DESVIOS COMETIDOS NA INTERAÇÃO

Renata da Silva de Barcellos (CETOP – UFF)

 

INTRODUÇÃO

O presente minicurso visa refletir sobre os desvios cometidos consciente ou inconscientemente (gafe, mal-entendido, dentre outros), ao longo de uma situação comunicativa. Nesse sentido, então, almejamos contribuir com uma possibilidade de análise interacionista (o trabalho será desenvolvido na área de Estudos Lingüísticos à luz da Sociolingüística Interacional) desses fenômenos, a partir dos seguintes conceitos provenientes da pragmática e dos estudos das interações: footing (Goffman: 2002) e preservação da face (Goffman: 1975), polidez (Goffman: 1974), enquadre (Goffman: 1974), negociação (Kerbrat– Orecchioni: 2000) identidade (Charaudeau: 1991 & Kerbrat-Orecchioni: 2000) e cultura (Trouche apud Júdice, 2005: 69).

 

FALHAS CONSCIENTES OU INCONSCIENTES

Nesta parte, apresentaremos os desvios cometidos intencionalmente ou não. Vejamos:

 

Grosseria é a expressão e/ou gesto que denotam descortesia, incivilidade, ausência de educação, caráter, atributo do que é grosseiro mal-educado, incivil” (Houaiss, 2001). Vejamos o exemplo abaixo:

Na entrada da estréia do circo de Soleil, no Rio de Janeiro,  um dos filhos da Fernanda Torres, Joaquim, acompanhado  da família, ao ver os fotógrafos, virou o rosto e levantou o  dedo médio em direção a eles. (O Globo, 04/11/07)

Ao realizar um ato não linguageiro “levantar o dedo médio”, cujo valor ilocutório seria de “parem, não quero ser fotografado”, Joaquim demonstrou seu incômodo com os flashes em sua direção. Podemos dizer que o gesto de Joaquim soou como uma ofensa aos fotógrafos. E pelo fato de ele ser filho de artistas e de estar num local público, o insulto ameaçou a face dos fotógrafos e a de seus pais, por levar as pessoas a pensarem: “que tipo de educação recebe dos seus responsáveis?”. Isso significa dizer que, em qualquer interação, o indivíduo deve procurar agir de acordo com uma linha de conduta, por intermédio de um padrão de comportamento verbal, não-verbal e paraverbal, a fim de preservar a sua face e a dos outros interlocutores.

Dessa forma, a noção de polidez é de suma importância para tratarmos a grosseria. Ela consiste numa estratégia de preservação da face. Como nas trocas os participantes se preocupam em manter um certo controle da situação, eles se esforçam para evitar possíveis acidentes de comunicação ou para atenuá-los. As regras de polidez tornam-se, então, uma estratégia necessária nas interações, pois elas configuram “uma forma de otimizar a comunicação. A pessoa se mantém polida, também, para evitar situações que a deixem embaraçada” (Villaça, apud Mollica, 2004: 55). Portanto, alguns elementos são determinantes para que a grosseria comprometa a face de um dos interagentes. São eles: a identidade da pessoa que fez a grosseria, a sua posição social, o contexto no qual está inserido e o tipo de interação (assuntos a serem tratados posteriormente). Vejamos o seguinte exemplo: numa recepção, o senador Antônio Carlos Valadares, de Sergipe, se dirigiu a uma colega desta forma:

– A senhora é mais gorda pessoalmente do que na TV.

A elegante vítima mal recobrava a respiração e foi abatida por outra “gentileza” do senador:

Eu vou te mandar uns chás de pata-de-vaca. Mas a senhora precisará do apoio de uma esteira. (O Globo 16/12/2006)

Nesta situação interlocutiva, através dos atos de linguagem realizados pelo senador, observamos uma seqüência de grosserias. Inicialmente, quando efetua um ato direto afirmativo: “A senhora é mais gorda pessoalmente do que na TV”, cujo valor ilocutório seria depreciativo, em que não declara considerar a pessoa a quem se apresenta fora de forma, como também intensifica esta caracterização “gorda” ao utilizar o advérbio de intensidade “mais”. Quando retoma a palavra depoisEu vou te mandar uns chás de pata-de-vaca. Mas a senhora precisará do apoio de uma esteira”, fica implícito[1] que além da colega precisar fazer um regime (através da sugestão do chá de pata-de-vaca), necessita do auxílio de uma esteira para obter algum resultado (inferimos isso por meio da utilização da conjunção adversativa “mas”).

 

Mal-entendido é definido como “uma defasagem entre o sentido codificado pelo locutor (sentido intencional, que o emissor deseja transmitir ao destinatário) e o sentido decodificado pelo receptor” (Kerbrat-Orecchioni, 2005: 62). Ele é caracterizado pela divergência de interpretação cuja responsabilidade é freqüentemente atribuída ao único receptor que não capta a intenção comunicativa do locutor, pois produz um outro sentido a uma ação praticada pelo seu interlocutor (Grunig, 1985). Resulta assim de uma inadequação entre a intenção que o locutor confere a sua ação e a interpretação feita pelo interlocutor. Por exemplo:

F. relata que estava na casa de P., à tarde, para pagar uns produtos de beleza da Natura a mãe desta, C. Durante a conversa, P. resolve comprar algumas guloseimas para preparar o lanche. Nesse momento, C. diz à P.:

Traga a minha carteira!

– Tenho dinheiro. Não é preciso, obrigada.

Não. A carteira é para eu colocar o meu dinheiro, senão pode sumir.

(episódio ocorrido em janeiro de 2004)

Nessa troca, ao realizar um ato direto solicitativo “ Traga a minha carteira!” C. leva P. ao equívoco. Como P. não reconheceu a intenção de C. implícita em seu enunciado, replicou: “ Tenho dinheiro. Não é preciso, obrigada”, cujo valor ilocutório seria de recusa por estar implícito que C. estivesse se oferecendo para pagar as compras e não que pretendia simplesmente guardar o dinheiro recebido.

 

Mentira é definida como “uma afirmação contrária à verdade a fim de induzir a erro, pensamento, opinião ou juízo falso” (Houaiss, 2001). No momento em que a mentira é descoberta, o mentiroso tem a sua face ameaçada. Quem relata uma mentira, sabe a verdade e por algum motivo não a declara, como neste exemplo: o pastor Ted Haggard, líder evangélico americano, presidente da Associação Nacional de Evangélicos, que foi envolvido num escândalo homossexual, negou, inicialmente. Mas com o desdobramento do caso, confessou através de uma carta dirigida a fiéis. Vejamos:

Lamento as circunstâncias que provocaram tanta vergonha. Sou culpado de imoralidade sexual. E aceito a responsabilidade por todo o problema. Sou um mentiroso. Há uma parte de minha vida que é tão obscura e repulsiva que venho lutando contra isso durante toda a minha vida (...) neste momento minha confiabilidade é questionável. (O Globo, 09/01/2006

Neste caso, a mentira compromete ainda mais a face de Ted por causa de sua identidade (de ser um pastor) e da sua posição social (líder evangélico). Diante da prática de tais ações (relações com um garoto de programa e uso de drogas), esses elementos contribuíram para o agravamento da mentira cometida. Afinal, foram encontradas “provas irrefutáveis de que a pessoa que a disse sabe que está mentindo e o faz deliberadamente” (Goffman, 1975: 62). Assim, devido ao fato de ter refutado a acusação, quando o garoto de programa Mike Jones o denunciou, declarando que o pastor lhe havia pago para manter relações sexuais com ele; e também que havia consumido metanfetamina, Haggard tornou-se um mentiroso. Ao ser descoberta a verdade, ele assume tal prática (por meio de uma carta em que confirma o fato e renuncia o cargo de pastor), porque, neste caso, “o indivíduo surpreendido em flagrante no ato de dizer mentiras descaradas não apenas ficam desacreditadas durante uma interação, mas também podem ter sua dignidade destruída” (ibidem, 63). Nesse sentido, observamos que a mentira destruiu a imagem do pastor. Neste caso, como disse Kant, a mentira é “um crime que o homem comete contra si mesmo”.

 

Ironia

Historicamente, a noção de ironia consiste em dizer o contrário daquilo que se pensa, com intenção sarcástica ou depreciativa. Atualmente, alguns estudiosos vêm pesquisando esse tema, dentre eles, Kerbrat-Orecchioni, em Problemas de ironia (1976), que a define como uma contradição entre o que é dito e pensado por um mesmo individuo. Por exemplo: depois do erro cometido pela assistente Ana Paula contra o time Botafogo (ver página 42), o Flamengo passou a temer que o juiz Heber Roberto Lopes (por causa das reclamações contra a colega) entre em campo pressionado ou com pena do adversário. Por isso, o vice de futebol Kleber Leite declarou:

Com tanta reclamação. Parece que o mundo caiu e  o Botafogo é um pobre coitado. O juiz indo para o  jogo coagido. Além de linda, Ana Paula é muito competente e os lances que eles reclamam são complicados. (O Globo 25/05/07)

Nesta situação interlocutiva, observamos que os comentários não feitos contra o Botafogo caracterizam um deboche “.parece que o mundo caiu e o Botafogo é um pobre coitado” por causa da eliminação do time na Copa do Brasil, como também em relação à Ana Paula “é muito competente”, pois o que aconteceu com o Botafogo foi conseqüência do erro dela. Constatamos assim neste exemplo que Kleber Leite, ao utilizar o recurso da ironia, comprometeu a sua face por causa da sua identidade um profissional da área, vice de futebol, por isso, sabe a gravidade do erro e a sua conseqüência) e do conteúdo declarado (todos que tinham conhecimento do fato, sabiam da sua gravidade). Portanto, ao fazer tal declaração e as pessoas perceberem a ironia, Kleber compromete a sua face.

 

Gafe é definida por nós como o surgimento de uma ação (constituída pela realização de atos de linguagem[2] e/ou de atos não linguageiros) involuntária, imprevista ou até mesmo intencional praticada por um dos participantes, mas inadequada à situação comunicativa, cuja conseqüência é a desestabilização do curso da interação e ameaça à face do alvo. Vejamos o seguinte exemplo:

No carnaval de 2006, no camarote da Grande Rio, quando a atriz Suzana Vieira chegou, um repórter lhe fez a seguinte pergunta:

– Suzana, vamos fazer um ao vivo rapidinho? Conta pra gente, você vai desfilar ou vai ver aqui do camarote?

A atriz caiu na gargalhada. Gente, o que eu faço? Você não jornal, meu amor? (O Globo 26/02/07)

Na seqüência acima, a gafe é cometida no momento em que o repórter pergunta (através de um ato de linguagem direto) se a atriz desfilará ou nãovocê vai desfilar ou vai ver aqui do camarote?”. A atriz surpresa com o que ouviu, reage da seguinte maneira: primeiro, um comportamento não-verbal: gargalhada, que desempenha o papel de complementar[3] o verbal, pois indícios do absurdo de um jornalista não saber da função dela na Grande Rio. E segundo, a atriz realiza dois atos de linguagem: um direto gente, o que eu faço?”, se dirigindo a quem estava a sua volta e ouviu a pergunta (em que o repórter comete a gafe por falta de conhecimento); e um ato de linguagem indiretovocê não jornal, meu amor?” cuja força ilocutória de repreensão, embora o enunciado se apresente formalmente como uma pergunta.

 

Ato falho & lapso

Primeiramente, cabe ressaltar que o ato falho e o lapso são denominados de parapraxia por Freud na obra intitulada A psicopatologia da vida cotidiana (1974). Neste livro, analisa estes fenômenos para demonstrar a existência de processos mentais inconscientes nas pessoas sadias, atribuindo o surgimento deles à interferência de algum desejo, conflito ou seqüência de pensamentos inconscientes. Ou seja, trata-se de um distúrbio onde as palavras apropriadas são substituídas por palavras inapropriadas que conservam, entretanto, com as primeiras, alguma espécie de relação.

O lapso, que “ consiste em colocar outra palavra no lugar do que se pretendia dizer” (Freud, 1974:37), é um distúrbio da fala, que pode ser cometido por duas razões: primeira, pela influência de outro componente, como a antecipação de um som dentro de uma sentença no contexto; ou por questões exteriores à fala no contexto (como no exemplo abaixo de Dunga). Segundo Freud, há três tipos de lapso: língua, leitura e audição. Vejamos um deles:

lapso de língua: “erro involuntário na pronúncia ou na escrita de uma palavra que altera o seu sentido” (Doron & Parot, 2001) como no exemplo abaixo em que o técnico Dunga profere “sugerimentos” em vez de “sugestões”:

Depois de um jogo em que seu time ganhou na Suíça, numa entrevista, ao ser elogiado pela sua elegância, o técnico Dunga diz:

– Gabriela dá seus sugerimentos (O Globo, 16/08/2006)

Segunda razão, o lapso pode ocorrer devido ao emprego de uma palavra por outraum engano” (Péeron, 1996). Por exemplo, no segundo caderno, na coluna do Artur Xexéo, o jornalista relata o constrangimento que sofreu na entrega dos prêmios “Comunique-se”. Quando foi chamado para receber o seu prêmio, o troféu das mãos de Vercilo, fez um discurso para homenagear algumas pessoas. Dentre elas, pretendia homenagear a editora de cultura da revista Carta capital, Ana Paula Souza. Mas nesse momento:

E por alguma razão inexplicável, referi-me a Ana Paula  como Ana Cláudia. Ana Cláudia para , uma vez, Ana  Cláudia para , duas vezes, falei três vezes o nome Ana  Cláudia Souza, que por sinal, é outra coleguinha, tão  talentosa e simpática quanto Ana Paula que eu queria  homenagear, mas que não concorria a nada (...) Estou há uma semana ajoelhado no milho e repetindo como um  mantra Ana Paula Souza...  (O Globo, 20/09/2006

No exemplo acima, o jornalista Artur Xexéo, em vez de proferir Ana Paula Souza, disse Ana Cláudia Souza. Nesse momento da sua intervenção, cometeu um lapso de língua e, por conseqüência, comprometeu a imagem dele (como foi capaz de trocar os nomes naquela situação?) e do seu alvo (no caso a pessoa que pretendia homenagear). A situação torna-se mais constrangedora pelo fato de, ao trocar os nomes, acabar se referindo a uma outra colega de trabalho, não concorrente a nenhum prêmio.

Os atos falhos têm como base o esquecimento, cuja definição é “ o ato pelo qual o sujeito, a despeito de si mesmo, substitui um projeto ao qual visa deliberadamente por uma ação ou conduta imprevista” (Roudinesco e Plon, 1998: 40). Ou seja, o sujeito realiza um desejo inconsciente, mas quando desestabiliza a interação, atribui o seu fracasso à desatenção e ao acaso. Freud (1974) reuniu malogros de ação, da palavra e de memória. Por exemplo, no lançamento do Plano Nacional de Turismo, programa para estimular o turismo com crédito consignado, no Palácio do Planalto, ao perguntarem sobre o recomenda a quem viaja e enfrenta atrasos e caos nos aeroportos, a ministra Marta Suplicy responde:

– Relaxa e goza. Depois a gente esquece os transtornos. (O Globo 14/06/07)

O efeito deste ato falho cometido pela ministra contra os usuários de aeroportos foi de desafeto, porque, atualmente, passam horas para embarcar devido aos atrasos dos vôos. Esta declaração comprometeu a sua imagem (no status de ministra do turismo, deve demonstrar insatisfação com o atendimento nos aeroportos e não de tolerância) e a dos usuários (que pagam a passagem e têm o direito de serem respeitados através do bom funcionamento do serviço), o que a levou a pedir desculpas horas depois da declaração.

Minha intenção foi dizer aos jornalistas e à população que  viajar vale a pena, mesmo que os problemas nos aeroportos demorem um pouco um pouco mais, apesar de todo o empenho do governo federal para agilizar as soluções. (O Globo 14/06/07)

Segundo Freud, o grande valor das parapraxias consiste em “serem fenômenos muito comuns que, além de tudo, podem ser observados com facilidade em cada um, e ocorrer sem absolutamente implicar em doença” (1974: 98).

 

CONCLUSÃO

A partir da análise dos desvios cometidos consciente ou inconscientemente e de seus diferentes aspectos, como: identidade dos participantes e contexto, à luz da Sociolingüística Interacionista, constatamos que dependendo do comprometimento da face, podem causar desarmonia na interação em curso.

 

BIBLIOGRAFIA

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––––––. A elaboração da face. In: FIGUEIRA, S. A. (org.) Psicanálise e Ciências Sociais. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1980.

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HOUAISS, Antonio. Dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.

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ROUDINESCO, E. & PLON, M. Dicionário de Psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.

 

TEXTOS COMPLEMENTARES

1 A inspetora Marina Maggessi, chefe de investigações da Delegacia de Repressão a Entorpecentes, dá uma entrevista, num documentário, revelando o perfil de homem de sua preferência:

– O que eu quero é chegar e encontrar um homem parecido com o Marcio Garcia [...] Se for pra ter um marido chato que não presta pra nada, que nem as minhas amigas têm, eu também não quero. (Poderosa Chefona, GNT, 18/10/2006)

 

2– Na festa de lançamento da novela Paraíso Tropical, no Copacabana Palace, uma repórter portuguesa se dirige à atriz Beth Goulart e lhe pergunta:

Você é uma mãe galinha?

Com os olhos arregalados, Beth Goulart ouve a explicação da repórter

– Aquela que coloca os filhos embaixo das asas.

– Ah, tá. Aqui galinha é outra coisa (risos). (O Globo 05/03/2007)

 

3– Dinho, vocalista do grupo Capital Inicial, na casa de show Oi Noites Cariocas:

Num show no Oi Noites Cariocas, no meio do pessoal do marketing desta empresa telefônica Oi, ao ver a platéia com os celulares levantados, acompanhando uma musica, Dinho Ouro Preto, vocalista do Capital Inicial, diz:

Que coisa linda! Parece até propaganda da Vivo! (O Globo 15/12/2006)

 

4– O senador Jonh Kerry, dos Estados Unidos, ao em vez de ler o discurso preparado para um evento de estudantes na Califórnia, decide improvisar num determinado trecho, provocando polêmica ao declarar:

Vocês sabem que, se aproveitarem bem a educação, se  estudarem muito, se fizerem o seu dever de casa e se esforçarem para ser brilhantes, poderão se dar bem.

Se não fizerem isso, acabarão atolados no Iraque. (O Globo 2/11/2006)


 

[1] A noção de implicatura foi desenvolvida por Grice (1975), que a define como um conjunto de regras que ordena a passagem do sentido literal ao não-literal. Ele a divide em dois grupos: o das conversacionais, que resultam na aplicação das “máximas conversacionais>.; e o das convencionais, em que são provenientes das normas sociais (como a regra de polidez).

[2] Primeiramente, cabe dizer que adotamos o termo “linguagem” no lugar de “fala” porque analisaremos os diversos tipos de linguagem (verbal, não-verbal e paraverbal) para esta pesquisa, ou seja, não nos restringiremos a linguagem verbal “fala”. A teoria dos atos de linguagem surgiu no interior da Filosofia da Linguagem, no início dos anos sessenta, com os membros da Escola Analítica de Oxford – Austin, Searle, Strawson e outros. A partir da nova concepção de linguagem, enquanto forma de ação, o pioneiro Austin, desenvolveu a Teoria dos atos de fala, publicada, em 1962, no livro How to do Things with words. Mais tarde, Searle desenvolveu e aperfeiçoou o estudo e o funcionamento dos atos de linguagem na obra Speech acts, em 1969.

[3] Segundo Kerbrat-Orecchioni, os atos não linguageiros têm três funções: primeiro, desempenham um papel subalterno em relação ao verbal, por exemplo, o enunciadovocê pode me passar o sal?” geralmente vem acompanhado de um gesto de apontar. Segundo, desempenham um papel complementar, como nas saudações, é comum os gestos acrescentarem as palavras. E terceiro, assumem um papel integral quando sozinhos garantem a realização de uma intervenção (2005: 170-1).