A construção do leitor
no jornalismo espanhol
uma experiência com alunos de E/LE

Greice da Silva Castela (UFRJ)
Viviane Mendonça de Menezes
(SME/RJ)
Cristina Vergnano Junger
(UERJ)

Introdução

Este trabalho é a síntese de um estudo sobre leitura de textos jornalísticos em E/LE, realizado com alunos de oitava série do Ensino Fundamental, a partir de um jornal eletrônico espanhol. Sua motivação nasceu em parte da constatação da Internet como importante veículo acesso à informação e possível fonte de materiais para o ensino-aprendizagem de LE, em parte das reflexões que vêm sendo desenvolvidas sobre a compreensão leitora e seu ensino.

Assim, nosso objetivo é, também, trazer à discussão a necessidade de reflexão e enfrentamento por parte dos docentes dessa nova realidade em sala de aula, bem como mostrar uma maneira de desenvolver tais reflexões através da prática investigadora.

Alguns conceitos básicos

Optamos por assinalar aqui, sinteticamente, os pontos básicos para a construção dos instrumentos de coleta de dados e definição do desenho metodológico do presente estudo.

Freqüentemente, no ensino de língua estrangeira, o texto é levado à sala de aula para ser lido com o propósito de servir como suporte para o ensino de gramática ou vocabulário específico de determinado campo semântico. Com isso o aluno não possui motivação para ler, pois sabe que o faz somente para extrair algum conteúdo que lhe será exigido em testes e provas. Não costuma haver uma preocupação do professor em estimular em seu aluno a vivência do texto, enquanto leitura, ou seja, como um processo de construção de significado que exige interação entre leitor, texto e contexto (Junger, 2002).

De acordo com Vereza (1990), a análise do discurso (AD) apresenta uma visão de texto que pode auxiliar os docentes no ensino de leitura, já que, de acordo com este enfoque teórico, o conceito de discurso é o da linguagem em uso, contextualizada e imbuída de uma função social. A leitura não é mais somente um processo de decodificação de símbolos para a aprendizagem de um conteúdo. Neste sentido, a AD, portanto,

contribui com uma nova abordagem de análise, procurando superar as insuficiências da referida tradição de leitura/interpretação de textos que por muito tempo esteve centrada no dito, com ênfase nos aspectos ligados ao conteúdo. (Junger, 2002: 45)

Do campo da AD, destacamos três conceitos para o presente trabalho: subjetividade, ethos e descontextualização. Brandão (1995) relata o surgimento de uma nova visão de língua como constituição da subjetividade, aquela que constitui o sujeito, o qual passa a ter uma posição privilegiada no texto. O centro da relação de interlocução está no espaço discursivo entre os sujeitos - o eu que enuncia e o tu que co-enuncia - dividido com o outro, também constitutivo do sujeito (heterogeneidade discursiva). É importante ressaltar, no entanto, que nem sempre esses sujeitos vêm explicitados no texto através de marcas lingüísticas observáveis. Mas, como há subjetividade mesmo quando não se anuncia o eu, temos que considerar a ocorrência de um mascaramento que aporta sentidos ao discurso (Brandão, 1995), como, por exemplo, o fato de o enunciador compartilhar ou não assumir sozinho a responsabilidade da enunciação.

No que se refere ao ethos, consideramos o sujeito enunciador e o sujeito destinatário (Charaudeau, 1983), os quais são criados através do discurso e reconstruídos pelas marcas de enunciação. O ethos, enquanto imagens dos sujeitos do discurso, apresenta como materialidade lingüística marcas enunciativas que contribuem para sua (re)construção. A maneira como se enuncia permite estabelecer uma imagem projetada de si e do outro para quem se fala (Pauliukonis, 2003). O emprego de adjetivos apreciativos, uso das aspas ou outros recursos tipográficos para destacar aspectos, e as modalizações podem constituir-se marcas de subjetividade e de caracterização dos sujeitos da enunciação.

Finalmente, a descontextualização (Maingueneau, 1996) refere-se a que os textos estão pensados para um tipo de público, mas, como há a possibilidade de serem lidos em contextos espaciais e temporais diferentes dos de sua criação, a imagem do co-enunciador pressuposta pelo autor pode ser distinta daquela do leitor/ receptor real da obra. Junger (2002) adapta o conceito de Maingueneau, voltado para a literatura, para o ensino-aprendizagem de LE, já que os materiais levados à sala de aula pelo docente foram retirados de suas fontes originais, alterando a situação de enunciação - novos co-enunciadores, espaços, tempo e finalidades.

Ainda nos cabe destacar a relação entre leitura e hipertexto, inerente ao ambiente virtual da Internet. O hipertexto pode estar presente em qualquer suporte, mas é mais bem realizado quando os textos estão digitalizados e disponíveis em redes de computadores. Trata-se de uma maneira diferente de leitura, na qual a apresentação de informações é disponibilizada em conexões entre determinadas passagens de um texto, através de elementos destacados (palavra, expressão ou imagem) que, ao serem acionados, provocam a exibição de um novo (hiper)texto com informações relativas ao referido elemento (Smith, 1988. Lévy, 1993/96/2000). Portanto, das conexões emerge o sentido e essas têm como função reunir textos e redes de significações, aos quais os indivíduos vinculam outras redes de significações.

Em relação ao texto tradicional, o hipertexto apresenta algumas peculiaridades: não-linearidade, fragmentação, virtualidade, interface com os recursos multimídia, relações com outros textos, o que permite a interdisciplinaridade, usuários como co-produtores do processo interacional (Lévy, 1993). Lemos (1996) nos lembra que todo texto escrito é um hipertexto, uma vez que a leitura é feita de interconexões à memória do leitor, às referências textuais e aos índices que remetem o leitor para fora da linearidade do texto. A recepção não hierárquica do texto não é, portanto, uma revolução radical implantada pelo texto eletrônico. Mas a não-linearidade do hipertexto é inerente à sua estrutura e possibilita escolhas entre várias possibilidades, que podem modificar totalmente o tema inicialmente pesquisado. Sendo assim, podemos encontrar o mesmo texto em vários suportes, mas em cada um deles sua leitura/ recepção será distinta.

Descrição da proposta de investigação

Toda pesquisa foi orientada para responder as seguintes perguntas: a) como está caracterizado o leitor da versão on-line de um jornal em língua espanhola e b) considerando os conceitos de descontextualização e de leitura como enunciação, que discussões podem suscitar a proposta de utilização de um jornal eletrônico como material autêntico nas aulas de E/LE. Para tentar responder a tais questões, delimitamos como sujeitos da pesquisa alunos do último ano do ensino fundamental de uma escola municipal do Rio de Janeiro, pertencente à 8ª CRE e localizada no bairro de Realengo. Justifica-se tal escolha pela facilidade de acesso aos informantes, já que se trata do atual local de trabalho de uma das pesquisadoras, e por terem sido seus alunos de espanhol por dois anos consecutivos.

O jornal escolhido, El Mundo, possui uma versão eletrônica disponível gratuitamente na Internet, contendo além das sessões de sua versão impressa, outras sessões e notícias não publicadas em papel, com links para gráficos, vídeos, notícias relacionadas, outras notícias, edição impressa, classificados e propagandas. A versão impressa é disponibilizada em papel e na rede, mas acessível somente para seus assinantes, ou para quem opta por comprar o download de uma determinada matéria. O público-alvo para sua versão impressa pertence à classe média espanhola, mas, a partir do momento em que é disponibilizado em um site da Internet, seu público é potencialmente ilimitado.

A pesquisa estruturou-se em três etapas: (1) a aplicação de um questionário de sondagem para a definição dos perfis dos possíveis informantes; (2) a atividade de leitura on-line do jornal; (3) a atividade de leitura off-line de uma das notícias selecionadas anteriormente. Nos dois últimos casos, trabalhou-se exclusivamente com 5 alunos, escolhidos entre os 46 participantes do questionário de sondagem, componentes de uma única turma de oitava série do Ensino Fundamental. As leituras foram seguidas das respectivas análises de dados coletados.

 

Questionário de Sondagem

Elaboramos um questionário de sondagem e o aplicamos a 46 alunos de uma turma com a finalidade de:

a) construir um perfil dos leitores como alunos de E/LE, identificando seus hábitos de leitura de jornais;

b) averiguar que interesse desperta o jornal estrangeiro em leitores adolescentes de E/LE e o seu domínio na utilização da Internet;

c) delimitar os informantes da pesquisa;

d) colher informações para a preparação dos instrumentos de coleta de dados para composição do corpus de análise.

O instrumento estava composto de nove questões objetivas sobre: freqüência de leitura de jornais, partes e assuntos preferidos, nível de conhecimento e freqüência de uso da internet, motivos de acesso à rede, interesse por sites estrangeiros. Na pergunta sobre o interesse pela leitura de jornais em espanhol, havia também um espaço para a explicação das motivações (resposta aberta). Além dessas questões, foram apresentados fragmentos de 5 textos de gêneros e assuntos diversos para que cada aluno os classificasse como: “interessante”, “muito interessante”, “chato”.

A atividade foi realizada em um tempo de 50 minutos, sem maiores esclarecimentos sobre a finalidade das respostas, além do fato de que, a partir desse questionário, algumas pessoas seriam selecionadas para ajudar na realização de um projeto de monografia de pós-graduação de duas pesquisadoras. Os itens elaborados para a sondagem nos ajudaram a alcançar todos os objetivos enumerados e a escolher cinco alunos da turma com o perfil desejado para a realização da segunda etapa do trabalho. O critério de escolha foi optar por aqueles que mostraram ter habilidade no uso de Internet e interesse pela leitura de jornais em espanhol. Também se considerou a viabilidade de transporte dos informantes para o local da atividade como fator limitador da quantidade de sujeitos participantes.

 

Leituras on-line e off-line

Na segunda etapa da pesquisa, no laboratório de informática de uma instituição de ensino superior (IES) pública no Rio de Janeiro, foi informado previamente aos alunos que manuseariam o computador e que trabalhariam com a leitura on-line. Eles, então, acessaram o site indicado - do jornal El Mundo -, partindo da página principal da seção “Sociedad”, a que obteve maior preferência na pesquisa prévia do questionário de sondagem. Depois, puderam escolher distintos percursos de leitura, acessando um total de quatro páginas cada um. Os 13 textos escolhidos foram, em sua grande maioria, notícias da seção “Sociedad”, ratificando a preferência dos estudantes por esta parte do jornal.

O material selecionado foi salvo e enviado por e-mail para os endereços eletrônicos das pesquisadoras, para posterior impressão e análise. Elaboramos um segundo questionário, que os alunos responderam ao término da leitura de cada texto escolhido, a fim de identificar a razão da eleição dos links e a sua opinião sobre os supostos enunciadores e co-enunciadores de cada texto.

Com a finalidade de reconstruir o ethos do enunciador e do co-enunciador através das marcas formais presentes nos textos, utilizamos os seguintes critérios, que pautaram as análises posteriores:

a) Os indícios de subjetividade, envolvimento ou parcialidade do enunciador foram considerados, principalmente, por meio do emprego de adjetivos apreciativos no texto.

b) A caracterização da faixa etária como jovem ou adulta estava calcada no tema abordado e nas marcas de formalidade encontradas no texto - opções por determinadas formas de tratamento, uso de gírias, ou vocabulário próprios de faixas etárias ou classes sociais específicas.

c) O domínio do tema foi medido de acordo com a presença ou ausência de vocabulário especializado e/ou de siglas e da quantidade de informação sobre os fatos e as pessoas citadas. Consideramos que a ausência dos dois primeiros e a grande quantidade deste último indicam um ethos de enunciador com domínio do tema, mas que supõe um co-enunciador que não necessariamente precisa tê-lo para ler, pois as informações são-lhe oferecidas. Por outro lado, se faltam dados, ou a linguagem é excessivamente especializada, o ethos construído do co-enunciador aponta para um sujeito que domina o assunto.

d) As características psicológicas do co-enunciador basearam-se na presença de adjetivos atribuídos ao leitor no texto.

e) Associamos o ethos indicativo da nacionalidade do enunciador e do co-enunciador à presença ou ausência de vocabulário e expressões regionais. Consideramos que o leitor esperado é tido como universal se o texto facilita a leitura de um estrangeiro, por apresentar grande quantidade de palavras não-específicas de determinada área/comunidade lingüística, atividade, ou grupo social e ampla informação sobre o tema, assim como possuir links e imagens relacionadas à noticia. Caso contrário, o ethos do co-enunciador aponta para a nacionalidade espanhola, ou seja, para um leitor familiarizado com o conteúdo e a forma utilizados na construção do texto. Cabe lembrar que a origem do jornal é espanhola. Sua veiculação através da Internet permite supor uma universalização, que não chegaria a ocorrer se o discurso assumisse características regionais ou especializadas.

No mês seguinte à segunda etapa, na escola onde estudam, os cinco alunos foram convidados para a atividade de leitura off-line, selecionando apenas um dos quatro textos anteriormente escolhidos na leitura on-line. Cada um teve que justificar a escolha de reler determinada notícia e, após lerem as respostas que deram ao questionário referente a este texto, manifestaram se mudaram algo com relação à sua leitura anterior. O trabalho foi realizado com uma versão impressa dos referidos textos.

Expressaram, também, sua opinião sobre alguns aspectos da enunciação que não constavam no questionário anterior como: o que diriam da pessoa que escreveu e da que leu este texto; qual a suposta faixa etária do enunciador; se achavam que o autor e o leitor esperado dominavam (ou deveriam dominar) o tema de que trata o texto; quais as marcas do autor na notícia; e se foi apontada alguma característica psicológica (através de adjetivos) do leitor. Sempre que possível os alunos deveriam justificar suas respostas com base em fragmentos do texto. Também lhes foi solicitado que comparassem a leitura on-line com a off-line: “O que mudou na leitura de um texto on-line?”, “O que é mais fácil e mais difícil na leitura on-line e na off-line?”. Nesta nova leitura com distanciamento temporal, buscou-se dar voz aos alunos, visto que tiveram a oportunidade de repensar o texto e sua leitura anterior, verbalizar aspectos da enunciação e contrapor a leitura on-line e a off-line.

Para orientar a análise dos resultados das leituras - on-line e off-line - partimos de nosso próprio processo leitor, observando a presença e/ou ausência dos seguintes aspectos nos treze textos escolhidos: marcas da subjetividade do enunciador, caracterização psicológica do co-enunciador, ethos para indicação de nacionalidade e faixa etária, domínio do assunto e fatores que influenciaram na leitura.

Com relação ao ethos do enunciador constatamos que: (1) em sete textos há ausência de elementos que possibilitem identificar subjetividade (mascaramento do sujeito); (2) sua faixa etária pode ser identificada como adulta em oito textos e como possivelmente jovem ou adulta em cinco, devido principalmente à seleção temática; (3) em dez textos o enunciador dá sinais de domínio do tema.

No que se refere ao ethos do co-enunciador, verificamos que: (1) não há, em geral, marcas de sua caracterização psicológica, exceto em um único texto; (2) pode ser considerado um leitor universal na maioria dos textos, sendo visto como exclusivamente espanhol em três; (3) sua faixa etária pode ser identificada como adulta em seis textos e como possivelmente jovem ou adulta em sete, em função do tema; (4) em oito dos textos parece apontar para um sujeito que pode ter pouco domínio do tema.

Analisando fatores que interferem na leitura identificamos: (1) a exposição de muita informação sobre o tema em nove textos e de pouca em quatro; (2) dez textos possuem links para notícias relacionadas, enquanto, nos demais, há apenas links para as seções do jornal; (3) há ausência de imagem em sete textos.

Todos os treze textos apresentam fragmentos destacados. Se, por um lado, iso permite ao leitor saber de que trata o texto sem ler toda a notícia, por outro, deixa uma marca de subjetividade, já que o autor / jornal escolhe o que considera mais importante para uma leitura superficial. Além disso, verificamos que fotos e links para noticias relacionadas contribuem para a contextualização e compreensão textual.

Para as correlações entre a leitura on-line, a leitura off-line e a leitura parâmetro das pesquisadoras consideramos somente os três textos (2, 3 e 9) que foram relidos pelos estudantes, destacando as incoerências e dificuldades detectadas nas respostas aos questionários.

Na leitura on-line, embora a maioria não tenha identificado o assunto do texto, todos os alunos consideraram a leitura fácil. Apesar dessa facilidade mencionada, julgaram que a presença de palavras desconhecidas dificultou a leitura. Também foram apontados itens como a falta de informação detalhada no texto e a dificuldade de ler em espanhol como fatores complicadores. Quando, ao contrário, identificavam o significado da maioria das palavras ou tinham informação abundante sobre o tema, consideraram que estavam diante de elementos facilitadores do processo leitor. Embora reconheçamos que os pares citados (vocabulário desconhecido/ conhecido; carência / abundância de informação), ao serem opostos, implicam, respectivamente, a menor ou maior facilidade no processo leitor, detectamos no problema da imprecisão quanto à definição do texto como fácil ou difícil uma falta de critério de classificação por parte dos leitores aprendizes.

A maioria dos alunos considerou o co-enunciador de cada texto como potencialmente universal. O enunciador foi visto como supostamente espanhol, entre outras razões, porque a falta de marcas explícitas de subjetividade dificulta a definição precisa da nacionalidade, bem como da faixa etária, dependendo esta caracterização apenas da amplitude do tema exposto e da consideração da origem da fonte. Ou seja, o mascaramento da subjetividade tornou-se um fator complicador para a identificação de traços dos sujeitos da enunciação. Nessa linha, também identificaram, em geral, os textos como voltados para leitores de todas as idades, embora em um dos casos as opiniões se dividam entre jovens e adultos.

A presença de links para aprofundar a informação é citada nos três textos como aspecto diferenciador da leitura on-line em relação à off-line. Além disso, no texto 2, dois alunos apontam como diferença, igualmente, o grau de atenção que está associado à velocidade da leitura. Como fatores que dificultam a leitura on-line, em todos os textos são mencionados problemas técnicos que podem interromper a conexão. Como fatores que a facilitam, os principais são, segundo os alunos, a localização da informação e a presença de links e imagens.

Na leitura off-line, todos os alunos conseguiram expressar o assunto do texto selecionado, cuja escolha foi motivada por seu interesse pelo tema abordado, sendo considerados de dificuldade mediana pela maioria. Foi unanimidade que a presença de palavras desconhecidas dificultou a leitura, embora outros fatores também tenham sido apontados.

Com relação à caracterização psicológica do co-enunciador, no texto 2, os alunos divergem quanto à sua ausência ou presença, enquanto, em nossa leitura, consideramos a ausência de marcas lingüísticas que o identificassem. No texto 9, o aluno considera sua presença, diferentemente de nossa análise. Ainda sobre caracterização de co-enunciador, no texto 2, os alunos concluíram que este não necessita dominar o tema do texto para compreendê-lo, no entanto em nossa análise julgamos necessário tal conhecimento. No que se refere às questões de nacionalidade e faixa etária, não houve mudanças entre as leituras on-line e off-line.

Na leitura off-line a possibilidade de deslocar o texto para qualquer lugar e o maior tempo de leitura contribuem, segundo os informantes, para facilitá-la. Especificamente em relação ao texto 2, os alunos consideram que nada dificulta a leitura off-line, exceto o desinteresse por ler nesse suporte (papel). Essa resposta expressa a concepção que os estudantes possuem sobre o processo de leitura a que estão acostumados. De acordo com essa visão, as dificuldades leitoras podem não ser decorrentes dos textos, mas, provocadas pela falta de motivação. Já, nos textos 3 e 9, as dificuldades de leitura off-line são associadas à ausência de imagens e à menor freqüência na atualização dos textos impressos. Dessa maneira, os alunos expressaram uma dificuldade comum (a falta de imagens relacionadas) aos dois tipos de leitura considerados - on-line e off-line - e identificaram como diferença a atualização realizada constantemente nos textos da rede, ao contrário do que ocorre no texto impresso, que permanece sem alterações.

Considerações finais

Estudos, como este, não pretendem chegar a generalizações, mas, através da descrição e análise de casos particulares, fomentar o olhar crítico e investigativo. A primeira etapa da investigação permitiu-nos observar que se pode fomentar o interesse dos adolescentes pela leitura, além de lançar uma luz sobre temas que lhes agradam, suas dificuldades ao ler no idioma espanhol e o que pode facilitar a sua tarefa.

Na leitura on-line, esperávamos que os alunos, após acessarem uma notícia, abrissem os links dos textos relacionados, mas como não o fizeram, suas leituras não foram hipertextuais. Os estudantes utilizaram a Internet, mas não exploraram o hipertexto, realizando leituras aleatórias e sem relação entre si. Portanto, podemos dizer, por um lado, que não são leitores on-line propriamente ditos, mas que, por outro, tampouco fazem parte dos leitores exclusivamente de textos impressos. Caracterizam-se, portanto, como estando num momento de transição na construção de um novo leitor, entre o papel e o suporte virtual.

No que se refere à leitura off-line, ficou claro pela informação dos próprios alunos que ela gera menos motivação que a leitura on-line. Também tem a desvantagem de não oferecer os recursos do hipertexto, embora, como já pontuamos, eles não tenham sido efetivamente utilizados. Em contrapartida, sua independência de recursos técnicos e o maior tempo disponível para a tarefa leitora foram fatores positivos observados.

Quanto ao reconhecimento da diversidade dos leitores da fonte trabalhada, considerando o caráter universal da Internet e rompendo a descontextualização gerada pelas diferenças de tempo, espaço e nacionalidades, os resultados obtidos com os questionários apontam para um leitor universal. Isso se comprova pela linguagem desprovida de regionalismos ou de termos específicos de grupos lingüísticos determinados e pelos temas de interesse geral, sem ênfase em particularidades espanholas e com informações suficientes para a reconstrução dos sentidos por qualquer leitor.

A respeito da aplicação didática desse material, seu caráter universal permite considerar como um possível co-enunciador também o aluno de E/LE. No entanto, fatores como o não domínio do idioma, de aspectos culturais e discursivos acarretam dificuldades de leitura. Isto não precisa ser considerado pelos jornalistas, uma vez que estes não escrevem para a leitura em atividades didáticas. Ainda assim, é preciso admitir que tais limitações criam empecilhos para a sua utilização em sala de aula. Cabe ao professor, durante sua etapa de planejamento selecionar cuidadosamente tanto o material que será utilizado, quanto as atividades que pensa propor. Os objetivos a serem alcançados e as peculiaridades de seus alunos são pontos chaves para apoiar suas decisões.

Com relação às contribuições que os estudos de AD podem oferecer ao trabalho de desenvolvimento da compreensão leitora em LE, consideramos que a prática docente que incorpore pressupostos dessa linha não utilizará o texto apenas como um pretexto para o ensino do idioma, mas trabalhará a compreensão leitora considerando todos os aspectos enunciativos que atuam na construção do sentido.

Concluindo, aspectos discursivos como os expostos neste estudo, podem enriquecer a prática didática e trazer contribuições que diminuam as perdas provocadas pelo ambiente de simulacro da aula, pois permitem a conscientização da mudança na situação enunciativa original e das suas implicações. Também é importante ressaltar que, apesar da expansão da Internet no cotidiano moderno, a leitura hipertextual ainda precisa ser desenvolvida através de trabalho sistemático para alcançar sua potencialidade. Vale deixar registrado, contudo, que o apelo que exerce sobre os jovens, no caso específico que estudamos, contribui como fator motivador para o desenvolvimento da leitura, não só em suporte virtual, mas também em papel.

 

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