UMA INTRODUÇÃO À ANÁLISE CONTRASTIVA
DOS PRONOMES ITALIANOS E PORTUGUESES
Ilduara Silveira (UERJ)
Carmem Praxedes (UERJ)
INTRODUÇÃO
Ensino e Práticas de Ensino em Línguas Estrangeiras – o caso do Italiano, é o título do projeto de pesquisa, cujo objetivo geral é propor um modelo de ensino-aprendizagem de Italiano - Língua Estrangeira – ITAL/ LE - que busque atender às necessidades básicas do aprendiz desta língua em nível universitário no Brasil. Para tanto, guiamo-nos pela nossa experiência em sala de aula que apontava para o atendimento da necessidade de analisar contrastivamente as partes do discurso, em que os estudantes da habilitação em Português Italiano da UERJ apresentavam maior dificuldade de sistematização, não só na aquisição da nomenclatura gramatical, mas também, e principalmente, na compreensão textual. Sendo assim, propusemos e desenvolvemos com os nossos alunos de graduação, na referida habilitação, trabalhos e estudos sobre o artigo, os pronomes, os verbos e as preposições. Nestes trabalhos, lançamos mão dos estudos de Pierini (2005) sobre a lingüística contrastiva aplicada ao caso do italiano, dos pressupostos da Semiótica de Eco (1993) e dos estudos de Pais (1993), especialmente aqueles referentes à produção da visão de mundo, à dinâmica e coerência da produção de significação, da análise conceptual e da atualização sêmica e lexical.
OBJETO DE ESTUDO E METODOLOGIA:
Neste primeiro momento, analisamos os modelos normativos do Italiano e do Português considerando, especialmente, as partes do discurso destacadas. Realizamos o contraste, com vistas a evidenciar as suas características comuns e/ou distintas. Mas, o nosso maior interesse centrava-se na compreensão da forma de pensar do italiano, naquilo que é posto e pressuposto em situação textual, ou seja, como as preposições, verbos e pronomes expressam um conteúdo semântico e realizam-se num processo de significação discursivo peculiar àqueles que pensem à italiana, que engendram para além do nível superficial do texto uma estrutura profunda em que seu conhecimento pré-existente possa ser manifestado. Então, neste sentido, não basta ao estudante fixar as regras gramaticais se não possuir uma aceitação/compreensão dos dados culturais, da forma de perceber e organizar os objetos, coisas e seres do mundo. Na análise dos pronomes, pudemos notar tal caráter cultural, principalmente, no uso das formas de cortesia. Isto posto, passamos para a análise lingüística propriamente dita; que se concentra na produção do utente de uma determinada língua natural; que neste estudo partiu das observações dos estudantes de graduação em PORT/ITAL da UERJ e nos seus desvios no emprego das partes do discurso envolvidas.
RESULTADOS:
Especificamente para o emprego e compreensão dos pronomes italianos, temos a relatar que a aceitação do conceito da língua materna – LM, no caso o Português do Brasil – PB, transfere-se para o italiano, causando, em muitos casos, interferências por conta da nomenclatura pronome substantivo e pronome adjetivo, uma vez que em italiano, pronome é rigorosamente aquilo que se coloca no lugar do nome (pronomen) e nome em italiano é apenas o substantivo, enquanto que em português tanto o substantivo, quanto o adjetivo podem ser considerados nomes, ou seja, nome em italiano é sinônimo de substantivo enquanto que em português, além de substantivo, ele nos remete também para o adjetivo (CAMARA JUNIOR: 1977, p.177). Como o ensino de uma língua pode ter diversos caminhos, notamos que em pelo menos dois tipos de descrição/explicação, fomos levados aos mesmos entraves na aquisição da norma italiana, ou seja, partindo do conceito do termo pronome ou da análise textual da função pronominal, tanto uma quanto a outra levava o estudante ao mesmo choque na construção dos sentidos gramaticais. Todavia, uma vez que essas diferenças sejam apontadas e tratadas como aquilo que faz com que uma língua seja diferente da outra, em virtude dos elementos histórico-culturais que nela se expressam; os alunos assumem o pacto e se esforçam para empregar os pronomes consoante com o entendimento italiano. Dando prosseguimento, em nível morfológico, com recorte centrado nos pronomes pessoais, que na função de sujeito têm aceitação bastante fácil, mas que apresentam dificuldades dentro do próprio sistema lingüístico italiano, por que este possui uma grande quantidade de dialetos e grande interferência dos meios de comunicação, que fazendo uso do italiano coloquial, contribuem, ainda mais, para a fixação das formas loro e lui na função de pronomes pessoais sujeito, quando, normativamente, são considerados pronomes complementos. Por isso, ao destacar os pronomes pessoais, cabe ao professor sinalizar que por contato com a variação diamésica; que ao mesmo tempo que unifica a língua padrão, socializa algumas marcas dialetais; existe, atualmente, na Itália um grande uso do pronome complemento loro na função de sujeito; ex.: Loro mangiano – não obstante esta função ainda não ter sido aceita normativamente. Para os pronomes na função de complemento direto ou indireto, o primeiro equivale ao português na função de objeto direto, enquanto o segundo à função de objeto indireto (complemento di termine). Entretanto, é importante salientar que em italiano existem muitos complementos indiretos, nem sempre categorizados como equivalente ao objeto indireto português. É também relevante observar que a nomenclatura gramatical de alguns complementos ainda vigentes na Itália, já tiveram espaço na NGB, conforme pudemos notar no Dicionário de Termos Abolidos. E é exatamente na conceptualização do uso normativo e extranormativo dos complementos, principalmente, indiretos italianos que o estudante brasileiro apresenta maior resistência inicial. Mas, a partir de uma exposição contrastiva dos dois sistemas, ele avança na compreensão e na aceitação da visão de mundo do outro povo. Esclarecemos que os resultados que ora apresentamos têm ainda um caráter parcial, todavia vêm sendo testados e confirmados há 04 anos. O quadro que segue fornecer-nos-á uma visualização, em nível morfológico, do anteriormente afirmado.
Tabela 1
I pronomi italiani |
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Pronomi personali in funzione di soggetto |
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Pronomi personali in funzione di complemento Forme toniche o forti |
Forme atone o deboli |
1ª persona singolare |
Io |
Me (di me, a me, con me, ecc[1] ) |
Mi |
2ª persona singolare |
Tu |
Te (di te, a te, con te ecc) |
Ti |
3ª persona singolare |
Maschile: Egli (lui) esso |
Lui (di lui, a lui, con lui ecc) sé, ciò |
Lo, gli, lui, esso, ne (=di lui), si |
Feminile: Ella (lei) essa |
Lei (di lei, a lei, con lei) sè |
La, le, essa, ne (=di lei), si |
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1ª persona plurale |
Noi |
Noi (di noi, a noi, con noi ecc) |
Ci |
2ª persona plurale |
Voi |
Voi (di voi, a voi, con voi ecc) |
Vi |
3ª persona plurale |
Maschile: Essi (loro) |
Essi, loro (di loro, a loro, con loro ecc), sé |
Li,ne (=di loro),si |
Feminile: Esse (loro) |
Esse, loro (di loro, a loro, ecc), sé |
Le, ne (=di loro), si |
Tabela 2
Os pronomes portugueses |
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Pronomes pessoais retos |
Pronomes pessoais oblíquos |
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1ª pessoa do singular |
Eu |
Tonicos (com preposição) |
Àtonos (sem preposição) |
2ª pessoa do singular |
Tu |
Mim |
Me |
3ª pessoa do singular |
Masculino: Ele |
Ti |
Te |
Feminino: Ela |
Ele, si |
Lhe,o,se |
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Ela, si |
Lhe, a,se |
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1ª pessoa do plural |
Nós |
Nós |
Nos |
2ª pessoa do plural |
Vós |
Vós |
Vos |
3ª pessoa do plural |
Masculino: Eles |
Eles, si |
Lhes, os, se |
Feminino: elas |
Elas, si |
Lhes, as, se |
Tabela 3
Pronomi personali in funzione di soggetto / Pronomes pessoais do caso caso reto |
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I pronomi italiani / os pronomes portugueses |
Contraste |
Io |
Referem-se à pessoa do discurso que fala |
Eu |
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Tu |
Referem-se à pessoa com quem se fala. |
Tu |
|
Egli |
Referem-se somente à pessoa de quem se fala. |
Ele |
|
Lui |
Lui se refere à 3ª pessoa do singular, ou seja, de quem se fala, e è um pronome complemento indireto. Em função de sujeito, é mais usado que Egli, no italiano coloquial. |
Ele |
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Esso |
Esso se refere à 3ª pessoa do singular, ou seja, de quem se fala, substitui no discurso somente o nome de animal ou coisa do gênero masculino. |
Ele |
|
Ella |
Referem-se somente à pessoa de quem se fala. |
Ela |
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Lei |
Lei se refere à 3ª pessoa do singular, ou seja, de quem se fala, sendo mais usado que Ella, podendo substituir o nome de pessoa, animal ou coisa de ambos os sexos. Lei é usado também como forma de cortesia. |
Ela |
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Essa |
Essa se refere à 3ª pessoa do singular, ou seja, de quem se fala, substitui, no discurso, o nome de pessoa animal ou coisa do gênero feminino. |
Ela |
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Noi |
Indicam mais de uma pessoa da qual faz parte aquela que produz o discurso (primeira pessoa plural). |
Nós |
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Voi |
Indicam mais de uma pessoa com quem se fala. |
Vós |
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Essi |
Indicam mais de uma pessoa de quem se fala. |
Eles |
|
Loro |
Loro è um pronome complemento indireto, sendo usado como pronome pessoal, no italiano coloquial Na variação diamésica é mais usado que Essi, e pode substituir o nome de pessoa, animal ou coisa. |
Eles |
|
Esse |
Indicam mais de uma pessoa de quem se fala. |
Elas |
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Loro |
Loro e è um pronome pessoal em função de sujeito sendo mais usado que Essi,, e pode substituir o nome de pessoa, animal ou coisa. |
Elas |
CONCLUSÃO
Ainda parcialmente, podemos concluir que numa visão morfossemântica o italiano possui uma quantidade maior de formas pronominais que transitam da modalidade escrita para a falada com usos diversificados, inclusive funcionalmente, o que causa ao estudante universitário brasileiro, principalmente para aquele que ainda não tenha tido contato com esta língua previamente, pois terá de conhecer e reconhecer o sistema, os usos e a norma da língua italiana em um período regular de quatro anos.
Diante de tal situação, o professor de Italiano - LE para brasileiros terá de usar estratégias de ensino-aprendizagem que mantenham o foco na fixação, discussão e análise das estruturas desta língua, sem perder de vista os investimentos histórico-culturais do povo italiano.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa. Rio de Janeiro: Lucerna, 2001.
COSERIU, Eugênio. Lições de Lingüística Geral. Rio de Janeiro: Ao Livro técnico: 1980.
CAMARA JR, Joaquim Mattoso. Estrutura da Língua Portuguesa. Petrópolis: Vozes, 1984.
DARDANO, Maurizio e TRIFONE, Pietro. Grammatica Italiana con nozioni di Linguistica. Bologna: Zanichelli, 1999.
GREIMAS, A. J. &COURTÉS, J. Dicionário de Semiótica. São Paulo: Cultrix, 1989.
PAIS, Cidmar Teodoro. Conditions semantico-syntaxiques et semiotiques de La productivite systemique, lexicale et discursive. Thèse de Doctorat d’Etat ès-Lettres et Sciences Humaines. Directeur de Recherche: Bernard Pottier. Paris, Universitè de Paris- Sorbonne (Paris IV), Lille, Atélier National de Réproduction des Thèses, 1993.
OLIVEIRA, Candido de. Dicionário Gramatical. II vol. São Paulo: Ed. FTD.
PIERINI, Letizia. Principi di Lingüística Contrastiva. Roma: Università di Roma Tre/ Italian Culture on the Net, www.italicon.it, 2004.
OLIVEIRA, Candido de. Dicionário Gramatical. II vol. São Paulo: Ed. FTD.
RECTOR, Monica & YUNES, Eliana. Manual de semântica. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1980.
SENSINI: Marcelo. La Grammatica della Lingua Italiana. Milano: Mondadori, 1997.
[1] Ecc (Eccetera ital.) equivale ao Port. Etc (etecétera adv., abrev. etc., do lat. et coetera). A abreviação etc também é usada em italiano.