CONVERSAÇÃO E ENSINO DA LÍNGUA
Julia Pereira Marques da Silva
Apresentação
Pelo estudo da seleção vocabular e da sintaxe, objetivamos descrever as mudanças que podem ocorrer na produção textual escrita, a partir do vocabulário e do uso deste pelo emissor, nos processos de comunicação dos quais faz parte.
Ao produzir seu texto, seja ele falado ou escrito, o emissor estará, mesmo sem ter consciência disto, envolvendo, além da seleção vocabular e da sintaxe, outros campos de pesquisa nesta produção. Referimo-nos à semântica e à estilística.
Dessa forma, tentaremos desvendar a rede de relações que existe desde o momento em que o emissor pretende construir sua mensagem, passando pela influência que a oralidade pode exercer sobre ela e pela sua escritura propriamente dita, até sua conseqüente interpretação por determinado interlocutor.
Para o falante, a sua língua materna é um instrumento de suma importância tanto para a sua prática comunicativa quanto para sua afirmação enquanto sujeito que exerce determinado papel na sociedade.
O que existe por trás do ato comunicativo, da fala em si, não está explícito para o emissor. Porém, mesmo que o falante desconheça ou (re)conheça este fato, isto não fará com que sua mensagem seja menos eficiente, pois os sentidos das palavras que emprega não se acham dissociados do próprio pensamento. Marx esclarece muito bem esta relação entre fala e pensamento/consciência:
A fala é velha como a consciência, a fala é uma consciência prática, real, que existe tanto para os outros como para mim mesmo. E a fala, como a consciência, nasce apenas da necessidade, da imperiosidade de contato com outras pessoas. (Marx apud Schaff, 1968, p. 317.)
A necessidade inegável de que o homem sente em se comunicar com o outro resulta em escolhas: a quem falar, o que falar, como falar. O discurso produzido a partir dessas escolhas será somente seu, visto que refletirá seus fracassos e conquistas, sua história, seu “eu”.
Fazendo parte de uma sociedade, na qual estará em contato constante com outros, o indivíduo necessitará não apenas da linguagem oral para se comunicar. Dentre outras linguagens, a escrita será mais um instrumento à disposição dele para demonstrar sua competência lingüística.
Acontece que esta competência é constantemente colocada à prova, como se o usuário da língua nunca tivesse tido contato com ela. Referimo-nos especificamente ao ensino da língua. Ao tentar transportar os conhecimentos lingüísticos que já possui e que emprega eficientemente, da linguagem oral para a linguagem escrita, revela-se muitas vezes um fracassado. É difícil entender por que precisamos expressarmo-nos diferentemente na escrita. Por que existem tantas regras que já não traduzem a realidade do usuário da língua? Por que a cada esquina de uma página há tantas exceções, contradições?
Há extrema urgência em se rever o ensino da língua nas escolas, principalmente de ensino fundamental, para que estas questões possam ser esclarecidas. E, antes de tudo, a reformulação precisa estar presente também nos cursos de formação de professores, para que esta nova visão ganhe o devido espaço.
De outro modo, não vemos como o falante deixará de sentir-se perplexo diante de um “Dê-me um cigarro” no lugar de um “Me dá um cigarro”.
O estudo da seleção vocabular e da sintaxe na produção dos sentidos durante a textualização justifica-se tendo em vista que
· é através da seleção vocabular que o emissor revela a sua intencionalidade ao produzir determinado texto;
· o contexto situacional do ato comunicativo determinará, em parte, a escolha vocabular do sujeito escritor;
· a organização das palavras selecionadas levará à interpretação desejada pelo emissor;
· se faz necessário evitar as interferências negativas no processo de produção textual escrita, uma vez que, por serem negativas, prejudicam o bom entendimento da mensagem.
Estudo da Seleção Vocabular
Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?
Carlos Drummond de Andrade
Todo usuário da língua possui a chave que lhe dá acesso ao mundo das palavras. A capacidade da linguagem humana é essa chave. Quando criança, o falante, de modo bastante natural, principia a utilizar o valioso instrumento da linguagem. Enquanto tímido aprendiz de palavras, reproduz muito e cria pouco. Porém, seguindo um caminho irretornável, não mais necessita de que lhe digam o que falar, como falar. Já se sente perfeitamente capaz de seguir sozinho. Sente-se seguro do conhecimento que possui, do acervo vocabular de que dispõe. O uso que fazemos desse acervo vocabular é determinado pelas situações que vivenciamos.
Dessa forma, em um dado contexto, a seleção vocabular da qual lançaremos mão para produzir um texto deverá estar de acordo com o sentido que queremos dar à nossa mensagem. Então, não nos causa espanto que o nosso aluno/usuário da língua queira manter-se fiel ao seu texto, reproduzindo na escrita aquilo que pensou e disse. Mesmo que esse texto passe a ser “condenado” por não se ajustar aos padrões impostos pelas gramáticas normativas. Parece-lhe que, ao mexerem no seu texto, estão retirando o seu direito de ser autêntico.
O pessoal fizeram muita bagunça na sala, professora!
A gente gostamos de aula vaga.
É perfeitamente compreensível que tais construções sejam usadas pelo falante/escritor, uma vez que ele não quer deixar dúvidas de que está referindo-se a um grupo de várias pessoas. No seu entender, o verbo no singular soa de forma estranha, não condiz com a verdade que ele quer expressar.
Sobre o papel do sentido nas relações entre as palavras, afirma Guiraud (1972, p. 26-27):
O sentido, tal como nos é comunicado no discurso, depende das relações da palavra com as outras palavras do contexto, e tais relações são determinadas pela estrutura do sistema lingüístico.
À estrutura do sistema lingüístico chamamos gramática internalizada por cada indivíduo, o mesmo que conhecimento implícito da língua, conforme Perini (2000, p. 12.). Por saber empregá-la, o falante faz as relações que deseja com as palavras escolhidas de seu léxico, de forma que molda seu texto para este atenda às suas intenções. A disposição em que coloca as palavras valoriza o significado delas. Wittgenstein (apud Rector, 1980, p. 53.) corrobora esta idéia ao “constatar que as palavras só significam na medida em que estão num contexto interativo, isto é, como se seu valor variasse em função de sua disposição face às demais”.
A interação da palavra com o contexto revela-se no discurso, pois é nele “que se manifestam estas relações da linguagem, visto que o discurso é o lugar de encontro do significante e do significado e o lugar das distorções da comunicação que ocorrem devido à liberdade da comunicação.” (Rector, 1980, p. 130.)
O falante não deseja perder a liberdade de comunicar-se, de colocar no ato de comunicação do qual faz parte sua marca pessoal. Atentemos aqui para a questão do estilo próprio. Uma entonação diferente, uma determinada flexão de grau, uma intencional ausência de flexão de número são exemplos de marcas pessoais que ocorrem na fala e que naturalmente se concretizam na escrita.
AMIGO 1: - Comprei um estojo ‘manero’. Custou só dois ‘real’!
AMIGO 2: - Também, você é filhote de loja de um e noventa e nove!
Há tendência, por parte do falante de língua portuguesa, a reduzir ditongos em simples vogais, conforme atesta Coutinho em sua “Gramática Histórica (COUTINHO, p. 108.). Assim, para o usuário da língua, é perfeitamente correto falar “manero” em vez de “maneiro”. Tal tendência acaba por ser explicitada na escrita por influência da oralidade. Se ninguém praticamente fala “manteiga”, conseqüentemente estaremos diante da palavra “mantega” nas redações de nossos alunos.
Quanto à questão da ausência de flexão de número da palavra “real”, temos aqui duas colocações. Por um lado, poderíamos considerar a expressão “dois real” apenas um caso de erro de concordância; por outro lado, estaríamos diante de uma seleção vocabular empregada para expressar, por exemplo, esperteza de quem compra um bom produto por um pequeno preço.
Em nossa literatura, há muitos exemplos em que a seleção vocabular aliada à linguagem oral, só para determo-nos em assuntos objetos de nosso estudo, produzem obras originalíssimas. Citemos, para ilustrar, Mário de Andrade com “Macunaíma” (texto em prosa) e Oswald de Andrade com o texto em verso que vai transcrito a seguir:
brasil
O Zé Pereira chegou de caravela
E preguntou pro guarani da mata virgem
- Sois cristão?
- Não. Sou bravo, sou forte, sou filho da Morte
Teterê tetê Quizá Quizá Quecê!
Lá longe a onça resmungava Uu! ua! uu!
O negro zonzo saído da fornalha
Tomou a palavra e respondeu
- Sim pela graça de Deus
Canhem Babá Canhem Babá Cum Cum!
E fizeram o Carnaval.
(Andrade apud Cereja & Magalhães, 1995, p. 312.)
Para o falante/usuário da língua o que conta é a praticidade. Se na linguagem oral, ele dispõe de tanta liberdade para comunicar-se, por que não fazer uso dessa liberdade também na escrita? Não queremos dizer com isso que devemos abolir, no ensino da língua, as regras que estruturam nosso sistema lingüístico, mas que precisamos adaptá-las à realidade do falante. Por que não acompanhar na escrita a dinamicidade da língua?
Concluindo, o ensino da língua pode contribuir para que o nosso aluno (falante competente da língua materna) aproprie-se de conhecimentos que permitam que ele não apenas chegue perto e contemple as palavras, mas que faça bom uso da chave que possui para que não dê respostas pobres ou terríveis às perguntas que lhe forem feitas.
Sintaxe de Concordância
A oralidade influencia constantemente a produção de um texto escrito. Muitas vezes, esta influência é considerada negativa, pois resulta nos chamados “erros de concordância”. As gramáticas normativas costumam listar regras muitas vezes inflexíveis para determinar o que é certo e o que é errado. Porém, estudiosos mais modernos têm percebido e registrado casos passíveis de discussão.
Perini (2000, p. 19.) cita o caso da expressão “os relógio”, comprovadamente utilizada por falantes “cultos e incultos”. Não estamos diante de um mero caso de erro de concordância e sim de uma tendência lingüística da oralidade que vem sendo empregada também na escrita. Tendência esta que não pode ser ignorada pelos profissionais que lidam com o ensino da língua.
Para Lapa (1991, p. 157.) o erro de concordância não existe, pois a construção de um texto reflete o estilo de cada um. Vejamos sua colocação sobre o assunto:
...esses desvios aparentes de concordância se explicam sobretudo por três motivos: um que consiste em concordar com as palavras não segundo a letra mas segundo a idéia; outro, segundo o qual a concordância varia conforme a posição dos termos do discurso; e um terceiro, que traduz o propósito de fazer a concordância com o termo que mais interessa acentuar ou valorizar.
É preciso que analisemos bem os casos dos chamados “erros de concordância” que surgem nos textos produzidos por nossos alunos. Muitas vezes, a produção do aluno revela textos coerentes e coesos, dentro de seus propósitos, “diferentes” do que esperamos e desejamos encontrar.
Observemos um trecho de uma redação de um aluno da 7ª. Série do ensino fundamental:
Gosto de sair curto muitos bailes fanks todos os finais de semana vou ao baile. (sic)
Ignorando em nosso comentário as questões da pontuação e da grafia equivocada da palavra “funk”, vamos ao caso de concordância que aí se apresenta: “curto muitos bailes fanks”. Nós, professores da língua, esperaríamos encontrar a seguinte construção: “curto muito bailes funks”, na qual a palavra muito estaria funcionando como advérbio e não como pronome indefinido, tal como se encontra na redação do aluno. Para que se considere errada a construção do aluno, é preciso analisar seu texto com cuidado, tentando perceber sua intenção, seu propósito.
Acreditamos que a falta de organização do pensamento influencia a produção do discurso do nosso aluno, seja tal produção oral ou escrita. A forma como o ensino da língua ainda é tratado não tem oportunizado o exercício da organização do pensamento, uma vez que os conteúdos gramaticais são priorizados em detrimento de outros (produção oral e escrita, por exemplo), tornando a aula de português um “amontoado de coisas sem sentido”.
Não temos dado ao nosso aluno espaço suficiente para que ele exerça seu direito de fala. Normalmente, ele está na sala apenas para ouvir, para copiar, para reproduzir o que se espera dele. Ao ser solicitado a falar, muitas vezes, sua fala é truncada, inicia um assunto e não é capaz de concluí-lo. Questão de timidez? Em alguns casos, sim. Essa fala fragmentada, não desenvolvida, concretiza-se na escrita de forma bem clara: ausência de coesão e de coerência, fuga ao tema proposto, repetições excessivas, para citar apenas os problemas mais encontrados.
Prycila eu quero que você fiquei torcendo porque agora porque no dia 16 de outubro vou fazer prova com padre para crisma porque no final do vou se alistar. (sic) (Trecho de um texto produzido por aluno de 6ª. Série do ensino fundamental.)
Atentemos para a mistura de assuntos que o aluno realiza, utilizando basicamente um conectivo (porque). Que relação existe entre os dois fatos, o de ser crismado e o de se alistar no final do ano (palavra omitida, provavelmente sem que o aluno tenha tido esta intenção)? Acreditamos que aqui não estejamos diante de um caso de desconhecimento do significado do conectivo apenas. E sim de incapacidade de relacionar idéias, de fazer conexão de sentidos.
Por tudo o que foi exposto até aqui, cremos que o exercício da leitura e da escrita, como forma de desenvolver a competência lingüística, seria uma das estratégias numa tentativa de minimizar muitos dos problemas citados.
Sintaxe de Regência
Na maioria das gramáticas normativas, o conceito de regência aborda a relação de dependência entre termos da oração. Fazer com que o nosso aluno, que traz influências (negativas e positivas) da oralidade, perceba e compreenda essa idéia de dependência é, por vezes, tarefa bastante árdua.
Pesquisando em algumas gramáticas disponíveis aos nossos estudantes, observamos que alguns casos são tratados de forma diversa. Vejamos um caso: no “Curso Prático de Gramática”, de Ernani Terra (1996, p. 299.), há a seguinte afirmação referente à regência do verbo chegar:
“O verbo chegar exige a preposição a e não a preposição em.”
Já a “Gramática”, de Faraco e Moura (1999, p. 514.), apresenta a seguinte colocação em relação ao mesmo verbo chegar:
“É intransitivo no sentido de atingir data ou local. (...) Já é bastante comum o uso da preposição em nesta acepção.”
Essas abordagens conflitantes apresentadas pelas gramáticas citadas acabam por confundir o nosso aluno e, até mesmo, por dificultar o entendimento deste assunto. Que frase é mais comum nas redações de nossos alunos? “Cheguei em casa muito tarde” ou Cheguei a minha casa muito tarde”? Com certeza, a primeira. Portanto, não é mais cabível afirmar que o verbo chegar não exige a preposição em. Uma ou outra preposição é perfeitamente admissível.
Reconhece-se que a língua falada no Brasil não é a mesma representada na escrita. É também dessa questão que temos tratado até então. O falante, com o propósito de passar adiante seu pensamento, suas idéias, seleciona as palavras que melhor representam sua intenção e arruma-as de maneira que estas atendam aos seus desejos. Altera, propositalmente ou não, a sintaxe de concordância ou de regência, construindo seu próprio estilo. Sua mensagem poderá ou não ser compreendida da forma como gostaria de que fosse. As chances de que o entendimento ocorra tal como planejou são grandes.
O estudo do emprego diversificado que se faz da língua falada (situações informais) e da língua escrita (situações formais) está cada vez mais ocupando espaço nos meios acadêmicos que tratam do ensino da língua. Algumas obras vêm acrescentar novas idéias que auxiliam o presente trabalho, como Mário Perini (Sofrendo a Gramática), Celso Pedro Luft (Língua e Liberdade) e Evanildo Bechara (Ensino da Gramática. Opressão? Liberdade?). Porém, décadas de um ensino equivocado exigirão a adoção de um novo modo de ensinar a gramática, a partir de uma visão de linguagem que liberte, que permita a construção de um discurso de sujeito, e não de quem se sujeita.
Voltando a mais um caso de sintaxe de regência. Se um dos significados da palavra “com” é a idéia de companhia, como considerar errada a construção “Namoro com Carlos”? Para o falante/usuário da língua, a frase está corretíssima. Para tentarmos convencer este falante de que a sua construção é incorreta, só temos o argumento de que o verbo namorar é transitivo direto (não admitindo preposição), pois quem namora, namora alguém. Porém não é argumento forte o suficiente para deslegitimar a sua intenção de transmitir a idéia de um estar com o outro, de namorar com o outro.
Finalizando, a estrutura lingüística que cada usuário da língua internaliza, dá-lhe subsídios para que ele elabore construções que, na escrita, são consideradas como erros de concordância, de regência, entre tantos outros “erros”. Cabe ampliar, na sistematização das regras que estruturam a língua, o registro das possibilidades de construções de que o usuário da língua dispõe. Até porque as invariações dentro das variações é que dão vida à língua.
Sintaxe de Colocação
No início de nosso trabalho, comentamos a respeito de o falante sentir-se perplexo diante da construção “Dê-me um cigarro”, verso conhecidíssimo do poema “Pronominais”, de Oswald de Andrade, muito usado para exemplificar casos de colocação pronominal. É claro que o usuário da língua estranha uma construção como essa, quando, no seu falar revela-se a tendência de fazer uso da próclise. O nosso aluno jamais empregaria a frase “Empreste-me uma caneta” ao dirigir-se ao colega a seu lado. Até mesmo nós, professores e conhecedores da língua, no dia a dia, empregamos a próclise com abundância em nossa fala. Ainda mais que a questão da colocação dos pronomes na frase está mais a serviço da estilística que da sintaxe. Observemos:
A. Se atrasou hoje, professora.
B. Atrasou-se hoje, professora.
De acordo com as regras que norteiam o emprego da próclise, a frase A estaria fora dos padrões, porém, numa linguagem informal, falada ou escrita, seria perfeitamente justificável, na medida em que representaria um estilo despojado e simples do locutor/escritor. Já a frase B exemplifica o correto emprego do pronome, mas na prática de nossos alunos é pouco utilizada.
O emprego da mesóclise é ainda mais complicado. Em primeiro lugar, há a preferência de o usuário da língua portuguesa no Brasil utilizar para o tempo futuro do presente do indicativo, por exemplo, a locução verbal: “Vou fazer prova amanhã” no lugar de “Farei prova amanhã”; em segundo lugar, o emprego da mesóclise soa como pedantismo, próprio da linguagem rebuscada, empolada: “Far-te-ei uma proposta amanhã”. O uso da mesóclise está reduzido à produção escrita de usuários com bom domínio da estrutura da língua.
Façamos mais um comentário:
“Está um calor! A janela está fechada, professora. Quer que abra ela?”
É um tipo de construção amplamente empregada pelo falante. Devemos considerá-la totalmente errada? E o que podemos dizer de construções do tipo “Professora, eu se machuquei!”? Não seria mais relevante preocuparmo-nos com frases desse tipo? E não é só uma questão de concordância ou de colocação. É uma questão de identidade. O falante não se reconhece no próprio discurso. Não é capaz de reconhecer-se no me, pois é a partir do se que vê o mundo: “Entre, sente-se, cale-se, saia e vire-se; a minha parte eu já fiz.”
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