UM CASO DE PRÓCLISE ESPECIAL
EM TEXTO DO SÉCULO XIX
A
INTERPOLAÇÃO OU APOSSÍNCLISE

Expedito Eloísio Ximenes (UECE)

 

Introdução e caracterização do corpus

Este trabalho é uma análise de corpus que investiga a colocação dos pronomes clíticos na língua portuguesa em documentos oficiais do governo da Capitania do Siará Grande no século XIX.

O corpus estudado é constituído por 67 Autos de Querella escritos no período de 1802 a 1829, distribuídos em 04 livros, referentes à época colonial e início da republicana. Os documentos encontram-se organizados e guardados no Arquivo Público do Estado do Ceará (APEC), situado no centro da cidade de Fortaleza.

Trata-se de registros de queixas referentes aos diversos crimes ocorridos em todas as vilas da então Capitania. Esses crimes são de natureza variada, como espancamentos, furtos, estupros dentre outros, revelando a situação em que se encontravam as vilas, distantes das autoridades e dos órgãos públicos do sistema colonial.

Os envolvidos nos crimes, geralmente, são pessoas simples, pobres e analfabetas. A maioria é constituída de agricultores ou criadores de pequenos rebanhos de gado. Essas pessoas formam uma mistura de raças que habita as terras cearenses, sobressaindo o pardo, o mameluco, o cabra, o índio e o escravo, apesar da predominância do branco. Todos esses personagens reais atuam no cenário social e político de nossa história, cenário de pouco prestígio e de quase abandono das autoridades constituídas, onde reinam a violência, o abuso e o desrespeito com a pequena população das primeiras vilas do Ceará. É também, por não dizer, o cenário lingüístico, pois esses extratos sociais influenciam no uso de nossa língua.

Aparece a figura de um juiz ordinário ou corregedor, que percorre a capitania de norte a sul para ouvir e receber as queixas sobre os crimes ocorridos. Esse juiz era geralmente um leigo e ignorante que não entendia das leis, no entanto, era o responsável pela aplicação da justiça. Afirma Prado Jr. (1999) que a justiça não tinha autoridade alguma quando muito era entregue, nos melhores casos, à incompetência e ignorância de leigos escolhidos pelo povo através de eleição popular.

Destaca-se também um escrivão de correição, esse era um cidadão comum ou uma pessoa de influência na comunidade que, pelo menos, sabia ler e escrever, qualidades indispensáveis para assumir tal cargo. O escrivão é nomeado através do pagamento de uma certa quantia, para exercer a função por um ano. Esse é o suposto sujeito dos textos, que a função lhe é atribuída por ele saber ler e escrever.

Os textos são razoavelmente longos obedecendo a um modelo uniforme e a uma linguagem formal como requer, pois trata-se de documentos jurídicos da administração do governo colonial. Não obstante o grau de formalismo, a maneira de escrever é muito livre, apresentando variação ortográfica com grande freqüência e predomínio da escrita fonética. Quase nãosinais de pontuação e de acentuação gráfica, como também, nãoregra para os limites de palavras nem obediência à translineação. Essa forma de escrever caracteriza a escrita do século XIX, por isso a importância de se estudar os aspectos lingüísticos salientes.

Os documentos foram compilados e editados por Ximenes (2003). Seguimos o modelo de edição semidiplomático estabelecido pelo grupo Para a História do Português do Brasil (PHPB). As normas desse modelo de edição foram estabelecidas em 1998 em Campos do Jordão, por ocasião do segundo seminário do grupo, apresentadas por Lobo (2001).

Nosso estudo concentra-se na análise da colocação dos pronomes clíticos, considerando alguns condicionantes gramaticais. Neste artigo, apresentamos os resultados encontrados relativos à apossínclise ou interpolação do clítico, que será visto com mais detalhe no item 3.

 

O estudo da sintaxe dos clíticos
na
língua portuguesa

Os pronomes átonos são vocábulos que giram em torno de um verbo, apoiando-se nele em posição proclítica, enclítica ou mesoclítica, formando com este um vocábulo fonológico. Para Huber (s/d: 177), “o pouco valor significativo dos pronomes-complemento tem como conseqüência serem átonos, aparecerem, portanto, imediatamente depois de uma palavra fortemente acentuada”.

Na história da língua portuguesa, o estudo dos pronomes clíticos teve pouca importância. As primeiras gramáticas da língua não abordam o assunto.

Melo (1981: 132) ressalta que o assunto é recente na língua, apesar disso gerou muitas polêmicas. “O problema é relativamente novo, talvez não conta com cem anos, mas deu matéria a muitas gramatiquices e a infinitas discussões estéreis, simplesmente por que mal posto e tratado com método inconveniente

Lobo (2001) afirma que no Brasil a história da gramatização inicia-se na segunda metade do século XIX, em que todos os gramáticos passam a dedicar um capítulo ao tema da sintaxe dos pronomes clíticos.

A história da gramatização, no Brasil, inicia-se na segunda metade do século XIX e, não por acaso, todos os gramáticos brasileiros, desde então, dedicarão um capítulo à “Colocação dos pronomes oblíquos átonos” o que, claramente, contrasta com a tradição gramatical portuguesa, que desde os gramáticos do século XVI, (...) nãotratamento especial a este item da sintaxe ”. (op. cit. p. 516).

O assunto passa a ganhar enfoque nas gramáticas, a partir de então, sendo apresentado como um conjunto de normas que serve de parâmetro para o “bom uso” da língua, levando-se em consideração apenas a variante lingüística padrão. Tanto as gramáticas quanto outros trabalhos são embasados nas obras de escritores clássicos de Portugal e do Brasil, que pretendem dar conta das normas, mas não refletem as múltiplas realizações do fenômeno nem contemplam as diferenças entre os dois países.

Maciel (1914), no capítulo sobre “collocação de pronomes”, salienta que as “fórmas syncliticas” devem ser embasadas na análise dos modelos clássicos.

A theorização attinente às três posições das fórmas syncliticas, isto é, o conjunto de condições que se devem observar, segundo a analyse dos modelos clássicos, diz-se synclitismo. As fórmas pronominaes se dizem proclíticas, mesocliticas e enclíticas, conforme lhes seja na phrase a posição quanto ao verbo, como centro de attracção do systema pronominal (p. 372).

Said Ali (1969) em sua Gramática Secundária da Língua Portuguesa ao tratar do assunto ressalta que

As formas pronominais átonas me, te, se, lhe, o, a, nos, vos, lhes, os, as colocam-se em português normalmente após o verbo a que se servem de complemento e a ele se encostam, sendo pronunciadas como se com o verbo constituíssem um vocábulo . Chamam-se por isso pronomes ENCLÍTICOS (p. 204).

No entanto, o autor discute a posição dos pronomes que varia de acordo com o aspecto fonético havendo deslocamento do clítico para antes do verbo, principalmente no Brasil, em que a pronúncia difere da de Portugal. “a pronúncia brasileira diversifica da lusitana; daí resulta que a colocação pronominal em nosso falar espontâneo não coincide perfeitamente com a do falar dos portugueses” (p. 205)

Em relação aos casos mais polêmicos, se assim podemos dizer, como das palavras negativas que atraem os pronomes átonos, afirma ele que podem ou não deslocar, estando de acordo com a flexão do verbo.

O advérbio de negação, modificando diretamente o infinitivo, desloca o pronome átono sempre que o infinitivo é flexionado, mas pode deixar de o deslocar quando o infinitivo não tem flexão. (p. 207).

Cunha e Cintra (2001: 309) também ressaltam que a posição lógica e normal é a ênclise, mas também destacam que “Há, porém, casos em que, na língua culta, se evita ou se pode evitar essa colocação, sendo por vezes conflitantes, no particular, a norma portuguesa e a brasileira.” Apresentam as mesmas normas comuns em outros autores, fazendo ressalvas para o português europeu e o português brasileiro, caso raro entre os gramáticos distinguir as diferenças lingüísticas entre os dois países.

A colocação dos pronomes átonos no Brasil, principalmente no colóquio normal, difere da atual colocação portuguesa e encontra, em alguns casos, similar na língua medieval e clássica. (op. cit., p. 316).

Góis (1958) trata os clíticos como palavras que participam da acentuação de outras a que vêm apostas. Constitui, segundo ele, uma das dificuldades e uma das belezas da língua.

Conforme o autor, quanto à posição dos clíticos em outras línguas românicas como o italiano e o francês, obedece à normas fixas, salvo alguma exceção. No espanhol, prevalece a próclise; em alguns casos limitados, emprega-se a ênclise. Na língua portuguesa, no entanto, a colocação dos pronomes é muito instável constituindo uma grande dificuldade para a língua, mas a mobilidade dos clíticos torna essa língua menos rígida e mais maleável.

A instável colocação dos pronomes pessoais oblíquos átonos junto ao verbo (de que são complementos) constitui uma das dificuldades e uma das belezas características de nossa língua: dificuldade meramente aparente, por isso que a sua topologia obedece a fatores de fácil percepção: a atração, a distância, a pausa (ou parada), a eufonia, a eustomia, a clareza; beleza característica (ou melhor, idiomática), porque a mobilidade do pronome pessoal oblíquo átono em torno ao verbo produz alternativas topológicas, que tornam a frase menos rígida, isto é, mais plástica e maleável. (p. 77-78).

Ressalta, ainda Góis, que a tendência natural da língua portuguesa é a ênclise, apesar de haver uso bastante acentuado da próclise por influência do espanhol, italiano e francês, que são línguas proclíticas. Porém, mesmo defendendo que a língua portuguesa, por uma questão natural, tem preferência pela ênclise, o autor estabelece 15 normas de colocação da próclise, e a mesma quantidade para o emprego de ênclise.

Infelizmente, nota-se em nossos dias manifesta tendência, por parte de escritores infensos à gramática, ou seus desconhecedores, a “fixar” o pronome pessoal oblíquo átono antes do verbo, isto é, a, “uniformizar” a sua colocação (por influência, sem dúvida, do francês, do italiano e do espanhol), esquecidos de que a precedência ao verbo do pronome pessoal oblíquo átono (isto é, a próclise) em certos casos é tão contrária ao gênio do português que constitui verdadeiro solecismo. (p. 78-79).

Conforme Góis, (op.cit., p. 95) “a ênclise é a mais lógica e a mais natural das colocações do pronome pessoal oblíquo átono”. Sendo a ênclise natural e inerente, os clíticos deveriam vir invariavelmente pospostos ao verbo, porém existem casos diversos em que ocorrem a próclise.

Sendo esses pronomespalavras sem acentuação própria” (isto é, palavras enclíticas (...) deveriam vir invariavelmente pospostos ao verbo, se a eufonia, a eustomia, a ênfase e outras causas não os solicitassem para antes em certos casos) (op. cit. p. 95-96)

Outro argumento para que ocorra a ênclise é que os pronomes sendo complementos de verbos deveriam ser colocados, portanto, logo após este.

Sendo esses pronomes os complementos do verbo (objeto direto, ou indireto), – o seu lugar naturalmente indicado é tomar posição logo após o verbo ( e não antes destes) (op. cit., p. 96.)

Vemos que as normas de colocação dos pronomes clíticos não se sustentam, muitas são até contraditórias entre si. Não se sustenta também a tese de que a língua portuguesa é naturalmente enclítica, que admite uma grande quantidade de ocorrências proclíticas, o que nos leva a crer que outros fatores, como o fonético, por exemplo, são condicionantes para a sínclise e merecem ser tratado com mais cuidado.

estudiosos que vão além das puras normas gramaticais para explicar o fenômeno, defendendo a importância de outras variáveis que contribuem para que o pronome clítico assuma este ou aquele lugar na sentença. Fatores como o fonético, o rítmico prosódico de cada língua.

Said Ali (1957) faz diversas críticas às teses defendidas pelas gramáticas, refutando frágeis argumentos, principalmente, quando se trata da força atrativa de algumas palavras. Aborda também as diferenças de emprego entre Brasil e Portugal destacando que essas diferenças são naturais por que entram em jogo fatores de ordem fonética.

É conveniente, pois aceitar outras regras de uso que, apesar de estigmatizadas pela norma padrão, não são menos importantes que essa. Através da história da língua conhecemos que as ocorrências menos privilegiadas sempre existiram e tudo que hoje é visto no português brasileiro é fruto de um período histórico, é uma mudança em curso que ainda não se cristalizou ou é algo arcaico que volta à língua, enfim, nada é estranho e devemos considerar qualquer variedade dessa língua.

Sabemos que toda língua tem seu código, ou seja, sua gramática pautada na variante padrão para que tal língua tenha uma identidade, para que haja consenso na modalidade culta eleita como padrão, mas ao lado dessa norma, existem muitas outras que merecem ser analisadas com cuidado, para que possamos entender o funcionamento do sistema como um todo.

Análise do fenômeno
uma
próclise especial
interpolação ou apossínclise

Apresentamos aqui apenas os resultados referentes à interpolação ou apossíclise encontrados em nosso corpus. Foram estudados 67 documentos da língua formal da administração judiciária, conforme anunciado anteriormente.

No que diz respeito à posição do clítico, é notória a predominância da anteposição desse ao verbo em todos os contextos. Há exceção apenas, com o tempo verbal no gerúndio em que ocorre a posposição. Os resultados contradizem a tese de que a língua portuguesa é uma língua por natureza enclítica.

Um tipo de próclise que nos chamou a atenção é a freqüência do uso da interpolação, caso não mais descrito nas gramáticas atuais, mas muito freqüente no português medieval e clássico, como bem ressalta Martins (1994).Trata-se do fenômeno de não adjacência entre o clítico e o verbo, sendo possível apenas quando o pronome precede à forma verbal.

Góis (1958: 107) denomina o fenômeno de reforço da próclise que se identifica pela “anteposição do pronome pessoal oblíquo átono, não ao verbo, como a outras palavras, que precedem ao verbo”.

Para ele, esse fato é um idiotismo arcaico que subsiste ainda com a partícula não e outro elemento causador de próclise como uma conjunção subordinativa, um advérbio ou um pronome relativo. Pode ocorrer o fenômeno de reforço da próclise em quatro casos:

a)   O pronome precede ao verbo e o advérbio. lhe eu perdoara tudo.

b)  O pronome precede ao verbo, ao sujeito e ao advérbio. Para se aqui deter não razão.

c)  O pronome precede ao verbo, ao sujeito e ao advérbio. Mas se lh’o o regimento não consente.

d)  O pronome precede ao verbo, ao sujeito e ao objeto direto. Se me isto o céu concede

Barbosa (1909) fala da interpolação como uma concorrência entre o pronome se e o advérbio não, ressaltando que o uso por bons escritores antigos e modernos e todos que falam bem é a preferência pela anteposição do pronome à negação.

Maciel (1931) considera o uso da anteposição do advérbio não ao clítico uma questão de elegância. Para ele a apossínclise é usada “quando occorre variação pronominal, ao longe o verbo a que pertence, separada por palavras ou expressões intercurrentes” (op. cit. p. 419).

É uma influência da sintaxe latina, na língua portuguesa. É um fenômeno antigo, chama a atenção o gramático. Podemos perceber que, diferentemente dos outros autores, que consideram um fenômeno possível apenas na presença do não, esse acha possível em outras situações desde que esteja longe do verbo, como no exemplo que apresenta “Em se ella annuveando, em a não vendo / se me a luz detudo annuveava”.

Pereira (1943) também fala da freqüência do fenômeno da anteposição do pronome ao advérbio não entre os clássicos e entre os escritores portugueses, porém entre os brasileiros é preferida a posposição.

As gramáticas atuais não se referem ao assunto. É com certeza um fenômeno extinto da língua, principalmente no Brasil. Porém, aparece com freqüência na literatura portuguesa do século XIX, basta lermos Camilo Castelo Branco. nos textos da administração pública, tanto de Portugal como do Brasil, é muito recorrente esse tipo de colocação do clítico.

Martins (1994), analisa documentos notariais de Portugal do século XIII ao XVI, e apresenta como elementos interpolados: o advérbio de negação não, o sujeito (pronominal e nominal), um sintagma preposicional ou um sintagma adverbial.

Observa Martins que a grande maioria ocorre nas orações subordinadas finitas, apesar de ocorrer com subordinadas infinitas introduzidas por preposição, de, por, a, pera. A autora também encontrou a interpolação em outros contextos como nas orações introduzidas por advérbios que provocam a anteposição do clítico; em orações introduzidas por quantificadores e em orações introduzidas por sintagmas focalizados.

No estudo de Lobo (2001), apenas o não ocorre interpolado entre o clítico e o verbo, observado em dois tipos de estruturas: orações dependentes finitas e orações não-dependentes modificadas por advérbioscausadores” de próclises.

Shei (2003) ao analisar três romances portugueses conclui que a interpolação ocorre também com não. Os contextos em que o fenômeno é freqüente são as orações subordinadas, com advérbio e com infinitivo preposicionado, não aparecendo nenhum exemplo de interpolação em outros contextos além dos citados.

Em nosso corpus encontramos várias ocorrências de interpolação que não diferem dos apresentados por Lobo e Schei. Aparece o fenômeno com as seguintes formas clíticas: se, lhe, a, o, os, somente diante do advérbio negativo não. Sendo freqüente nos contextos de orações subordinadas finitas, na maioria dos casos, e em orações coordenadas, apenas um exemplo. Com formas verbais simples e / ou compostas e em orações reduzidas, conforme as ocorrências de (1) a (17) apresentadas a seguir.

(1) que sedis lhe fizera seo genrro | (...) õmem pardo ameia noite em | dia de Quarta feira do mes deSetembro dopresente anno | que senão lembra a hora do dia (L.39, A. 3, L. 61).[1]

(2) Seomosso por nome (...) filho do Alferes Joaõ Rodrigues lhenão pedice que Seaque | tace...(L.39. A.12. L.26).

(3) epasar as Ordens | necesarias comtodo osegredo | dejustiça para Serem prezos | os Criminozos pedindo-se Au | xilio da Milícia Sem aqual Senaõ | Conceguiria aprizaõ denenhum dele (L. 33, A.1, L.58).

(4) Segundo Senaõ Continha | emdito despaxo (L.33, A. 5, L. 95).

(5) oqual logo se auzen | tou epertendia de envergonhado | largar logo apatria pais eparen- | tes se estes lhe não persuadissem | que pellos meios jidiciais procuras | se satisfação (L. 33, A.19, L.50).

(6) epara teralivio tomou Cinco | Sangrias, epor ficar toda pi- | zada, emaltratada, quesenaõ | aCudice aronda, Sertamente | que osuplicado aCoices lheaca | bava os dias devida (L.64, A.1, L. 28).

(7) ejuntamente darlhe Com os | pez, esenão fez vestoria logo pa | ra sever as noduas, epizaduras quetinhas, foi por senaõ puder | levantar daCama (L. 64, A. 2, L. 39-40).

(8) elhe intra | raõ adar borduadas Comhumpáo || Páo de Angico Cheio deEspinhos, que | por felicidade onaõ matarão, porem | oferiraõ gravementena Cabeça (L.64, A. 12, L. 29)

(9) Aeste ensulto respondeo ofilho do Su | plicante, que esses bofetes deviaõ aCon | tecer a o seo amo, enaõ aelle que onaõ | offendera (L.1087, A. 7, L. 45).

(10) sealgumas mulheres || Mulheres osnaõ aCudicem eporque | Compete ao Suplicante acçaõ deque | rella Contra osSuplicados (L.1087, A. 8, L. 40).

(11) eque auiaõ | ser asproprias quenomeado auia | emsua Pitiçaõ com cominação | que não Sendo aprezentadas no | dito termo deannos edia delhenaõ | Serem mais tomadas (L.33. A. 2, L. 65).

(12) Em Sua petição com cominação | de que não produzindo nodito | termo lhenaõ Serem mais to | madas (L. 33, A. 11, L. 76).

(13) para estelhe pagar dita | quantia antes devencido oprazo | prestado oQuerelante não obstan || Obstante se não achar vencido | o prazo procurou o dinheiro | efoi levallo (L. 33, A. 19, L. 25).

(14) ejuntamente darlhe Com os | pez, esenão fez vestoria logo pa | ra sever as noduas, epizaduras quetinhas, foi por senaõ puder | levantar daCama (L. 64, A. 2, L. 39-40).

(15) na tardedodiaoito do Cor | rentemes deoitubro, eannodemil | oito Centos edoze, la afoi inqui- | etar odito Suplicado, eporque | anão podevencer por rogos, a | vanssaouse aella Como danado | eainda quedellese desviace, Como | as debeis forças anão Ajudarão, | eainda que gritace... (L. 64, A. 16, L. 25)

(16) Assim mesmo coma falta daprata | aquerelante que onaõ quis aSeitar | eandou demaõ, emmaõ té que ficou | namaõ deManoel deMelo Pereira (L.33, A. 10, L. 72).

(17) edos brados que daua aSuplicante, aCodio Antonio Rodri | gues Ramos mais onaõ achou Senaõ os vestigios do Caua | llo (L.39, A.12, L.28).

Conforme atestou Martins (1994), como também Lobo (2001), podemos demonstrar quase as mesmas normas para o fenômeno. No corpus que analisamos, podemos observar queocorrências em contextos sintáticos de subordinadas com verbos simples na maioria dos casos, como apresentamos nos itens 1 a 10. Também em contextos subordinados com grupos verbais ocorreram 6 casos em que o verbo principal está no particípio, nas sentenças (11), (12) e (13), e no infinitivo nas sentenças (14), (15) e (16), havendo elemento “proclitalizante”. no número (17) aparece a interpolação em contexto de oração coordenada. Podemos afirmar que o fenômeno é mais recorrente nas orações subordinadas, mas não restritas a elas.

 

Conclusão

Conforme o exposto, a apossínclise ou interpolação foi bastante usada em Portugal no período arcaico e no clássico da língua, tanto em documentos de caráter oficial quanto nos textos literários, até o século XIX.

No Brasil, constitui um arcaísmo, mas foi muito recorrente nos textos da administração pública, escritos durante o período colonial. Talvez pelo fato de que a maioria dos escribas ou era da metrópole ou tinha raízes portuguesas, que na colônia o índice de analfabetismo era muito alto, não tendo mão de obra especializada para ocupar a função de escrivão nas unidades do governo.

A independência política do Brasil em 1822, leva a uma euforia dos brasileiros pela independência lingüística, sobretudo, os intelectuais e escritores românticos e mais tarde os Modernistas. De fato, houve uma mudança lingüística, como afirma Ribeiro (2001) que se processou no final do século XIX, gerando uma gramática do português do Brasil diferente da de Portugal, principalmente, no que tange ao assunto da colocação dos pronomes complementos nas sentenças. Esse ponto é um dos aspectos de maior distanciamento de nossa língua em relação a Portugal.

 

Referências bibliográficas

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Fontes de Pesquisa

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APEC. Autos de Querella. Livro 64. 1810-1813.

APEC. Autos de Querella. Livro 1097.1824-1829.


 


 

[1] Leia-se: L. livro, A. auto, L.linha. São referências ao corpus analisado.

 

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