A variação das preposições DE e EM
Confronto entre fala e escrita

Arilma Coutinho dos Santos (Ufrj)
Vítor Cezário S. Campos (
Ufrj)
Dinah Callou (
Ufrj
)

 

Introdução

Este trabalho tem por objetivo estabelecer os contextos sintático-semânticos que favorecem o emprego da preposição DE ou EM nos casos em que sua alternância de uso não implica mudança de sentido.

A hipótese para a elaboração do projeto baseia-se nas afirmações de Lapa (1968: 203) e de Avelar (2004). Segundo Lapa, a preposição DE pode marcar tanto origem, quanto causalidade, referência e finalidade. De acordo com Avelar, a possibilidade de a preposição DE intermediar relações semânticas diversas deriva de seu esvaziamento semântico.

O que evidencia esta hipótese é o fato de a preposição DE, em muitos casos, pressupor uma significação que pode ser veiculada por outras preposições ou até por predicadores de outra natureza.

Fala:

(1)  depende da hora da da aula da / na faculdade (inq. 003 / a.C. – L. 19)

(2)  não deixa o menino comer nada de açúcar / que tenha açúcar (inq. 002 R – l. 41)

(3)  o dia que ela tiver de / com bom-humor (inq. 003 / a.C. – L. 45/46)

(4)  oficinas de / para carros (inq. 133 / 70 – l. 26)

Escrita:

(4)  na delegacia de/ em Meriti... (anún. 1/ l. 1)

(5)  existem ambições de mando/ que tenham mando (edit. 1/ l. 3)

(6)  apenas impõe que se reitere o compromisso de dotar a região de/ com condições infra-estruturais... (edit. 2/ l. 13)

(7)  chegou o momento de/ para resolver o problema... (edit.7/ l. 51)


 

Corpora e metodologia

Para a implementação desta pesquisa foram analisados, na fala, 18 inquéritos, 6 da década de 70 e 12 da década de 90, todos eles distribuídos por gênero e por faixa etária – 25 a 35 anos, 36 a 55 anos e 56 anos em diante. Em cada inquérito foram coletadas, em média, 50 preposições chegando a um total de 934 ocorrências.

Em relação à escrita, foram utilizados 21 textos jornalísticos – 7 anúncios, 7 notícias e 7 editoriais – que fazem parte do corpus VARPORT – (em cada texto foram coletadas, em média, 40 preposições), totalizando 821 dados.

A análise quantitativa e qualitativa fez uso do programa varbrul, tanto para a análise dos dados da escrita como para os da fala, e, no estudo variacionista, foram utilizados 15 grupos de fatores, dentre eles: tipo de preposição, possibilidade de variação, função sintática do sintagma preposicional, possibilidade de mudança de de por outra preposição.

 

Resultados

A partir da análise dos dados, foram observadas cinco preposições, as mais recorrentes tanto na escrita quanto na fala: DE, EM, COM, PARA e POR.

preposições

de

em

com

para

por

oco/ total

399/934

239/934

76/934

55/934

37/934

(%)

43

26

8

6

4

Tabela 1 – Distribuição das preposições na fala

 

Preposições

DE

EM

COM

PARA

POR

Oco/ Total

402/821

146/821

42/821

63/821

63/821

(%)

49

18

6

8

8

Tabela 2 – Distribuição das preposições na escrita.

A maior ocorrência de DE pressuporia o fato de a mesma ser menos marcada, assumindo diferentes sentidos. A partir daí, observou-se o uso da preposição DE em contextos em que outras preposições poderiam ser utilizadas, sem mudança ou com mudança sutil de sentido.


 

Possibilidade de permuta
da preposição DE por outras:

Das 399 ocorrências da preposição DE, 38% são intercambiáveis por outras, enquanto 62% não o são, como observa-se no gráfico que segue:

Gráfico 1 – Percentual de possibilidade de substituição na fala.

Na escrita, pode-se observar que das 402 ocorrências da preposição DE 21% são intercambiáveis por outras, enquanto 79 % não o são, o que pode ser visto no gráfico a seguir:

Gráfico 2 – Percentual de possibilidade de substituição na escrita

Observando as tabelas abaixo, fica nítido que as preposições que co-ocorrem com maior freqüência são DE/ EM.


 

 

DE/ EM

DE/ COM

DE/ PARA

DE/ POR

DE/ ZERO

Oco/ Total

62/ 151

30/ 151

20/ 151

11/ 151

10/ 151

(%)

41

20

13

7

7

Tabela 3 – Possibilidade de alternância das preposições na fala

 

DE/ EM

DE/ COM

DE/ PARA

DE/POR

DE/ ZERO

Oco/ Total

59/ 135

4/135

8/135

9/ 135

1/ 135

(%)

43

3

6

7

1

Tabela 4 – Possibilidade de alternância das preposições na escrita


 

(8)  a primeira greve do / no país foi em mil novecentos e dezessete (Inq. 164 R – l. 25)

(9)  eu chamo de / Ø subcultura de Botafogo (Inq. 133 / 70 – l. 20/21)

(10)      quem é o atual prefeito do / no Rio? (edit. 6/ l.24)

A análise dos dados mostra ainda que a maior possibilidade de alternância da preposição DE, tanto na fala quanto na escrita, ocorre na função de adjunto adverbial, como se observa nos gráficos que seguem:

Gráfico 3 – Possibilidade de alternância das preposições por função sintática

 

Gráfico 4 – Possibilidade de alternância das preposições por função sintática.

Essa substituição de acordo com a função sintática talvez se explique pelo fato de a regência dos predicadores das preposições exigirem, nos casos dos complementos verbal e nominal (exemplos nº 11 e 12), preposições específicas. Nos casos de adjunto adnominal (exemplo nº 13), em que a possibilidade de variação foi próxima da dos complementos, essa hipótese não se confirmou por ter o adjunto adnominal uma ligação mais intrínseca com o seu predicador, o que não ocorre com o adjunto adverbial (exemplo nº 14), tanto que este pode ser deslocado dentro da oração.

Exemplos (por função sintática):

Complementos, verbal e nominalà regência dos itens aos quais o constituinte preposicionado se liga exige a presença de uma preposição específica.

(11) depende da classe em que você estiver.

(12) houve a tentativa (...) De se defender do perigo.

Adjunto adnominalà possibilidade de variação próxima da dos complementos fato não esperado talvez por o adjunto adnominal ter uma relação mais estreita com o nome a que se liga.

(13) um diretor da empresa não quis se identificar para a reportagem.

Adjunto adverbialà possui uma ligação mais “frouxa” com a estrutura, tanto que pode ser deslocado para diversas posições dentro de uma mesma sentença.

(14)   a. A primeira greve no país foi em 1917.

         b. No país, a primeira greve foi em 1917.

         c. A primeira greve foi, no país, em 1917.

         d. A primeira greve do país foi em 1917.

         e. Do país, a primeira greve foi em 1917.

         f. *a primeira greve foi, do país, em 1917.

Uma conclusão a que se pode chegar é a de que não há diferenças significativas entre fala e escrita, apenas diferenças percentuais. O uso da preposição DE ou EM corresponderia a estratégias morfossintáticas distintas de uma mesma gramática, não havendo condicionamento sociolingüístico.

 

Referências bibliográficas

AVELAR, Juanito. Traços do item de em preposições simples e complexa. Comunicação apresentada no VI Encontro do CELSUL. Florianópolis: 2004.

LAPA, M. Rodrigues. Estilística da língua portuguesa. 5ª ed. Rio de Janeiro: Acadêmica, 1968.

 

 

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