NOMES PRÓPRIOS: SEUS MITOS E RITOS

Maria Lúcia Mexias Simon (USS)

Objeta-se não serem os nomes próprios passíveis de sistematização, caso contrário, estariam nos dicionários de língua e nas gramáticas, tratados como fatos da língua. Porém, a distinção crucial entre dicionários e enciclopédias está exatamente no fato de que estas apresentam nomes de pessoas que se tomaram famosas por um motivo qualquer. Dicionários tratando de antropônimos são os dicionários etimológicos, o que faz crer não ser possível estudá-los em outra abordagem. Além disso, as etimologias são, por vezes, vagas e divergentes, em que pesem os valiosos trabalhos de Antenor Nascentes, José Pedro Machado e outros.

Quase tudo nesse campo, a começar pela questão da referência e do significado, ainda constitui objeto de controvérsia ou nem sequer chamou a atenção dos lingüistas. O simples fato de saber se os nomes próprios têm ou não significado carece de uma resposta simples e universalmente válida.

A esse respeito, o que em linhas gerais se observa é que certos antropônimos guardam um significado simbólico ou etimológico, porém nenhum deles expressa qualquer tipo de relação significativa que os distinga dos nomes comuns como uma classe. Numa análise lingüística, o que se pode registrar é terem os nomes próprios função vocativa, quando se interpela o ouvinte, e função referencial, quando se alude a terceiras pessoas, presentes ou ausentes no cenário. Atendem, assim, às funções apelativa, uma vez que solicitam, ao menos, a atenção do ouvinte, e referencial, descritiva. Acredita-se que, quando os homens começaram a descobrir maior rendimento no trabalho compartilhado, descobriram também a necessidade de estabelecer sons reconhecíveis como interpelações ou referencias a seus companheiros de trabalho. Passou-se, nesse momento, da horda à comunidade.

Além de vocativos e referenciais, são também os nomes índices de pertinência a uma coletividade mais ou menos ampla (família, clã, tribo), uma vez que as coletividades possuem regras para nomear, o que torna os nomes reconhecíveis como habituais num dado grupo, associando o portador do nome a esse mesmo grupo. Nesse ponto, nomear os seus membros é uma das formas de a comunidade manipular, controlar a natureza que a circunda, o que inclui manipular uns aos outros. É, o ato de nomear, algo que se cria e se transmite às gerações mais jovens, como mediação entre pessoas e coisas. Da mesma forma, se transmite a maneira de usar instrumentos da vida cotidiana, não sendo a manipulação das coisas muito diferente da manipulação das relações sociais. O emprego tido como adequado de uma ou outra forma de manipulação (cumprimentar, usar os talheres, comportar-se em determinadas ocasiões sociais) caracteriza o indivíduo como adulto, como amadurecido para, por sua vez, transmitir a outros as normas assimiladas de mover-se no ambiente, de mover o ambiente, inclusive gerando e nomeando novos membros.

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