BREVES CONSIDERAÇÕES
ACERCA DO LÉXICO EM D. CASMURRO

Lucia Arruda Ferreira de Menezes (UCB)

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por finalidade uma abordagem baseada na obra intitulada “Dom Casmurro”, de autoria de Machado de Assis.

Foi publicada em primeira edição em 1899, por H. Garnier, livreiro editor, Impresso, como todos os livreiros - editor, impresso, como todos os livros da editora àquela época, em Paris; a divulgação do livro no Rio de Janeiro se devem 1900.

Ao contrário do hábito do autor, em manter sigilo acerca dos próprios livros, este foi anunciado por Machado de Assis, desde 1896, segundo revelou Galante de Sousa (Bibliografia de Machado de Assis, Rio de Janeiro, 1995, p. 666).

Foram analisados os aspectos lexicológicos, incluindo aspectos lexicográficos e contribuições semânticas, relativamente às três edições: (a primeira de 1938, a segunda de 1997 e a terceira de 2001), serviram de base à pesquisa.

Foram também anexas cópias reprográficas do capítulo I a X das três edições.

COTEJO ENTRE EDIÇÕES

O Cotejo entre três edições de Dom Casmurro. (1938 , 1997 e 2001), revelam a existência de várias alterações.

No que se refere às alterações semânticas (substituições léxicais) deixam a desejar. Até que ponto seriam elas procedentes? Verifica-se, por exemplo, um comprometimento com a passagem de: alcançam para alcançaram.

Constata-se aí, uma mudança de tempo, de ocorrência, de ação.

Outros exemplos a destacarem seriam: havia alguns para havia alguém, governou para governo, aro para arco, era muita vez rápido para era muitas vezes rápido, haver alguém para haver algum.

Fica no ar o questionamento: é a obra escrita por Machado de Assis?

E a correspondência ao original?

É a vontade manifestada e expressada por Machado de Assis?

Aspectos Lexicológicos

CAELLUM > CAELLU > CÉLLU > CÉU

Na palavra céu,verifica-se o seguinte fenômeno etimológico:origem caellum, em alguns casos, na passagem do latim popular para o português, / m / constata-se a seguinte ocorrência: apócope no final por ser uma consoante débil.

Caellum > caellu > céllu > céu.

O / a /, intervocálico tende a sofrer “síncope”, ae (tônico) > é.

As vogais tônicas passam ao português sofrendo apenas as modificações comuns.

CHAPPELLUM > CAPPELLU > CAPELO > CHAPÉU

Na palavra chapéu , verifica-se o seguinte fenômeno etimológico:origem Cappellum , em alguns casos, na passagem do latim popular para o português, o / c / inicial evoluiu para / ch /.

Quanto ao restante da palavra, constata-se a seguinte ocorrência: Apócope do / m / final por ser uma consoante débil. Logo > chappellu.

Quanto às consoantes geminadas / pp / , / ll / , houve a assimilação. Logo pp > p, ll > l.

chapelu > chapeo > chapéu .

O / l / intervocálico tende a sofrer “síncope”.

ANNUS > ANUS > ANOS

Na palavra annus, verificou-se o seguinte fenômeno etimológico.

Origem annus, na palavra do latim popular, para o português.

Quanto a consoante geminada / nn / houve a assimilação.

Logo nn > n.

A transformação do / u / em / o / deu-se, segundo todas as probabilidades, no século IV.

SUCCEDERE > SUCCEDER > SUCEDER

Na palavra suceder, verificou-se o seguinte fenômeno etimológico.

Origem succedere,do latim popular, para o português, o / cc / consoante geminada no interior da palavra.

Houve a assimilação, logo / cc / > / c /. O / c / sofreu à “síncope”.

Quanto succedere > succeder > suceder, ocorreu apócope do / e / final por ser uma vogal débil.

PHYSIONOMIA > FISIONOMIA

Na palavra physionomia, verificou-se fenômeno etimológico.

Era comum o /ph/ inicial evoluir para /f/.

O /y/ grego passou a constituir a vogal /i/.

Physionomia > fisionomia.

THEÃTRUM > THEÃTRON > THEATRO > TEATRO

Na palavra teatro, ocorreu-se o seguinte fenômeno etimológico.

Origem theãtrum, em alguns casos, na passagem do latim popular para o português / m /, constata-se a seguinte ocorrência: Apócope no final, por ser uma consoante débil.

Theãtrum > Theãtron > Theatro > Teatro.

METTELO > METER-LO > METÊ-LO

Na palavra metê-lo, verificou-se o seguinte fenômeno etimológico.

Em alguns casos, na passagem do latim popular constata-se a seguinte ocorrência: quanto às consoantes geminadas / tt / houve a assimilação: logo / tt / > / t /.

Mettello > Meter + o > Metê-lo , o / t / e / l / sofreram a “síncope”.

Verbo terminado por r , s , z cortam-se estas consoantes e usa-se a variante - lo e flexões.

MANUSCRIPTUM > MANUSCRIPTU > MANUSCRIPTO > MANUSCRITO

Na palavra Manuscrito, verificou-se o seguinte fenômeno etimológico: em alguns casos, na passagem do latim popular, para o português, constata-se a seguinte ocorrência: o / p / intervocálico tende a sofrer “síncope”.

O / u / evoluiu para / o / no vocábulo manuscriptu > Manuscripto, de Onde surgiu o português manuscrito.

Quanto manuscriptum > manuscriptu > manuscrito, ocorreu apócope do / m / final por ser uma consoante débil.

CONTRIBUIÇÕES SEMÂNTICAS

São muitas as contribuições semânticas identificadas em “ Dom Casmurro”.

No capítulo I , encontrou-se registrado:

Chapéu:

“... Encontrei no trem da central um rapaz aqui do bairro, que eu conheço de vista e de chapéu”.

Na obra semanticamente “chapéu é o que cobre a cabeça”.

Todavia, chapéu pode remeter à capela, à grinalda, à coroa, à coroinha, a toucado, à touca, à peruca, à cabeleira (postiça), à tiara e etc.

Camarote:

“... venha e dormirá aqui na cidade: dou-lhe camarote, dou-lhe chá, dou-lhe cama; só não dou-lhe moça.

Em Dom Casmurro , semanticamente camarote era quarto de dormir.

Atualmente, camarote tem outro sentido:

“Vou comprar um ingresso para assistir, de camarote ao desfile ...”

O próprio título merece análise.

Dom:

“...Dom veio por ironia, para atribuir-me fumos de fidalgos. Tudo por estar cochilando.

Segundo Machade de Assis, Dom , significa, no caso, ação por cochilar.

No capítulo II, foram selecionados os seguintes termos:

Pena:

“Agora que expliquei o título passo a escrever livro”.

“Antes disso, porém, digamos os motivos que me pões a pena na mão”.

Semanticamente significa peça metálica de ponta fina, que se adapta à caneta para escrever ou desenhar.

Teto:

“Na principal destas, a pintura do teto e da parede é mais ou menos igual..”

Semanticamente significa parte superior interna da casa.

Espinho:

“... mas é também exato que perdeu muito espinho que a fez molesta, e, da memória, conservo alguma recordação doce e feiticeira.”

Semanticamente significa dificuldade, embaraço.

Seca:

“Depois pensei: em fazer uma história dos subúrbios, menos seca que as memórias do padre Luís Gonçalves dos Santos, relativas à cidade; era obra modesta, mas exigia documentos e datas, como preliminares, tudo árido e longo.”

Semanticamente corresponde à poucas palavras.

No capítulo III, foram destacados os seguintes termos:

Ano:

“A casa era da Rua de Mata-Cavalos, o mês novembro, o ano é que é um tanto remoto, mas eu não hei de trocar as datas à minha vida só para agradar às pessoas que não amam histórias velhas; o ano era de 1857”.

Semanticamente significa tempo remoto, “passado”.

Tempo:

“Há algum tempo estou para lhe dizer isto, mas não me atrevia. Não me parece bonito que o nosso Bentinho ande metido nos cantos com a filha do Tartaruga, e esta é a dificuldade, porque se ele pega de namoro, a senhora terá muito que lutar para separa-los”.

Semanticamente corresponde à ocasião própria ao momento.

CONCLUSÃO

Ao término deste trabalho percebe-se o grande desafio que é estudar e pesquisar a língua portuguesa, com referência à língua escrita, em especial dos Clássicos da Literatura Brasileira.

Dentre esses clássicos inclui-se aquele escrito por Joaquim Maria Machado de Assis, intitulado “Dom Casmurro”.

Foram constatados alterações ortográficas nas edições 1997 e 2001.

Com alterações ortográficas de 1904 de Gonçalves Viana e com adaptação à nomenclatura gramatical brasileira da lei 5.765 e 18.12.1971.

Essas alterações constatam um desafio: a falta de respeito a real escritura do autor da obra, uma vez que essas alterações foram feitas obviamente sem autorização de Machado de Assis.

Ficam aqui duas questões:

1. Até que ponto a obra Dom Casmurro foi apenas escrita por Machado de Assis?

2. Até que ponto essas alterações dificultam um estudo diacrônico,do que está contido na obra principalmente dentro de um enfoque ortográfico e mesmo semântico?

BIBLIOGRAFIA

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