PATRONÍMICOS
Ruy Magalhães de Araújo
(UERJ)
Fazendo
parte
dos
antropônimos,
os
patronímicos
ou
patrônimos começaram a
surgir
na
tradição
peninsular
ibérica
por
ocasião
da
Idade
Média.
Aglutinava-se ao
nome
de
batismo
o
nome
próprio
do
pai
com
a
desinência
ci, genitivo
latino,
que,
por
abrandamento, passou
inicialmente
a z, e
posteriormente
s.
Dessa
forma:
Gonçalo Fernandici > Fernandez > Fernandes. (Gonçalo,
filho de Fernando). José Rodriguici > Rodriguez > Rodrigues. (José,
filho de Rodrigo).
De
início,
tinham o
valor
de
adjetivo.
Sob
a
perspectiva
diacrônica,
forneceremos a
evolução
fonética
de
alguns
patronímicos,
mostrando,
inclusive,
sua
origem,
etimologia
e
significado.
Assim,
vejamos:
Aaronês
Álvares
Antunes
A vilês
Dias |
|
|
| |
Domingues
Femandes
Gomes
Gonçalves
Henriques |
|
|
| |
Lopes
Martins
Paes
Rodrigues
Soares |
Aaronês
> Aaroniz : patronimico de Aaron (
mesmo
que
Aarão, do hebraico Abaron, interpretado
como
" o
montanhês,
o
elevado"),
personagem
bíblico,
irmão
de Moisés e
sumo
sacerdote
da
Antiga
Lei
- Ex 28,3;
era
egípcio,
mas
desconhece-se a significação do
seu
nome.
A
hipótese
que
tira
este
do
hebreu
"Aaron" (
montanhês)
parece
pertencer
ao
número
das tradicionais impostas
por
aparências.
O
uso
deste
antropônimo
deve-se
certamente
à
influência
bíblica. Recebemos
este
nome
do
latim
Aron.
Álvares:
sobrenome
português,
em
vez
de Alvarez,
patronímico
de Álvaro (
étimo
controverso:
" o
que
se defende de
todos"
, " o
que
tudo
e
completamente
vigia,
cuida, preserva, defende", "casa
velha",
guerreiro
dos elfos"). Meyer- Lübke afirma
que
este
deriva
de al- ,
alemão
moderno
alls "
todo,
muito",
e *wars
"atento,
circunspecto".
Piel prefere
como
segundo
elemento
um
derivado do
Gótico
" warjar",
saxão
arcaico
" waron, warar" ( o
que
se ofende de
todos).
Latinizado, "Alvarus" dever-se-ia a "Alver" de " Alvered" ( donde o
espanhol
Alvarado ),
ou
a
forma
apocopada de " Alvaradu".
Antunes
: de Antonici,
patronímico
de Antonius. O -u- poderá explicar-se
por
influência
do -i- ( unlaut),
também
se
usa
na Galiza: Antúnez. Antonius > António :
imposto
pela
popularidade
de
Santo
António (1195- 1231),
natural
de Lisboa, de
seu
verdadeiro
nome
Fernão
ou
Fernando,
após
breve
permanência
em
Marrocos, viveu na França e na Itália; foi
aí
que
adotou António
como
nome
de
religião.
Esta
escolha
prova
que
no
seu
tempo
já
se usava António na Itália. A
forma
italiana provém do
latim
"Atonius",
que
na
antiga
Roma pertencia a uma
geração
da
qual
Marco
Antônio (83 - 30 a.C) foi o
mais
famoso
membro.
A
origem
do
antropônimo
é
obscura.
A
manutenção
em
português
da
forma
António revela
influência
culta,
se
não
se teria alterado. Note-se
até
que
o
latino
" Antonius",
em
referência
ao
ermitão
do
deserto
de Tebaida e
um
dos
fundadores
da
vida
monástica
(251 - 356) se transformou
em
" Antão".
Avilês
:
sobrenome
derivado de Ávila (
cidade
da Espanha)
ou
Avilés (
topônimo,
nome
geográfico
asturiano Oviedo e Múrcia ). De
origem
espanhola,
mas
que
em
Portugal significa
título
de nobreza
desde
1838 :
Conde
de Avilês.
Dias
:
sobrenome
português,
em
vez
de Diaz; do genitivo
latino
Didaci,
patronímico
de Didacus, Dídaco (
étimo
obscuro
e
controverso;
do
latim
Didacus, Didachus pode
ter
surgido "Diogo".
Talvez
se
prenda
ao
grego
didachos: " instruído" ,
segundo
Meyer- Lübke). A
perda
do
valor
próprio
do -Z- trouxe a
grafia
Dias.
Dias
não
se prende etimologicamente à
palavra
"dez"
(
espanhol'
diez')
nem
tampouco
ao
substantivo'
dias'
( da
semana),
como
parece.
Domingues:
do
latim
*Dominiquici, patronimico de Dominicus,
Domingo.
Domingo:
do
latim
Dominicus ( do
senhor),
apelido
romano
e
depois
nome
de
santo.
O
mais
célebre
foi o
espanhol
fundador
da
ordem
dos Domínicanos ( *1170-- 1221). O
nome
chegou
até
nós
por
via
culta
e o -s- representa o
nominativo
latino.
Dominiquiz . Dominiguiz > Dominiquizi . Dominquici > Dominquiz > Domenquizi >
Dominguis > Dominguit > Dominguez.
Fernandes
:
sobrenome
português,
em
vez
de Femández,
patronímico
de Fernando (“protetor
corajoso,
audaz"; "ousado
pela
ou
na
paz").
Documentado
como
Fernandiz
em
915, Fernandit
em
926, Frenandiz
em
981, Femandici
em
1078. *Ferdinando do
gótico
" Frithunanthes", de "frithus" (
paz)
+ "nanthean" (
arriscar).
Na Espanha "Hernandez".
Gomes:
sobrenome
português,
em
vez
de Gómez,
patronímico
de *Gomo
ou
Guma.
Português
arcaico:
Gómez;
latim
bárbaro
da Espanha: Gomizi e Gomiz ( séc. IX).
Segundo
Piel, provavelmente se prende ao visigótico Guma ("homem"),
e
talvez
abreviatura
de"
Com(o)arius"
(“homem
da
guerra”)
Gonçalves:
sobrenome
português,
em
vez
de Gonçálvez,
patronímico
de Gonçalo,
espanhol
González. Do
baixo
latim,
Gundisalvici, de Gundisalvus. Gundesalbiz,
ano
de 879; Gundisaluiz,
ano
de 928; Gundissalbici,
ano
de 1026; Gunsaluizi e Gunsaluiz,
ano
de 1077. Gonçalo, do
germânico.
A
forma
alatinada
primitiva
é Gundisalvus,
cujo
primeiro
elemento
é gundi, *gunthi, “batalha”,
“luta”.
O
segundo
elemento
é salo, “escuro”,
“cego
pela
luta”.
Outra
interpretação
é
que
a
raiz
gótica
salwa,
correspondente
ao
latim
salvus, “salvo”,
“são”,
significa “são,
invulnerável
no
combate”.
Gunsalbus, 882; Gundisaluus, 915; Gunzaluo, 961; Gundissaluo, 979; Gunsaluuo,
1002; Gundiçalvus, 1033; Gonsalvo, 1033; Gunsaluus, 1032; Gunçaluoo,1085;
Gunzalbo, 1088; Gonçalo,
atualmente.
Henriques
:
sobrenome
português,
em
vez
de Henríquez,
patronímico
de Henrique (germânico
Haganrich: "
senhor
(rich) do
couto,
do
souto
(hagan).
Menos
provável
de Heinrich : "senhor
da
casa,
do
lar".
Os Henriques vêm de D. Femando Henriques,
neto
de D. Henrique II,
reide
Castela.
Lopes:
sobrenome
português,
em
vez
de Lopez,
patronímico
de Lopo. Havia,
ainda,
a
forma
Lopiz. Proveio de Lupici, do
baixo
latim.
Numa
inscrição,
registrou-se a
forma
Lupicus.
Lobo:
s. m.
Nome
de
homem.
Em
espanhol
Lope, tirado do vasconso, significava “grosso”,
“espesso”.
Formas
de
origem
obscura.
Não
deve
representar
o
latim
lupu,
embora
por
vezes
designações de
animais
se apliquem a
pessoas,
principalmente
como
sobrenome.
Martins
:
sobrenome
português,
em
vez
de Martinz,
patronímico
de Martim ( do
latim
Martine, derivado de Martens;
Marte:
Deus
da
guerra
na
Mitologia
romana)
ou
Martinho, do
latim
martinici ( "
belicoso",
derivado
ou
diminutivo
de
Marte
). "A
rainha
Dona
Caterina, govemante do
Reino
de Portugal, na menoridade de El
Rei
D. Sebastião, deu 'as
armas'
a Diogo Martines no
ano
de 1560.".
Marte:
deus
da
guerra,
filho
de
Júpiter
e Juno, foi educado
por
um
dos
Titãs,
que
lhe
ensinou a
dança
e os
exercícios
corporais.
Marte
ensinou aos
homens
as
regras
de
ataque
e
defesa.
Paes
:
mesmo
que
Pais,
sobrenome
português,
em
vez
de Paez, patronimico de
Paio
ou
Pelágio ( " do
mar,
marinho,
marítimo,
marinheiro;
do
grego
pélagos:
" do
mar",
"
pélago".)
Pelagizi > Pelaici > Pelaiz > Paaiz
ou
Paaez,
escrito
modernamente”Pais
ou
Paes.
Paio:
hoje
tem
pouco
uso.
É a
forma
popular
de "Pelágio"
com
o
intermediário
"Pelaio". Sanctus Pelagius,
depois
Sam
Pelagio e Saam Pacio,
hoje
Sampaio.
Rodrigues
:
Patronímico
de "Rodrigo". Do
germânico
"'Hrod" (
glória)
+ "ric" (
poderoso);
é a
forma
culta
divergente
de "Rorigo". Rodrigues '" Rodorigiz > Ruderigiz > Rodorigiz > Rodoriquiz >
Roderiquiz > Roderiquici > Rodoriguiz.
Soares:
sobrenome
português,
em
vez
de Soárez, derivado de Suáriz, Suárizi, do
latim
Suárici,
patronímico
de Suário, o
mesmo
que
Soeiro (
nome
e
sobrenome
portugueses, do
latim
Suarius).
Português
arcaico,
forma
erudita
Suário, derivado do
germânico.
O
primeiro
elemento
Su- é de
etimologia
obscura.
Segundo
Meyer- Lübke, prende-se ao
gótico
savil : "
sol",
e
segundo
Tõrstemann, significa “espada"
. O
segundo
elemento
parece
que
é do
gótico
hariis: "
exército".
Outros
acreditam
que
"Soares"
provém do
latim
"Suarius" > ”Soarius”( de “sus” =
porco.
“porqueiro”
ou
que
“cria
porcos”).
Soariu. > Soeiro. >
Soares.
Pode
ser
encontrado
também
nas
formas
Suarez e Soarez.
De
modo
curioso,
poderíamos
dizer
que
as
pessoas
abaixo
listadas “possuem
dois
ou
três
pais”:
·
Rodrigo
Pais
Rodrigues (Rodrigo,
filho
de
Paio,
filho
de Rodrigo);
·
Júlio Fagundes Fernandes (Júlio,
filho
de Fagundo,
filho
de Fernando);
·
Carlos Antunes Gonçalves (Carlos,
filho
de Antônio,
filho
de Gonçalo);
·
João
Peres
Soares
(João,
filho
de Pero,
filho
de Soeiro);
·
Pedro Álvares Henriques (Pedro,
filho
de Álvaro,
filho
de Henrique);
·
Paulo Nunes Guedes (Paulo,
filho
de Nuno,
filho
de Gueda);
·
Rodolfo
Dias
Mendes Martins (Rodolfo,
filho
de Diogo,
filho
de Mendo,
filho
de Martinho);
·
Alberto Vasques Ramires (Alberto,
filho
de
Vasco,
filho
de Ramiro);
·
Roberto Marques Sanches (Roberto,
filho
de
Marco,
filho
de Sancho);
·
Luís Gomes Bernardes (Luís,
filho
de Bernardo,
filho
de Guma);
Referências
bibliográficas
BRANDÃO, Junito de Souza.
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Mítico-Etimológico. Petrópolis:
Vozes,
1993. 2
volumes.
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PEREIRA,
Eduardo Carlos.
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O
asterisco
(*),
geralmente
encontrado
antes das
palavras,
indica
escrita
hipotética,
i.e.,
não documentada.