Discurso Direto e Indireto
uma análise sistêmico-funcional
Clara A. Vaz
Introdução
Passagens
em
Discurso
Direto e
Indireto se tornaram
recursos
amplamente utilizados
em
jornais e
revistas.
Seus
usos abrangem a
reprodução de
depoimentos de
testemunhas,
comentários de
figuras famosas
ou de
jogadores de
futebol
sobre a
partida,
pronunciamentos
importantes de
políticos,
citações
em
textos
científicos,
dentre
outros.
Todavia, as
estruturas
em
Discurso
Direto e
Indireto têm sido tradicionalmente estudadas de
modo a
privilegiar o
critério
sintático, oferecendo, dessa
forma,
um
quadro
teórico
por
demais simplista.
Além disso, as
gramáticas tradicionais tendem a
analisar essas
estruturas
apenas
em
textos
literários, deixando de
abordar
seus
usos
tão difundidos na
imprensa,
tanto
escrita,
quanto
falada.
A
fim de se
reverter
esse
quadro,
este
trabalho investigará
estruturas
em
Discurso
Direto e
Indireto
em
textos midiáticos, da
seção das
cartas dos
leitores da
Revista Veja, publicados
nos meses de
abril e
maio de 2005, tendo
por
base a
teoria sistêmico-funcional de Halliday,
mais especificamente no
que concerne às
relações lógico-semânticas de
projeção.
Dessa
forma,
este
trabalho pretende
realizar uma
análise
que envolva,
além do
critério
sintático, os
critérios
semântico e funcional-discursivo
para
que se possa
oferecer,
então,
um
quadro
mais abrangente das
diferentes
funções discursivas e variados
usos a
que se submetem essas estruturas.
A
Gramática Sistêmico-Funcional de Halliday
A
gramática sistêmico-funcional
desenvolvida
por M. A. K. Halliday é considerada de
base
funcional,
pois foi
desenvolvida de
modo a
priorizar os
usos da
língua e o
objeto de
investigação é o
texto.
Para Halliday,
são
exatamente os
usos
que deram
forma ao
sistema da
língua. A funcionalidade é
intrínseca à
língua (Halliday & Matthiessen, 2004: 31)
Dessa
forma, a
língua
não seria
arbitrária,
pois se organiza
funcionalmente, de
acordo
com as
necessidades humanas, na
interação comunicativa: “a functional grammar is essencailly a ‘natural’ grammar, in the sense that everything in it can be explained, ultimately, by reference to how language is used” (Halliday, 1994: XIII).
Quanto ao
caráter
sistêmico, Halliday explica
que
sua
teoria envolve
significado e
escolha. A
gramática de uma
língua é representada
por
redes sistêmicas,
não
por
um
inventário de
estruturas (Halliday & Matthiessen, 2004: 23). As
estruturas seriam
formas derivadas de
escolhas sistêmicas
feitas
pelo
falante: “a language is a resource for making meaning, and meaning resides in systemic patterns of choice” (Halliday & Matthiessen, 2004: 23).
A
estrutura é analisada
em
termos
funcionais.
Neves (2001: 60), ao
discorrer
sobre o
funcionalismo de Halliday, acrescenta: “as
diferentes
redes sistêmicas codificam diferentes
espécies de
significado, ligando-se,
pois, às
diferentes
funções da linguagem”.
Essa
rede
sistêmica de
escolhas corresponde a
certas
funções básicas da
língua. Halliday sugere duas metafunções
principais, a ideacional,
que se subdivide
em experiencial e
lógica, e a
interpessoal. A
terceira,
que se combina
com as outras duas e
lhes confere
relevância, é a
textual (cf. Halliday 1994, 1970 e Halliday & Matthiessen, 2004). Todas essas metafunções estão refletidas na
estrutura da
oração (Halliday, 1970: 143) e interagem na
construção do
texto, conferindo-lhe
um
caráter
multifuncional (Almeida, 2002: 39).
The multiple function of language is reflected in linguistic structure; this is the basis for recognition of the ideational (including logical), interpersonal and
textual functions (...) The investigation of these functions enables us to relate the internal patterns of language – its underlying options, and their realization in structure – to the demands that
are made on language in the actual situations in which it is used. (Halliday, 1970: 165)
Para Halliday,
como a funcionalidade é
intrínseca a
toda
língua, seria
redundante
falar
em
funções básicas. Sendo
assim, o
autor
cria os
nomes ‘metafunções’.
Essas metafunções revelam
propósitos
fundamentais do
uso da
língua. A ideacional proporciona uma
teoria da
experiência
humana
através da
língua.
Por
meio dessa
função, a
língua é
capaz de
expressar
conteúdos e
experiências do
mundo. Ao
servir a essa metafunção, as
línguas transformam
em
estrutura as
experiências humanas utilizando-se de
suas respectivas lexicogramáticas (cf. Halliday, 1970 e Halliday & Matthiessen, 2004).
Já a metafunção
interpessoal reflete o
caráter
ativo da
língua: “While construing, language is always also enacting: enacting our personal and
social relationship with the other people around us” (Halliday & Matthiessen, 2004: 29-30). Essa metafunção é
tanto
interativa
quanto
pessoal, daí
interpessoal (idem).
Por
meio dessa
função os
grupos
sociais
são delimitados e a
identidade é expressada e
desenvolvida (Halliday, 1970: 143).
Por
fim, a metafunção
textual se relaciona
com a
construção de
textos, ligando a
língua a
características da
situação
em
que é usada (idem).
Por
meio dessa metafunção, é
possível
estabelecer
relações coesivas
entre
sentenças num
discurso. Pode-se
dizer
que essa
função é instrumental
em
relação às outras duas:
...both the others – construing experience and enacting interpersonal relations – depend on beig able to build up sequences of discource, organizing the discoursive flow and creating cohesion and continuity as it moves along. (Halliday & Matthiessen, 2004: 30)
Para Halliday, o
texto se
torna,
então,
ferramenta
essencial de
investigação
para o
lingüista
que
deseja
estudar a
língua
funcionalmente,
ou seja, os
seus
usos
em
situações
reais de comunicação: “when people speak or write, they produce a text” (Halliday & Matthiessen, 2004: 03).
Para Halliday e Hasan (1976: 02), o
texto é uma
unidade
semântica, uma
unidade de
significado,
não de
forma. O
texto é,
então, relacionado a
orações
ou
sentenças
pois é
codificado, realizado,
por
elas. Sendo
assim, o
texto revela,
mais uma
vez, as
escolhas sistêmicas
feitas
pelo
falante:
...when we analyse a text, we
show the functional organization of its structure; and we
show what meaningful choices have been made, each one seen in the context of what might have been meant but was not. (Halliday & Matthiessen, 2004: 24)
Além do
texto, a
teoria sistêmico-funcional de Halliday
leva
também
em
consideração os
contextos
em
que
esses
textos se realizam,
pois os
textos variam de
acordo
com a
natureza dos
contextos
em
que
são usados (Halliday & Matthiessen, 2004: 27).
Within our
general topic, we shall be focusing on the special area of what in linguistics is referred to as text; but always with emphasis on the situation, as the context in which texts unfold and in which they
are to be interpreted. (Halliday & Hasan, 1989: 05)
Para Halliday, a
análise
lingüística deve
ser
capaz de
distinguir se
um
texto é
eficaz
ou
não
em
seus
propósitos
comunicativos. Essa seria uma
grande
contribuição da
Lingüística no
que concerne à avaliação de
textos (Halliday, 1994: XV).
Esse
nível de
análise
só se daria
com o
estudo do
texto inserido
em
seus
contextos de
uso.
We use language to make sense of our experience, and to carry out our interactions with other people. This means that the grammar has to
interface with what goes on outside language: with the happenings and conditions of the world, and with the
social process we engage in. (Halliday & Matthiessen, 2004: 24)
O
Sistema Lógico-Semântico de Projeção
A
projeção é,
juntamente
com a
expansão,
um dos
processos
que
liga
orações
para
formar
orações complexas. A
projeção é
definida
como uma
relação lógico-semântica
em
que uma
oração funciona
não
como uma
representação de uma
experiência
não
lingüística,
mas
como uma
representação de uma
experiência
lingüística (Halliday & Matthiessen, 2004: 441).
Na
relação lógico-semântica de
expansão, a
segunda
oração expande a
primeira
por
elaboração,
extensão
ou
aumento.
Já na
projeção, a
segunda
oração é projetada
por
meio da
primeira, a
qual a coloca
como
locução
ou
idéia.
Expansion relates phenomena as being of the same order as experience, while projection relates phenomena to phenomena of higher order of experience (semiotic phenomena – what people say and think). (Halliday & Matthiessen, 2004: 377)
Dessa
forma, a
projeção faz
parte da metafunção ideacional organizada no
modo
lógico, contrastando
com os
aumentos circunstanciais da
oração organizados no
modo experiencial, e
com as
seqüências coesivas da metafunção
textual (Halliday & Matthiessen, 2004: 370).
Os
muitos
usos discursivos atribuídos à
projeção incluem:
fontes de reportagens e
notícias,
representação de
pontos de
vista no
discurso
científico,
construção de
diálogos
em
narrativas,
representação de questionamentos na
conversação (Halliday & Hansan, 2004: 443).
A
projeção se realiza
por
meio de
orações
verbais,
ou
orações de ‘dizer’, e
mentais,
ou
orações de ‘sentir’. As
orações
mentais estão relacionadas a
experiências vividas no
mundo e à
consciência
humana (Halliday & Matthiessen, 2004: 197).
Para Halliday e Matthiessen (2004: 253), ‘dizer’ deve
ser interpretado
em
um
sentido
lato: “...’saying’ has to be interpreted in a rather broad sense; it covers any kind of symbolic exchange of meaning”.
A
teoria sistêmico-funcional hallidiana distingue
três
diferentes
sistemas
para a
diferenciação de
tipos de
projeção: o
nível de
projeção (idéia X
locução), o
modo de
projeção (relato hipotático X
citação paratática) e a
função discursiva (Halliday & Matthiessen, 2004: 443).
O
nível de
projeção define se a
projeção é uma
representação do
conteúdo de uma
oração
mental,
ou seja, o
que é pensado,
ou se é uma
representação do
conteúdo de uma
oração
verbal,
ou seja, o
que é
dito. A
primeira
projeção é denominada ‘idéia’ e a
segunda ‘locução’.
Isso
quer
dizer
que a
projeção envolve os
dois
níveis do
plano do
conteúdo da
língua:
projeção de
significados, ‘idéia’, e
projeção de
enunciados, ‘locução’. Halliday exemplifica essa
distinção
gramatical
com a
convenção das
Histórias
em Quadrinhos:
idéias
são representadas
em “nuvens” e
locuções
em “balões” (Halliday & Matthiessen, 2004: 443).
O
modo de
projeção define se a
projeção é uma
citação,
ou seja, se a
oração é projetada parataticamente,
ou se é
um relato,
ou seja, se é projetada hipotaticamente. Essa
distinção é
correspondente aos tradicionais
Discurso
Direto,
para
citação paratática, e
Discurso
Indireto,
para relato hipotático.
Todavia,
para Halliday, a
distinção deve
ser
feita levando-se
em
consideração
não
apenas a
forma,
como é
feita nas
Gramáticas Tradicionais,
mas
também o ‘pensamento’, ‘pensamento
direto’ e ‘indireto’ (Halliday & Matthiessen, 2004: 443).
Por
fim, a
função discursiva define se o
conteúdo do
que é projetado é uma
asserção
ou uma
proposta.
Quanto a essa
função, o
modo de
projeção
em
citação paratática permite uma
grande
variedade de
formas a serem projetadas. Pode-se
citar
desde
asserções e
propostas a
exclamações e
saudações.
Já o
modo
em relato hipotático limita-se a
asserções e
propostas
apenas.
A
citação,
correspondente ao tradicional DD, é considerada a
forma
mais
simples de
projeção. A
oração
que
projeta é
um
processo
verbal, de ‘dizer’, e a
oração projetada representa o
que é
dito (Halliday & Matthiessen, 2004: 445). O
tipo de
combinação de
orações é a parataxe,
pois as duas
orações possuem o
mesmo
status. Pode-se
notar
esse
fato a
partir da
observação da
oração projetada,
que retém todas as
características do
que foi
dito, incluindo o
modo,
vocativos,
conjunções etc., demonstrando
seu
caráter independente (Halliday & Matthiessen, 2004: 446).
What is the nature of the projected clause? The projected clause here stands for a ‘wording’: that is, the phenomenon it represents is a lexicogrammatical one. (Halliday & Matthiessen, 2004: 447)
Halliday e Matthiessen (2004: 448) listam uma
enorme
variedade de
verbos usados na
oração
que
projeta,
ou seja,
verbos
para
introduzir
citações. O
verbo de
sentido
mais
geral é o ‘dizer’.
Todavia, há
dentre
eles
verbos
específicos
para
atuar no
discurso,
como ‘anunciar’, ‘apontar’, ‘observar’,
verbos
para
questionar,
como ‘perguntar’, ‘pedir’, ‘mandar’,
verbos
com
funções
adicionais circunstanciais,
como ‘responder’, ‘protestar’, ‘interromper’, ‘insistir’, ‘gritar’ e
verbos
que sugerem
atitudes
ou
emoções,
como ‘respirar aliviado’.
Por
fim,
vale
destacar a
questão da
pontuação da
projeção
em
citação paratática
ou DD. Halliday (1989) e Halliday e Matthiessen (2004) apontam
para o
fato de
que na
escrita, a
oração projetada é marcada prosodicamente
por
pontuação,
que pode
ser representada
por
aspas
duplas
ou
simples. A
diferença
entre os
dois
modos de
pontuação marcaria,
em
princípio, no
sistema da
língua inglesa, a
projeção de
significado,
para
aspas
simples, e a
projeção de
enunciados,
para
aspas
duplas.
Segundo Halliday e Matthiessen (2004: 452),
em
relação a
aspas
duplas:
We
are unconsciously aware that when something has the
status of a wording it lies not at one but at two removes from experience; it has undergone two steps in the realization process.
Por
outro
lado, o relato,
correspondente ao tradicional DI, é considerado
um
processo
mental
em
modo hipotático (Halliday & Matthiessen, 2004: 448).
Seus
usos incluem a
representação dos
pensamentos do locutor ou do
interlocutor no
diálogo, a
representação da
consciência de
um
personagem, a
representação do
pensamento de
experts e
pontos de
vista de
autores renomados no
discurso
científico e a
representação de
crenças e
opiniões no
discurso
jornalístico.
A
diferença
fundamental
entre a
citação e o relato está no
fato de
que no
segundo, a
oração
que
projeta contém
um
verbo de
processo
mental,
enquanto na
citação, o
processo é
verbal.
Além disso, no relato, a
oração projetada representa
um
significado,
não
um
enunciado,
como na
citação. No relato é representada uma
idéia,
enquanto na
citação o
que se
encontra é uma
locução (Halliday & Matthiessen, 2004: 449).
Something that is projected as meaning is still a phenomenon of language (...); but it is presented at a different level – semantic, not lexicogrammatical. When something is projected as a meaning it has already been ‘processed’ by the linguistic system – it is a phenomenon of experience that has been construed as a meaning; but processed only once, not twice as in the case of a wording, where a phenomenon of experience is construed first as a meaning and then in turn as a wording. (Halliday & Matthiessen, 2004: 451)
Para Halliday e Matthiessen (2004: 452), a
projeção de
significado é
dependente do
processo
mental explicitado na
oração
que
projeta,
por
isso a
forma
padrão de
combinação é a hipotaxe.
Portanto, a
oração projetada é
dependente da
oração
mental
que a
projeta.
Halliday e Matthiessen (2004: 450) fazem
também
um
inventário dos
verbos de
processo
mental
que introduzem relato hipotático.
Dentre
eles, o
mais
geral é o ‘pensar’, no
sentido de
expressar
opinião,
além de ‘acreditar’, ‘achar’, ‘lembrar’, ‘saber’, ‘ocorrer’ e ‘duvidar’. No relato hipotático,
quando a
oração projetada está
em
forma de
asserção,
ela é precedida de ‘que’ (that).
Halliday e Matthiessen (2004: 453)
também admitem a possibilidades de se
reportar
um
enunciado, representando-o
como
um
significado Essa é a
forma tradicional do DI das
Gramáticas Tradicionais,
que propõem muitas
regras de transposição de DD
para DI. Da
mesma
forma, é
também
possível
representar
um
processo
mental,
ou seja,
um
pensamento,
em
forma de
citação (Halliday & Matthiessen, 2004: 456).
Para os
mesmos
autores,
quando há uma
representação hipotática de
um
processo
verbal, de ‘dizer’, o
princípio
que o determina é o
fato de
que o
que é reportado
não é necessariamente o
que foi
realmente
dito.
Contudo, Halliday e Matthiessen (2004: 454) acrescentam:
This is not to suggest, of course, that when a
speaker uses the paratactic, ‘direct’ form he is always repeating the exact words; far from it. But the idealized function of the paratactic structure is to represent the wording; whereas with hypotaxis the idealized function is to represent the sense, or gist.
Por
fim, é
importante
ressaltar
que na
citação paratática, a
perspectiva
central da
oração projetada é aquela marcada
pela
pessoa
que pronunciou aquelas
palavras.
Já no relato hipotático, a
perspectiva
central da
oração projetada é a do
locutor (Halliday & Matthiessen, 2004: 452-3). Daí todas as
regras de transposição, de
tempo,
circunstância e
pessoa, das
Gramáticas Tradicionais.
Análise dos
Dados
Foram analisados
sete
textos da
seção das
cartas dos
leitores da
Revista Veja, publicados
nos meses de
abril e
maio de 2005. Ao
todo foram encontradas doze
ocorrências
em
forma de DD,
ou
citação paratática, e uma
ocorrência
em
forma de DI,
ou relato hipotático.
Esses
textos configuram-se
como
comentários,
escritos
por
jornalistas
ou
editores da
Revista Veja, a
cartas enviadas de
leitores
que apontam
erros cometidos
pela
revista.
Por
ser
um
texto
midiático, de
função informativa e
persuasiva, é encontrado
um
maior
número de
estruturas
em
citação paratática
ou DD,
pois há a
forte
tendência
para
representar as “verdadeiras”
palavras dos
interlocutores, de
modo a demonstrar
credibilidade
em
seu
discurso.
Tabela I:
estruturas
em
citação paratática (DD)
e relato hipotático (DI) encontradas.
Estruturas
em
citação paratática (DD): 12 ocorrêcias |
Exemplo
Depois de
ler a
matéria "O
alvo errado do
plebiscito" (Contexto, 20 de
abril), o
leitor Ricardo Henrique Cavagna,
advogado
em José Bonifácio (SP), escreveu: "Há
menções ao
termo
plebiscito referindo-se à consulta
popular
sobre a possibilidade da
proibição da
comercialização de
armas de
fogo e
munições
em
todo o
território
nacional. Na
verdade, o
termo
técnico
correto é
referendo".
Revista Veja, 4/ 5/ 2005 |
Estruturas
em relato hipotático (DI): 1
ocorrência |
Exemplo
Ananias
Pereira de Souza, de
Montes
Claros,
Minas
Gerais, e
outros
dez
leitores advertem
que
esse
famoso
problema matemático está concluído.
Revista Veja, 27/ 4/ 2005 |
O
único
exemplo
em relato hipotático
ou DI encontrado ocorre
por
meio de
um
processo
verbal,
ou seja, a
oração é projetada a
partir de uma
oração ‘verbal’,
com o
verbo ‘advertir’, o
mesmo
que
chamar a
atenção
ou
observar, encontrados na
lista de
verbos de ‘dizer’ de Halliday & Matthiessen (2004: 4448).
Acredita-se
que o relato hipotático foi a
forma escolhida
pelo
autor do
texto pelas
seguintes
razões: a) a
projeção é atribuída a
três
interlocutores,
ou seja, seria
difícil
representar as efetivas
palavras
que
cada
um teria
escrito; b) o
autor do
texto resumiu
em uma
oração a
idéia, e
não as exatas
palavras
ou
locução do
que foi
dito
pelos
três
interlocutores, daí a
sua classificação
como relato hipotático; c) o
autor escolheu
um
verbo de ‘dizer’
para
conferir “veracidade”,
ou seja,
credibilidade ao
discurso,
seu
efeito
persuasivo seria
menor se o
verbo escolhido fosse
um
verbo de ‘sentir’
ou ‘pensar’.
Quanto às
formas
em
citação paratática,
três
orações complexas apresentaram
formas precedidas
pela
conjunção
integrante ‘que’ (cf.
Tabela II),
como nas
formas
em relato hipotático.
Porém, as
orações projetadas representam o
enunciado proferido
pelos
interlocutores,
fato
este ratificado
pela
utilização de
aspas
para
marcar o
que foi
dito.
Entende-se que nos casos de citação paratática em que houve a
utilização da
conjunção
integrante ‘que’, persiste esse
modo de projeção nas
três
orações complexas,
pois as
orações projetadas continuam a
possuir o
mesmo
status
que a
principal,
além de
sua
independência, demonstrando
modo,
tempo e
circunstâncias próprias e, o
mais
importante, o
ponto de
vista de
quem proferiu o
enunciado, e
não do
locutor
ou
autor do
texto.
Há ainda o
caso do
exemplo “Ungaretti Junior lembrou
ainda
que "o
último
plebiscito a
que o
povo
brasileiro foi convocado...”” que é
muito interessante,
pois se
trata de uma
citação introduzida
por
processo
mental (‘lembrou’).
Entretanto, o
nível de
projeção permanece o de
citação,
pois a
oração projetada representa uma
locução, e
não uma
idéia.
Tabela II
EXEMPLO DE CITAÇÃO PARATÁTICA PRECEDIDA
POR ‘QUE’ |
Ungaretti Junior lembrou
ainda
que "o
último
plebiscito a
que o
povo
brasileiro foi convocado serviu
para
decidir
sobre
parlamentarismo
ou
presidencialismo e
entre monarquia e
república,
em 1993".
Revista Veja, 4/ 5/ 2005 |
Encabeçando a
lista dos
verbos
mais encontrados na
oração
que
projeta uma
citação paratática (cf.
Tabela III) está o
verbo ‘escrever’,
com
quatro
ocorrências.
Isso advém da
natureza dos
textos e
seus
contextos de
produção. O
verbo
mais
geral de ‘dizer’
que
projeta
citação paratática da
lista de Halliday e Matthiessen (2004: 448) é o ‘dizer’ propriamente
dito.
Todavia, os
autores se reportam a
citações de
enunciados proferidos
oralmente
pelos
interlocutores. No
caso dos
textos
aqui estudados, os
autores representam as
palavras
escritas
pelos
leitores nas
cartas enviadas à
revista. Os
jornalistas e
editores,
autores dos
textos, acabam
por
conferir à
citação o
caráter de
representação do
discurso
escrito e
não
oral.
É
natural,
portanto,
que o
verbo
mais
geral, nesses
contextos de
projeção, seja o ‘escrever’, e
não o ‘dizer’. ‘Informou’ vem
em
segundo
lugar,
com 2
ocorrências, seguido
por ‘citou’, ‘explicou’, ‘esclareceu’ e ‘resumiu’,
todos
com uma
ocorrência. Nesses
outros
casos, à
exceção de ‘escreveu’, o
caráter de
representação de
um
discurso
escrito
não é marcado.
Ademais,
todos
esses
verbos representam
processos
verbais.
Quanto à
citação paratática projetada
por ‘ter’ (uma
dúvida), percebe-se
que
não se
trata de uma
asserção e
sim de uma
pergunta
ou
proposta. A
lista de Halliday e Matthiessen (2004: 448) prevê
muitos
verbos
que projetam
propostas,
como “sugerir’, ‘oferecer’, ‘concordar’, ‘ordenar’, ‘pedir’, ‘dizer’, ‘chamar a
atenção’ etc. “Ter uma
dúvida” é o
mesmo
que “pedir”
para
que alguma
coisa seja
dita
em
resposta à dúvida.
Tabela III
Verbos
introdutores de DD encontrados |
Nº de
ocorrências |
Escreveu |
4 |
Informou |
2 |
Citou |
1 |
Explicou |
1 |
Esclareceu |
1 |
Resumiu |
1 |
Ter (uma
dúvida) |
1 |
Lembrou |
1 |
TOTAL |
12 |
Conclusão
A
análise sistêmico-funcional de formas
em DD e DI demonstrou a
importância de
um
estudo
que
leve
em
consideração os
efetivos
usos e
funções discursivas dessas
estruturas.
Isso
só é
possível ao se
considerar
textos produzidos
em
contextos
reais de
interação comunicativa, como os contextos midiáticos.
Somente o
texto, inserido
em
seus
contextos de
uso, é
capaz de
proporcionar ao
lingüista
um
estudo
mais abrangente dos
usos da
língua e, dessa
forma,
revelar os
padrões de
escolha
sistêmica e os usos de
que dispõe o
falante.
Of course, structure is an
essencial part of the description; but it is interpreted as the outward form taken by systemic choices, not as the defining characteristic of language. Language is a resource for making meaning, and meaning resides in systemic patterns of choice. (Halliday & Matthiesse, 2004: 23)
Referências Bibliográficas
ALMEIDA. P. M. C. Atendimento de ‘check-in’ de
companhia
aérea:
análise sistêmico-funcional de
um
gênero discursivo do
português.
Dissertação de
Mestrado. PUC-Rio:
Departamento de
Letras, 2002.
––––––. Language structure and language function. In: LYONS, J. (ed). New horizons in Linguistics. Great Britain: Penguin Books, 1970.
––––––. Spoken and written language. Oxford: Oxford University Press, 1989.
HALLIDAY, M. A. K. & HASAN, R. Cohesion in English. London: Longman, 1976.
HALLIDAY, M. A. K. & HASAN, R. Language, context, and text: aspects of language in a social-semiotic perspective. Oxford: Oxford University Press, 1989.
HALLIDAY, M. A. K. & MATTHIESSEN, C. M. I. M. An introduction to functional grammar. 3rd ed. Great Britain: Arnold, 2004.
NEVES, M. H. de M. A
gramática
funcional.
São Paulo: Martins
Fontes, 2001.
ROCHA
LIMA, C. H. da.
Gramática normativa da
língua portuguesa.
Rio de
Janeiro: José Olympio, 2000.