O VOCALISMO ROMÂNICO
Bruno Fregni Bassetto (USP)
O fato de uma vogal, portuguesa por exemplo, seja pronunciada aberta ou fechada não é aleatório, bem como o fato de as vogais médias de primeiro e de segundo graus, segundo a classificação de Mattoso Câmara, sofrerem a denominada ditongação espontânea na maioria das línguas românicas. Tudo isso está relacionado com a quantidade vocálica latina. Verifica-se que as vogais longas resultaram em fechadas e as breves em abertas.
O minicurso pretende mostrar como das dez vogais latinas - cinco longas e cinco breves com valor fonológico, distintivo semanticamente - resultaram os três sistemas vocálicos românicos, respectivamente de sete, seis e cinco fonemas vocálicos. Esses sistemas vocálicos sofreram modificações posteriores conforme as tendências e particularidades de cada idioma. Dar-se-á obviamente destaque ao português, que certamente é o que mais interessa aos participantes Nesse aspecto nossa língua destaca-se no contexto românico por manter os sete fonemas vocálicos iniciais em sua plenitude, não apresentando a ditongação espontânea, fator que reduziu as oposições entre as médias. Também o sardo, sobretudo o logodurês, sua variante mais característica, não apresenta esse fato vocálico, mas por outra razão: não apresenta qulquer distinção de timbre, tendo apenas perdido a quantidade latina, sem a adoção de distinções por meio do timbre. Por essa razão, o vocalismo sardo consta apenas de cinco fonemas, sendo essa uma de suas características no contexto romano, ao lado do siciliano e outras variantes lingüísticas do sul da Itália. O catalão e o provençal mantiveram, em parte, a distinção das médias pelo timbre, mas em menor escala que o português. O sistema de seis fonemas vocálicos é próprio do romeno, língua que não distingue, em toda sua história, o /o/ aberto ou fechado por razões ainda não bem esclarecidas.
Uma conseqüência da distinção das vogais pelo timbre, com valor fonológico, foi a necessidade de se lançar mão de sinais e acentos gráficos nas línguas românicas, com a finalidade de ajudar o leitor a apreender o sentido das palavras homógrafas heterofônicas à primeira leitura. Os diversos sistemas de acentuação gráfica das línguas românicas partem dessa necessidade, sendo, por isso, sistemas lógicos perfeitamente claros, quando se conhecem as razões que levaram à formulação respectiva. Nesse aspecto, as "regras" de acentuação gráfica são coerentes, absolutamente não arbitrárias. Para tanto, mais uma vez o conhecimento filológico e diacrônico da língua é indispensável para se obter uma explicação razoável de algo aparentemente tão simples como colocar ou não um acento gráfico em uma palavra