A
SEMIÓTICA NA
MODA
UMA
IMAGEM
VALE
MAIS
QUE
MIL
PALAVRAS
Maria Elisa Magalhães Barbosa
A
SEMIÓTICA NA
MODA
De
acordo
com Lúcia Santaella “o
estudo da
linguagem e dos
signos é
muito
antigo. A
preocupação
com os
problemas da
linguagem começam na Grécia. A
semiótica
implícita compreende todas as
investigações
sobre a
natureza dos
signos, da significação e da
comunicação, é uma
semiótica
explícita
quando a
ciência
semiótica propriamente
dita começou a se
desenvolver” (SANTAELLA, 2002: XII).
Winfried Nöth
relata
que
para Peirce “a
semiótica
não é uma
ciência
especial
ou especializada,
como
são as
ciências
especiais, a
física, a
química, a
biologia, a
sociologia, a
economia, etc.,
quer
dizer,
ciências
que têm
um
objeto de
estudo delimitado e de cujas
teorias podem
ser extraídas
ferramentas empíricas
para serem utilizadas
em
pesquisas aplicadas” (NÖTH, 1995: 5).
A
noção de
signo é
básica na
lingüística.
Signo é a
menor
unidade de
um
código
dado. As
famílias de
signos
não cessam de se
multiplicar
pelo
planeta.
O
desenvolvimento a
partir de raízes estruturalistas foi
evidente
nos
trabalhos de Roland Barthes (1915-1980).
Ele foi
um estruturalista e propagou o
programa
semiológico de Saussure. No
quadro do
paradigma estruturalista atingiu o
clímax
com o
seu
sistema da
Moda (1967).
Abordando a
cultura de
massa Barthes analisou e encontrou a
chave
para as primeiras
análises
semióticas. Definiu o
signo
como
um
sistema constituído de E, uma
expressão R
em
relação e C
um
conteúdo (ERC).
Tal
sistema sígnico
primário pode se
tornar
um
elemento de
um
sistema sígnico
mais
amplo. Se a
extensão é de
conteúdo, o
signo
primário se
torna a
expressão de
um
sistema sígnico
secundário. Neste
caso, o
signo
primário é de
semiótica denotativa,
enquanto o
signo
secundário é de
semiótica conotativa.
Na
crítica
literária e cultural, Barthes empregou o
conceito de
semiótica conotativa
para
revelar as
mais diversas significações ocultas
em
textos. No
seu
estudo
Mitologias,
ele definiu
tais
sistemas de significações secundárias
como
mitos. Os
meios de
comunicação de
massa criam
mitologias e
ideologias
como
sistemas conotativos. No
nível conotativo,
ele esconde significações secundárias e ideológicas
e no denotativo
elas expressam
significações primárias “naturais”.
Para Barthes, “o
mito é
sempre uma
linguagem roubada” (BARTHES, 1993: 131).
Para J. Lotman, “a
arte e a
cultura
em
geral
são consideradas
como
sistemas de modelagem secundárias” (LOTMAN, 1979:
7).
Para Pierce, é
um
significado,
que aparece
como
resultado de
um
acordo
interpretativo dos
intérpretes do
signo.
Barthes
vê uma
nova
abordagem de
semiologia
ou a
nova
mitologia,
já
não será
capaz de
separar
tão facilmente o
significante do
significado, o ideológico do fraseológico.
UMA
IMAGEM
VALE
MAIS DO
QUE
MIL
PALAVRAS
A
teoria
semiótica
nos habilita a
penetrar no
movimento
interno das
mensagens, o
que
nos dá a possibilidade de
empreender os procedimentos e
recursos
empregados nas
palavras,
imagens,
diagramas,
sons, nas
relações
entre
elas, permitindo a
análise das
mensagens.
As
mensagens podem
ser analisadas
em
si mesmas, nas
suas
propriedades internas,
quer
dizer,
nos
seus
aspectos
qualitativos,
sensórios,
tais
como, na
linguagem
visual,
por
exemplo as
cores,
linhas,
formas,
volumes,
movimento,
dinâmica,
quando,
em
terminologia
semiótica, analisa-se os quali-signos das
mensagens.
Para Embacher, citado
por Maria Luiza Feitosa de Souza “a
moda (indumentária), uma anciã
em
meados da
Idade
Média, emerge
poderosa neste
fim de
século,
com
toda a complexidade de
objeto epistemológico dos
mais
instigantes.” (SOUZA, 2003)
O
mesmo
autor verbera
que “o
vestuário participa da
constituição da
identidade e é
por
ela constituído, e verifica
também a possibilidade do
indivíduo, ao
construir
seu
próprio
estilo,
ser
capaz de tornar-se representante de
si
mesmo, criando uma
identidade,
que articula as
igualdades e as
diferenças
que constituem e
são constituídas
pela
história desse
mesmo
indivíduo” (Idem.
Ibidem).
Isto
porque, “a
grande
realização
humana na
conquista da
identidade
pessoal é
conseguir
adequar os papéis
sociais
que é
obrigada a
desempenhar, à
capacidade de
pautar essa
identidade
pelo
seu
desejo.” (Idem,
Ibidem)
E sintetiza
mostrando
ser esta
situação “uma
autonomia
que emancipa o
sujeito proporcionando-lhe,
entre outras
coisas,
um
estilo
próprio de
vestir.
Um
estilo
capaz de
expressar o
que
ele está–sendo e o
que
ele é sem-estar-sendo,
coerente
com o
movimento
contínuo de concretização
que
lhe permite
ser representante de
si,
com
autonomia, na
busca da mesmidade.” (Idem,
Ibidem)
Ana Paula
Celso de Miranda e Maria Carolina Garcia, afirmam
que “atitudes levam as
pessoas a gostarem
ou
não das
coisas, aproximarem-se
ou afastarem-se delas.
Esses
gostos e
desgostos
são chamados
atitudes.” (MIRANDA, 2003)
Estas mesmas
autoras, citando
Eco, afirmam
que “sendo a
moda
símbolo na
essência, parece
certo
afirmar
que à
ela se aplica
perfeitamente
transferência de
significados, visando a
comunicação
integrante de
sociedades,
onde
tudo comunica, sendo
assim, o
vestuário é
comunicação.” (MIRANDA, e GARCIA, 2003)
O
indivíduo possui
tendência
psicológica a
imitação e proporciona a
satisfação de
não
estar
sozinho.
Imitar
não
só transfere a
atividade
criativa,
mas
responsabilidade
sobre a
ação dele
para o
outro. A
necessidade de
imitação vem da
necessidade de similaridade. Daí a
moda é a
imitação de
modelo estabelecido
que satisfaça a
demanda
por
adaptação
social,
diferenciação e
mudança,
que é adotada
por
um
grupo
social.
A
moda,
dentre outras, possui, duas
vertentes
singulares: uma é a
individualidade e a
outra a
necessidade de
integração
social. Salomon, a
nós trazido
por
Ana Paula
Celso de Miranda e Maria Carolina Garcia
ensina
que “moda é
processo
muito
complexo
que opera
níveis.
Em
um
extremo, está o
macro,
fenômeno
que
afeta muitas
pessoas simultaneamente,
ela exerce
efeito
muito
pessoal no
comportamento
individual. As
decisões de
compra do
consumidor
freqüentemente motivadas
pelo
desejo de
estar na
moda.” (MIRANDA e GARCIA, 2003)
As
mencionadas autoras,
agora
com
substrato
em Freyre registram
que “a
moda se impõe (...) é a
pressão,
sobre
esse
gosto de
um
consenso
coletivo.” (MIRANDA e GARCIA, 2003)
Dos
muitos
símbolos e
expressões, a
roupa é uma das
mais
importantes
linguagens
não verbalizadas do
eu
que
passa de
controle
social.
Por
ela as
pessoas procuram
comunicar
para os
outros, esta
percepção de
si,
que demandam a
integração
social
mediante o
que é culturalmente aceito. A
moda é
um
dispositivo
social,
portanto o
comportamento orientado
pela
moda é
fenômeno do
comportamento
humano generalizado e está
presente na
sua
interação
com o
mundo. Nesse
sentido afirma Baudrillard
que “se modernidade define-se
pela
hegemonia do
código, a
moda,
enquanto
dimensão
total dos
signos, é
sua
instância
emblemática. A
moda constitui uma
ruptura
profunda no
pensamento discursivo, mergulhando-o na
irreverência
absoluta,
ela desarticula o
esquema tradicional da
representação”. (BAUDRILLARD, 1996)
Que
nos impõe
profundamente
à
moda é a
ruptura
com uma
ordem
imaginária: a
da
Razão
sobre a todas
as
formas.
Umberto
Eco assevera
que a
moda é
um
exercício
contínuo de
recuperação das
formas repertoriadas, num
processo de estilização ao
qual é
indiferente
qualquer
dimensão de
profundidade.
Para Baudrillard na
tolerância do
passado está
envolta na
ambigüidade do
simulacro. Ao
ressuscitar o
passado, a
moda, o exclui. A
moda é
sempre retrô,
mas
com
base na
abolição do
passado:
morte e
ressurreição
espectral
das
formas. A
moda é a
preeminência
do
trabalho
morto dos
signos
sobre a
significação. A
moda simula o
dinamismo
interno do
ser,
isto é, o
próprio
devir.
Nesse
sentido é
que
ela se situa
numa
relação de
contemporaneidade e de complementaridade
com o
museu.
Moda e
museu
são
cúmplices e se
opõem
conjuntamente
a todas as
culturas
anteriores
feitas de
signos
inequivalentes e de
estilos
incompatíveis.
Os
modelos regem o
campo da
moda. Existe, uma
diferença
fundamental
entre a
função totalizante da
moda na modernidade e a
função do
ritual na
ordem
primitiva, à
qual
escapa o
efeito
estético da
ostentação
pelos
signos
que caracteriza o
sistema da
moda. A
moda assume
diante da funcionalidade
econômica o
aspecto de
festa e de gratuidade. Exerce uma
fascínio
que advém dos
aspectos de
inutilidade e de
arbitrariedade
que
lhes
são
próprios.
O
sistema da
moda é
paradoxal e
enquanto
código
absoluto
ela está
acima de
qualquer
valor. A
imoralidade da
moda torna-a
impenetrável à
racionalidade
revolucionária.
A
única
alternativa
para Baudrillard é a
descontração sígnica,
ou seja, a desestruturação do
código,
que se obtém jogando-o
contra
si
mesmo.
O
design na
moda,
nos possibilita
entender a
semiótica,
que é
como uma
embalagem,
um
rótulo
que é utilizado na
moda
para
despertar
sensações.
São
elementos
comuns do
design: o
brilho,
que
são
sinais
visuais,
que pontilham a
rastro da
roupa.
Esse
rastro
marca
com uma
clareza a
oposição
entre
brilho e
não–brilho. Essa
opção
marcante
entre duas
qualidades, a de
brilhar e a de não-brilhar dá essa
alternativa uma
predominância
qualitativa e icônica.
Para Lúcia Santaella (2002: 24 e ss.),
O
signo está
apto a
provocar
em
um
intérprete
sentimentos,
isto é,
um
interpretante
emocional.
Ícones tendem
a
produzir
esse
tipo de
interpretante
com
mais
intensidade.
Os
interpretantes
emocionais
estão
sempre
presentes
em quaisquer
interpretações,
mesmo
quando
não
nos damos
conta deles.
Um
signo pode
ser energético,
que
corresponde a uma
ação
física
ou
mental,
quer
dizer, o
interpretante
exige
um
dispêndio de
energia de
alguma
espécie. A
moda tende a
produzir
esse
tipo de
interpretante
com
mais
intensidade,
pois os
índices chamam
nossa
atenção,
dirigem
nossa
retina
mental
ou
nos movimentam
na
direção do
objeto
que
eles indicam
conotação do
brilho nas
roupas surge
por
trás da
linha do
horizonte e a
conotação de
revelação na
forma
que está
por
trás do
uso da
roupa e
que da a
predominância
metafórica.
A
imagem é uma
opção na
moda
que mantém a
unidade de
todo o
conjunto. As
imagens
indicam
todo o
processo
que é
visto e a
predominância
referencial dessa
imagem.
O
brilho, a
imagem e a
conotação fazem
parte de
todo
esse
processo no
mundo da
moda. Há
alguns
traços
comuns
que
são
caracteres semióticos
comuns no
mundo da
moda. O
poder da
imagem está nas
cores. Algumas
cores predominam outras
apenas
são
pinceladas. O
azul é uma
cor
fria. O
amarelo, uma
cor
quente, o
branco é
inexistência de
cor, o
laranja o
brilho do
sol, o
vermelho é uma
cor carregada.
Elas encantam, emocionam. A
síntese das
cores é o
branco. As
linhas
são
eficazes,
porque sugerem
movimento, dando a
sensação de uma
certa
leveza. As
linhas
diagonais, as simétricas, as
circulares, todas as
linhas imaginárias
ou
não, transmitem ao
tecido
um
significado
bem
próprio.
Significado
esse
que
leva o
interpretante a
viajar
nos
padrões da
moda.
As
formas
que
são
elementos distribuídos no
tecido
são reforçados
pela
cor
que funciona
como
traço
distintivo
entre
um
padrão e
outro.
Enquanto o
primeiro é
mais
formal, o
segundo é
mais
subjetivo e
ainda
mais
significativo.
A
distribuição de
elementos,
desenhos,
símbolos e
outros
caracteres
também faz
com
que o
tecido fique
ainda
mais
chamativo
para o
usuário.
Nos
padrões da
moda, há
um
certo
apelo sinestésico,
isto é as
imagens visam
produzir
sensações
não
só
visuais,
como
também
sensações táteis, olfativas
com o
apelo sinestésico do
cheiro de
roupa
nova.
Nas
relações
entre a
imagem e
mensagem predomina a complementaridade.
Quer
dizer as
mensagens
são organizadas de
modo
visual seja
capaz de
transmitir
tanta
informação
que
já passaram
visualmente e
acrescentar
informações específicas
que o
visual
não é
capaz de
transmitir.
Isso fica
claro nas
diferenças das
cores
que criam uma
distinção
que vem a
ser especificada pelas
palavras
que dão
nome às
cores.
As
palavras
também se relacionam
com as
imagens, predominando
também a complementaridade.
Quer
dizer, as
mensagens
são organizadas de
modo
que o
visual seja
capaz de
transmitir a
informação. Os
padrões
são especificados pelas
diferentes
cores,
diferentes
matizes,
diferentes
desenhos,
que as
roupas trazem formando
assim uma
distinção de
padrões
dentro da
moda.
Padrões
esses
que dizem
respeitos aos
elementos culturais, as
convenções de
época
que a
moda incorpora. Os
elementos culturais e
convenções
só funcionam simbolicamente para
um
interpretante. Dependendo do
tipo de
intérprete, dependendo
especialmente do
repertório cultural
que o
intérprete internalizou,
alguns
significados simbólicos se atualizarão,
outros
não.
Os
interpretantes
por estarem no
mundo,
por fazerem
parte dos
desígnios da
vida, os
efeitos
que os
signos poderão
porventura
produzir no
seu
dia-a-dia
são
tão enigmáticos
quanto o
próprio
desenrolar da
vida.
A
moda atende
cegamente aos
ditames do
consumo. Se uma
imagem é
um
bom
produto, se vende
bem, essa
imagem será perseguida
sem
tréguas e
sem
limites.
A
conclusão a
que se
chega é no
sentido de
que
emoções
são
signos e,
como
tais a
moda
nos
causa
emoções. Nesse
ponto, o
caminho parece
estar
aberto
para a
nossa
análise
semiótica da
moda
como uma
emoção,
em
pecado
emocional
que é
um
signo.
Qualquer
signo,
todo
signo,
mesmo
um
signo
mental, deve
estar corporificado. Estando corporificado, o
signo tem
qualidades
materiais
que
lhe
são
peculiares
como uma
entidade
ou
evento
que
ele é,
independente de
sua
função representativa.
Em
conclusão, cita-se Barthes,
para
quem “o
signo é,
pois,
composto de
um
significante e
um
significado. O
plano dos
significantes constitui o
plano de
expressão e dos
significados o
plano de
conteúdo”. (BARTHES, 1997: 43)
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