A PAIXÃO DE LER CAMÕES (A LÍRICA)
Lucia Maria Moutinho Ribeiro (UNIRIO/FSJ)
Ao abordar a lírica camoniana não se pode desconhecer o problema ecdótico que a envolve devido ao fato de ter o poeta publicado em vida sob sua vista apenas três composições como epígrafes em homenagem a obras de amigos seus: em 1563 apareceu a Ode ao Conde Redondo no livro Colóquios dos simples e drogas e cousas medicinais da Índia de Garcia da Horta, publicado em Goa, e em 1576 uma elegia em tercetos e um soneto a Dom Leonis Pereira, governador da Índia, na História da província de Santa Cruz a que vulgarmente chamamos Brasil, publicada em Lisboa, de Pero Magalhães Gândavo (além do Auto de Filodemo em 1555 pela posse do governador Francisco Barreto na Índia e de Os Lusíadas em 1572 em Lisboa). Eminentes filólogos brasileiros como Cleonice Berardinelli e Leodegário Azevedo, entre outros, têm se debruçado sobre a produção lírica camoniana tentando estabelecer-lhe um cânone como verdadeiros curadores desse tesouro literário de valor inestimável. O problema da autenticidade da autoria permanece, porém; tanto que Vasco Graça Moura diante dos expurgos a que se tem submetido a lírica teceu um soneto brincando com a eliminação de “O dia em que nasci moura e pereça”. Talvez a marginalidade do poeta entre seus contemporâneos o justifique, bem como a censura inquisitorial que dava preferência a composições “a lo divino”. O epitáfio inscrito sobre a lápide do suposto túmulo do poeta em 1613 por Dom Gonçalo Coutinho comprova aquela exclusão: “Aqui jaz Luís Vaz de Camoens, Príncipe dos Poetas do seu tempo. Viveo pobre, e miseravelmente, e assi, morreo, ano de M.D.LXXIX” (BERARDINELLI, 2000: 152), apesar do êxito editorial de Os Lusíadas, o que lhe valeu a concessão de uma tença, embora instável, como toda a sua vida.
Nascido em torno de 1525, nobre ou vilão, em Coimbra ou Lisboa, filho de Simão Vaz de Camões e de Ana de Macedo ou Ana de Sá ou Ana de Sá de Macedo, teria o poeta obtido a sua formação cultural na Universidade de Coimbra, onde o tio Bento de Camões era chanceler. Em Lisboa, aproveitaria a juventude em boêmia, mulheres, turmas de rapazes, mas poetando sempre. Na primeira biografia que precede comentários da edição de Os Lusíadas em 1613, o historiador Padre Pedro de Mariz reporta a perda de um olho em batalha naval em Ceuta na África. Como fidalgo decaído, dizem, sobreviveria como soldado e aquela marca registrada no seu rosto não lhe impediu os inúmeros galanteios às musas inspiradoras como na esparsa “A ua dama que lhe chamou “cara-sem-olhos”:
Sem olhos vi o mal claro
Que dos olhos se seguiu,
Pois cara sem olhos viu
Olhos que lhe custam caro
De olhos não faço menção;
Pois quereis que olhos não sejam:
Vendo-vos, olhos sobejam;
Não vos vendo, olhos não são. (CAMÕES, 1963: 491)
O texto alude, pois, ao convívio com o paço em Lisboa. Dizem até que o poeta teria caído em desgraça devido a amores pela Infanta Dona Maria, irmã de Dom João III, quatro anos mais velha do que aquele. É bem possível que sim, embora o refutem os críticos. Conta-se que era muito culta e mantinha uma “Universidade Feminina” no seu palácio, onde se reuniam as eruditas Luísa Sigea e sua irmã, Públia Hortência de Castro e Paula Vicente. Quem sabe o poeta não o freqüentava? É possível que com o seu dom de versejar tenha sido correspondido. Entretanto a princesa permaneceu solteira, impedida de se casar pelo rei e irmão, apesar dos inúmeros pretendentes da nobreza européia, para não dispersar seu dote que era vultoso e não desfalcar o erário público.
Voltando ao texto acima. Este devolve a ofensa com um misto de galanteio e ironia. O poeta é caolho, sim, mas enxerga tão bem que vê olhos belos, grandes e tão expressivos “que lhe custam caro” - eco de cara - porque maldosos. Por outro lado, diz à dama que só a notará se a vir. Virando as costas, não se lembrará mais dela, apesar dos olhos grandes (“olhos sobejos”), pois não a vendo “olhos não são”. O cenário palaciano lhe inspiraria, pois, as tradicionais e graciosas redondilhas, lúdicas, jocosas, eróticas, impregnadas de “engenho e arte”:
É a partir da segunda metade do século XVI que a função do signo se altera radicalmente na literatura e na linguagem de corte. Uma palavra significa ao mesmo tempo e no mesmo contexto várias coisas; pode ter vários entendimentos. A seqüência das palavras não corresponde mais à seqüência lógica. Cada um dos entendimentos da palavra pode desenvolver-se independentemente dos outros, o que permite seqüências logicamente imprevisíveis, embora gramaticalmente correctas, saltos súbitos, mudanças de agulhas, por intermédio dos chamados jogos de palavras. No século XVI chamava-se a este tipo de discurso o “estilo derivado”; à capacidade de o entender e produzir “agudeza”. Um pensamento imprevisto, baseado na possibilidade de utilização de uma das várias ideias contidas na palavra, chamava-se no século XVII “conceito”.
[...] trata-se de um jogo que tem regras muito exactas e difíceis, porque era preciso utilizar as palavras em vários tabuleiros.
Aliás, é um jogo, no sentido lúdico, para o qual não se exigia apenas a actividade do “juízo”, mas sobretudo a do “engenho”, que não se preocupa apenas com a verdade ou a falsidade das proposições, mas também com o seu lado estético. Faz parte deste jogo construir as proposições de forma simétrica, repetitiva, opositiva, contrastante, elíptica, etc, como pequenas arquiteturas que se bastam a si mesmas. [...] (SARAIVA, 1985: 157-158)
Assim aconteceu com as palavras “olhos”, “cara” e “caro”, no poema acima, em que o poeta não deixa de fazer um auto-retrato crítico, irônico, jogando sofisticadamente, prazerosamente com tais palavras.
Já em “Verdes são os campos”, em nenhum momento, se emprega o verbo ver, embora ‘Verdes”, a cor, no nível do significante, o compreenda e o ato de ver seja tema do texto, à medida que sugere uma contemplação de um quadro bucólico que ao poeta traz a lembrança da amada:
Verdes são os campos,
De cor de limão:
Assi[m] são os olhos
Do meu coração.
Campo que te estendes
com verdura bela;
Ovelhas, que nela
Vosso pasto tendes,
De ervas vos mantendes
Que traz o Verão,
E eu das lembranças
Do meu coração.
Gado que pa[s]ceis,
Com contentamento
Vosso mantimento
Não o entendeis:
Isso que comeis
Não são ervas, não:
São graças dos olhos
Do meu coração. (p. 517)
Verdes são os campos, verdes são os olhos da amada que, por analogia, o poeta (quer dizer, o eu-lírico) vê. O olhar, o ver, a contemplação que faz lembrar, correspondem ao fundamento dessa composição, que dessa forma não deixa de fazer um questionamento ontológico à medida que o gado também presente no quadro não percebe nada disso. Diz Antonio José Saraiva, no capítulo “Os estilos camonianos” do seu Luís de Camões, que aí está imbricada uma concepção platônica, pois o poema trata da essencialidade da verdura traduzida no cenário descrito nele. Através do jogo dialético e de palavras entre o ver/não ver, isto é, entre, presença/ausência ou presença na ausência, o texto brinca com o amor, a congeminação filosófica e ontológica e com a concepção platônica - temas camonianos por excelência -, com gravidade abordados nos sonetos, canções e em “Sôbolos rios”.
As redondilhas conservam a tradição da lírica trovadoresca: a cantiga de amigo, na barcarola “Irme quiero, madre”; o maldizer, nas “Estanças na medida antiga que tem duas contrariedades, louvando e deslouvando ua Dama”, pois, dependendo da disposição dos versos e de a leitura ser vertical, evoca “Ay, dona fea! Foste-vos queyxar”, cujo refrão acentua “dona fea, velha e sandia”, como numa anticantiga de amor. E se a leitura for horizontal defende os preceitos do amor cortês e exalta a dama, a sua beleza sem par, a boa reputação, o recato e a sua distância social, que o amador deve respeitar e a eles aludir apenas em discurso escrito, para não invadir a privacidade da senhora. Com isso, está mais do que demonstrado o virtuosismo camoniano, com o qual, parece, ele mesmo se compraz.
Mas na produção clássica, sob certos aspectos, ainda sobrevive essa concepção medieval da amada, como nos tercetos do soneto “Eu cantarei de amor tão docemente”. Já em “Pede o desejo, Dama, que vos veja”, encontra-se o poeta dividido entre a lei e o seu impulso amoroso. É bem verdade que se identificam características maneiristas em sua obra: “Sôbolos rios”, além de traduzir a filosofia platônica, fornece uma visão bem pessimista da vida, sob a qual o decorrer do tempo caminha sempre para o pior. Além disso, os recursos formais disseminados aqui e ali indicam a dilaceração entre corpo e alma, pela recorrência a paradoxos, antíteses, anáforas, hipérboles. O famoso “Amor é fogo” é exemplo canônico do maneirismo camoniano, entretanto não deixa de ser clássico pelo fato de as anáforas que enumeram e procuram definir o estado amoroso expressarem uma tentativa de racionalizar o amor para entendê-lo, como se o amador não pudesse antes disso a ele se entregar. O soneto se desenvolve todo em cima de definições do amor. São tantas as dúvidas em relação ao amor, é tão difícil compreendê-lo que se indaga o poeta no último terceto: como pode o coração humano suportar tantas contradições provocadas pelo amor e ainda assim sujeitar-se a ele? Mencionem-se ainda “Tanto de meu estado me acho incerto” todo montado sobre antíteses; as personificações de “Aquela triste e leda madrugada” que termina com a belíssima hipérbole que evoca os amantes Orfeu e Eurídice: “Ela ouviu as palavras magoadas/ Que puderam tornar o fogo frio/ E dar descanso às almas condenadas.” Será esse o soneto camoniano da separação como Vinícius de Morais intitularia o seu séculos mais tarde?
Soneto de separação
De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.
De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.
Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.
(GRÜNEWWALD, 1987: 191).
O soneto de Vinícius emprega os recursos clássicos regiamente: o verso decassílabo, a disposição estrófica, as antíteses entre riso e pranto; bocas unidas e mãos espalmadas; calma, momento imóvel e vento; próximo e distante; e o quiasmo do primeiro terceto entre triste e contente e amante e sozinho; mas sem o tom macabro daquele, disputando, embora, a perfeição estética e a disciplina formal típica do mestre quinhentista:
Aquela triste e leda madrugada,
Cheia toda de mágoa e de piedade,
Enquanto houver no mundo saüdade
Quero que seja sempre celebrada.
Ela só, quando amena e marchetada
Saía, dando ao mundo claridade,
Viu apartar-se de ua outra vontade,
Que nunca poderá ver-se apartada.
Ela só viu as lágrimas em fio.
Que de uns e de outros olhos derivadas,
Se acre[s]centaram em grande e largo rio.
Ela [ou]viu as palavras magoadas
Que puderam tornar o fogo frio
E dar descanso às almas condenadas. (p. 272)
O poema camoniano diz que a separação dos amantes, traduzida pela metonímia “apartar-se de ua outra vontade”, é tão horrenda que só a madrugada lhe pode assistir e assim será por todo o sempre, isto é, enquanto houver saudade no mundo e amantes separando-se.
Lembremos agora “Transforma-se o amador na cousa amada” e a versão contemporânea de Carlos Filipe Moisés “A paixão segundo Camões”. Para Eduardo Lourenço em Camões, Antero e Pessoa: poesia e metafísica, aquele soneto representa um poema-questão que está acima dos jogos de corte. Mergulhado em petrarquismo e platonismo, nele a ausência da amada é que alimenta o amador, de início satisfeito com o “muito imaginar” que a traria para junto de si. Quer dizer, nas quadras, contenta-se o eu-lírico com a idealização do amor, com o amor de almas. Mas nos tercetos o recusa e torna-se aristotélico, pois “como o acidente em seu sujeito” e “como a matéria simples busca a forma”, tal como, por exemplo, a água (=matéria) toma a forma do conteúdo do pote que ela preencher, quer a satisfação do amor carnal, material, corpóreo:
Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar;
Não tenho, logo, mais que desejar,
Pois em mi[m] tenho a parte desejada.
Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente pode descansar,
Pois consigo tal alma está liada.
Mas esta linda e pura semidéia,
Que, como o acidente em seu sujeito,
Assi[m] coa minh’ alma se conforma,
Está no pensamento como idéia;
[E] o vivo e puro amor de que sou feito,
Como a matéria simples busca a forma. (p. 301)
Já o meta-soneto de Carlos Felipe Moisés retrata um amante contemporâneo, nada altivo, disperso, errando de amor em amor, sem pensar no passado, vivendo só o presente, “ausência, nada”.
Transforma-se o amador em coisa alguma,
sem dolo, sem virtude e sem razão.
Por muito amar, dispersa o coração
e rói daquilo que é a alma nenhuma
As esperanças perde, uma a uma,
de decifrar o rosto da paixão.
Sem rumo, ilhado entre o sim e o não,
se no amor de um mar sem espuma.
Transforma-se o amador em coisa errante,
atira ao vento um grito enrouquecido,
buscando se encontrar na coisa amada.
A pele rota, o gesto vacilante,
transforma-se, de amar como um perdido,
em sombra de si mesmo, ausência, nada.
(Antologia da Poesia Portuguesa, 1999: 28)
Derivado da palavra som, desde que foi criado pelo poeta siciliano Giacomo de Lentino no século XIII, o soneto desafia o virtuosismo dos metrônomos. E depois de Petrarca “inundou o mundo” (GRÜNEWALD, 1987: 19). No Brasil foi introduzido pelos poetas barrocos Gregório de Matos e Manuel Botelho de Oliveira e, séculos mais tarde, com a tríade parnasiana formada por Olavo Bilac, Raimundo Correia e Alberto de Oliveira se popularizou. Entre os modernos não são só os célebres “Sonetos de intimidade, de fidelidade, de meditação, de separação”, entre outros sonetos de Vinícius de Moraes, que fazem ecoar a lira camoniana, não. Surpreendamo-nos com uma composição do rebelde Mário de Andrade que lembra os clássicos portugueses Camões e Bocage, de “O ano em nasci” e “Meu ser evaporei”, respectivamente, em suas reflexões sobre a vida em forma de soneto:
“Quarenta anos”
A vida é paa mim, está se vendo,
Uma felicidade sm repouso;
Eu nem sei mais se gozo, pois que o gozo
Só pode ser medido em se sofrendo.
Bem sei que tudo é engano, mas sabendo
Disso, persisto em me enganar... Eu souso
Dizer que a vida foi o bem precioso
Que eu adorei. Foi meu pecado... Horrendo
Seria, agora que a velhice avança,
Que me sinto completo e além da sorte,
Me agarrar a esta vida fementida.
Vou fazer do meu fim minha esperança,
Oh sono, vem!... Que eu quero amar a morte
Com o mesmo engano que amei a vida. (Ibidem. p. 171)
O balanço no dia do aniversário, o passar do tempo, a proximidade da morte os inspiraram. O texto marioandradino não deixa de usar vocabulário erudito e antítese: entre gozo e sofrer, entre engano e esperança, vida e morte, bem ao gosto quinhentista.
Se conforme seu étimo alegoria significa “dizer o outro”, isto é, na alegoria “cada elemento quer dizer outra coisa que não o seu sentido original” (KOTHE, 1986: 52), concebemos que as noções de alegoria e de ruína alegórica fundamentam essas intertextualidades entre os textos canônicos de Camões e os demais, que são leitores dos camonianos, pois:
O manuscrito e a página impressa são as ruínas da obra elaborada pelo autor; com essas ruínas o leitor reconstrói, constrói de um modo novo, a obra do autor. Essa ruína é a runa que atravessa espaço e tempo. Ou é, simplesmente, o caixão de uma esperança. Um monumento assume o caráter de indiciar intencionalmente o passado, enquanto o documento indicia o passado sem que o gesto de sua constituição necessariamente contivesse esse adendo. A obra enquanto ruína é um legado do passado: sempre há um hiato de tempo entre autor e leitor. A ruína, resto de um mundo que já foi e já se foi, aproxima-se do documento por não constituir-se a priori com a intenção de testemunhar propositalmente o passado (podendo fazê-lo a posteriori, quando transformada em monumento) Monumento, ruína e documento unem-se como runas, índices do que foi, restos do pretérito, presentificados e presenteados a presentes posteriores. [...].
Os clássicos da literatura são ruínas transformadas em monumentos. Mas entender o texto literário apenas como ruína seria reduzi-lo a mero documento destinado a reconstituir o passado, o momento de sua gênese. O texto é a ruína não só de algo que houve, mas também de algo que não houve (ao menos para a historiografia dos senhores). Tanto o texto quanto, mediante a leitura judicativa, a sua concretização nas formas da crítica servem para desvelar o real e para ocultá-lo em suas várias dimensões. A obra e o documento são importantes não só como testemunhos do passado, mas também como significativos para o presente: seja na concordância seja no desacordo. Por outro lado a obra não é a não-ruína por excelência: índice de possibilidades, concretização de um mundo possível, reconhecimento do existente, alternativa ao statu quo, oportunidade de dizer o que o poder vigente não quer que se diga. (Ibidem, p. 68-69)
Nesses fatos talvez resida o motivo da rejeição de Camões pelo seu tempo.
Enquanto o seu contemporâneo Diogo Bernardes é dignificado pelo rei com altos cargos e honrarias, aquele atravessa anos obscuros, isolado de seus pares, que nunca se lhe referem em suas obras.
Tendo este texto sobre Camões sido exposto em uma mesa de comunicações coordenadas sobre “Tradução e terminologia”, durante os debates, a Professora Tânia Shepherd, a propósito da citação acima sobre o conceito benjaminiano de alegoria, lembrou o estudo de Walter Benjamin intitulado “A tarefa do tradutor”. E o Professor Adilson Corrêia aduziu que as transleituras contemporâneas dos sonetos clássicos por Vinícius de Moraes e Mário de Andrade poderiam ser consideradas traduções intralingüísticas. Indagou então uma jovem estudante da UERJ se a intenção da leitura era a penas a de descrever a lírica camoniana ou se haveria algum suporte teórico fundamentando uma pesquisa mais ampla. De fato a comunicação se limitou a descrever a lírica, mas a intenção é de prosseguir tais estudos no sentido de investigar o substrato platônico em relação ao tema da contemplação, do ver, do não ver, do olhar, presente na produção lírica camoniana. Até porque Platão era a corrente filosófica em voga na Renascença e Camões dela não escaparia, o que foi mencionado em relação a “Verdes são os campos”, como ensinara Antônio José Saraiva.
BIBLIOGRAFIA
ANTOLOGIA DA POESIA PORTUGUESA: linhas mestras. Rio: Faculdade de Letras, UFRJ, 1999. t. II.
BERARDINELLI, Cleonice. Estudos camonianos. Rio: Nova Fronteira, 2000.
CAMÕES, Luís de. Obra completa. SALGADO JÚNIOR, Antônio, org. Rio: Aguilar, 1963.
GRÜNEWALD, José Lino. Grandes sonetos da nossa língua. Rio: Nova Fronteira, 1987.
KOTHE, Flávio. A alegoria. São Paulo: Ática, 1986.
SARAIVA, António José. A cultura em Portugal. Lisboa: Bertrand, 1985.
------. Luís de Camões. Lisboa: Europa-América, [s. d.].