O
SOFTWARE
COMO
FERRAMENTA
DE
AUXÍLIO
PARA
A APRENDIZAGEM
INFANTIL
A
AQUISIÇÃO
DA
LINGUAGEM
POR
SEU
INTERMÉDIO
À
LUZ
DAS
TEORIAS
DE VYGOTSKY
QUESTÕES
PRELIMINARES
Mirian
Rosa de Freitas Montin (UNIOESTE)
Jorge Bidarra (UNIOESTE)
INTRODUÇÃO
Vemos
que,
nos
últimos
tempos, a
abordagem sócio-histórica tem sido
amplamente investigada e discutida, sugerindo,
assim, a
adoção de
um
novo
paradigma
educacional.
Dentre
outros
pesquisadores dessa
abordagem, destacamos Lev Semenovitch Vygotsky,
bielo-russo,
que,
mesmo
em
poucos
anos de
vida,
deixou-nos
um
grande
número de
estudos, dos
quais a
questão do
desenvolvimento da
linguagem e
sua
relação
com o
desenvolvimento do
pensamento é
um dos
assuntos
que
nos interessa
discutir
mais de
perto.
Concretamente,
o
que
desejamos
com
essa
pesquisa
(em
sua
fase
bem
inicial)
é a
partir
dos
estudos
de Vygotksy, especificamente os relacionados
com
a aprendizagem e
mais
exatamente
no
campo
do
desenvolvimento
da
linguagem,
extrair
um
conjunto
de
informações
que
julgamos
relevantes
e úteis
não
apenas
para
avaliar
softwares
educacionais
mas
também
que
nos
sirvam
para
a
proposição
de
um
modelo
de
software,
a
nosso
ver,
mais
adequado
para
a
finalidade
a
que
se propõe.
MATERIAL E MÉTODOS
O
trabalho
que vimos desenvolvendo
tem
dois
objetivos
principais.
Um deles,
adquirir
subsídios
teóricos
que
nos permitam
mais facilmente, de
um
lado,
avaliar os
ditos
softwares
educacionais e, de
outro,
tentar
estabelecer
qual
exatamente a
contribuição
que
esses
softwares,
hoje uma
realidade
em muitas
instituições de
ensino, vem propiciando aos
alunos e
professores. O
segundo
objetivo é
propor uma modelagem de
software
educacional, tomando
por
base as
teorias de Vygotsky.
Para
atingir os
nossos
propósitos, de Vygotsky estamos interessados
em
discutir de uma
maneira
geral a
questão da aprendizagem
infantil,
mas
em
especial o
tópico
referente ao
desenvolvimento de
linguagem. A
seguir, passamos
em
revista
alguns dos
principais
pontos da
teoria de Vygotsky
que de
fato
nos interessam nessa
pesquisa.
A
teoria de Vygotsky: uma
visão geral
Para Vygotsky, a
linguagem possui duas
funções básicas: a de
intercâmbio e a de
pensamento generalizante. A
necessidade de
comunicação do
homem
com
seus
pares faz
com
que sejam
criados (e utilizados)
sistemas de
linguagem.
Entretanto,
para
que essa
comunicação possa
ser de
fato viabilizada,
não
basta
que a
pessoa manifeste
apenas
estados
gerais,
tais
como as
crianças
pequenas o fazem, de
incômodo
ou
prazer. É
preciso
que os
signos utilizados,
no
geral
expressos
por
meio de
palavras, possam
traduzir
idéias,
sentimentos,
pensamentos e
vontades,
mas
que
somente terão
validade se compreensíveis
por
outros
indivíduos.
Já o
pensamento generalizante é a
função
que permite ao
indivíduo
denominar,
via
palavras,
um
certo
conjunto de
elementos do
mundo
real. Uma
palavra será compreendida
por outras
pessoas
mesmo
que a
experiência
concreta
que tenham dela seja
diferente da
experiência do
indivíduo
que a utilizou.
As
questões envolvidas nessa
discussão
são diversas,
porém,
antes de irmos
adiante, achamos
conveniente,
senão
necessário,
esclarecer
desde
já o
que estaremos entendendo
aqui
pelos
seguintes termos:
voz,
fala,
língua e
linguagem. É
importante
termos
em
mente
que
cada
um desses
termos tem
seu
papel na
comunicação e no
próprio
desenvolvimento do
indivíduo. Partimos do
princípio de
que se
voz é a
articulação das
pregas
vocais,
isto é a
emissão de
som,
fala vem a
ser a
articulação
ordenada desses
sons,
logo
língua o
código entendível
para uma
determinada
cultura e
linguagem a
habilidade do
indivíduo de
expressar
seus
pensamentos,
vontades,
sentimentos e
idéias.
Um
fator de
grande
importância revelado
por Vygotsky,
relativamente ao
estudo do
pensamento e da
fala, é
que,
segundo
ele, o
progresso da
fala
não é
paralelo ao
progresso do
pensamento, uma
vez
que o
pensamento e a
fala possuem raízes geneticamente
diferentes. Estas duas
funções desenvolvem-se
em
trajetórias
diferentes e
independentes. As
curvas de
crescimento de
ambos cruzam-se muitas
vezes, podendo
até
mesmo
correr
lado a
lado
ou fundir-se
por
algum
tempo,
mas acabam se separando
novamente. Vygotsky afirma,
ainda, a
existência de uma
fase pré-lingüística no
desenvolvimento do
pensamento e uma
fase pré-intelectual no
desenvolvimento da
fala. Estas
linhas se encontram
em
determinado
momento
onde,
como
conseqüência, o
pensamento torna-se
verbal e a
fala
racional.
Raízes pré-intelectuais da
fala no
desenvolvimento da
criança
são
bem conhecidas. O
choro e o balbucio da
criança
são
claramente
estágios do
desenvolvimento da
fala
que
não têm
relação
com a
evolução do
pensamento.
Embora
nem
toda
manifestação se
limite à
função de
descarga
emocional, estas
manifestações
geralmente
são consideradas uma
forma de
comportamento predominantemente
emocional.
É num
certo
momento, aproximadamente aos
dois
anos de
idade,
que as
curvas do
desenvolvimento do
pensamento e da
fala,
que
até
então eram separadas, encontram-se iniciando,
assim, uma
nova
forma de
comportamento. É
quando a
criança “descobre”
que
cada
coisa tem
seu
nome. Nesse
momento a
fala
passa a
servir ao
intelecto e os
pensamentos começam a
ser verbalizados. A
prova
inconfundível disso é a
curiosidade
que as
crianças passam a
ter perguntando “o
que é
isso?” e,
como
conseqüência, a
ampliação de
seu
vocabulário.
Até
este
momento a
criança reconhecia
um
determinado
número de
palavras
que substituem
objetos,
pessoas,
estados,
desejos
ou
ações. A
partir dessa
idade a
criança
passa a
sentir a
necessidade das
palavras e, ao
fazer
perguntas,
tenta
aprender os
signos vinculados aos
objetos, dando-se
aí a
descoberta da
função simbólica das
palavras.
Agora, a
fala
deixa de
ser afetivo-conativa
para
ser
intelectual.
Vygotsky aborda o
desenvolvimento da
fala mostrando-nos
que esta segue e obedece ao
mesmo
curso e às
leis
que o
desenvolvimento de todas as outras
operações
mentais
que envolvem o
uso de
signos, dividindo-o
em
quatro
estágios. O
primeiro
estágio é
natural
ou
primitivo. Corresponde à
fase da
fala pré-intelectual e do
pensamento pré-verbal. O
segundo é chamado de “psicologia
ingênua”,
assim chamado
por analogia com a “física
ingênua.
É nesse
estágio
que a
criança domina a
sintaxe da
fala
mas
não
ainda a do
pensamento.
O
terceiro
estágio se caracteriza
pelo
uso de
signos
exteriores,
em
que a
criança
lança
mão de
auxiliares
externos
para a
solução de
problemas
internos. Considera-se
esse
estágio
como sendo o da
fala
egocêntrica. O
quarto
estágio é chamado de “crescimento
interior”
ou da
fala
silenciosa.
Um
exemplo é
quando se repassa
mentalmente uma
notícia a
ser
dada.
Não existe
mentalmente
divisão
entre o
comportamento
interno e
externo, e
um influencia o
outro.
Vygotsky termina o
seu 4º
capítulo,
em
Pensamento e Linguagem, “As raízes
genéticas do
pensamento e da linguagem”, afirmando:
Isto
nos
leva a
outro
fato
inquestionável
e de
grande
importância: o
desenvolvimento
do
pensamento é
determinado
pela
linguagem,
isto é,
pelos
instrumentos
lingüísticos
do
pensamento e
pela
experiência
socio-cultural na
criança.
Basicamente, o
desenvolvimento
da
fala
interior
depende de
fatores
externos: o
desenvolvimento
da
lógica na
criança,
como os
estudos de
Piaget demonstraram, é uma
função
direta de
sua
fala
socializada. O
crescimento
intelectual da
criança
depende de
seu
domínio dos
meios
sociais do
pensamento,
isto é, da
linguagem.
Vygotsky e os
níveis de
desenvolvimento da aprendizagem
Pois
bem,
tomando
como
ponto
de
partida
o
fato
de
que
a aprendizagem
escolar
nunca
parte
do
zero
(a aprendizagem da
criança
começa
muito
antes
da aprendizagem
escolar,
pois
tem uma
pré-história),
parece
razoável
pensar
que
esse
processo
difere de
modo
essencial
do
domínio
de
noções
que
a
criança
adquire
durante
o
ensino
escolar.
Vygotsky
mostra
que
aprendizagem e
desenvolvimento
estão intimamente ligados
entre
si
desde
os
primeiros
dias
de
vida
da
criança.
Vale
notar
que
a
própria
história
da
escrita
na
criança
é uma
habilidade
que
começa
muito
antes
da
primeira
vez
em
que
esta vai a
escola
e o
professor
coloca
um
lápis
em
sua
mão
e
lhe
mostra
como
formar
letras.
Vygostsky
chama
nossa
atenção
para
um
fato
empiricamente estabelecido e
bem
conhecido,
a
questão
de
que
o
aprendizado
deve
ser
combinado de
algum
modo
com
o
nível
de
desenvolvimento
da
criança,
isto
é,
não
acontecerá a aprendizagem se a
criança
não
estiver num
estágio
de
desenvolvimento
em
que
esta possa
ocorrer.
Para
que
se descubram as
relações
reais
entre
o
processo
de
desenvolvimento
e a
capacidade
de aprendizagem
não
podemos
nos
limitar
somente
à
determinação
de
níveis
de
desenvolvimento.
(Vygotsky, 2001)
Em
seus
estudos,
Vygotsky apontou
para a
necessidade de
se olharem as
investigações
sobre
aprendizado e
desenvolvimento
de
maneira
diferenciada.
Apesar disso,
o
que percebemos
é
que
ainda
hoje boa
parte das
investigações,
em
particular
psicológicas,
acerca do
aprendizado
escolar mede o
nível de
desenvolvimento
mental da
criança a
partir da
resolução de
determinados
problemas
padronizados.
Partindo desse pressuposto, a
conclusão
que se
chega é
que a
criança
só terá
concluído
determinada
fase de
desenvolvimento
se
capaz de
conseguir
resolver
sozinha
certos
problemas.
Dessa
maneira,
mede-se a
etapa
já concluída
do
desenvolvimento
da
criança,
não levando
em
conta a
totalidade do
processo.
Esse é o
ponto. No
fundo, sabemos
que,
com o
auxílio de
outra
pessoa e
até
mesmo de
ferramentas
computacionais,
qualquer
criança pode
fazer
muito
mais do
que faria
sozinha. A
imitação e o
aprendizado
desempenham
um
papel
importante,
tornam
possíveis
novos
níveis de
conhecimento
através de
qualidades
especificamente humanas. O
que a
criança é
capaz de
fazer
hoje
em
cooperação,
amanhã será
capaz de
fazer
sozinha.
Portanto,
o
único
tipo
positivo de
aprendizado é
aquele
que
caminha à
frente do
desenvolvimento,
servindo-lhe de
guia; deve
voltar-se
não
tanto
para as
funções
já maduras,
mas
principalmente
para as
funções
em
amadurecimento. (Vygotsky, 1987: 130)
Com
isso queremos
dizer
que
não podemos
nos
limitar
somente à
determinação
de
níveis de
desenvolvimento
se o
que
realmente
desejamos é
descobrir
quais as
relações
reais
entre o
processo de
desenvolvimento
e a
capacidade de
aprendizagem.
Com
respeito ao
desenvolvimento
infantil, Vygotsky
mostra,
ainda,
que há
dois
diferentes
níveis, o do
desenvolvimento
real e o do
desenvolvimento
potencial. O
primeiro deles é o
nível de
desenvolvimento
das
funções
mentais da
criança
que se
estabelecem
como
resultado de
certos
ciclos de
desenvolvimento
já
completados.
Nos
estudos do
desenvolvimento
mental das
crianças
encontrados na
literatura especializada,
geralmente
admite-se
que
só é
indicativo da
capacidade
mental das
crianças
aquilo
que
elas conseguem
fazer sozinhas. É o
que,
nos
termos de
Vygotsky, vai
ser chamado de
nível
de
desenvolvimento
real.
O
segundo é o
nível de
desenvolvimento
potencial
é o
que
autor define
como aquelas
funções
ainda
não
amadurecidas,
ciclos de
desenvolvimento
não
totalmente
completados,
mas
que estão
em
processo de maturação.
Entre o
primeiro e o
segundo
níveis,
encontramos a
zona de
desenvolvimento
proximal, a
qual
segundo
Vygotsky (1998: 112)
É a
distância
entre o
nível de
desenvolvimento
real,
que se costuma
determinar
através da
solução
independente de
problemas, e o
nível de
desenvolvimento
potencial,
determinado
através da
solução de
problemas
sob a
orientação de
um
adulto
ou
em
colaboração
com
companheiros
mais
capazes.
A
hipótese
que levantamos
aqui é de
que seria
exatamente
através da
zona de
desenvolvimento
proximal
que poderíamos
entender o
processo
interno de
desenvolvimento
e
acentuar a
eficácia e a
utilidade da
aplicação de
métodos
diagnósticos
do
desenvolvimento
mental a
problemas
educacionais.
Dito
em
outros
termos, é
partindo da
compreensão da
zona de
desenvolvimento
proximal da
criança
que poderíamos
delinear o
estado
dinâmico de
seu
desenvolvimento,
propiciando,
assim, o
acesso
não
somente ao
que
já foi
atingido
através do
desenvolvimento,
mas
também ao
que está
em
processo de maturação.
Admitindo,
pois,
que o estamos
corretos
em
nosso
raciocínio, o
que
pretendemos nesse
artigo é
dar
início a uma
discussão
crítica
sobre o
papel dos chamados
softwares
educacionais.
RESULTADOS E
DISCUSSÃO
A
idéia desse
trabalho,
conforme
mencionado
anteriormente,
é
investigar os
softwares
educacionais,
destinados à
fase de alfabetização,
considerando
quais os
aspectos
que
estes possuem
e se têm
condições de
interação
com
seus
usuários, no
caso a
criança
por
volta dos 6
anos de
idade. É
necessário
que essa
análise seja
detalhada ao
observar de
que
maneira o
software está
conduzindo o aprendizado: se
apenas
reforça
estágios de
desenvolvimento
já superados
ou instiga a
criança a
alcançar
um
novo
estágio no
seu
desenvolvimento.
Precisamos
nunca
perder de
vista a
maneira
como
estes
softwares
estão levando à
criança a
desenvolver
seu
potencial de
leitura e
escrita, se
respeitam as
maneiras
diferentes de
aprendizado,
se estimulam as
habilidades
cognitivas das
crianças e,
acima de
tudo, ofereçam
a estas,
situações
para
que possam
utilizar
seus
novos
conhecimentos
para a
solução de
novos
problemas e
assim
ajudá-las a
atingir,
sempre,
um
novo
estágio de
desenvolvimento.
Fica
claro
que
nossa
investigação é
verificar se os
softwares
possuem
elementos
que auxiliem à
criança,
partindo do
nível de
conhecimento
real, a
estabelecer,
através da
interação
com o
software
ou
outra
pessoa, a
superação
deste
nível. É o
que Vygotsky
chama de
zona de
desenvolvimento
proximal.
CONCLUSÕES
Esperamos,
com o
desenvolvimento dessa
pesquisa,
conseguir
subsídios
teóricos
suficientes
para
não
somente avaliarmos
alguns
softwares
educacionais destinados à
alfabetizar,
mas
sim,
através destes, desenvolvermos
sugestões
para
um
modelo de
software
dentro das
teorias discutidas
em
nossa
pesquisa.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
VYGOTSKY, L. S.. A
formação
social da mente: o
desenvolvimento dos
processos
psicológicos
superiores. In: COLE, M. et al.
(eds.;
tradução José Cipolla Netto, Luís
Silveira Menna Barreto, Solange Castro Afeche. 6ª
ed.
São Paulo: Martins
Fontes, 1998.
––––––.
Pensamento e linguagem
Tradução: Jefferson Luiz Camargo – 2ª ed. –
São Paulo: Matins
Fontes, 1987.
––––––; LURIA, Alexander Romanovich; LEONTIEV,
Alexis N.
Linguagem,
desenvolvimento e aprendizagem.
Tradução Maria da
Penha Villalobos. 7ª ed. São Paulo: Ícone, 2001.
Como cada indivíduo vive sua experiência pessoal de modo muito complexo e
particular, o mundo da experiência vivida tem que ser extremamente
simplificado e generalizado para poder ser traduzido em signos que possam
ser transmitidos a outros.
Na verdade muitas escolas (psicólogos, pedagogos e afins) ainda utilizam e
valorizam estes testes padronizados, o de Q.I. por ex., onde apenas
constatam o nível de desenvolvimento cognitivo do indivíduo, isto é, o que
este consegue fazer sozinho, sem, muitas vezes, levar em conta o processo de
desenvolvimento.