Semiótica & Tecnologia
dos pictogramas à cibercultura

Maria Suzett Biembengut Santade
(UERJ, FIMI e FMPFM)

 

Palavras Iniciais

O trabalho tem como proposta pensar sobre a evolução histórica da linguagem desde os primeiros grafismos da humanidade até a cibercultura. Encaminha-se o estudo nestes objetivos: conhecer melhor as novas tecnologias; compreender a importância das inovações tecnológicas para a evolução da humanidade; construir conceitos sólidos em relação à tecnologia, descartando os mitos e inverdades a respeito dessas inovações; utilizar, de forma consciente, as novas tecnologias do saber; realizar estudos aprofundados a respeito dos impactos sociais causados pelo domínio das novas tecnologias; estudar a influência exercida pelas novas tecnologias nos processos de aquisição do conhecimento lingüístico; e, aprender a utilizar os recursos modernos nas relações de ensino-aprendizagem da língua.

É relevante assinalar que o indivíduo é considerado analfabeto em dias atuais se ele não souber lidar com a magia da Internet que em segundos apresenta todas as redes culturais e sociais do planeta. Para Lévy (1999) a compreensão tecnológica consiste apenas em reconhecer dois fatos. Em primeiro lugar, que o crescimento do ciberespaço resulta de um movimento internacional de jovens ávidos para experimentar, coletivamente, formas de comunicação diferentes daquelas que as mídias clássicas nos propõem. Em segundo lugar, que estamos vivendo a abertura de um novo espaço de comunicação, e cabe apenas a nós explorar as potencialidades mais positivas deste espaço nos planos econômico, político, cultural e humano.

O homem moderno vive de forma paradoxal com a rapidez de mudanças e inovações a cada instante de novos conceitos. Com o contaminar de informações e acúmulo de tarefas, acaba ganhando uma vida estressada mesmo com as facilidades do dia-a-dia. No entanto, as perspectivas de futuro compreendem as inovações tecnológicas contínuas da comunicação, da informação, dos transportes, da educação, da medicina e das realizações tecnológicas nucleares.

O ritmo acelerado da evolução da tecnologia estimula previsões sobre novos avanços educacionais. E o resultado dessas estimativas é impressionante quando suscitado na escola em seus laboratórios de informática e de línguas.  Esse processo metodológico cresce a cada dia com impacto e velocidade tecnológicos e deixa o professor sempre atrasado nas atualizações de suas aulas.

Vale reler, segundo Rydlewski e Greco (2006), uma abordagem histórica sobre o Impacto e Velocidade da Tecnologia:

No fim dos anos 90, ainda no século passado, o consagrado físico e matemático Freeman Dyson, professor emérito do Instituto de Estudos Avançados de Princeton, observou que a tecnologia é apenas uma das forças que impulsionam a humanidade. E nem sempre é a mais importante. Ela divide seu poder de influência com a política, a religião e a economia, além das rivalidades militares e culturais. É tudo verdade. Mas não chega a surpreender se esse tipo de conceito tiver de ser revisto nas próximas décadas, tais são o impacto e a velocidade com que a tecnologia tem provocado mudanças na sociedade. Essas alterações são cada vez mais profundas e se aplicam tanto à maneira como as pessoas se relacionam quanto à forma como produzem. Exemplos não faltam. Em 1990, a internet nem sequer existia em termos sociais. Hoje, conecta quase 1 bilhão de pessoas no mundo e deve interligar a metade da população mundial em dez anos. Atualmente, o preço de uma transação feita pela rede de computadores já atingiu 0,01 centavo de dólar. Numa agência bancária, custaria 1,07 dólar. É por isso que o comércio eletrônico dispara a cada ano, mesmo em um país como o Brasil, que ocupa o modesto 41º lugar entre as nações tecnologicamente mais preparadas, em ranking elaborado pela IBM e pela consultoria The Economist Intelligence Unit. As máquinas também avançam. Entre 1950 e 2000, o poder de processamento dos computadores cresceu inimagináveis 10 bilhões de vezes. O engenheiro e inventor americano Ray Kurzweil, autor de livros como Fantastic Voyage: Live Long Enough to Live Forever (algo como A Viagem Fantástica: Viva o Suficiente para Viver para Sempre), acredita que esse ritmo vai aumentar ainda mais. É verdade que Kurzweil é uma das pessoas mais otimistas quando o assunto é o avanço da tecnologia. Mas, bom engenheiro, gosta de fazer contas e já acertou em muitos prognósticos. No seu primeiro livro, The Age of Intelligent Machines (A Era das Máquinas Inteligentes), publicado em 1990, previu que em poucos anos uma rede global de computadores cobriria o planeta. Eis a web. Disse também que uma máquina poderia derrotar um campeão de xadrez até 1998. Foi isso que o Deep Blue, da IBM, fez com Garry Kasparov, em 1997. Kurzweil continua a produzir estimativas – que devem ser vistas mais como tendências, e não necessariamente como previsões. Depois de desenvolver um novo modelo, chegou à conclusão de que a velocidade dos avanços tecnológicos tende a dobrar a cada dez anos. Estima que, no início deste século, o mundo das técnicas salte o equivalente a vinte anos de pesquisas em apenas catorze. Depois pulará mais duas décadas, mas em sete anos. O resultado final é que as tecnologias podem apresentar um progresso mil vezes maior no século XXI do que mostraram no século XX. "Os cálculos convencionais normalmente subestimam a intensidade das mudanças porque usam um raciocínio linear. E a tecnologia tem outro ritmo. Ela será o primeiro exemplo de um processo evolucionário marcado por um padrão exponencial", disse Kurzweil a VEJA. Aos descrentes, o engenheiro e escritor fornecem uma idéia do que vem por aí: "Basta dizer que foram necessários catorze anos para chegar à seqüência do HIV. Já no caso do vírus da sars (síndrome respiratória aguda grave), a seqüência foi feita em somente 31 dias”. (Veja, Edição Especial Tecnologia) [1]

 

Compreensão do novo caminho educacional

É difícil, entretanto, argumentar sobre a complexidade da linguagem escrita tecnológica hoje, sem acompanhar seus avanços desde os primeiros sinais, deixados em registro pelo ser humano. A própria aquisição da linguagem pela criança mapeia um caminhar de evolução do simples sinal à palavra no entorno da criança. Assim, vão surgindo também as questões: a criança já nasce programada para falar? A linguagem é inata ao ser humano? A aprendizagem da linguagem independe do contexto social? Ou o contexto social somente complementa o inatismo? O sistema de traços não-lingüísticos (sinais não-lingüísticos) encontra-se, quer nos humanos, quer nos animais em geral? (Cf. Biembengut Santade, 2002)

Mencionado isso, muitos estudiosos buscam suas hipóteses no caráter vocal da linguagem, dizendo que, se houvesse a perda da voz, teríamos que nos comunicar através dos gestos, e estes teriam evoluído também com um tipo de estrutura gramatical com um grau de complexidade semelhante a línguas faladas e processariam diversas propriedades arbitrárias, transformando em sistemas semióticos com características semelhantes ao universo das línguas faladas (e escritas também).

O ponto principal de discussão é o seguinte: se, em qualquer explicação, parte-se da simplicidade para a complexidade, houve, então, evolução da linguagem? Se os lingüistas ortodoxos não aceitam a evolução da própria linguagem juntamente com a evolução da corporeidade humana, não podemos nos adiantar nos avanços lingüísticos da educação? Se o componente verbal da linguagem distanciar-se da manifestação natural num grau de independência, esfriamo-nos no como a escrita surgiu até chegar-se à comunicação digital?

Colocadas essas questões, as línguas podem ser consideradas independentemente da essência, em que se manifestam naturalmente, quando “as línguas escritas adquiririam certo grau de independência como um dos principais meios de comunicação do homem” (Cf. Lyons, 1980:78). Chaves[2], no texto “Acompanha a Filosofia da Educação a Evolução da Tecnologia”, afirma que a comunicação humana passou por quatro revoluções distintas: começando pela palavra falada, depois pela palavra escrita, seguindo pela palavra impressa e finalmente pela profunda, e em curso, palavra digital (p.3). Eduardo O. C. Chaves argumenta que não é fácil falarmos de educação se não entendermos essas quatro revoluções (não de maneira linear) em grande metáfora, pois as diferentes revoluções acometem umas as outras em ondas de mudança, que colidem, sobrepõem-se e coexistem. Sendo assim, Chaves se propõe investigar a evolução dessas quatro revoluções, para entender a evolução da tecnologia (que é uma construção humana), sem desconsiderar o interesse do ser humano pela aprendizagem. Esse estudioso busca em Sócrates a metáfora do instigar a pensar, colocando o método chamado de “maiêutica” ¾ palavra que vem do grego e quer dizer “arte da parteira”. Para Sócrates, o professor é como uma parteira ao dar à luz o conhecimento do aluno [a parteira somente faz o papel de ajudar as mulheres a darem à luz seus rebentos]. Tudo semelhante ao papel do professor, que ajuda a trazer à luz o saber do aluno.

É impossível pensar hoje sem os sinais verbais, que se tornaram independentes do aspecto natural e primitivo do ser humano. Também não seria possível conceber um grupo, que se separasse do corpo da nossa sociedade e renunciasse ao uso da língua falada? Em que sentido a sua linguagem escrita ou gestual dependeria ainda da língua falada, a que estava acostumado em sociedade? Não poderia ela desenvolver-se independentemente, tal como a língua escrita se desenvolveu numa independência parcial da fala? E não poderia ser ensinada às crianças, sem que elas tivessem primeiramente adquirido a língua falada, que a ela correspondesse parcialmente? ¾  Essas são questões levantadas por Lyons, ainda não respondidas, sobre a correspondência entre a origem da linguagem e o seu aspecto convencional (Cf. 1980:78).

Para Lévy (1999), o homem é quem cria as mudanças, mas muitas vezes o impacto delas causa inadequação quando não compreendidas pela sociedade. Esse autor coloca as indagações: as técnicas viriam de outro planeta, do mundo das máquinas, frio, sem emoção, estranho a toda significação e qualquer valor humano, como certa tradição de pensamento tende a sugerir? Para o autor parece, pelo contrário, que não somente as técnicas são imaginadas, fabricadas e reinterpretadas durante seu uso pelos homens, como também é o próprio uso intensivo de ferramentas que constitui a humanidade enquanto tal (junto com a linguagem e as instituições sociais complexas.

 

Desenhando a trajetória do minicurso

Assim, encaminha-se este trabalho na compreensão e inserção do novo ritmo da evolução tecnológica; e, na utilização da arte dos desenhos, diagramas, gráficos no intuito de tornar a metodologia mais dinâmica no ensino de língua na absorção dos conteúdos por meio das imagens. A alfabetização visual materializa os conceitos abstratos da gramática tradicional e em caminho inverso chega-se à compreensão lingüística.

Em resumo, este minicurso visa apresentar: (i) Questão: Por que o uso da tecnologia encanta o aluno que apresenta dificuldade na percepção das normas da língua? (ii) Procedimentos metodológicos: Processo da significação dos aspectos formais da língua, através da gramática on-line valendo da arte imagética na construção do conteúdo. O aluno habituado a consumir informações de natureza iconológica chega à norma gramatical com a percepção aguçada às imagens que vêm suscitadas pelo ambiente virtual na visita aos sites e aos portais. A passividade do aluno diminui nas práticas integradas, pois ele utiliza a sua criatividade visual na operacionalização da linguagem verbal. (iii) Avaliação: Os conceitos lingüísticos ficam ilustrativos no percurso metodológico quando a imagem verbo-visual aparece imediatamente ao aprendiz validando sua própria pesquisa. A interação dos conteúdos gramaticais com a semiótica da tecnologia tem favorecido a compreensão dos conceitos abstratos da língua. (iv) Proposta: Com o alfabetismo visual, a compreensão das indagações lingüísticas expande-se com o próprio potencial de fruição visual do aluno, desde a expressão subjetiva até a aplicação prática. A linguagem visual torna os ensinamentos mais práticos, com aprendizagem mais fácil em significados vários.

Serão abordados os seguintes itens: compreensão, mitos e verdades das novas tecnologias. Nesta ordem, seguem:

  • Compreensão das novas tecnologias: As mudanças fazem surgir dúvidas; As dúvidas geram incertezas; As incertezas causam rumores e profecias; Os rumores suscitam estudos e pesquisas; As pesquisas requerem pesquisadores e pensadores; O novo assusta e cria mitos.
  • Mitos das novas tecnologias: Máquina versus Homem; Fim dos Problemas; Vida Plena e Democrática; Autonomia das Máquinas; Rebelião das Máquinas; Cultura Desumanizadora; Inovar versus Piorar.
  • Verdades das novas tecnologias: Facilidade para a vida humana; Avanços na ciência e na medicina; Prolongamento da vida humana; Melhor qualidade de vida; Acesso à informação; Acesso ao conhecimento; Encurtamento das distâncias; Maior diálogo entre as nações; Maior comodidade; Melhor desempenho nas tarefas; Redução de custos; Desenvolvimento sustentável; Cinema, Arte, Televisão, Literatura.

 

Palavras Finais

Desde os mais primórdios tempos o homem tem registrado suas marcas através de desenhos, sinais, ícones, entre outros. Os registros em forma de desenhos e pinturas nas cavernas apresentam a história do homem na sua vivência cultural. No percurso da história da humanidade os manuscritos tornaram-se ilustrados no intuito de retratar as indagações culturais e religiosas da época. As antigas tapeçarias também espelharam o conhecimento matemático da geometria no uso das cores, dos diagramas, das imagens.

Não se pode esquecer de que a linguagem escrita é visual e os signos escritos hoje tão abstratos foram no passado desenhos os quais representavam a cultura do homem há mais de quatro milênios antes de Cristo. Assim confirma Almeida Jr. (1989:9) que “o processo de iconização só foi possível graças ao processo tecnológico dos veículos de comunicação experimentado desde o início deste século com o cinema, a televisão e, especialmente, com as novas técnicas de impressão jornalística”.

É claro que com o progresso eletrônico a imagem passou a fazer parte do cotidiano das pessoas no mundo. Assim a linguagem oral vem acompanhando essa linguagem visual, massificando também o conteúdo das gerações atuais. No entanto, há o lado negativo da massificação da linguagem verbal e visual, fazendo que a população atual seja condicionada a não refletir sobre sua pessoa como elemento integrante dessa comunicação de massa.

Além da comunicação visual do movimento televisivo e cinematográfico emergem-se outras artes visuais como fotografias, cartazes, pôsteres, painéis, propagandas, cartuns, etc., transmitindo mensagens a cada instante aos leitores virtuais. Vale também assinalar que, infelizmente, a contaminação da imagem tem chegado rapidamente aos leitores virtuais desavisados e despreparados, modificando assim seu comportamento sem nenhum discernimento formalizado.

A linguagem visual provoca sinestesia àquele que a interpreta. Através da imagem os cinco sentidos provocam-se nos anúncios publicitários, nas capas de revistas, nos portais e sites. Observando as propagandas de produtos alimentícios, o paladar e o olfato instigam-se pelas cores, pelo efeito da comida em horários de refeição. Como exemplo, os sanduíches e os refrigerantes são representados pelas cores vermelhas e amarelas porque estas instigam o paladar. As cores frias nos produtos de limpeza instigam a higiene. A imagem produz em determinado grupo social reações próprias do mesmo. Por isso que o fenômeno da imagem emerge satisfatoriamente no momento histórico-social de determinada sociedade a qual nunca permanece igual em tempos diversos.

Quando a imagem emite ao receptor a mensagem, este participa do diálogo na completude da comunicação. Ao ser persuadido pela imagem, o sujeito transforma-se, integrando-se não mais de modo ingênuo no processo visual. O mesmo fenômeno acontece com a linguagem verbalizada. O texto transmite a informação e o leitor interagido nele (no texto imagético ou não) contextualiza-o, transformando, como usuário sócio-histórico na prática lingüística. O discurso de cada indivíduo acentua-se na prática, e na enunciação o sujeito torna-se polifônico. Portanto, ao ser seduzido pela imagem, o sujeito materializa-se nela a qual o retrata no contexto social ao qual pertence.

Hoje a computação gráfica utiliza a construção formal das palavras, comungadas com a imagem na propagação das mensagens. Os signos icônicos tornaram-se, na globalização da multimídia, universais. A cada dia a linguagem visual reflete o conceito único da humanidade. As diferenças de interpretação acontecem na contextualização cultural de cada povo. Porém, as oportunidades de encontro com outras culturas tornam-se reais através da Internet nas imagens via satélite. Já desde a Antigüidade a linguagem visual transmite as indagações sócio-culturais e históricas do homem. No rastro da evolução humana constrói-se uma leitura universal da imagem, mas cada indivíduo não pode perder seu imaginário, tornando-se alienado na sociedade em que vive. Com a globalização de informações o homem perde seus preconceitos e não deve perder a si mesmo enquanto sujeito criador.

 

Referências Bibliográficas

ALMEIDA JR., João Baptista de. Ter Olhos de Ver: subsídios metodológicos e semióticos para a leitura da imagem. Dissertação de Mestrado, FE-UNICAMP, 1989.

BIEMBENGUT SANTADE, Maria Suzett. Apreciações Semânticas de Relatos de Aprendizagens. Tese de Doutorado. UNIMEP, Piracicaba, 2002.

CHAVES, Eduardo Oscar de Campos. Acompanha a Filosofia da Educação a Evolução da Tecnologia. Texto disponível em  www.chaves.com.br/textself/edtech/abe.htm e em                                  http://edutec.net/biblioteca%20virtual/edtextos.htm

LEVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999.

LYONS, John. Semântica-I. Trad. Wanda Ramos. Lisboa: Presença; Martins Fontes, 1980.

RYDLEWSKI, Carlos e GRECO, Alessandro. Impacto e velocidade. Veja on-line Edição Especial Tecnologia. Texto disponível em         http://veja.abril.com.br/especiais/tecnologia_2006/p_014.html


 

[1]  Veja on-line Edição Especial Tecnologia. Impacto e velocidade. Escrito por Carlos Rydlewski e Alessandro Greco. Texto disponível em:             http://veja.abril.com.br/especiais/tecnologia_2006/p_014.html

[2] Eduardo O C Chaves. Ph.D. em Filosofia, University of Pittsburgh (Pittsburgh, PA), 1972. Professor Titular de Filosofia da Educação da Universidade Estadual de Campinas (Campinas, SP). Coordenador da EduTecNet – Rede de Educação e Tecnologia / Comunidade Virtual de Aprendizagem Colaborativa em Educação. Texto disponível em:  http://www.chaves.com.br/textself/edtech/abe.htm