Vc tb escreve
axim?
Uma
análise
do
léxico
nos
blogs de
adolescentes
Carmen Pimentel (UERJ)
Introdução
Com as
novas
tecnologias da
informação, muitas
pessoas estão
cada
vez
mais utilizando a
Internet
para se
comunicar.
Através de
e-mails, blogs, orkut e
chats,
podem-se
contatar
pessoas de
qualquer
parte do
mundo
para
trocar
correspondência,
conversar,
pesquisar,
estudar, informar-se. O
que
mais
chama a
atenção é o
intenso
uso da
escrita nesses
meios
eletrônicos,
mas uma
escrita
com
características específicas, próprias.
Com a
Internet, a
escrita
ganha
um
novo
espaço,
mas
com algumas
variantes
pertinentes a
esse
meio –
abreviações,
símbolos e
maneiras de
usar a
língua de
forma
econômica
devido à fluidez do
meio. Surge
um
novo
jargão? Uma
nova variação
lingüística? Mattoso
Câmara Jr. (1980:27) diz
que
a
língua é, de
maneira
geral,
coletiva;
mas
cada
um de
nós tem
certas
peculiaridades
lingüísticas,
ou
pelo
menos
preferências, e há
assim, de
certo
modo, múltiplas
línguas
individuais,
ou idioletos (...). O
estilo é
em
princípio,
individual, (...)
mas os
traços estilísticos coincidem,
em
grande
parte,
nos
indivíduos de uma
sociedade
lingüística (...).
Então nesse
meio
eletrônico estaria surgindo uma
sociedade
lingüística
com
suas
peculiaridades
ou seria
apenas uma
transcrição da
linguagem
oral
para a
escrita
sem a
preocupação da
formalidade
gramatical?
Como a
língua é utilizada na
Internet numa
relação
mais
íntima
com a
oralidade, a
preocupação
com a
correção diminui e
em
muitos
casos encontraremos
textos
com
vocabulário
mais relaxado e
estruturas
gramaticais inadequadas à
norma
culta. Os blogs utilizam uma
escrita
menos monitorada e,
portanto,
mais
livre
nos
aspectos morfológicos e
lexicais. Existe
aqui,
portanto, uma
relação
mais
contundente
entre a
oralidade e a
escrita.
Analisar o
uso da
linguagem e
termos
específicos
para
verificar a
provável
formação de uma
gíria
para
esse
meio é
um dos
objetivos desse
trabalho.
Como o
aprimoramento da
Língua acontece a
partir do
momento
em
que se
deseja
transmitir
informações e se
quer
ter a
certeza de
que o
interlocutor compreenderá a
mensagem,
mais
um
uso da
Língua Portuguesa se faz
presente: o
possível
dialeto da
Internet
ou uma
escrita
eletrônica. Cabe
aqui
estabelecer
relações
entre a
oralidade e a
escrita,
entre a
língua
culta e a
coloquial e
entre
texto
escrito no
papel e
texto
escrito no
meio
digital.
Blogs
Blogs
são
diários
eletrônicos
ou
diários
virtuais divulgados na
Internet. O
termo é uma
corruptela de WEBLOG (WEB – a
rede de
computadores mundial – e LOG –
tipo de
diário de
bordo). É
como se fossem
sites
com
temas
específicos e
desenvolvidos
por
qualquer
pessoa
que tenha
algo a
contar. Utilizam o
texto
escrito
como
base,
mas permitem outras
mídias
como
som,
imagens,
pequenos
vídeos.
São,
portanto,
eventos
multimídia.
O
que os diferencia dos
diários “de
papel” é
que
estes
não foram
feitos
para serem lidos
por
qualquer
pessoa,
pois funcionam
como
um
amigo
confidente e muitas
vezes carregam
chaves
para
que fiquem
fora do
alcance de
leitores indesejados.
Só chegam à publicação os autorizados
para
isso.
Já
aqueles
são publicados na
Internet
pelo
próprio
autor,
para
que
qualquer
pessoa do
mundo leia e comente.
Isso faz
com
que os blogs tenham uma
característica
distinta dos
diários
que é
justamente o
segredo. Na
verdade,
quem escreve confidências
ou
intimidades
em
um blog,
quer
que
todos saibam de
seu
segredo.
Qualquer blog possui uma
entrada
para
receber
comentários.
Isso os
torna
interativos,
abertos à participação.
Tais
entradas permitem
deixar
breves anotações
para o
autor do blog, possibilitando o
exercício da
argumentação. O
leitor,
então,
passa a
ter uma
outra
atividade no
processo – a de
co-autor
ou
leitor participativo
ou,
ainda,
leitor/autor.
Os blogs
apareceram no
final dos
anos 90 e
hoje
em
dia, acredita-se,
já existe
um
milhão de blogueiros (escreventes
de blogs) espalhados
pelo
mundo.
Aliás, essa é uma das
características dos blogs –
muitos
não têm
nem a
identificação de
onde
são. A
idéia é
trocar
informações e
divulgar
opinião e
sentimentos,
não importando
muito
quem
ou de
onde é o
autor. Forma-se
aí uma
grande
rede
social de
divulgação de
saberes.
Existem
muitos blogs
feitos
por
adolescentes
que relatam
suas
experiências
diárias
como as
noitadas
com a
turma,
quem ficou
com
quem,
filmes a
que assistiram,
seus relacionamentos
com os
pais etc.
Também existem blogs
criados
por
jornalistas,
escritores,
religiosos,
políticos etc. O
objetivo de
todos, no
entanto, é o
mesmo –
divulgar
idéias
através da
produção
textual
para
que o
mundo
todo tenha
acesso. O
que os diferencia é a
linguagem: dos
adolescentes,
informal; os
outros,
mais
cuidada.
Devido às
suas
características –
poder
ser
sempre atualizado;
ter
facilidade de
utilização; a publicação de
textos é
sem
limite de
tamanho;
permitir o armazenamento de várias
versões;
para
cada
texto publicado há
espaço
para
comentários de outras
pessoas (interatividade);
é
disponível a
todos (livro
aberto),
entre outras – os blogs podem
ser utilizados no
contexto
educacional. Permitem a
troca
entre
grupos, a
organização de
conteúdos, o
exercício da
argumentação, a participação de
vários
alunos
sem
restrições (timidez,
tempo,
número de
alunos), a
elaboração de
projetos
com
acréscimo de
diferentes
mídias,
entre outras possibilidades.
Esses blogs permitem aos
estudantes
produzir
informação a
partir de
suas próprias
conclusões, motivando-os e valorizando
seu
trabalho.
A
escrita
na
Internet
A
comunicação
só
acontece
porque
existe uma
espécie
de
acordo
entre
os
componentes
de
um
grupo
para
utilizarem
determinada
variedade
lingüística.
É o
caso
da
Internet.
Os
usuários
de blogues (principalmente
os
adolescentes)
optaram
por
uma
forma
de
escrita
com
características
próprias e passaram a se
comunicar
através
dela. Pode-se
chamar
esse
fenômeno
de
linguagem
digital
ou
virtual
ou,
ainda,
eletrônica.
Para Minchillo e Cabral (1994,
prefácio),
escrever é uma
constante e
difícil
procura da
situação
certa, da
palavra adequada, da
idéia
atraente. (...)
Não existem
regras,
mas existem
recursos
que,
bem trabalhados, resultam numa
narrativa interessante. A
partir dessa
idéia dos
autores, de
que
para
escrever é
necessário
que haja
um
conjunto de
recursos
que resultarão
em
um
texto interessante, é
que irei à
busca desses
recursos
que os
escritores de blogues
utilizam
para
sua
produção
escrita na
Internet.
Primeiramente abordarei a
questão da
criação de
comunidades
virtuais
que surgem
em
torno de
um blogue.
Isso pode
justificar o
uso da
linguagem adotada
pelos
jovens.
Depois, uma
análise das
marcas de
oralidade
que aparecem
nos
textos dos blogues; e, a
seguir, os
neologismos e
abreviações provenientes da
escrita
eletrônica.
Por
fim, será
feita uma
breve
discussão a
respeito de
alguns
termos utilizados nesse
meio
em
função do
teclado
ou de
programas de
computador
que
não suportam
til,
acentos e
cedilha.
As
comunidades
virtuais
Esse
meio de
comunicação – o blogue – favorece a
criação de
comunidades
virtuais,
já
que reúne
pessoas de
diferentes
lugares e
culturas
para discutirem
sobre
assuntos de
comum
interesse.
Para Marcuschi (2004:22), uma
comunidade é uma
coleção de
membros
com relacionamentos
interpessoais de
confiança e
reciprocidade, partilha de
valores e
práticas
sociais
com
produção,
distribuição e
uso de
bens
coletivos num
sistema de
relações duradouras. Se transferirmos
essa
definição
para o
ambiente dos blogues, teremos
como
membros os
usuários (autor e
leitores), a
produção é o
próprio
texto
escrito
coletivamente; e,
como os blogues estão na
Internet
desde o
final dos
anos 90,
já poderíamos considerá-los
duradouros.
Comunidades
virtuais
são
grupos
que surgem
dentro do
espaço
virtual – a
Internet,
por
exemplo – e
que mantêm uma
rede de
informações e
afinidades. As
comunidades
virtuais criaram
novas
formas de sociabilidade
em
que está
presente a
sensação de pertencimento. O
ambiente
virtual
passa a
ser
um
novo
local de
interação
social. No
entanto,
nem
sempre podemos
considerar
este
tipo de
ambiente (como os
chats, blogues,
listas de
discussão,
sites)
como
comunitário,
pois
seus
membros usufruem do
espaço
virtual de duas
maneiras
diferentes: (a)
com uma
permanência
temporal e compartilhando do
espírito
comunitário
ou (b)
sem
nenhum
vínculo
afetivo
ou
temporal.
Para Rheingold (2000), é
necessário
que haja
interesses compartilhados,
sentimento
comunitário e perenidade nas
relações
para
que se tenha uma
comunidade
virtual. É
preciso motivação
para
que uma
comunidade continue
com
vigor e
intensidade. Howard Rheingold aponta
também,
como
grande
vantagem das
comunidades
virtuais, a possibilidade de se
entrar num
assunto desejado
imediatamente,
através de
tópicos armazenados na
memória de
determinada
comunidade mediada
por
computador.
É nesse
sentido, de
comunidade
com
permanência
temporal,
vínculo
afetivo e
interesses compartilhados,
que surge uma
linguagem
comum
como motivação
para
que o
grupo continue a se “encontrar”
com
intensidade e continuidade. Seria uma
espécie de
pacto, a
criação desse
dialeto
como uma
marca desse
grupo.
Se a
linguagem utilizada
pelos
jovens
nos blogues pode
ser considerada
um
dialeto, significa
que
ela tem
características próprias,
mas
sem
prejudicar
ou
interferir na
compreensão e na
intercomunicação
entre
pessoas
que falam a
Língua Portuguesa. Podemos,
então,
considerar
esse
dialeto
como sendo
um
fenômeno
social,
pois utilizado
por
um
determinado
grupo de
pessoas, de
certa
faixa
etária e
condição
social; e,
também,
como
um
fenômeno
geográfico, no
sentido
espacial da
palavra,
só
que
um
espaço
virtual.
A
linguagem de
um
grupo fornece
pistas a
seu
respeito: a
que
classe sócio-cultural
pertence,
quais as
características dos
falantes
ou
escritores,
como
idade,
sexo,
nacionalidade etc.
Leite e Callou (2004:7) dizem
que “é na
linguagem
que se refletem a
identificação e a
diferenciação de
cada
comunidade e
também a
inserção do
indivíduo
em
diferentes
agrupamentos,
estratos
sociais,
faixas etárias,
gêneros,
graus de
escolaridade”. Dessa
forma, o
grupo
que participa de
um blogue usando
um
dialeto, diferencia-se do
resto, criando uma
identidade
própria.
Além disso,
também podemos
constatar
que a
linguagem dos blogues tem
marcas
fortes de
oralidade,
pois é
como se fosse a
representação
escrita de uma
conversa,
não presencial e
assíncrona,
mas
ainda uma
expressão
oral
através do
textual
escrito.
Mais uma
vez fica caracterizada a
existência de
um
dialeto da
Internet.
As
marcas
de
oralidade
A
principal
diferença
entre a
linguagem
escrita e a
linguagem
oral está na
situação de
interação. Na
linguagem
oral, os
interlocutores estão face-a-face e fazem
uso de
recursos entonacionais e gestuais, de sobreposição
de
vozes, de
repetições,
correções,
entre
outros
eventos. Na
linguagem
escrita, muitas
vezes
não se sabe
nem
quem vai
ler o
texto. Na
escrita, tem-se
tempo
para
reelaborar o
que se
quer
escrever, existe o
cuidado
com a
gramática e as
escolhas
lingüísticas. Preti (2004:18) afirma
que a
tendência,
pois, é atendermos
com
mais
atenção às
regras da
gramática tradicional,
embora o
coloquial possa
também
fazer
parte de
nosso
estilo.
No
caso dos blogues, os
interlocutores se conhecem (ou
não!),
ou
virtualmente
ou
pessoalmente,
mas
não estão ao
mesmo
tempo no
espaço da
conversa.
Cada
um escreve
sua
mensagem
em
momentos
diferentes,
mas
com
características de
conversação. A
escrita de
um
texto
por
um
interlocutor é comentada
por
outro
que responde
novamente –
tudo assincronamente.
Por
ter essa
forma de
conversa, o
texto fica
carregado de
marcas de
oralidade.
No
caso da
Internet,
em
que
seus
textos apresentam
características
ora da
fala
ora da
escrita,
não há
preocupação
mais
intensa
com a
formalidade dos
textos e o
uso da
língua
culta.
Preti enumera
estratégias conversacionais
empregadas
durante
um
diálogo. Algumas delas podem
ser observadas
em
um blogue.
São
elas a
riqueza
prosódica; as
interrupções sintáticas; a
mudança de
tópicos
durante a
conversação;
hesitações;
repetições e
paráfrases; parentéticas; a sobreposição de
vozes; os
marcadores conversacionais;
períodos
curtos;
frases incompletas;
uso de
gírias,
entre outras (op.cit.:121,124).
Na
observação da
escrita
virtual – de
um blogue,
por
exemplo – percebe-se
que há uma transposição da
língua
falada
para o
texto
escrito,
pois
não existe
um
planejamento
prévio
nem
elaboração da
escrita,
muito
menos de reescrita
com a
finalidade de
correção. A
impressão
que se tem é
que o
autor
pensa e escreve no
mesmo
momento,
sem
nenhum
distanciamento,
quase
como se fosse uma
gravação de
sua
fala.
O
que se pode
concluir é
que:
Não
existe
variante
boa
ou
má,
língua
rica
ou
língua
pobre,
dialeto
superior
ou
inferior.
O
que
ocorre é uma variabilidade na
produção,
muitas
vezes
determinada
por
fatores
sociais,
que
não
é
exclusiva
de uma
língua,
é
universal
e
inerente
a todas. (Leite e Callou [2004:7])
Por
isso a
linguagem usada
pelos
adolescentes
em blogues,
ou
em
outros
ambientes da
Internet,
não deve
ser considerada
como “cheia de
erros”
ou
como
um “empobrecimento da
língua”,
mas
sim
como
mais uma
variante da
língua portuguesa e,
pelo
contrário,
rica
em
criatividade. O
importante é
que se compreenda
que
esse
tipo de
variante é
pertinente ao
meio
eletrônico e
tão
somente a
ele, devendo ter-se o
cuidado de
não
fazer
uso dessa
linguagem
em outras
situações de
comunicação.
Ainda
como
marcas de
oralidade, os blogues apresentam
símbolos,
pontuação
excessiva,
gírias e
neologismos.
Estes
últimos
criados, muitas
vezes, especificamente
para o
meio.
Os
símbolos
também
são
conhecidos
como emoticons (do
inglês emotion + icons –
ícones
que exprimem
emoção) e
são,
geralmente, representados
por carinhas
que mostram os
sentimentos do
autor.
Elas
são confeccionadas
com o
próprio
teclado,
apesar de
hoje
em
dia
já se tê-las
disponíveis
para
inserir no
texto
com
seu
formato
definitivo.
A
pontuação
expressiva é
muito utilizada
nos
textos de blogues.
Como
ferramenta de
representação do gestual e da
entonação, o
uso de
exclamações, interrogações e
reticências é
bastante enfático.
Outros
recursos
também
muito aproveitados
pelos
escritores de blogues é a
letra
maiúscula e a
repetição de
letras,
que funcionam
como uma alteração de
voz,
um
grito
ou uma
ênfase na
sílaba
ou
palavra. No
exemplo
abaixo, podemos
observar
esses
recursos e
sua
utilização:
Terça-feira,
Maio 03,
2005
ATENÇÃO!!!
É
com
prazer
que
hoje
inauguramos a
nova
sessão
do
nosso
blog. E
com
vocêêêêês... TÃNÃNÃÃÃÃÃÃÃÃ...
- O
LIVRO
DE
RECEITAS
DO
CHEF
JOSÉ FRANCISCO (TAMBÉM
CONHECIDO
COMO
MEU
PAI)
Receita
de
Hoje:
-
PIPOCA
DE
MICROONDAS
–
(...)
Já
em
casa,
retire a
embalagem
externa
(para
que o
pacote
possa "estuuUUUUFFAAAARRRR",
enquanto
as
sementes
de
milho
explodem
dentro
da
embalagem
interna!)
Recolhido do blogue:
http://www.eeepa.blogger.com.br/ (em 18/05/2005 - trechos) |
(Luciana Farias tem 16
anos (em 2005) e
utiliza
seu blog de diversas
maneiras:
para
contar
fatos ocorridos no
dia-a-dia, transcreve
diálogos
que teve
com as
pessoas envolvidas,
ou faz
pequenas
narrativas de
suas
lembranças.
Também
gosta de
dar
dicas
sobre
como
fazer a
mala,
tirar
dúvidas de
informática, o
que
fazer
com
trabalhos
urgentes,
receitas,
entre outras. Lu
não escreve
com
abreviações,
mas
usa
bastantes
onomatopéias.)
Neologismos
O
acervo
lexical de uma
língua
viva está
sempre se renovando. No
caso da
língua portuguesa,
atualmente, as
maiores
contribuições
são de
língua inglesa.
Um dos
motivos é o
grande
uso de
equipamentos de
informática,
que,
junto
com a
importação, trazem
consigo
vários
termos
específicos
que
são rapidamente incorporados e,
em
alguns
casos, abrasileirados.
Alves (2004)
apresenta uma
série de
tipos de
neologismos
que servirão de
base
para
guiar a
análise dos
vocábulos utilizados
pelos
adolescentes
em
seus blogues. Os
neologismos podem
ser
fonológicos,
sintáticos,
semânticos,
por
conversão,
por
empréstimo,
além de
outros
processos.
O
grande
desafio é
determinar
em
que
categoria
alocar os
termos
criados
pelos
usuários dos blogues. Poderíamos
considerar os
termos vc (você), tb (também),
blz (beleza), bjs (beijos)
como
neologismos
fonológicos,
que sofreram transformações ao
nível do
significante,
mas
sem
impedir
que o
leitor os compreenda adequadamente.
Também poderíamos colocá-los no
grupo dos
neologismos
sintáticos – da
composição
por
siglas,
ou acronímica –,
em
que “o
sintagma é reduzido de
modo a tornar-se
mais
simples e
mais
eficaz no
processo da
comunicação” (op.cit.:56), ao
que a autora denomina
economia discursiva.
Ainda no
caso de
neologismo
fonológico, existe o
tipo transformação
gráfica, e podemos
incluir
aí as
palavras akele (aquele),
nkela (naquela), mew (meu), nunk
(nunca),
em
que o
grupo qu e o
grupo ca foram substituídos
pela
letra k.
Aquele
por
economia,
este
porque a
letra k tem
som equivalente a ca, o
que
também resulta
em
economia de
escrita.
As
onomatopéias
também
são
muito utilizadas
nos blogues.
Como a
intenção do
autor é
reproduzir a
fala, a
conversa,
esse
recurso é
bastante
usual.
Para
indicar
que o
autor está rindo, o
recurso é rsrsrs (para
risos), hahaha (para uma
gargalhada), hehehe (para
um
sorriso
maroto).
“Nos
vocábulos giriáticos,
criados
com a
intenção de
dificultar a
compreensão
por
parte daqueles
que
não integram
um
determinado
grupo, a neologia é
muito
produtiva” (op.cit.:65).
Este é o
caso das
palavras
que surgiram a
partir da
unidade
lexical blogue: blogar, blogueiro, blogagem. Estas
novas
palavras entraram
para o
vocabulário do
usuário de blogues
pelo
processo de
estrangeirismo integrado à
língua receptora. Há
aqui uma
adaptação
gráfica e morfológica.
Como
neologismo
sintático, muitas
palavras
que entraram na
língua portuguesa
pelo
processo de
estrangeirismo, passaram a
incorporar o
sufixo
verbal
ar, colocado nas
palavras
que
já sofreram
adaptação do
inglês
para o
português,
como
em blogar,
postar e linkar.
Galli (2004:
127) diz
que “a
linguagem
virtual possibilita ao
indivíduo
participar e inteirar-se dos
acontecimentos
sociais e
universais,
visto
que
ele está
em
contato
com uma
linguagem globalizada,
conhecida
também
por
culturas diversas”. A
utilização da
Internet acabou
por
produzir uma
linguagem
própria
entre
seus
usuários,
repleta de
termos
específicos
que têm
como
finalidade
facilitar a
comunicação e
agilizar o
processo de
interação.
Programas
e
teclados
Com
base
em
pesquisa
feita
com
jovens e
adultos
usuários de
computadores e de
Internet, consegui algumas
justificativas
para essa
escrita
tão
peculiar dos blogues (e de
outros
meios de
interação
virtual). Dos
mais
velhos, a
informação colhida trazia a
explicação
sobre os
primeiros
programas de
computador
desenvolvidos
para a
troca de
e-mails.
Lá
pelos
fins da
década de 80, trocavam-se os
primeiros
e-mails,
através de
programas
sem
interface
gráfica e
sem
recursos
que permitissem o
uso de
acentos,
cedilha
ou
til nas
palavras.
Esses
programas eram
em
inglês, importados e
ainda
não traduzidos
para a
nossa
língua.
Como na
Língua Inglesa
não há
palavras
com essas
marcas
lingüísticas, o
programa
não havia sido
preparado
para
elas. A
solução foi
encontrar
meios
para
grafar as
palavras de
maneira
que
não gerasse
dúvida no
leitor. É
claro
que,
em
muitos
casos, o
que aconteceu foi
um
processo de hipercorreção,
pois essa
dúvida
certamente
não existiria
já
que
todos os
usuários tinham
consciência do
que se passava.
Aliado a
isso,
ainda havia a
falta de algumas
teclas e a
disposição delas no
teclado.
Como
este
era
americano, a
tecla ç,
por
exemplo,
não existia
nos
primeiros
teclados importados
ou fabricados
aqui,
mas
ainda
como
cópias dos
originais.
Para
digitar essa
letra,
era
preciso
teclar
aspa
simples (pois
também
não existia a
tecla de
acento
agudo) e
depois a
letra c. Cabe
aqui
observar
que os
usuários muitas
vezes
não encontravam as
teclas no
teclado e desistiam de
digitar
acentos.
Mas
também havia o
problema do
programa de
computador,
que
simplesmente
não reconhecia
acentos e
cedilha e transformava essas
marcas
em
símbolos
ininteligíveis, atrapalhando a
leitura e a
compreensão do
texto. A
saída foi
buscar
alternativas.
A
falta de possibilidade de
acentuar as
palavras fez
com
que se usasse a
letra h
para
mostrar
que
ali deveria
haver
um
acento
agudo:
eh (é), soh (só),
neh (né).
Por
economia de digitação e/ou
de
tempo,
alguns blogueiros adotaram a
escrita da
palavra
não,
por
exemplo, na
forma naum. Se analisarmos o
teclado do
tipo
americano,
que
era o
mais utilizado,
era
necessário
digitar as
teclas n-a-shift-til-o (cinco
teclas)
para
escrever
não. A
forma naum
só
usa
quatro
teclas.
Essas
são
as
explicações
que
recebi ao
perguntar
para
jovens
e
adultos
sobre
o
porquê
da
escrita
de blogues e de
outros
meios
de
comunicação
na
Internet
serem dessa
maneira
abreviada,
econômica
e
tão
peculiar.
No
próximo
capítulo
reproduzo
um
trecho
de
um
blogue
em
que
todos
esses
termos
aparecem.
Além
disso,
ainda
aponto
para
outras
características
desses
tipos
de
textos.
Estudo
de
caso
– O blogue de Alexis
Esse blogue representa
como é a
escrita na
maioria dos blogues de
adolescentes na
Internet.
Vários
outros foram analisados e
muitos deles utilizam
esses
termos abreviados, as
formas de
expressão
com
pontuação exagerada, as
marcas de
oralidade etc.,
como veremos:
Nome:Alexis
Idade:16
em 2004
(SP)
http://www.arekisu.blogger.com.br/
(já não está mais atualizando porque criou um
outro novo) - trecho
Dani:...qtas
brigas
bestas...qse
dexo de
falar
com vc q
eu
gosto
tanto...desde
akele feeesta da
pontes....foi
mto
bom
ter
ido
nkela
festa,
ter robado
seu
breguetin e emprestado
meu
palito
pra vc...ainda
bem q
eu fui
de bicao!hahaha...naum naum..gracas a voce consegui
convite
pra
festa..mew...conte
sempre
cmg
linda...vc
eh mto
especial
pra
mim(taum
inteligente
e esclerosada neh!hehehe)Bju!!!(nossa,
vc
me
passando essa
foto
agora,
vai
demorar
dois
anos
hein..pelo
menos a
gnte fica conversando
por
mais
tempo!)
Bom...sexta
eu fui
numa
festa...de
uma
tal de
Natalia(faze oq...num conheco!) Soh consegui
convite gracas a
Dani(brigadao Dani!Te
Adoro!)...para
mim e
pro Vitola....
O
DJ
era
estiloso...fez uns remix la da
hora..as
vezes
exagerava,
mas blz...
e pros q duvidaram(Rugna, Denise e
pirralha
da
perua q
eu
eskeci o
nome)
eu num
fikei bebado =] e
nem sou
bebado.....e nunk fikei beb....ah...essa
parte
pula
entao...acho q
eh soh...
Flw pessu!
|
Análise
do blogue de Aléxis:
Abreviações
qtas (quantas) |
qse (quase) |
vc (você) |
q (que) |
mto (muito) |
cmg (comigo) |
bju (beijo) |
gnte (gente) |
oq (o
que) |
blz (beleza) |
flw (falou) |
|
Troca de
letras
|
akele (aquele) |
nkela (naquela) |
naum (não) |
mew (meu) |
taum (tão) |
eskeci (esqueci) |
fikei (fiquei) |
nunk (nunca) |
pessu (pessoal) |
num (não) |
|
Falta de
letra/acento/til
dexo (deixo) |
faze (fazer) |
voce (você) |
as
vezes(às
vezes) |
robado (roubado) |
bicao (bicão) |
brigadao (obrigado) |
la (lá) |
entao (então) |
bebado (bêbado) |
|
|
O
nome do blogue
O
nome do blogue no
endereço da
Internet (arekisu) é uma
brincadeira
com a
pronúncia do
nome do
autor Aléxis,
em
que houve a
troca do
fonema /le/
por /re/ e o
som da
letra x foi representado
pelo
grupo /kis/.
Algumas
trocas
fonéticas
u
final é substituído
por w
em mew (meu)
que, qua –
ou é abreviado
para q
ou é substituído
pela
letra k
ca
também foi substituído
por k
ão
por aum
São os
neologismos
fonológicos citados
anteriormente.
A
evolução da
palavra
você
A
palavra
você
já sofreu muitas mudanças ao
longo dos
tempos.
Já foi
Vossa
Mercê, vossemecê, vosmecê,
você, ocê,
até a
forma
cê na
fala
atual.
Segundo o
Dicionário Aurélio
Século XXI, existem
cerca de 30 variações e
formas
paralelas no Brasil derivadas de
Vossa
Mercê. A adotada
pela
informática é vc.
Abreviações
As
abreviações
geralmente se dão
pela
manutenção das
consoantes – vc, tb, mto, cmg.
Isso
nos remete à
teoria de Emília
Ferreiro e
Ana Teberosky (1986)
sobre a
hipótese silábica
em
que a
criança,
em
fase de alfabetização, se
encontra. A
criança nesse
nível utiliza as
letras
com
atribuição de
valor
sonoro,
ora
vogais
ora
consoantes,
para
representar as
palavras.
As
faltas
As
cedilhas
não aparecem –
graças, conheço –
novamente
por uma
questão de
economia.
Para
digitar a
cedilha “gastam-se”
tempo e
teclas.
Substituição de
acento
agudo
por h –
eh, soh
Gírias
breguetin (breguetinho)
remix la da
hora
bicao
perua
Importante
ressaltar
que o
autor é de
São Paulo, daí o
uso de algumas
expressões específicas da
região – “meu”, “breguete”.
Apesar da
linguagem
coloquial e
informal, o
uso de
palavras
como estiloso e esclerosada mostram
um
vocabulário
um
pouco
mais apurado. No
entanto, essas
palavras foram
empregadas
com
sentido
pejorativo.
Pontuação
Uso
excessivo de
reticências
como
marca de
hesitação.
Falta de
vírgulas e de
ponto
lógico mostram o
descuido
com as
regras
formais da
língua e apontam
para
transcrição
imediata da
fala,
sem
distanciamento
ou
preocupação
com a
correção e
com reescrita. No
entanto, a
opção
pela
pontuação
expressiva demonstra
que a
preocupação está no
nível da expressividade e da
entonação,
ou seja, da
representação da
forma
oral da
língua.
Marcas de
oralidade
Parentética,
hesitação (reticências),
interrupção (brigadao Dani),
marcadores conversacionais (bom...
ah...),
frases curtas, interrompidas. Muitas
são essas
marcas, o
que vem
comprovar a
idéia de
que os
textos na
Internet procuram
ser a
reprodução de uma
conversa
informal.
Gênero
epistolar
Esse
trecho corresponde ao
registro de
um
dia,
em
resposta ao
comentário de uma
amiga (Dani). O
autor
começa o
trecho
com uma
saudação – o
vocativo Dani – e escreve o
primeiro
parágrafo
para
ela. O
segundo
parágrafo
já é dirigido a
um
público
mais
geral e pode-se
perceber essa
mudança de
destinatário
pela
palavra
Bom... e
porque Dani é citada
como
referência no
texto.
Mas o
autor sabe
que Dani está lendo,
pois “conversa”
com
ela
nos
parênteses. Ao
final do
texto, o
autor se despede,
não de Dani,
para
quem foi destinado o
primeiro
trecho,
mas
para
um
público
maior e
genérico (“Flw pessu” – Falou,
pessoal).
Percebe-se
aqui
nuances do
gênero
epistolar nas
marcas de
saudação e
despedida, nas
conversas
com o
leitor, nas
possíveis
respostas
que
ele dá a
esse
destinatário.
Mas,
novamente, o
cuidado
com a
correção é deixado de
lado. O
autor
não
procura uma uniformidade discursiva – o
receptor varia
como
em uma
conversa
com
mais de
dois
interlocutores,
em
que
ora
nos dirigimos a
um
ora a
outro.
Quando
isso é transcrito,
como no
exemplo
acima, temos a
impressão de uma
grande
confusão,
mas
só
para os
mais
desavisados! Os
jovens estão
bastante acostumados
com essa
forma recortada de
escrita e
não demonstram
nenhum estranhamento na
leitura desses
textos.
A
partir do blogue de Aléxis, podemos
constatar
que essa
linguagem é
bem
específica do
meio
em
que é utilizada. De
maneira
geral,
não apresenta
dificuldade de
entendimento,
mas
causa estranhamento nas primeiras
vezes
em
que se
lê o
texto. É
claro
que
para o
que se
destina – a
comunicação
entre
jovens –
sua
função foi cumprida.
Conclusões
Essa
linguagem dos blogues (e
também de
outros
meios da
Internet) tem sido incorporada
pelos
jovens, e
por
adultos
também,
como
forma de
interagir
socialmente e se
comunicar
com
pessoas de
todo o
país (e do
mundo,
pois
esse
fenômeno ocorre
também
em outras
línguas).
Isso parece se
dar
por
necessidade de
comunicação
ou
por
imposição
social:
um “modismo
lingüístico”.
Esses
termos e
expressões
já estão difundidos na
linguagem do
dia-a-dia.
Bilhetes,
cartas
familiares, anotações
particulares
já contêm
abreviações e
empréstimos utilizados
naturalmente,
já
que essa
linguagem se constrói a
partir da
língua
comum
com
pequenas
adaptações.
Transferência
para o
dia-a-dia
Muitos
pais
e
professores
estão preocupados
com
a
escrita
eletrônica.
Acreditam
que
seus
filhos
e
alunos
estão desaprendendo o
Português
com
o
uso
cada
vez
mais
intensificado da
Internet
e
seus
meios
de
comunicação.
Isso
não
tem
fundamento,
de
maneira
geral.
A
maioria
dos
adolescentes
não
trocou a
escrita
formal
pela
escrita
da
Internet.
Pelas
entrevistas
que
tenho
feito,
eles
sabem
que
cada
variante
lingüística
tem
seu
espaço
para
se
manifestar.
Um
ou
outro
admitiu
deixar
“escapar”
um
vc
ou
um
tb de
vez
em
quando
numa
redação
escolar.
Mas,
no
geral,
eles
se policiam e procuram
não
misturar
as
situações.
Cabe
também
aos
professores
e aos
pais
alertar
os
jovens
sobre
essa variação
dialetal
da
língua
e orientá-los
quanto
ao
uso
correto
de
cada
uma.
A
escrita internetês na Tv
Essa
escrita,
que
já
está ficando
conhecida
como
internetês, apareceu
agora
na Tv. O
canal
de
televisão
pago
Telecine (NET)
agora
tem uma
sessão
de
filmes
legendados
com
essa
linguagem.
Uma
vez
por
semana,
um
filme
de
interesse
do
público
jovem
é transmitido
com
legendas
em
internetês. Essas
legendas
são
escritas
por
jovens
que
“traduzem” a
legenda
em
português
para
essa
linguagem.
Segundo
reportagem do
jornal
Folha
de
São
Paulo,
o
canal
de Tv decidiu
por
essa
alternativa
por
considerar
que
os
jovens
já
não
assistiam
mais
a
filmes
nem
programas
da Tv, preferindo
ficar
no
computador
em
salas
de
bate-papo
ou
navegando
pela
Internet.
A
solução
foi
usar
a
linguagem
deles na Tv.
O
dialeto
da
Internet,
representada
aqui
pelos
blogues, mostrou-se dominando
vários
espaços
da
sociedade.
Isso
faz
com
que
pensemos
sobre
a
utilização
da
língua
como
meio
de
comunicação
e de socialização,
principalmente
quando
disseminada
por
um
meio
tão
amplo
de
divulgação.
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lexical. 2ª ed.
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Dicionário
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virtual
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Disponível no
site do
autor
www.rheingold.com/index.html.
Acessado em 28/7/2005.
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