Língua,
cultura
e
poder
o
caso
da
língua
brasileira
de
sinais
e
seus
espaços
sociais
de
resistência
numa
sociedade
marcada
pelo
“ouvinticentrismo”
Edicléa Mascarenhas
Fernandes (UERJ)
Glaucia Silva de
Carvalho
(UERJ)
A
língua
como
instrumento de
poder,
dominação e
discriminação
social de
grupos minoritários tem sido
bastante estudada no
ramo da sociolingüística fundada
por Benveniste
em 1960. Os
trabalhos de William Labov (1963,
apud CAMACHO, 2000)
sobre as
variantes
lingüísticas vieram
colaborar
para o
entendimento de
que
não existe
deficiência
lingüística,
pois
toda
língua é
suficiente
para o
estabelecimento de
um
sistema de
comunicação num
grupo
social. O
que existe é a
tentativa de uma
supremacia
lingüística de
grupos
dominantes.
Nosso
trabalho pretende
discutir o
processo de
estigma e
preconceito
que a
Língua
Brasileira de
Sinais e a
cultura
surda sofreu
durante
anos de
supremacia do ouvinticentrismo
nos
espaços dos
sistemas
oficiais
educacionais e
inclusive no
campo
acadêmico. Os
trabalhos do
lingüista William Stokoe começaram a
ser difundidos no Brasil no
final dos
anos 80,
porém ocorreram
incipientes mudanças nas
práticas
educacionais
oficiais
para
alunos
surdos,
que passam a
ser compreendidos a
partir do
enfoque
bilíngüe. A
garantia da
manutenção da
língua das
comunidades surdas e
sua
cultura vêm sendo garantidas
em
nosso
país
muito
mais
por
movimentos
sociais organizados do
que
por
organismos
oficiais e
centros
acadêmicos. Apresentamos
em
nosso
estudo,
através de
fontes documentais, o
caso das
igrejas evangélicas e do
Ministério do
Silêncio,
que constituíram no
cenário
nacional o
que denominamos de uma
pedagogia
bilíngüe de
resistência
através da
qual a
Língua
Brasileira de
Sinais (LIBRAS) e a
cultura
surda vêm se mantendo.
Atualmente a
Lei 10436/2002,
que instituiu
oficialmente a
Língua
Brasileira de
Sinais no
artigo 1o “reconhece
como
meio
legal de
comunicação e
expressão a
Língua
Brasileira de
Sinais –
Libras e
outros
recursos de
expressão a
ela
associados”. E no
parágrafo
único define como
Língua
Brasileira
de
Sinais
–
Libras
a
forma
de
comunicação
e
expressão,
em
que
o
sistema
lingüístico
de
natureza
visual-motora,
com
estrutura
gramatical
própria,
constituem
um
sistema
lingüístico
de
transmissão
de
idéias
e
fatos,
oriundos
de
comunidades
de
pessoas
surdas do Brasil.
O
decreto 5296/2004
que
regulamenta as
Leis 10048/2000 e 10098/2000 estabelece
normas
gerais e
critérios
básicos
para
promoção de
acessibilidade, e no
capítulo II,
artigo 6o ,
parágrafo 1o,
inciso III
Propõe
serviços
de atendimento a
pessoas
com
deficiência
auditiva
prestado
por
intérpretes
ou
pessoas
capacitadas
em
Língua
Brasileira
de Sinais-
LIBRAS
e no
trato
com
aquelas
que
não
se comuniquem
em
Libras.
Este
panorama se constitui como desafio à
universidade
brasileira no
que concerne à
adequação de
cursos e ao
preparo de
profissionais (professores
ouvintes e
surdos e
intérpretes de
Libras)
para garantirem o
direito
social e
lingüístico do
bilingüismo das
comunidades surdas.
A
diferença
sempre fez
parte da
sociedade, acrescentando uma nuança
em
toda a
cor de
nossa
existência. Matiz que seria
melhor percebido se, da
mesma
forma
que existem
pessoas portadoras de
necessidades
especiais, a
sociedade as enxergasse
com “olhos
especiais”. A
conseqüência da
falta desse “olhar
especial” é o
completo
descaso e a
ausência de
suportes
para
que essas
pessoas sejam
melhor incluídas.
Idéias pré-concebidas
em
relação a
deficiência ocasionaram uma
série de
intervenções inadequadas
que têm sido realizadas
nos
processos
educacionais.
Por
isso é
necessário
que se continue e se incentive as
lutas
em
favor das
causas das
pessoas
especiais e se trabalhe
para
que haja empoderamento;
desenvolvimento da
autonomia e socialização. E,
mais do
que
isso, é
preciso
também
conhecer os
diversos
espaços
onde,
este
tipo de
trabalho é realizado
para
que haja uma
relação
dialógica estabelecendo
parcerias.
Este
tipo de relacionamento poderá
trazer
contribuições na
troca de
conhecimentos
entre as
partes envolvidas e
também
provocar uma
maior mobilização e conscientização
pelos
direitos das
pessoas
com
deficiência e
até
mesmo a
aceleração de
suas
conquistas.
Os
surdos
e
alguns
aspectos
de
sua
trajetória
na
luta
para
preservar
sua
cultura
e
língua
Durante
muito
tempo a
língua de
sinais foi reprimida
em
favor de
idéias
dominantes
que visavam à normalização do
surdo,
por
meio de
práticas corretivas.
Entre estas
práticas podemos
mencionar o
ato de
amarrar as
mãos das
crianças
para impedi-las de sinalizarem.
Este
tipo de
prática
por
muito
tempo esteve
presente na
educação dos
surdos e impedia o
uso da
LIBRAS nas
instituições de
ensino,
mas,
não nas
pequenas
comunidades.
Mesmo sendo
alvo de
grande
preconceito e
proibições a
língua de
sinais resistiu a
tais
medidas impostas aos
surdos.
Estas
ações foram fundamentadas
em uma
ideologia
clínica e
dominante
que contribuiu
para o
impedir a
disseminação da
língua de
sinais, ao
mesmo
tempo
em
que impôs uma
condição
sob a
qual a
maioria dos
surdos
não pôde se
incluir,
por
pressupor
que a
comunicação
plena do
surdo aconteceria se
ele aprendesse a se
expressar
verbalmente. A
surdez
era entendia
como “doença”, sendo assim
propostos
tratamento fonoaudiológico e o
uso de
aparelhos
auditivos.
Como
conseqüência desta
ideologia ouviticentrista criou-se uma
cultura
surda marginalizada, reprimida, e o
isolamento
social deste
grupo,
pois esta
ideologia
clínica
não conseguiu
dar
conta do
que
ela
própria defendeu (SKLIAR,
1998).
Espaços
de
manutenção
da
cultura
surda
o
estudo
de
caso
das
Igrejas
Protestantes
Os
espaços observados, neste
estudo, foram as
Igrejas de
religião
protestante
que realizam
projetos
com
pessoas surdas,
entre
quais podemos
citar:
Primeira
Igreja
Batista
em
São Gonçalo,
que tem
pouco
mais de vinte
anos de
ministério;
Primeira
Igreja
Batista do
Rocha e
Primeira
Igreja
Batista
em
Trindade. Esta
última tem
um
trabalho
mais
recente (aproximadamente
cinco
anos). O
motivo desta
escolha é o
fato de se
perceber
que
muitos
intérpretes
são provenientes de
igrejas evangélicas e
este
também
ser o
lugar
onde começou a
sua
trajetória na
experiência
com os
surdos
além destes
últimos estarem incluídos e
atuantes nas
atividades promovidas pelas
igrejas. O
objetivo desta
pesquisa é
identificar a
existência de uma
proposta
pedagógica
nos
trabalhos de
evangelização realizados e
quais
são os
meios utilizados.
Além de
descobrir
quais
são as
contribuições
para o
desenvolvimento sócio-cultural do
surdo.
Esses
tipos de
movimentos (ministérios),
espaços
sociais de
resistência, há
muito têm carecido de
um
olhar
acadêmico.
A
metodologia
empregada
foi o
estudo
de
caso,
a
observação
participante,
análise
de
fontes
documentais (revistas,
material
pedagógico
e
registro
dos
eventos)
e
entrevistas
gravadas
em
áudio
e
vídeo.
Durante
a
entrevista
os
surdos
tiveram a
oportunidade
de
exprimir
suas
motivações no envolvimento
com
o
trabalho;
as
contribuições
trazidas
para
o
seu
crescimento
como
pessoa;
sua
opinião
crítica
sobre
a
escola,
como
eles
têm percebido a
visão
da
sociedade
em
relação
aos
aspectos
da
surdez,
bem
como
sua
participação no
ministério.
Uma
visita ao
arquivo da
Junta de
Missões
Nacionais,
que é
um
órgão ligado as
Igrejas
Batistas e oferece
treinamento e
assessoria
para a
organização do
ministério, trouxe
um
dado
estatístico
importante: consta no
seu
cadastro
um
total de 569
igrejas
que
já foram atendidas
pela
Junta de
Missões no Brasil.
Isso
ainda
não
retrata
completamente a
realidade uma
vez
que o
cadastro encontra-se
em
construção e a
cada
ano surgem
novos
ministérios
em
diferentes
denominações,
como
por
exemplo,
Assembléia de
Deus,
Nova
Vida e
Presbiteriana.
Apesar
do
enfoque
maior
do
nosso
estudo
ser
no
município
de
São
Gonçalo podemos
citar
algumas
igrejas
que
desenvolvem
um
trabalho
com
surdos
do
Espírito
Santo:
Primeira
Igreja
Batista
em
São
Mateus
(início
do
trabalho:
1988);
Segunda
Igreja
Batista
de
Cachoeira
de Itapemirim (início
do
trabalho:
2000);
Igreja
Batista
da
Praia
do
Canto
(
início
do
trabalho:
1999);
Igreja
Batista
Praia
de Suá (início
do
trabalho:
1989);
Primeira
Igreja
Batista
de
Vitória
(início
do
trabalho:
1994);
Primeira
Igreja
Batista
de Guarapari (início
do
trabalho:
1999).
Primeira
Igreja
Batista
em
São
Mateus –
início do
trabalho: 1988.
Estes
exemplos
servem
para
mostrar
que
a
língua
de
sinais
tornou-se
um
elo
entre
as
igrejas
de diversas
denominações
e
regiões.
É
importante
tentar
entender a motivação do
surdo,
porque, na
verdade
quando
ele
não
encontra
apoio
entre
seus
familiares (na
maioria dos
casos) e se sente discriminado,
ele
procura
um
grupo no
qual possa se
identificar. Essa
identificação é
fundamental,
pois, facilita
sua
inclusão:
O
desencontro
do
surdo
com
sua
identidade
o conduz a uma
atitude
de
não
aceitação
a
sua
própria
condição,
e
esse
desencontro
se dá
devido
a
imposição
de
um
ouvinte
como
modelo,
gerando
insegurança,
rejeição à
Língua
de
Sinais
e,
óbvio,
fracasso
na
comunicação
do
surdo
com
outras pessoas. (BRITO,1993: 56)
O
processo de
identificação
conseqüentemente,
reforça a
manutenção da
cultura
surda e de
sua
língua,
porém,
em
guetos. E a
permanência isolada dessa
cultura
não contribui
para desconstrução de
idéias equivocadas
em
torno da
surdez
que tem sido olhada
como uma
deficiência e
não
como uma
diferença,
ou seja, há uma
grande
preocupação
com a
patologia,
com a
intervenção
clínica e
não
com as possibilidades
que podem
surgir
com o
uso da
língua de
sinais,
que possui uma
beleza
singular,
como
principal
característica o
uso
espacial –
visual , transmite
idéias,
expressões e
sentimentos sejam
eles
quais forem.
A
tradução
de
qualquer
assunto
pela
língua
de
sinais
acontece
porque
ela
é
completa
apresentando
todos
os
níveis
lingüísticos:
fonológico,
sintático
e
semântico,
permitindo
que
a
LIBRAS
seja considerada uma
língua
(BRITO, 1993).
Dentro do
Ministério do
Silêncio podemos
perceber
um
exemplo
prático do
quanto a
língua de
sinais pode
traduzir
termos
abstratos,
principalmente
durante a
interpretação de
louvores.
Por
exemplo, uma
determinada
música possui a
seguinte
frase: “Vou
voar
como
águia...”
que transmite a
idéia de
força e
liberdade. Podemos
observar o
uso da
linguagem
figurada,
que foi utilizada
para
fazer uma comparação, e
que
ouvintes compreendem
bem e dão a
sua
particular
interpretação. Ao
passar esta
mensagem ao
surdo o
intérprete tem o
cuidado de
usar os
sinais
que correspondam à
mensagem
abstrata (força,
liberdade) e
não
fazer a
interpretação ao
pé da
letra,
sinalizar: “EU
IGUAL
ÁGUIA VOANDO”
que seria a
tradução
em
LIBRAS no
sentido
literal.
Este
tipo de
interpretação pode
causar uma
grande
confusão
entre o
público
surdo,
principalmente
entre
àqueles
que
não conhecem o
Português,
além de se
estar incorrendo no
erro de
abandonar a
estrutura
gramatical da
língua de
sinais. Seria
como se tentasse
traduzir
cada
palavra utilizando
um
sinal equivalente. Dessa
forma o
intérprete,
mesmo
sem
intenção, estaria
alimentando uma
concepção
que
durante
muito
tempo permeou as
idéias relacionadas a
LIBRAS levando as
pessoas a crerem
que
ela
não passava
simplesmente do
Português sinalizado.
Quando uma
pessoa é integrada à
comunidade dos
surdos
ela recebe
um
sinal.
Este
sinal funciona
como se fosse o
nome
próprio, e é formado
pela
letra
inicial
mais
um
traço
físico
marcante da
pessoa.
Como
exemplo, uma das
intérpretes
cujo
nome
começa
com a
letra “R” e possui as
sobrancelhas grossas,
quando
precisa
ser solicitada, os
surdos se dirigem a
ela
com a
mão
em “R” (alfabeto dactilológico)
tocando a
sobrancelha. É
como se fosse uma
espécie de
batismo, ao
ingressar na
comunidade. Às
vezes o
sinal pode
ser modificado se os
surdos perceberem
que existe
um
traço
mais adequado
para a
formação do
mesmo.
Apesar de
existir a possibilidade de
modificação o
sinal
não é transferível,
ou seja,
ele é usado
para se
referir a uma
única
pessoa
mesmo
que
dentro da
comunidade coincidentemente possa
haver
dois
sujeitos
com a
mesma
inicial e
traços
físicos
em
comum. (BRITO, op. cit., p. 107)
Essa é uma
característica
interessante da
cultura
surda
e
que
foi respeitada e aceita
pelo
Ministério
do
Silêncio,
dando
oportunidade
aos
surdos
o
gozo
de
seus
direitos
lingüísticos
de
forma
plena,
sem
superficialidades,
onde
sua
cultura
e
língua
são
valorizadas e
não
reprimidas, servindo
apenas
como
um
meio
de oralização e normalização do
surdo.
O
surgimento do
Ministério do
Silêncio aconteceu
devido à
necessidade de
atender aos
surdos
que chegavam à
igreja, e tinham
vontade de
participar das
reuniões de
adoração (cultos). As
Igrejas
que foram observadas contam
com
um
grupo de aproximadamente vinte
surdos
que participam
ativamente no
ministério. O
número de participantes
muda
constantemente,
pois,
alguns saem ficam
um
período
fora e
depois voltam,
ou mudam
para uma
outra
Igreja.
Este
estudo identificou
dentro dos
ministérios investigados uma
metodologia de
trabalho, uma sistematização
que envolve
peças
teatrais,
visitas
nos
lares,
passeios,
estudos da
bíblia e
apresentação de
músicas
por
meio da
Língua de
Sinais.
Além dessas
atividades há
também uma
preocupação da
equipe
responsável
em
acompanhar o
surdo na
procura de
um
emprego, nas
idas ao
médico, encaminhá-lo
para uma
escola, e
procurar mantê-los
sempre informados
sobre
cursos e
oportunidades
novas
que possam
aparecer.
Durante as
reuniões no
templo o
grupo de
surdos ocupa os
primeiros
bancos,
pois
precisa
ter o
tempo
todo
um
intérprete
para
que
consiga
acompanhar a
programação.
Tudo
que os
surdos fazem
causa
grande
impacto e
admiração,
pois
até
bem
pouco
tempo o
máximo
que se
via
era
apresentação de
um
coral
ou uma
pequena
peça
teatral e
hoje
até
composições musicais
são
feitas :como foi
encontrado na
Primeira
Igreja
Batista de
São Gonçalo, uma
surda
que compõe
louvores e a
maior
parte do
tempo
canta
em
Língua de
Sinais. A
descoberta desta
surda compositora mostrou
que a
língua de
sinais
também promove
momentos de
lazer e
adoração e é
essencial
para
desenvolver as potencialidades do
surdo,
mesmo
que estas
potencialidades na
concepção
do “ouviticentrismo” fossem
impossíveis.
A
equipe
responsável
pelo
Ministério das
igrejas estudadas é formada
por uma coordenadora
geral
que é
ouvinte,
um
surdo
que
além de
ensinar
LIBRAS, no
curso oferecido,
ajuda no aconselhamento, na
organização de
eventos,
além de
contar
com
um
grupo de
intérpretes
que se organizam
por
meio de uma
escala e auxiliam nas
visitas e
estudos oferecidos aos
surdos e
ouvintes
que desejam se
tornar
intérpretes. A
equipe
procura ao
máximo se
atualizar e
aprender
mais
sobre os
aspectos da
surdez. Participa de
encontros e
seminários a
fim de se aperfeiçoarem
para o
trabalho, e os
surdos estão
sempre acompanhando
esses
eventos,
eles
não deixam de se
envolver e gostam
muito disso
por considerarem
muito
importante
que os
ouvintes se interessem
em
aprender a
língua do
surdo e
sua
cultura.
Isso pode se
perceber no
curso de
LIBRAS,
sempre tem
um
surdo,
além do
professor, acompanhando o
curso e ajudando
com
muito
empenho. O
curso é ministrado
através de
recursos
visuais e
atividades de
pequenas
representações
teatrais do
cotidiano e evita-se ao
máximo
usar o
Português.
É
importante
lembrar
que
as
pessoas
envolvidas nesse
trabalho
não
são
fonoaudiólogos,
terapeutas
ocupacionais
ou
psicólogos,
são
pessoas
interessadas
em
trabalhar
com
surdos
e dedicam
parte
do
seu
tempo
ao
ministério.
Embora
a
base
da
formação
destes
voluntários
esteja
nos
cursos
que
são
oferecidos pelas próprias
igrejas,
muitos
deles procuram o
ingresso
em
uma
faculdade
.
Eles
acreditam
que
a
formação
superior
contribui
para
o
bom
desenvolvimento
do
trabalho.
Um dos
encontros promovidos,
para
capacitação e aperfeiçoamento de
intérpretes,
que merece
ser mencionado é o ENOS –
Encontro
Nacional de
Obreiros
com
Surdos –
que acontece
anualmente.
Este
evento começou a
nível estadual
em Goiânia
com trinta e
cinco
intérpretes inscritos e,
atualmente acontece a
nível
nacional ,ultrapassando o
número de oitocentas
pessoas inscritas
entre
elas
intérpretes e
surdos de
diferentes
denominações. Os
temas abordados nesses
encontros apontam
questões
que envolvem
tanto a
postura do
intérprete
como as
questões
lingüísticas relacionadas a
LIBRAS.
Como
exemplo, podemos
citar
alguns:
Traços Supra-segmentares da
Língua de
Sinais /Discurso
Direto e
Indireto,
Oficina de
Expressão,
Ética e
Associação de
Intérpretes, O
Uso do
Cantor
Cristão na
Interpretação;
Surdez e
Linguagem;
Teatro
para
Surdos;
Implantação do
Ministério
com
Surdos;
Contratação de
Obreiros
com
Surdos;
Preparo do
Obreiro
Surdo; O
Preparo do
Obreiro
Surdo
para Aconselhamento de
Surdos;
Personalidade e
Estrutura no
Contexto
Cristão;
Abordagem Fonoaudiológica –
Visão
Geral e
Ministério
com
Surdos uma
Obra
Missionária; A
Postura
Corporal e
sua
Influência na
Liderança; A
Vida do
Líder
Cristão:
Princípios
Morais,
Éticos
e
Espirituais.
O ENOS é
um
evento
que reúne
surdos e
intérpretes de
todos os
estados
brasileiros.
Um
encontro
como
esse, tem a possibilidade de
promover
trocas enriquecedoras
entre as
mais diversas
comunidades surdas de
todo o Brasil, trazendo
um
acréscimo ao
potencial
lingüístico do
surdo e
maior
conhecimento
para os
intérpretes.
No
início deste
trabalho citamos
como
um dos
objetivos a
identificação de
propostas pedagógicas.
Apesar de
não aceitarmos o reducionismo da
pedagogia,
ou seja, “enxergar a
prática
educacional dissolvida
nos
movimentos
sociais” (LIBÂNEO, 2002), temos
que
reconhecer
que
dentro dos
ministérios observados identificamos
práticas pedagógicas.
Além do ENOS, constatamos
tais
práticas no
curso de
LIBRAS, obviamente,
com
metodologia
própria
para
ensinar aos
ouvintes a
língua de
sinais.
Ensinar o
vocabulário
não é a
principal
preocupação dos
organizadores do
curso, existe
também
todo o
cuidado de
transmitir aos
futuros
intérpretes
questões
que envolvem a
postura, a
responsabilidade e a
ética,
ou seja, considera-se
importante capacitá-lo
para uma
atuação
criteriosa e
eficaz
em
qualquer
instituição seja
ela de
ensino,
trabalho
ou
qualquer
outro
aspecto da
vida
social. O
fato do
intérprete
ser capacitado no
ministério do
silêncio
não o vincula a
atuar
exclusivamente na
igreja,
muitos deles trabalham
em outras
instituições de
ensino
como
faculdades e
cursos profissionalizantes.
Podemos
observar no
nosso
estudo de
caso a
presença de uma
pedagogia
formal, estruturada e planejada
para,
intencionalmente,
transmitir
um
conhecimento (que
neste
caso é a
língua e a
cultura
surda) a
fim de
que seja disseminado
entre as
pessoas interessadas
em
trabalhar
com os
surdos,
independente de
denominação
religiosa. E
mais do
que
isso vemos uma
pedagogia
inclusiva
que
procura
aceitar a
diferença e
fazer dela
um
importante
meio de se
exercitar a
solidariedade e
encorajar os
surdos a desenvolverem
diversos
trabalhos
onde
a
sua
cultura
e a
sua
língua
tenham
um
destaque.
Se existe uma
crença na
educação
para
todos e uma
expectativa de
um
currículo
menos
excludente, é
preciso
criar
pontes
entre a
cultura
surda e a
cultura da
sociedade ao
qual o
surdo está inserido. No
entanto,
não existirão
pontes
firmes se
não
existir uma
compreensão da
visão do
surdo
diante do
mundo e
também da
sua
postura. E
não haverá
melhor
maneira de
conhecer esta
postura se
não tentarmos uma
aproximação
com
estes
sujeitos
dentro de
seus
espaços de
atuação.
É
importante
ressaltar
que o
olhar
sobre
esses
espaços deve
ser desatrelado dos
preconceitos
para
que se possa “...
aprender e
apreender a multiplicidade de
elementos constitutivos das
realidades
que fazem
parte de
nosso
campo de
pesquisa...” (OLIVEIRA,
2005).
Este
fragmento foi retirado de
um
texto
em
que a autora se referia a
escola.
Porém
com a
ampliação do
conceito de
educação e,
mais do
que
isso,
considerar o
papel do
pedagogo
também
como
pesquisador deve-se
ultrapassar os
muros da
escola e
observar
outros
campos.
Campos
estes aos
quais
muitos
alunos estão inseridos e
atuantes. E
que podem de alguma
forma
contribuir
para a
elaboração de
um
currículo
que abranja
culturas das
mais diversas e tenha
como
finalidade a
formação de uma
sociedade
mais
justa e
democrática. Dessa
forma poderá
ser
desfeito a
legitimação de uma
cultura
hegemônica
em
detrimento de
culturas estigmatizadas.
O
preconceito
social
não é o
único
entrave na
vida do
surdo. Existem
também muitas
dificuldades enfrentadas
como a
falta de
um
apoio
por
parte da
família
que
geralmente
não compreende a
dificuldade
que o
filho
surdo enfrenta e há
até
mesmo
desinteresse
em
aprender a
língua de
sinais. E muitas das
vezes a
não
preocupação
em
aprender a
língua de
sinais, se dá
não
pelo
fato de
discriminação do
filho,
mas,
pelo
fato de se
acreditar numa
ideologia marcada
pelo ouviticentrismo, no
qual a verbalização é o
único e
possível
meio de
comunicação
aceitável
em
nossa
sociedade (BOTELHO, 1998). Destaca-se o
descaso das
instituições e
compromisso dos
poderes
públicos na
garantia e fiscalização da
legislação existente
que legitimou a
Língua de
Sinais
Brasileira garantindo a
pessoa
surda o
direito à
educação bilíngüe e a
presença de
intérpretes
em
instituições de
caráter
público (escolas,
hospitais,
fóruns,
delegacias,
empresas).
Como
resultado vemos o
isolamento do
surdo
dentro da
própria
casa, da
comunidade e do
país) e
mais
prejuízo na
sua auto-estima,
dificuldade no
convívio
social e na aprendizagem.
Porém,
nosso
estudo de
caso aponta
para o
fato
que os
mecanismos
sociais de
inclusão podem
ser planejados, sistematizados e implementados. As
fontes documentais estudadas confirmam o
que denominamos de uma “pedagogia
bilíngüe” pautada numa
metodologia
que envolve publicações,
capacitação de
instrutores,
manuais de
orientação,
performances artísticas,
encontros e
eventos. Esta
pedagogia levou a
inclusão
social da
pessoa
surda, a
aquisição da
LIBRAS
pela
comunidade de
surdos e
ouvintes e
principalmente
quebra de
preconceito,
promoção de
igualdade
com
respeito à singularidade cultural e
lingüística e
sobretudo
solidariedade
humana. Estas
conclusões
nos remetem à possibilidade de
utilização de
metodologias
similares
em outras
instituições e
movimentos
sociais:
como
escolas,
centros de
convivência,
associações de moradores e
empresas
para a
promoção de
ambientes
inclusivos.
REFERÊNCIAS BibliogrÁFICAS
BRASIL.
Lei 10436 de 2002.
Disponível
em
www.planalto.gov.br. Acessado em
10 de julho de 2004.
–––––. Decreto 5296 de 2004.
Disponível
em
www.planalto.gov.br. Acessado em
10 de julho de 2004.
CAMACHO, R. G.
Sociolingüística-
parte
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domínios
e
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v. 1, 3ª ed.
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BOTELHO, P.
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BRITO, L. A
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Anais do
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LIBÂNEO, J.
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para
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São Paulo: Cortez, 2002.
MISSÕES
NACIONAIS. O
Clamor do Silêncio- uma
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SKLIAR,C(org.).
Um
olhar
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Porto
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