O EMPREGO DOS CLÍTICOS
EM A DEMANDA DO SANTO GRAAL

Miguél Eugenio Almeida (PUC-SP)

A pretensão deste trabalho é apresentar, sem analisar amplamente devido à natureza do mesmo, as ocorrências da posição dos clíticos em A Demanda do Santo Graal - edição crítica de Magne (1944) e aproveitando a versão de Megale (1987); ou seja, buscando a dimensão 'interna' da pesquisa para relacioná-la com sua dimensão individual e social, a chamada 'externa'.A seleção do corpus foi feita aleatoriamente procurando, apenas, um número de ocorrências que dê conta das regras gramaticais do documento histórico.Assim, selecionamos os textos da versão de Magne que compreendem 69 páginas (259-328); e da versão de Megale que correspondem 44 páginas (169-213).

Mattos e Silva (1993) é a referência teórica e aplicada na pesquisa em questão, porque contempla a colocação no português arcaico dos pronomes pessoais do caso reto e oblíquo, mostrando os alomorfes, as variantes apocopadas, as combinações de pronomes, as variantes -lo, -la, -los, -las depois de R e S (mesmo em formas não-verbais); os alomorfes -no, -na, -nos, -nas, mesmo em situações não usuais hoje em dia.

A amostragem do corpus compõe o número de 523 frases sobre o texto do século XIV (XIII?). Certamente que os aspectos fonológicos interferem na posição dos clíticos nas frases. Limitamo-nos aos aspectos sintáticos. A partir daí, detectamos o "estado de língua" do documento com os do momento atual, para que possamos compreender através da descrição e explicação de como os clíticos se produziram e se desenvolveram na época do documento no contexto social e cultural. Américo Facó, chefe da secção de enciclopédia e do dicionário do Instituto Nacional do Livro, apresenta-nos, através de sua introdução de A Demanda do Santo Graal - versão Augusto Magne (1944), alguns esclarecimentos sobre a produção do documento em questão; e, também, outros estudiosos nos auxiliam neste trabalho de pesquisa.

Augusto Magne (1944), ao fazer sua edição crítica do documento, fez cópia do apógrafo da Biblioteca Nacional de Viena (antiga Biblioteca Palatina). O mesmo compreende uma miscelânea literária de poemas, romances, pseudocrônicas e aventuras fantásticas dos cavaleiros de Artur que envolveu o europeu do século XII ao XVI. Ou seja, cf. Américo Facó (1944):

A lenda não é apenas uma, antes vasto, complicado sistema de muitas, e muitas, que se entrelaçavam de procedência vária alteradas, mudadas, conjugadas, deformadas, inovadas, adaptadas ao mesmo fim pelo devanear dos poetas, dos cantores músicos, dos cantadores, dos romanceadores. E a partir do século XII, até o século XV, de certo modo ainda no correr do século XVI, a Europa se banha com enlevo na magia inundante dos poemas e romances, pseudocrônicas e aventuras fantásticas dos cavaleiros da Távola Redonda, dos cavaleiros de Artur, e de todos os cavaleiros andantes, que deles se iam derivando.(1944: 14)

A lenda, do ponto de vista antropológico da linguagem, tem uma importância fundamental de lançar o homem para o universo quando ele se manifesta originalmente pela linguagem. Assim, a mesma passa a transformar o homem na sua caminhada evolutiva para o homo loquens. Mondin (1980) faz, de maneira brilhante, sua colocação a este respeito baseado em Heidegger:

A linguagem original, precisa Heidegger, tem uma força, um poder todo especial, uma força que funda o próprio ser das coisas, poder-se-ia mesmo dizer uma força criativa. Essa linguagem não se baseia em qualquer signo nem muito menos é um simples conjunto de signos; pelo contrário, todos os signos têm sua origem nela. Ela é a força original e primordial do aparecer, do se mostrar. (1980: 147)

Esta capacidade de criar vem do imaginário humano de moldar a realidade de acordo com a sua vontade. E é isto que o impulsiona para sua evolução em todos os aspectos de sua vida. Notadamente em A Demanda, Américo Facó (1944) faz sua observação a respeito da criação da lenda:

O que se afigura incontestável é que jamais houve um Rei Artur para inspirar a ficção poética e romanesca, mas que existiu muito provavelmente um guerreiro Artur, que lutou com vantagem contra os invasores saxões da antiga Britânea, no século VI. (1944: 14)

A seguir, apresentamos as ocorrências e as descrições dos clíticos, onde podemos observar que o seu uso é abundante para o contexto discursivo da época da formação da língua portuguesa.

PRÓCLISE

Observemos as diferentes situações de ocorrência da próclise, cf. Mattos e Silva (1993: 128-132):

1. Nas orações subordinadas, o clítico apresenta-se contíguo ao elemento subordinante ao verbo. Vejamos alguns exemplos, que ilustram muito bem esta situação, numa amostragem de 156 ocorrências:

a)...em guisa me rogastes, que a deixarei (p. 317)

b) Rogo-vos que me digaes porque vos cobatestes (...) porque me quereis (p. 317)

c)... porque vos rogou a dona (p. 317)

d)... quando me faz cavaleiro (p. 317)

e)... jamais nom quero que me tenham por cavaleiro. (p. 320)

f)... que me nembrei de vós (p. 320)

g)... ca vos terriam por sandeu (p. 322)

h)... cavaleiro (...) que me vencesse (p. 322).

i) _ Ora vos rogo (...) que me saüdês. (p. 323)

j)... nom sei que vos direi (p. 323)

l)... ca se semelhou (p. 325)

2. O clítico nas orações subordinadas, apresenta-se contíguo ao elemento subordinante e distanciado do verbo por outros constituintes. Dos 44 casos anotados, apresentamos algumas amostras:

a)... se vos nom cunhicia (p. 309)

b)... mas bem sabede que lhe nom disse Galvam tôda verdade (p. 310)

c)... ca se lhe a verdade dissesse (p. 310)

d)... que lho por mal nom tevesse (p. 310)

e)... se os vós matastes e me conhecíades, eu vo-lo perdôo (p. 311).

f)... que os vós matastes, vos querrá ende mal (p. 311).

g) _ Eu lho saberia dizer (...) se o eu visse. (p. 312)

h)... e se vos eu tanto errasse (p. 312)

i)... se vos depois chamo aa batalha (p. 314)

j)... bondade que vos eu vejo, semelha-me que seria (p. 316).

l)... convinria que vos combatesseis comigo (...) que me nom poderiades durar nenhua cousa (p. 316).

m)... porque me nom quisestes fazer (p. 318)

Os constituintes que permeiam o verbo e o pronome são de classes gramaticais diferentes, como observamos nos casos acima, ou seja: advérbio de negação, artigo, substantivo, pronome pessoal átono, contração da preposição com o artigo, pronome possessivo, advérbio, pronome pessoal do caso reto e pronome indefinido.

3. Próclise em frases negativas quer subordinadas, principais ou coordenadas. Encontramos 60 ocorrências.

3.1. Pronomes contíguos ao subordinante:

a)... que o nom vissem (p. 304)

b)... ora vejo eu bem que me nom partirei (...) ca vos nom podedes defender. (p. 304)

3.2. Pronome sucedido da negação:

a)...sabede que ele se esquecerá de vós, e nom vos dará honra de cousa (p. 297).

b)...e se me podesse prender, jamais lhe nom sairia da maão. (p. 299)

c)... e nom me poderam guardar (p. 300)

d) _ Nem alhur (...) nom vos levarei eu (p. 301)

e)... pois se eu posso haver doos cavaleiros boõs, nom me terriam por sandia (p. 302).

f)... eu nom vos faleço (p. 303)

g)... vós nom na podedes defender (p. 304)

h)... que nom lhes semelhava a eles (p. 305)

3.3. Pronome junto ao subordinante ou ao verbo quando mediado por outro constituinte:

a) E rogo-vos (...) que logo mo dedes. (p. 288)

b)... ca bem sabia que todo lhe vinha (p. 289)

c)... e se el mal fez, nom no devedes vós. (. 293).

d)... ca muito lhes prazia de falarem (p. 295)

e)... eu me nom para o paraíso, que me tu quiseste tolher (p. 295).

ÊNCLISE OU PRÓCLISE

Há 299 casos, dos quais 89 ocorrências são de próclise e 210 ocorrências de ênclise.

Ênclise ao verbo em posição inicial absoluta ou inicial, onde a primeira oração não é a principal:

a)... Leixades-me soo (p. 260)

b)... nembrade-vos de mim (p. 260)

c) Vaamos-nos quanto podermos.(p. 260)

d) - Tende-o bem.(p. 261)

e) - Pesa-me ende (p. 261)

f)... espertou-se tam lasso e tam cansado.(p. 265)

g)... ergueu-se e disse-lhe.(p. 265)

Variação ênclise / próclise do verbo na posição não inicial da oração:

a)... entam se iam todolos coroados contra o céeu (p. 260)

b) Entam se chamava astroso e cativo (p. 260)

c)... ante o levavam a ữa cova muito escura (p. 261)

d) Aquel pecado te meterá em tam grã coita.(p. 263)

e)... esta maravilha vos mostrou Deus.(p. 267)

Ênclise em orações coordenadas quando os coordenantes forem e, mais e pero. Há 192 ocorrências. Vejamos casos ilustrativos:

a)... e metiam-lha na cabeça (p. 260)

b)... e deu-as ao homem boõ e disse-lhe (p. 273)

c)... e dizede-me o quer jaz (p. 273)

d)... e ouvindo-o Persival; (p. 274).

Próclise em orações coordenadas:

a) E quando se via soo, dava vozes e eu vos meterei em tam gram de ou em maior (p. 260)

b)... e lhe semelhava (p. 262)

c)... entam se iam todolos coroados contra o ceeu. (p. 260)

d) Vós me havedes metuda em esta grande coita em que me veedes; e eu vos metrei. (p. 261)

e)... e assi lhe semelhava ali u dormia (p. 162)

f) E se me alguém preguntasse (p. 269)

g) E quando viu Persival ante si seer e o conheceu (p. 265)

h) E ela se tornou pera aquela carreira. (p. 267)

i)... e senha em tal guisa nom lhe poderia vỉir senam mal (p. 267)

j) Entam se chegou a ele (p. 271)

l) E ele lhe respondeu (p. 271)

m)... mas eu a recebi (p. 273)

n)... e todavia lhes amoestava o homem (p. 272)

Próclise ou ênclise ao verbo que precede ao infinito:

a)... e se vos prouguer de me dizerdes vossa fazenda (p. 326)

b)... eu vo-lo direi por provar se sodes tam cortês como me vos mostrastes. (p. 326)

c)... sobreveio um vento tam forte, que os alagou assi, que os vi todos morrer ante mim. (p. 326)

d) Estonce começou-lhe a demandar o coraçom. (p. 327)

e) E quando a viu rir (p. 327)

f)... demo que me quer tolher (...) mostra-mo. (p. 328)

g)... e vai-te u te ela levar (p. 328)

h)... pois Persival vos quer guiar (p. 301)

i)... pois se eu posso haver doos cavaleiros boõs (p. 302)

j)... deixae-na, se vos aprouguer. (p. 302)

MESÓCLISE

Mesóclise com verbos no futuro do presente e do pretérito. A freqüência de ocorrências nestes casos é baixíssima, vejamos:

a)... prazer-me-ia muito (p. 266)

b) Ora ouve a carta e leer-ta-ei em tal guisa (p. 274)

c)... e nom me poderam guardar, e guardar-me-íades vós?(p. 300)

d)... e se visse que houvessem mester sua ajuda, ajudá-los-ia. (p. 304)

e) - E porque sodes vós em salvo (...) de hoje-mais ir-me-ei eu. (p. 306)

f)... ante vingar-me-ia deste maau cavaleiro.(p. 315)

g) - Saber-me-edes dizer novas (p. 312)

h)... e contar-vos-ei.(p. 326)

i)... ir-me-ei depois eles (p. 294)

Nota: os exemplos b, c, d, h e i mostram a ocorrência da mesma - mesóclise - em orações coordenadas. Já a forma frasal “a” ocorre em orações principais com o verbo em posição inicial absoluta. As formas frasais “e” e “f” ocorrem precedidas do verbo com outros constituintes.

O uso dos clíticos parece ter uma relação contundente de afirmação existencial do homem e da fixação da sua língua em formação para com seu semelhante, do ponto de vista antropológico da linguagem, ou seja, cf. Mondin (1980): Ela [linguagem], com efeito, além de descrever objetos e comunicar sentimentos serve outrossim para testemunhar aos outros e a nós mesmos a nossa existência.(1980: 145) Assim, a compreensão do uso dos mesmos leva-nos a ver com mais clareza sobre a importância deles no processo lingüístico de comunicação geral.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ALTMAN, C. A pesquisa lingüística no Brasil (1968 - 1988). São Paulo: Humanitas Publicações / FFLCH / USP, 1988.

A DEMANDA DO SANTO GRAAL: versão de Augusto Magne. Vol. I. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional / INL - Ministério da Educação e Saúde, 1944.

A DEMANDA DO SANTO GRAAL: manuscrito do século XIII / Texto sob os cuidados de Heitor Megale. São Paulo: T. A. QUEIROZ / EDUSP, 1988.

FACÓ, A. "Introdução". A Demanda do Santo Graal: versão de Augusto Magne. V.I. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional / INL - Ministério da Educação e Saúde, 1944, p. 1-30.

KOERNER, K. Questões que persistem em Historiografia Lingüística. Revista da ANPOLL nº 2, 1996, p. 44-70.

MATTOS E SILVA, R.V. O Português Arcaico - Morfologia e Sintaxe.São Paulo: Contexto, 1993.

MONDIN, B. O homem quem é ele: elemento de antropologia filosófica. Tradução: R. Leal Ferreira e M. A. S. Ferrari. São Paulo: Paulinas, 1980.

 

O EMPREGO DOS CLÍTICOS
EM A DEMANDA DO SANTO GRAAL

Miguél Eugenio Almeida (PUC-SP)

A pretensão deste trabalho é apresentar, sem analisar amplamente devido à natureza do mesmo, as ocorrências da posição dos clíticos em A Demanda do Santo Graal - edição crítica de Magne (1944) e aproveitando a versão de Megale (1987); ou seja, buscando a dimensão 'interna' da pesquisa para relacioná-la com sua dimensão individual e social, a chamada 'externa'.A seleção do corpus foi feita aleatoriamente procurando, apenas, um número de ocorrências que dê conta das regras gramaticais do documento histórico.Assim, selecionamos os textos da versão de Magne que compreendem 69 páginas (259-328); e da versão de Megale que correspondem 44 páginas (169-213).

Mattos e Silva (1993) é a referência teórica e aplicada na pesquisa em questão, porque contempla a colocação no português arcaico dos pronomes pessoais do caso reto e oblíquo, mostrando os alomorfes, as variantes apocopadas, as combinações de pronomes, as variantes -lo, -la, -los, -las depois de R e S (mesmo em formas não-verbais); os alomorfes -no, -na, -nos, -nas, mesmo em situações não usuais hoje em dia.

A amostragem do corpus compõe o número de 523 frases sobre o texto do século XIV (XIII?). Certamente que os aspectos fonológicos interferem na posição dos clíticos nas frases. Limitamo-nos aos aspectos sintáticos. A partir daí, detectamos o "estado de língua" do documento com os do momento atual, para que possamos compreender através da descrição e explicação de como os clíticos se produziram e se desenvolveram na época do documento no contexto social e cultural. Américo Facó, chefe da secção de enciclopédia e do dicionário do Instituto Nacional do Livro, apresenta-nos, através de sua introdução de A Demanda do Santo Graal - versão Augusto Magne (1944), alguns esclarecimentos sobre a produção do documento em questão; e, também, outros estudiosos nos auxiliam neste trabalho de pesquisa.

Augusto Magne (1944), ao fazer sua edição crítica do documento, fez cópia do apógrafo da Biblioteca Nacional de Viena (antiga Biblioteca Palatina). O mesmo compreende uma miscelânea literária de poemas, romances, pseudocrônicas e aventuras fantásticas dos cavaleiros de Artur que envolveu o europeu do século XII ao XVI. Ou seja, cf. Américo Facó (1944):

A lenda não é apenas uma, antes vasto, complicado sistema de muitas, e muitas, que se entrelaçavam de procedência vária alteradas, mudadas, conjugadas, deformadas, inovadas, adaptadas ao mesmo fim pelo devanear dos poetas, dos cantores músicos, dos cantadores, dos romanceadores. E a partir do século XII, até o século XV, de certo modo ainda no correr do século XVI, a Europa se banha com enlevo na magia inundante dos poemas e romances, pseudocrônicas e aventuras fantásticas dos cavaleiros da Távola Redonda, dos cavaleiros de Artur, e de todos os cavaleiros andantes, que deles se iam derivando.(1944: 14)

A lenda, do ponto de vista antropológico da linguagem, tem uma importância fundamental de lançar o homem para o universo quando ele se manifesta originalmente pela linguagem. Assim, a mesma passa a transformar o homem na sua caminhada evolutiva para o homo loquens. Mondin (1980) faz, de maneira brilhante, sua colocação a este respeito baseado em Heidegger:

A linguagem original, precisa Heidegger, tem uma força, um poder todo especial, uma força que funda o próprio ser das coisas, poder-se-ia mesmo dizer uma força criativa. Essa linguagem não se baseia em qualquer signo nem muito menos é um simples conjunto de signos; pelo contrário, todos os signos têm sua origem nela. Ela é a força original e primordial do aparecer, do se mostrar. (1980: 147)

Esta capacidade de criar vem do imaginário humano de moldar a realidade de acordo com a sua vontade. E é isto que o impulsiona para sua evolução em todos os aspectos de sua vida. Notadamente em A Demanda, Américo Facó (1944) faz sua observação a respeito da criação da lenda:

O que se afigura incontestável é que jamais houve um Rei Artur para inspirar a ficção poética e romanesca, mas que existiu muito provavelmente um guerreiro Artur, que lutou com vantagem contra os invasores saxões da antiga Britânea, no século VI. (1944: 14)

A seguir, apresentamos as ocorrências e as descrições dos clíticos, onde podemos observar que o seu uso é abundante para o contexto discursivo da época da formação da língua portuguesa.

PRÓCLISE

Observemos as diferentes situações de ocorrência da próclise, cf. Mattos e Silva (1993: 128-132):

1. Nas orações subordinadas, o clítico apresenta-se contíguo ao elemento subordinante ao verbo. Vejamos alguns exemplos, que ilustram muito bem esta situação, numa amostragem de 156 ocorrências:

a)...em guisa me rogastes, que a deixarei (p. 317)

b) Rogo-vos que me digaes porque vos cobatestes (...) porque me quereis (p. 317)

c)... porque vos rogou a dona (p. 317)

d)... quando me faz cavaleiro (p. 317)

e)... jamais nom quero que me tenham por cavaleiro. (p. 320)

f)... que me nembrei de vós (p. 320)

g)... ca vos terriam por sandeu (p. 322)

h)... cavaleiro (...) que me vencesse (p. 322).

i) _ Ora vos rogo (...) que me saüdês. (p. 323)

j)... nom sei que vos direi (p. 323)

l)... ca se semelhou (p. 325)

2. O clítico nas orações subordinadas, apresenta-se contíguo ao elemento subordinante e distanciado do verbo por outros constituintes. Dos 44 casos anotados, apresentamos algumas amostras:

a)... se vos nom cunhicia (p. 309)

b)... mas bem sabede que lhe nom disse Galvam tôda verdade (p. 310)

c)... ca se lhe a verdade dissesse (p. 310)

d)... que lho por mal nom tevesse (p. 310)

e)... se os vós matastes e me conhecíades, eu vo-lo perdôo (p. 311).

f)... que os vós matastes, vos querrá ende mal (p. 311).

g) _ Eu lho saberia dizer (...) se o eu visse. (p. 312)

h)... e se vos eu tanto errasse (p. 312)

i)... se vos depois chamo aa batalha (p. 314)

j)... bondade que vos eu vejo, semelha-me que seria (p. 316).

l)... convinria que vos combatesseis comigo (...) que me nom poderiades durar nenhua cousa (p. 316).

m)... porque me nom quisestes fazer (p. 318)

Os constituintes que permeiam o verbo e o pronome são de classes gramaticais diferentes, como observamos nos casos acima, ou seja: advérbio de negação, artigo, substantivo, pronome pessoal átono, contração da preposição com o artigo, pronome possessivo, advérbio, pronome pessoal do caso reto e pronome indefinido.

3. Próclise em frases negativas quer subordinadas, principais ou coordenadas. Encontramos 60 ocorrências.

3.1. Pronomes contíguos ao subordinante:

a)... que o nom vissem (p. 304)

b)... ora vejo eu bem que me nom partirei (...) ca vos nom podedes defender. (p. 304)

3.2. Pronome sucedido da negação:

a)...sabede que ele se esquecerá de vós, e nom vos dará honra de cousa (p. 297).

b)...e se me podesse prender, jamais lhe nom sairia da maão. (p. 299)

c)... e nom me poderam guardar (p. 300)

d) _ Nem alhur (...) nom vos levarei eu (p. 301)

e)... pois se eu posso haver doos cavaleiros boõs, nom me terriam por sandia (p. 302).

f)... eu nom vos faleço (p. 303)

g)... vós nom na podedes defender (p. 304)

h)... que nom lhes semelhava a eles (p. 305)

3.3. Pronome junto ao subordinante ou ao verbo quando mediado por outro constituinte:

a) E rogo-vos (...) que logo mo dedes. (p. 288)

b)... ca bem sabia que todo lhe vinha (p. 289)

c)... e se el mal fez, nom no devedes vós. (. 293).

d)... ca muito lhes prazia de falarem (p. 295)

e)... eu me nom para o paraíso, que me tu quiseste tolher (p. 295).

ÊNCLISE OU PRÓCLISE

Há 299 casos, dos quais 89 ocorrências são de próclise e 210 ocorrências de ênclise.

Ênclise ao verbo em posição inicial absoluta ou inicial, onde a primeira oração não é a principal:

a)... Leixades-me soo (p. 260)

b)... nembrade-vos de mim (p. 260)

c) Vaamos-nos quanto podermos.(p. 260)

d) - Tende-o bem.(p. 261)

e) - Pesa-me ende (p. 261)

f)... espertou-se tam lasso e tam cansado.(p. 265)

g)... ergueu-se e disse-lhe.(p. 265)

Variação ênclise / próclise do verbo na posição não inicial da oração:

a)... entam se iam todolos coroados contra o céeu (p. 260)

b) Entam se chamava astroso e cativo (p. 260)

c)... ante o levavam a ữa cova muito escura (p. 261)

d) Aquel pecado te meterá em tam grã coita.(p. 263)

e)... esta maravilha vos mostrou Deus.(p. 267)

Ênclise em orações coordenadas quando os coordenantes forem e, mais e pero. Há 192 ocorrências. Vejamos casos ilustrativos:

a)... e metiam-lha na cabeça (p. 260)

b)... e deu-as ao homem boõ e disse-lhe (p. 273)

c)... e dizede-me o quer jaz (p. 273)

d)... e ouvindo-o Persival; (p. 274).

Próclise em orações coordenadas:

a) E quando se via soo, dava vozes e eu vos meterei em tam gram de ou em maior (p. 260)

b)... e lhe semelhava (p. 262)

c)... entam se iam todolos coroados contra o ceeu. (p. 260)

d) Vós me havedes metuda em esta grande coita em que me veedes; e eu vos metrei. (p. 261)

e)... e assi lhe semelhava ali u dormia (p. 162)

f) E se me alguém preguntasse (p. 269)

g) E quando viu Persival ante si seer e o conheceu (p. 265)

h) E ela se tornou pera aquela carreira. (p. 267)

i)... e senha em tal guisa nom lhe poderia vỉir senam mal (p. 267)

j) Entam se chegou a ele (p. 271)

l) E ele lhe respondeu (p. 271)

m)... mas eu a recebi (p. 273)

n)... e todavia lhes amoestava o homem (p. 272)

Próclise ou ênclise ao verbo que precede ao infinito:

a)... e se vos prouguer de me dizerdes vossa fazenda (p. 326)

b)... eu vo-lo direi por provar se sodes tam cortês como me vos mostrastes. (p. 326)

c)... sobreveio um vento tam forte, que os alagou assi, que os vi todos morrer ante mim. (p. 326)

d) Estonce começou-lhe a demandar o coraçom. (p. 327)

e) E quando a viu rir (p. 327)

f)... demo que me quer tolher (...) mostra-mo. (p. 328)

g)... e vai-te u te ela levar (p. 328)

h)... pois Persival vos quer guiar (p. 301)

i)... pois se eu posso haver doos cavaleiros boõs (p. 302)

j)... deixae-na, se vos aprouguer. (p. 302)

MESÓCLISE

Mesóclise com verbos no futuro do presente e do pretérito. A freqüência de ocorrências nestes casos é baixíssima, vejamos:

a)... prazer-me-ia muito (p. 266)

b) Ora ouve a carta e leer-ta-ei em tal guisa (p. 274)

c)... e nom me poderam guardar, e guardar-me-íades vós?(p. 300)

d)... e se visse que houvessem mester sua ajuda, ajudá-los-ia. (p. 304)

e) - E porque sodes vós em salvo (...) de hoje-mais ir-me-ei eu. (p. 306)

f)... ante vingar-me-ia deste maau cavaleiro.(p. 315)

g) - Saber-me-edes dizer novas (p. 312)

h)... e contar-vos-ei.(p. 326)

i)... ir-me-ei depois eles (p. 294)

Nota: os exemplos b, c, d, h e i mostram a ocorrência da mesma - mesóclise - em orações coordenadas. Já a forma frasal “a” ocorre em orações principais com o verbo em posição inicial absoluta. As formas frasais “e” e “f” ocorrem precedidas do verbo com outros constituintes.

O uso dos clíticos parece ter uma relação contundente de afirmação existencial do homem e da fixação da sua língua em formação para com seu semelhante, do ponto de vista antropológico da linguagem, ou seja, cf. Mondin (1980): Ela [linguagem], com efeito, além de descrever objetos e comunicar sentimentos serve outrossim para testemunhar aos outros e a nós mesmos a nossa existência.(1980: 145) Assim, a compreensão do uso dos mesmos leva-nos a ver com mais clareza sobre a importância deles no processo lingüístico de comunicação geral.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ALTMAN, C. A pesquisa lingüística no Brasil (1968 - 1988). São Paulo: Humanitas Publicações / FFLCH / USP, 1988.

A DEMANDA DO SANTO GRAAL: versão de Augusto Magne. Vol. I. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional / INL - Ministério da Educação e Saúde, 1944.

A DEMANDA DO SANTO GRAAL: manuscrito do século XIII / Texto sob os cuidados de Heitor Megale. São Paulo: T. A. QUEIROZ / EDUSP, 1988.

FACÓ, A. "Introdução". A Demanda do Santo Graal: versão de Augusto Magne. V.I. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional / INL - Ministério da Educação e Saúde, 1944, p. 1-30.

KOERNER, K. Questões que persistem em Historiografia Lingüística. Revista da ANPOLL nº 2, 1996, p. 44-70.

MATTOS E SILVA, R.V. O Português Arcaico - Morfologia e Sintaxe.São Paulo: Contexto, 1993.

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