âmbito intercultural.

Outro exemplo de investigação teórico-empírica sobre o fenômeno da polidez lingüística é desenvolvido no Projeto Cross-Cultural da Realização do Ato de Fala, conforme Blum-Kulka (1989). O projeto investiga a variação intralingual e intercultural em dois atos de fala: pedidos e desculpas que estão vinculados aos atos de ameaça à imagem, conforme Brown & Levinson. Tem como base a teoria dos atos de fala de Austin e Searle. As questões centrais da investigação do grupo envolvido nesse projeto, encontradas em Blum-Kulka (1989: 7) exploram o valor e função da polidez ou deferência na realização do ato de fala e a universalidade do fenômeno na abrangência intercultural e as línguas. Podemos destacar na exposição dos estudos reunidos pelo projeto, a profundidade teórica e metodológica, criando scripts que representam situações socialmente diferenciadas, mediante o emprego do instrumento denominado teste do discurso completo. Por razão de espaço não teceremos comentários mais amplos, mas devemos reconhecer a seriedade científica descrita nesse projeto para o estudo da polidez lingüística intercultural.

Considerações finais

O presente trabalho contempla possibilidades teórico-empíricas para o estudo do fenômeno da polidez lingüística (e comportamental) já em desenvolvimento e, de modo interdisciplinar, inicia os pressupostos de estudo com marcos teóricos da comunicação organizacional e a cultura, na perspectiva intercultural. Nesse sentido, queremos trazer reflexões e recebermos contribuições sobre o tema de investigação. Almejamos que, por meio de um trabalho em grupo, compondo redes de relacionamentos científicos, possamos nos desafiar, futuramente, em desenvolver tais estudos na América Latina. O desafio é possível para uma realização concreta? Possivelmente, isso dependerá não só da nossa vontade própria como também das parcerias científicas, além dos grupos sociais organizados que possam nos apoiar em tal empreitada. Nesse sentido, podemos trazer contribuições, tanto de natureza acadêmico-científica, como de natureza social e cultural nas ações lingüísticas aplicadas ao processo de comunicação organizacional que operam nos países de culturas que apresentam tipos de dimensões a serem exploradas, sistematicamente pela pesquisa, na América Latina.

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