ANTONÍMIA DE
SISTEMA
E
ANTONÍMIA DE
DISCURSO
Guiomar Fanganiello
Calçada (USP)
Abordaremos
aqui o
fenômeno da
antonímia apoiando-nos
em duas
tendências
aparentemente
contraditórias, a
que afirma a
importância do
contexto,
ou do
papel dos
conjuntos na
linguagem,
para a
determinação
do
verdadeiro
sentido das
palavras e a
que
procura
fixar-lhes
um
significado (sentido)
de
base,
fixo,
imutável,
comum aos
falantes de
uma
determinada
sociedade.
Para
tanto, é
preciso
estabelecer uma
concordância
entre a
idéia de
que o
valor de uma
palavra se
modifica
segundo o
contexto
em
que está
integrada e a de
que a
palavra
isolada do
contexto se
converte num
dado
impessoal
dotada de
significado
próprio. Procura-se,
então, uma
relação
entre a
idéia de
falta de
imutabilidade
do
significado e
a de
sua
dependência do
conjunto e da
organização
dos
textos
para
fins de
comunicação.
Orientando-nos
para
esse
objetivo,
admitimos,
conforme
Slama-Cazacu (1970),
que a
linguagem está
determinada
pelas diversas
situações da
dinâmica
psíquica no
quadro da
vida
social e,
portanto,
supõe a
existência de
uma
relação
social
entre
um
ou
vários
emissores e
respectivos
receptores.
Daí a
linguagem,
como
também a
língua, se
caracterizarem
como
fenômenos de
comunicação e
se fundamentarem
sobre a
possibilidade especificamente
humana de
captar o
caráter
significativo das
expressões
lingüísticas.
Como a
relação
entre
emissor e
receptor se
estabelece
naturalmente
por
meio da
linguagem,
esta,
como
todo
sistema
simbólico, utiliza-se de “signos”,
em
nosso
caso, as
palavras,
que refletem a
realidade circundante
em
seus
diversos
aspectos.
Estes “signos”,
em atendimento
à
finalidade
específica de
comunicação
interpessoal,
têm
um
valor
constante e
geral
para os
membros da
mesma
coletividade,
mas, ao
mesmo
tempo,
um
valor
variável,
apto a
expressar a
dinâmica da
realidade e as
necessidades
particulares
de
emissores
diferenciados.
Com
base no
princípio da
falta de
imutabilidade
do
significado,
justifica-se o
agrupamento de
lexemas
em
pares
antonímicos, a
partir dos
significados
de
base das
palavras da
língua, os
chamados semas dicionarizados.
Quanto ao
dicionário, considerado
como
sistema de
conceitos,
segundo
Biervisch, lê-se
em Lyons
(1976)
que:
Em
termos de
análise
componencial, o
significado de
uma
palavra é
um
complexo de
componentes
semânticos (ou
traços,
ou
marcadores)
vinculados
por
constantes
lógicas. Esta
superposição
permite-nos
definir
certas
relações e
propriedades
semânticas de
verbetes
lexicais.
Assim, uma
palavra é
semanticamente
ambígua se tem
mais de
um
complexo de
traços
semânticos
para designá-la. (p. 165)
E conclui o
autor a
respeito da
antonímia:
Dois
verbetes E1 e
E2 (...)
serão
antônimos se
seus
significados
forem
idênticos,
salvo
que o
sentido de E1
tem
um
componente C,
quando E2
tinha C’,
sendo
que C e C’
pertencem a
um
subconjunto
particular de
componentes
mutuamente
exclusivos.
(p. 165-166)
Essa
constatação
legitima o
fato de as
gramáticas
tradicionais conceituarem os
antônimos
como
vocábulos
com
sentidos
opostos,
como
já se observa
em Júlio
Ribeiro
(1910),
quando, ao
tratar dos
sinônimos,
homônimos,
parônimos e
antônimos,
afirma:
Quando,
finalmente, as
palavras
entre
si têm
significações opostas, tomam o
nome de
ANTONYMOS,
como
em –
amor,
ódio;
dia,
noite;
luz,
trevas;
riso,
lágrimas;
forte,
fraco;
corar,
empalidecer;
duro,
mole;
subir,
descer;
fechar,
abrir;
covardemente,
corajosamente;
fielmente,
infielmente;
etc. (p.325)
O
mesmo
conceito se
apresenta
em Eduardo
Carlos
Pereira
(1957:178),
quando, ao
tratar de
analogia e
oposição de
sentido, se
refere às
palavras
antônimas considerando-as: “(...)
palavras
diversas na
forma e opostas na
significação:
dia e
noite,
bem e
mal,
amar e
odiar,
sim e
não,
pró e
contra,
com e
sem.”
(p. 178)
Rocha
Lima (1992),
conceitua os
antônimos
dentro da
Estilística
Léxica,
chamando a
atenção
para os
dois
aspectos da
significação de uma
palavra, o
denotativo,
que diz
respeito à
função
representativa da
linguagem, e o
conotativo,
que se refere
à
capacidade da
palavra de
funcionar
como
exteriorização
psíquica,
ou
apelo.
Trata-se de
dois
aspectos
que se
combinam
para “compor
a significação
integral da
palavra”. O
autor
ainda
acrescenta
que
não é
difícil
concluir
que “o
exame da
conotação se
situa na
área da
estilística, e
só se
precisa no
contexto”. E,
ao
tratar das
séries
sinonímicas, ressalta
que é na
conotação “que
repousa,
em
grande
escala, a
escolha do
termo
adequado” à
série.
Para
ele, no
plano da
denotação, “o
que distingue
os
sinônimos é o
seu
significado
mais
amplo,
ou
mais restrito:
educador,
mestre,
professor;
recompensa,
gratificação,
gorgeta”. No
plano da
conotação, a
diferença se
deve ao
efeito
estético
orientado
pela
tonalidade
afetiva.
Quanto aos
antônimos,
aparecem no
item destinado
à polissemia, a
ser considerada no
âmbito
puro da
denotação. Ao
se
referir à polissemia, o
autor afirma:
“(...) –
vale
dizer a multiplicidade de
sentidos
imanente
em
toda
palavra, de
que resulta
que a
sinonímia depende
fundamentalmente
do
contexto.” (p.
485)
Entretanto, o
autor
restringe-se a
conceituar
os
antônimos
como “palavras
de significação
diametralmente
opostas”, acrescentando
que
...ora
são
termos de
radicais
distintos,
ora possuem o
mesmo
radical,
caracterizando-se
um deles
por
um
prefixo de
valor
negativo:
abrir -
fechar
feliz -
infeliz
claro
-
escuro
lealdade -
deslealdade
resistir-
ceder
normal
–
anormal.
(p. 486)
Como se pode
verificar,
não há nenhuma
referência ao
papel do
contexto
quanto à
significação dos
antônimos.
A consulta à
obra de
Evanildo Bechara (1973),
mostra
que o
autor, ao
tratar da
antonímia no
capítulo
destinado à
semântica,
nos remete ao
mesmo
conceito: “Antonímia
é o
fato de
haver
vocábulos
com
sentidos
opostos:
vida/morte;
crente/descrente.”
(p. 345)
O
autor
acrescenta
ainda
que,
conforme Nyrop,
um
mesmo
vocábulo pode
assumir
dois
valores,
como ocorre
com
freqüência
com as ‘voces
mediae’
que exprimem,
conforme o
caso, uma
alegria
ou
tristeza,
um
benefício
ou
prejuízo etc.:
fortuna
(boa
ou má),
sucesso
(bom
ou
mau),
augúrio,
sorte,
interesse.
Ressalta
também
valor
ativo e
passivo,
como é o
caso,
entre
outros, de
alugar
que pode
significar “dar
ou
receber de
aluguel”.
Com
base
nos
autores
consultados, pudemos
observar
que o
aspecto polissêmico dos
vocábulos se
fez
notar no
que se refere
ao
fenômeno da
sinonímia, apontando
para o
papel do
contexto na
atribuição do
sentido dos
vocábulos.
Ao
abordar o
problema da
sinonímia e da
antonímia, Lopes (1981:
255-259),
após
mencionar o
fato de as
gramáticas
tradicionais apresentarem
listas de
antônimos
porque afirmam
possuírem essas
palavras
sentidos
opostos,
esclarece o
que se deve
entender
por
sentidos
opostos.
Tal
expressão,
para o
autor, deve
ser
entendida
como
oposto
por
contrariedade
e
oposto
por
contraditoriedade. Considera
então
que a
relação
lógica de
contrariedade
é aquela
que “se
estabelece
entre
dois
termos, A e B,
quando A
possui
característica
semântica
(sema) /s/
que está
ausente do
outro
termo, B,
sendo essa
ausência
notada /-s/."
Já a
relação
lógica de
contraditoriedade se opera
entre
dois
termos, A e B,
“quando
A possui a
característica /s/
e B possui a
característica /não
s/.
Quanto à
contraditoriedade, esclarece
que esta “afirma
e
nega ao
mesmo
tempo,
uma
mesma
característica”,
enquanto
que a
contrariedade
afirma a
presença/ausência
de uma
mesma
característica.
Como
justificativa
para a produtividade da
formação de
antônimos nas
línguas
naturais, a
partir do
estabelecimento
dessas
relações, o
autor
baseia-se na
existência de
pares do
tipo
trazer/levar,
esquecer/lembrar,
entre
outros
que integram
enunciados
que “têm
como
ponto de
referência o
espaço
em
que se situa o
sujeito da
enunciação” (
marco
zero na
orientação
espaço
temporal “aqui
/
agora”).
A
partir dessas
considerações,
numa
primeira
abordagem,
temos a
proposta da
definição: “são
antonímicos
dois
termos, a
e b, se as
frases
que obtemos,
comutando-os, possuírem,
sob
algum
ponto de
vista,
sentidos
opostos (contrários
ou
contraditórios).”
(p.256)
Continuando nessa
linha de
pensamento,
afirma o
autor
que os
antônimos, da
mesma
forma
que os
sinônimos,
decorrem de “uma transformação de
sentido
da frase-corpus,
objeto das
manipulações
sino-antonímicas”,
nunca
são
perfeitos e
constituem
um
fenômeno
que
empenha
relações
lógicas,
ou seja,
relações
estruturais. Dessa
forma, a
antonímia,
bem
como a
sinonímia, é
vista
como “uma
propriedade
estrutural do
código,
ou
melhor,
das
relações
que
instauram as
estruturas.”
De
acordo
com essa
abordagem,
não se
considera a sino-sinonímia
como uma
propriedade
das
palavras,
pois as
relações
estabelecidas
entre
elas se dão
em
nível
mental,
onde
dois termos-objeto ocorrem
simultaneamente, ligados
por uma
relação.
De
acordo
com
esse
ponto de
vista, Lopes
(1981) afirma:
Se os
elemento
lingüísticos
se definem qua
valores,
como vimos
em Saussure e
Hjelmslev, é
porque
eles estão
como
que fixados
pela
malha de
relações
interna
que organiza o
código
lingüístico:
a
sinonímia é uma
dessas
relações
(Lyons, 1970:329), a
antonímia é
outra.
São essas
relações
que, aplicadas
a determinadas
partes do
vocabulário de uma
língua,
organizam-nas
como
microestruturas (campos
semânticos,
subcódigos...) análogas à
estrutura do
código
lexical.
(p.256)
Entretanto,
quanto ao
dicionário, considerado
como
sistema de
conceitos,
lê-se
em Lyons
(1976:166)
que “dois
verbetes E1 e
E2
são
sinônimos se
seus
significados
consistem dos
mesmos
componentes
vinculados pelas mesmas
constantes
lógicas.”
Portanto,
não se pode
negar a possibilidade de
estabelecer
pares de
sinônimos
em
nível de
sistema,
independentemente
das atualizações discursivas.
O
mesmo
raciocínio,
aplicado aos
antônimos,
nos autoriza
afirmar
que os
lexemas,
pelo
fato de
seus noemas
terem
pelo
menos
um
traço
comum e
outro
antitético, podem
ser agrupados
em
pares, a
partir do
significado de
base das
palavras.
Com
base nesse
princípio, a
observação dos
lexemas,
sobretudo daqueles
que indicam
qualidades e
processos,
levou Metzeltin (1982: 54-55) a
estabelecer os
cinco
casos de
oposição,
conforme
resumidos a
seguir:
1-
Quantitativa
relativa
é a
oposição
em
que “à
presença de
certa
quantidade
fenomenal
além de uma
quantidade considerada
normal opõe-se
a
falta dessa
quantidade”, a
exemplo do
que ocorre
com os
pares
quente
/
frio;
bonito
/
feio
e
depressa
/
devagar.
Trata-se de
pares
antonímicos
cujos
traços
comuns dizem
respeito
respectivamente
à
temperatura,
ao
aspecto
físico e à
velocidade de
movimento.
Quanto aos
traços
considerados antitéticos temos,
para
quente
a
quantidade + X e
para
frio a
quantidade – X,
face à
temperatura de
nosso
corpo
considerada
normal;
para
bonito
,
face ao
aspecto considerado
normal, temos
a
presença de X
traços
agradáveis
ausentes
em
feio, e
para
depressa,
de
acordo
com uma
velocidade
tomada
como
normal, temos
essa
velocidade + X e
para
devagar
essa
mesma
velocidade – X.
O
autor assinala
que, nesses
casos, “a
negativização de
um dos
termos
não equivale à
afirmação do
outro”,
logo
não
frio
não equivale a
quente.
E
que
“abstraindo do
fenômeno quantificado
obtemos as
oposições
muito /
pouco, muitas
vezes /
raramente.”
2-
Quantitativa
absoluta
é a
oposição
em
que “à
presença de
um
fenômeno se opõe a
sua
falta”, a
exemplo do
que ocorre,
entre
outros
pares,
em
nublado,
‘com a
presença de
nuvens’, e
limpo,
‘sem a
presença delas’.
3-
Probabilística
é a
oposição
em
que “à
afirmação de
um
termo opõe-se
a
negação de
outro”,
como se
verifica
em
falar/calar
( =
não
falar).
São
casos
em
que a
negativização de
um dos
termos pode,
mas
não deve
necessariamente
equivaler ao
outro
termo,
pois
não
calar pode
equivaler
tanto a ‘falar’
como a ‘cantar’.
4-
De
movimentos
são as
oposições do
tipo
ir/vir,
comprar/vender,
em
cujos
pares ocorrem,
respectivamente,
afastamento e
aproximação,
ou
movimentos
parecidos realizados
com
intenções
opostas.
5-
De
agente
e
paciente
são as
oposições
em
que “para
o
agente de uma
ação pode considerar-se
como
atividade dele
para
outro,
pelo
paciente pode
considerara-se
como
atividade de
outro
para
ele”,
como se
observa
em
ensinar/aprender
(=
ser ensinado).
O
mesmo
autor
ainda menciona
casos de
antonímia
artificial,
como ocorre
em
verde/vermelho,
‘poder
passar’ e ‘não
poder
passar’,
casos
em
que
entre os
conceitos de
verde e
de
vermelho
não se
verifica nenhuma
oposição
fenomenológica.
Ainda,
em se tratando
de
antonímia, Metzeltin
considera
ser
ela
um dos
meios
mais usados
para
estruturar a
semântica dos
comunicados,
entendendo-se
comunicado
como
um acto
semiótico (verbal,
pictórico, musical,
táctil)
que compreende
uma actividade
mental,
cujo
produto
denomina
textura,
e uma actividade de
expressão,
cujo
produto
denomina
texto,
ato
este limitado
pelos
momentos
inicial e
final de uma
comunicação
por
parte do
emissor.
Dessa
forma chegamos ao
fenômeno da
antonímia
textual
(discursiva)
em
que o
semanticismo dos
comunicados (romances,
poesias e
demais
gêneros) pode
se
estruturar
segundo
oposições,
como é o
caso do
romance
A
cidade
e as
serras
de Eça de Queirós, estruturado,
entre outras
coisas,
em
oposições do
tipo
fartura/miséria;
desequilíbrio/equilíbrio,
etc., enunciadas
pelo
próprio
título,
conforme cita
Metzeltin.
No
caso desse
fenômeno, (antonímia
textual
ou
discursiva), a
fim de
chamar a
atenção do
receptor
para
um dos
termos da
frase, o
emissor
procurará evidenciá-lo
por
meio de uma
ênfase
implícita
ou
explicitamente contrastiva. Afirma Meltzetin
que o
termo
enfatizado opõe-se a
um
ou a
todos os
outros da
mesma
classe referencial e
que, no
caso do
contraste
explícito, os
elementos
contrastados podem
ser evidenciados
por
meio de
expressões
como
não
só...mas
também,
entre
outras.
Assim,
devido ao
caráter
contrastivo do
realce, podemos
considerar os
antônimos
como
casos de
realce,
quer ocorram
numa
mesma
frase,
quer
em
frases
contíguas
em
que se realcem
reciprocamente. Lembramos
aqui o
trabalho de Seide (2001),
a
fim de
exemplificarmos o
comportamento
dos
antônimos
mais/menos,
simples/complicado,
bem
como
suas
funções
retóricas
em
nível de
discurso
manifestado.
No
nível
da
língua,
comenta essa autora, os
pares
mais
-
menos
e complicado -
simples
são
pares
antônimos.
Enquanto
mais
e
menos
são
palavras
que
podem
ser
usadas
em
comparações,
simples
e complicado se referem a duas
maneiras
possíveis
de se
qualificar
um
processo.
Esses
pares
classificados,
de
acordo
com
a
tipologia
proposta
por
Cruse (1991), exemplificam,
respectivamente,
a
antonímia
antonímica
polar
e a
antonímia
complementar
simples.
Entretanto,
observa Seide
que,
no
exemplo
a
seguir,
esses
vocábulos
estão combinados de
maneira
a
formar
uma
equivalência
lógica
que
produz duas
expressões
sinônimas :
Os
brasileiros
que
viviam
em
povoados,
comunidades
rurais
e
pequenas
cidades
do
interior,
onde
há
menos
empregos,
relações
sociais
mais
simples
e
menos
complicadas
ou
<<civilizadas>>, estão partindo
para
a complexidade da
vida
urbana
e inchando
cada
vez
mais
as
cidades
vizinhas e
maiores
(...) (Miguel Jorge,
Desafios
de
um
Brasil
mais
urbano,
O
Estado
de S. Paulo, 19/01/01)
Postula-se
então
que
a
antonímia
textual
se apresenta
em
decorrência
de uma
relação
semântica
de
oposição
atualizada discursivamente.
Em
virtude
disto,
antônimos
lexicais
podem
não
funcionar
como
antônimos
textuais,
e
palavras
que
não
são
antônimos
lexicais
podem apresentar-se
como
antônimos
textuais,
de
acordo
com
as
relações
estruturais estabelecidas
em
diferentes
níveis.
Observe-se o
exemplo
de Seide
para
demonstrar
o
efeito
de
realce
da
antonímia
no
trecho
em
que
se denuncia o
fato
de
vereadores
estarem empregando
familiares,
parentes
e
amigos:
“Enquanto
a
prefeita
não
encontra
recursos
para
dar
renda
mínima
a
muitos,
há
vereadores
maximalizando a
renda
familiar
para
poucos
(...)” (O
dinheiro
debaixo
do
nariz,
Folha
de S.Paulo, 5/01/2001)
Trata-se,
segundo
ela,
de
um
caso
típico
de
relação
que
transcende os
limites
da
palavra,
o
que
exige
que
se proceda a uma
análise
sintática
que
auxilie na
determinação
das
parte(s)
da
oração
que
integra(m) a
relação.
Parece-lhe
ser
a
análise
em
constituintes
a
mais
ser
adequada
para
este
fim,
pois
esta possibilita
isolar
o
que
está sendo contraposto,
qualquer
que
seja o
nível
em
que
a
oposição
se encontre. Neste
caso,
a
análise
sintática
mostra
que
a
antonímia
que
há no
trecho
citado se estabelece
entre
um
constituinte
de
quinto
nível
da
primeira
oração
e
um
constituinte
de
terceiro
nível
da
segunda:
[A
prefeita
[não
encontra
[recursos
[para
[dar
renda
mínima
a
muitos]]]]]
[Há [vereadores
[maximalizando a
renda
familiar
para
poucos]]]
Tratando
cada
um
dos
constituintes
como
uma
unidade
sintático-semântica, procede-se à classificação do
par.
A
análise
componencial do
par
indica
ser
a
quantidade
o sema
que
torna
os
termos
opostos
entre
si.
Considerar
uma
quantidade
como
“grande
ou
pequena”
requer
um
raciocínio
comparativo,
por
isso,
o
uso
de
adjetivos
como
mínimo
e
máximo
e de
advérbios
como
muito
e
pouco
pressupõe
que
algumas comparações foram
feitas
entre
a
quantidade
referida e a
quantidade
que
é considerada
como
média
ou
regular.
Haver
um
raciocínio
comparativo
subjacente
ao
uso
de
seus
termos
é a caracterítica
fundamental
da
antonímia
antonímica,
que
se subdivide,
segundo
Cruse,
em
polar,
sobreponente
ou
equipolente, de
acordo
com
as
características
da comparação.*
Na
coluna
examinada, conclui Seide, o
autor
utiliza a
antonímia
antonímica equipolente
dar
renda
mínima
a
muitos
- maximalizando a
renda
familiar
para
poucos.
Ao
fazer
isto,
o
autor
justapõe a
intenção
da
prefeita
aos
atos
dos
vereadores.
Esta
justaposição
realça as
diferenças
por
meio
do
contraste,
dando
mais
visibilidade
a
seu
argumento.
Secundariamente, o
par
imprime
ritmo
ao
discurso.
Considerando-se a
palavra
em
nível de
sistema,
admitimos atribuir-lhe
um
significado de
base,
sem negar-lhe
a
existência de
seus
vários
sentidos,
lembrando,
entretanto,
serem
eles
sentidos
virtuais,
cuja
atualização
em
um
contexto
dado se reduz
a
um
único
sentido
imposto
pela
comunicação.
Assim,
cada
palavra tem
um
sentido de
base e
apenas
um
sentido
contextual,
para
que
não ocorram
ambigüidades e
possíveis
confusões
que
prejudicariam a
compreensão e
interpretação
das
mensagens.
O
sentido de
base e o
sentido
contextual de
um
vocábulo,
embora possam
identificar-se
em
certos
tipos de
textos,
não se
superpõem,
pois há
um
único
sentido
contextual
para
cada
situação
dada.
Isto
porque a
cada
atualização corresponde
apenas uma
imagem
mental (conceitual),
ou seja,
um
conceito
ativado
pela
palavra
presente no
texto.
Aqui lembramos
Greimas (1971:45)
quando afirma
que as
estruturas da
significação,
conforme
definidas
por
ele
próprio, se manifestam na
comunicação (percepção),
uma
vez
que está no
ato de
comunicação,
no evento-comunicação, o
lugar
em
que o
significado
encontra o
significante.
Tal
junção faz
aparecerem as
unidades
mínimas do
discurso. É,
portanto, no
discurso
que as
estruturas se
apresentam
em
presença, selecionadas
certas
significações e excluídas outras, determinadas
por
categorias
morfossemânticas (tempo,
aspecto,
modo) e
pelo
mundo
onde se
realizam os eventos-mensagem,
um
mundo
relativamente
estável,
humano e “natural”,
que
rodeia o
locutor.
Consideremos
com Greimas
(1971)
que o lexema é
o
ponto de
manifestação e
de
encontro de
semas provenientes, a
miúdo, de
categorias e
de
sistemas
sêmicos
diferentes e
que mantêm
entre
si
relações
hierárquicas (quer
dizer hipotáticas) e
que é
igualmente
um
encontro
histórico,
pertencente,
pois, à
ordem do
evento.
Submetido ao
curso da
história, o
lexema se enriquece
ou se
empobrece,
respectivamente,
pelo
acréscimo de
novos semas
ou
pela
perda de
um
ou
mais semas.
Aceitamos,
então,
apresentar-se
ele
como uma
unidade de
comunicação
relativamente
estável,
mas
não
imutável.
Justifica-se
assim a
existência de
uma
semântica
lexical e de
uma
semântica
textual
com
sistemas de
relações
específicos, a
serem detectadas
em
cada
um dos
níveis de
análise na
busca do
sentido,
quer das
palavras,
quer do
texto
como
um
todo
orgânico. O
texto-objeto, considerado
como
unidade de
comunicação,
remete a
um semema,
cujo
feixe de semas
é
objeto de
seleção
perceptiva.
Uma
vez
selecionado
esse semema de
acordo
com a
intenção de
comunicação da
mensagem, os
semas dessa
unidade
(lexema), uma
vez
atualizados no
discurso
manifestado, ativam os
elementos
conjuntivos
ou
disjuntivos,
para
que possamos
captá-los de
imediato e de
uma
só
vez e
atribuir
um
sentido ao
texto (discurso).
Este
sentido se
estabelece de
acordo
com
um
eixo de
articulações
sêmicas cujas
relações
(paradigmáticas e sintagmáticas) se estruturam hierarquicamente (hipotaxe)
em
função de
um
tema.
Não se observa
contradição
entre os
pontos de
vista adotados
pelos
diferentes
autores, uma
vez
que a
conceituação,
a tipificação e a classificação do
fenômeno da
antonímia se aplicam aos
diferentes
níveis de
análise,
observando-se o
estabelecimento
de
relações de
sentido
em
cada
um deles
desde os
menos
até os
mais
complexos (
palavra,
frase,
texto), e
revelando
diferentes
níveis de
complexidade,
sem
que se tenha
chegado ao
estabelecimento
de
um
código
discursivo,
tal a
variedade de
formas
discursivas. Os
pontos de
vista,
portanto, se
complementam e, de
certa
forma, auxiliam
nos
procedimentos
mais adequados
para a
atribuição de
sentidos a
palavras,
enunciados
ou
discursos.
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