LÉXICO, CULTURA E PUBLICIDADE

Nelly Carvalho (UFPE)

INTRODUÇÃO

Sistema de interagir , sistema de crenças, valores, organização artística, científica e educacional , social e política, como também de atividades com fins econômicos, a cultura de uma nação ou de uma comunidade até que ponto é refletida na linguagem das mensagens publicitárias?

O acervo lexical é formado por unidades estáveis e econômicas, receptáculos preconstruídos e lugares de penetração privilegiados para certos conteúdos da cultura que a eles aderem, anexando-lhes outra dimensão à dimensão originária. Palavras que nomeiam referentes inexistentes na outra cultura, como cachaça (Br) e ginja (Port.), ou formas diferentes de nomear o mesmo referente, como garoto (Br) e puto (Port.), são exemplos de marca cultural. Essa carga ultrapassa a denotação ou o sentido literal e até a conotação ou o sentido figurado. A diferença entre ambas não é absoluta. São culturas próximas, pois a portuguesa foi o componente mais forte do caldo cultural brasileiro. A miscigenação com outros povos, no Brasil, provocou uma modificação na língua, sobretudo no domínio do léxico, pelas influências do superstrato africano e do substrato indígena

 

DELIMITAÇÃO DE CONCEITOS

O acervo lexical é formado por unidades estáveis e econômicas, receptáculos pré-construídos e lugares de penetração privilegiados para certos conteúdos da cultura que neles aderem, anexando-lhes outra dimensão à dimensão originária. Palavras que nomeiam referentes inexistentes na outra cultura,como cachaça (Br), e ginja (Port.). ou formas diferentes de nomear o mesmo referente como garoto (Br) e puto (Port.) são exemplos de marca cultural. Essa carga ultrapassa a denotação ou sentido literal e até a conotação ou sentido figurado. A fundamentação teórica para a análise lingüística partiu da definição de cultura para atingir o domínio do léxico.

Segundo Finkielkraut (1987:143), o pensado (erudito) parte do não-pensado (a vida cotidiana), de onde o primeiro retira a sua essência. O pensado seria a alta cultura onde se desenvolve a atividade criadora do homem. O saber comum (a vida cotidiana) seria o espírito do povo que impregna toda a maneira de pensar e agir. Essa cultura representa uma identidade geral que se apoia no inconsciente coletivo. Em qualquer sociedade, o comportamento coletivo foi elaborado lentamente e funciona de maneira quase inconsciente.

O processo de socialização introduz o indivíduo numa construção arbitrária do mundo, coerente, mas não universal. Essa universalidade, no entanto, é pretendida pelo indivíduo em relação à sua cultura pela versão de alteridade construída pelo prisma deformante da competência cultural de origem.( Zarate-1986:24).

A competência cultural decodificadora de sentidos não resulta necessariamente de uma oposição entre nacionalidades: pode ser uma questão regional.

A ordem e a lógica de sistemas culturais torna o léxico de uma língua mais rico nos campos semânticos valorizados pela comunidade que a tem como veículo.

O estudo sobre o léxico permite compreender os conceitos e as ocorrências da vida cotidiana, por ser modelo e modelador de cultura. Para Matoré (1953:37), a palavra analisa e objetiva o pensamento individual, assumindo um valor coletivo: há uma socialidade própria da língua. Para evitar uma interpretação ingênua da mensagem lingüística traduzida nos signos, é importante lembrar que a ordem das palavras não reproduz exatamente a ordem das coisas(Bourdieu-1982:36). No entanto língua e cultura formam um todo indissociável que não é ensinado em nenhum lugar especial, mas adquirido ao sabor dos acontecimentos cotidianos.

O vocabulário, símbolo verbal da cultura, perpetua a herança cultural através dos signos verbais(Biderman-1989:5). No caso da língua portuguesa, falada no Brasil e em Portugal, são duas normas que se diversificaram ao longo da história, refletindo as culturas variadas dos povos que a falam.

O estudo de palavras lexicais, onde o componente cultural se manifesta com mais intensidade, pode ser o fio condutor para o conhecimento de uma comunidade. Esse componente cultural é denominado por Galisson(1987:119) carga cultural partilhada, e permite identificar o falante enquanto indivíduo coletivo. Tal carga cultural, no entanto, não é uniforme. O acervo lexical é formado por unidades estáveis e econômicas, receptáculos pré-construídos e lugares de penetração privilegiados para certos conteúdos da cultura que a a eles aderem , anexando-lhes outra dimensão à dimensão originária. Palavras que nomeiam referentes inexistentes na outra cultura,como cachaça (Br), e ginja (Port.). ou formas diferentes de nomear o mesmo referente como garoto (Br) e puto (Port.) são exemplos de marca cultural. Essa carga ultrapassa a denotação ou o sentido literal e até a conotação ou o sentido figurado.

Todo ato de fala é um ato ritualizado porque representa as práticas sociais nas quais se reconhecem os membros de um grupo. Com essa ritualização da fala, estabelece-se um consenso que supõe a existência explícita de um contrato de fala. Dessa forma, circulam os discursos numa sociedade e são marcados os gêneros.

O discurso publicitário, marcado pelo gênero, exigirá para a sua realização e eficácia, que seja marcado pela cultura na qual está inserido, utilizando a variante local da língua veiculadora e escolhendo o léxico mais aceito com a carga cultural que lhe é própria.

Respeitando os mecanismos psicossociais, a mensagem publicitária evitará palavras-tabus, palavras de carga negativa ou pouco aceitas pela comunidade.

O texto publicitário, independente da mensagem que transmite, é o testemunho de uma sociedade de consumo e conduz à representação da cultura a que pertence, permitindo estabelecer relação pessoal com a realidade particular. Ele tem como mensagem primeira o consumo de um produto, pondo, porém, em destaque, determinado aspecto de uma cultura, tal como um projetor poderoso, criando, em torno de si, áreas de sombra.

A publicidade usa conotações culturais, icônicas e lingüísticas, sobretudo aquelas que veiculam estereótipos mais facilmente codificáveis e compreensíveis. Assim institui uma nova linguagem porque as variantes combinatórias recortam as significações, instauram um repertório e criam um léxico onde podem inscrever-se as modalidades recorrentes da palavra.

Seria ingênuo esperar ver, na diversidade de mensagens, um espelho da sociedade. Apenas elas são índices dos problemas e temas sociais e das formas de abordagem que mais tocam os usuários, falantes da língua.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O ponto de partida desse "flash" cultural é, na maioria das vezes, um estereótipo utilizado como referência pela coletividade. Por exemplo, na publicidade portuguesa, há uma preferência por temas históricos traduzidos lingüisticamente por palavras e expressões de forte carga cultural. Assim, a publicidade vai sempre utilizar modelos globais de conhecimento e basear neles as suas mensagens para que a comunicação se faça com rapidez, clareza e persuasão necessárias.

O léxico das publicidades portuguesas que constituíram o corpus desta reflexão apresentou duas tendências relevantes: espírito de renovação e espírito de conservação. O primeiro é representado por palavras novas (neologismos), e o segundo, por palavras de carga cultural partilhada.

O corpus foi recolhido em revistas femininas portuguesas de circulação nacional e em "outdoors" (lá, "cartaz exterior"). Foram usados como obra de consulta, o "Moderno Dicionário da Língua Portuguesa" de Aurélio Buarque de Holanda, 1986-Nova Fronteira,RJ, para o Brasil, e o "Moderno Dicionário da Língua Portuguesa" Lexicoteca, 1985, Círculo dos Leitores, Henrique Barbosa, Lisboa, para Portugal.

Além dos neologismos da variante portuguesa e das palavras inexistentes na variante brasileira, foram incluídas palavras que, embora entendíveis e usadas nas duas variantes, têm conotações diferentes para ambas e desencadeiam, por isso mesmo, processos diversos de decodificação.

BIBLIOGRAFIA

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