O educador, a cultura
e o ensino do español como LE no sul do Brasil

María Josefina Israel Semino de López

E-mail: dlamji@hotmail.com

 

Introdução

Pretendo abordar o tema proposto sob a ótica do jogo. Gostaria de colocar inicialmente as seguintes questões:

Podemos considerar à educação como sendo um jogo?

A educação é um jogo?

Ela tem capacidade de absorver o educando de maneira intensa e total com um envolvimento emocional?

Ela estimula a imaginação, a auto-afirmação e a autonomia do educando?

No jogo da educação existem regras que determinem o que “vale” e o que não “vale”?

Este jogo tem um caráter dinâmico, dialético, dialógico?

É possível repetir este jogo?

Ele tem um espaço limitado?

Ele se concretiza numa atmosfera de espontaneidade e de integração?

Ele cria um ser crítico e transformador?

 

O quê aprendemos com o jogo da educação?

Graças a este jogo aprendemos o mais básico de uma cultura: o que tem e/ou não tem determinada sociedade - grupo humano - ser individual, imitamos aos nossos educadores e tentamos fazer como eles fazem; relacionamos - no com as coisas, com os outros e com nós mesmos; descobrimos que tem um ensino já normalizado que podemos acatar e cumprir, gostar, rechaçar, ou transformar.

 

Poderíamos jogar de refletir sobre o sentido dos diferentes jogos educativos?

No jogo da educação bancária, a educação se torna um ato de depositar, em que os educandos são os depositários e o educador o depositante.

Paulo Freire na sua Pedagogia do Oprimido (1970:58) nos diz que:

Na visão “bancária” da educação, o “saber” é uma doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada saber. Doação que se funda numa das manifestações instrumentais da ideologia da opressão – a absolutização da ignorância, que constitui o que chamamos de alienação da ignorância, segundo a qual esta se encontra sempre no outro”.

E mais adiante (idem, ibidem, 59) Freire nos sintetiza os pressupostos deste tipo de educação. Diz que nela:

a) o educador é o que educa; os educandos, os que são educados;

b) o educador é o que sabe; os educandos, os que não sabem;

c) o educador é o que pensa; os educandos, os pensados;

d) o educador é o que diz a palavra; os educandos, os disciplinados;

f) o educador é o que opta e prescreve sua opção, os educandos, os que seguem a prescrição;

g) o educador é o que atua; os educandos, os que têm a ilusão de que atuam, na atuação do educador;

h) o educador escolhe o conteúdo programático; os educandos, jamais ouvidos nesta escolha, se acomodam a ele;

i) o educador identifica a autoridade do saber com sua autoridade funcional, que opõe antagonicamente à liberdade dos educandos; estes devem adaptar-se às determinações daquele;

j) o educador, finalmente, é o sujeito do processo; os educandos, meros objetos.

Já na concepção problematizadora e libertadora da educação desenvolvida por Paulo Freire como contrapartida à educação bancária, ele propõe que nesta educação não só os educadores, mas também os educandos se fazem sujeitos do seu processo. Neste processo o mundo já não é algo sobre que se fala com falsas palavras, mas o mediatizador dos sujeitos da educação, a incidência da ação transformadora dos homens, de que resulte a sua humanização.

Para Freire ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo e o homem como um ser inconcluso, consciente de sua inconclusão está em um permanente movimento histórico de busca desafiante do ser mais. E o olhar para trás não deve ser uma forma nostálgica de querer voltar, mas um modo de melhor conhecer o que está sendo, para melhor construir o futuro.

 

Mas como construiremos esse futuro educativo?

Numa primeira instância através dos atos da força ilocucionária na percepção de Austin (1990:123 e sigs.): veriditivos (por dar uma apreciação de veredito: absolver-condenar-constatar, considerar em termos legais-interpretar como...-entender, ver como...-determinar-calcular, computar-estimar-situar, valorizar-avaliar-descrever, caracterizar-diagnosticar-analisar); exercitivos (designar, votar, ordenar, instar, aconselhar, avisar, etc.); comissivos (prometer, comprometer, ter a intenção de..., tomar partido por...); comportamentais (pedir desculpas, felicitar, elogiar, dar os pêsames, maldizer,  desafiar); expositivos (contestar, argumentar, conceder, exemplificar, supôr, postular).

O ser humano não deve ser um ente passivo, mas um ser pensante « atuante « e transformador da realidade existente hic et nunc.

Se não estamos contentes com o ‘estar’ presente da educação, devemos agir com plena consciência para analisar o passado da mesma até hoje, resgatando o mais positivo, criticando os aspectos negativos e procurando as soluções imediatas, mediatas e a longo prazo.

Não queremos ‘encher a vasilha de verbosidade alienada e alienante’ mas também não pretendemos ‘procriar discussões estéreis e vazias sem perspectivas’.

Precisamos urgentemente ser ‘librianos’ e balancear procurando o equilíbrio eterno do saber ser e do saber fazer.

 

Como ser librianos e não cair no “jeu d’échecs”?

Para não cair no fracasso educativo, temos necessidade de saber sobre o tema em questão, mas também ter uma resposta e uma réplica sobre essa questão.

Para a compreensão da outra cultura em determinado aspecto, precisamos conhecer, em primeira instância, a nossa realidade cultural sobre esse aspecto e compará-la assim com à da língua em questão.

Só mediante a comparação e a integração sem limites é que poderemos acessar ao verdadeiro jogo educativo.

Serrani (2005) nos apresenta um currículo multidimensional de três componentes, onde se comparam duas culturas com os seguintes traços:

1) intercultural (em relação à diversidade sócio-cultural e às práticas discursivas que as ponham em relevo),

2) de língua-discurso (com estes dois subcomponentes integrados),

3) de práticas verbais (leitura, escrita, compreensão auditiva, produção oral e tradução com prática metalingüística ou metadiscursiva importante).

Como ilustração, baseados no esquema do componente intercultural, língua-discurso e de práticas verbais (idem, ibidem: 33 e 37), damos a continuação os conteúdos previstos de estes três componentes para uma unidade didática do curso de espanhol para universitários brasileiros. (Os exemplos são nossos).

 

Componente intercultural

Territórios, Espaços e Momentos

Tópicos Gerais

[Contexto de Partida – CP]: A região Sul e parte da região Centro-Oeste do Brasil. [Contexto alvo – CA]: Alguns países de fala hispânica do Mercosul.

Um aspecto cultural da região Sul e parte da Centro–Oeste do Brasil e de alguns países sul-americanos hispânicos. A cultura do mate nestes países.

 

Tópicos Específicos

[CP]: As variantes regionais no Brasil: os Estados de Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul.

[CA]: As variantes regionais nos países de fala hispânica: Argentina, Paraguay, Uruguay e região de Chiloé no sul de Chile.

 

Pessoa e Grupos Sociais

Tópicos Gerais

[CP]: A produção da erva-mate no Brasil.

[CA]: A produção da erva-mate nos países sul-americanos de fala hispânica.

Tópicos Específicos

[CP]: Os produtores da erva-mate nos Estados de Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul do Brasil.

[CA]: Os produtores da erva-mate na Argentina, no Paraguay, no Uruguay e no Chile.

 

Legados Culturais

Tópicos Gerais

[CP/CA]: Poemas, contos, adivinhações e canções populares representativas com temas ligados às atividades produtivas das regiões escolhidas, tanto no contexto de partida quanto no contexto alvo.

Tópicos Específicos

[CP]: O conto gauchesco “O mate de João Cardoso” de João Simões Lopes Neto.

[CA]: O conto “Todos los días son domingo” de Mario Benedetti no livro intitulado “La muerte y otras sorpresas”.

 

Componente língua – discurso

Tópicos gerais

(Gênero(s) Discursivo(s) em Foco/Léxico, Construções Morfossintáticas, o Sistema e seu funcionamento no Discurso:

Discurso narrativo e poético. Discurso cotidiano descritivo. Formulação e apreciação de planos de ação em variedades informal e formal: uso de expressões coloquiais e idiomáticas. Uso do modo Imperativo, dos clíticos, e o gênero de algumas palavras do léxico nas duas línguas em questão (espanhol e português), que não abordaremos aqui.

 

Tópicos específicos

Expressões coloquiais ou idiomáticas em discurso cotidiano de registro informal em “O mate de João Cardoso”:

  • Oh! crioulo! Traz mate!
  • Não! não mande vir, obrigado! Pra volta!
  • Por fim o andante não agüentava mais e parava patrulha: ... Agora vou mesmo.
  • O chimarrão, aqui, nunca se corta, está sempre pronto!
  • Ora, patrício, espere! Oh crioulo, olha o mate!
  • E o carvão sumia-se largando sobre o paisano uma riscada do branco dos olhos, como encarnicando...

 

Expressões coloquiais ou idiomáticas em um excerto de discurso cotidiano em registro informal em espanhol em Los albañiles de “Los Tapes” em Cuentos Escogidos de Juan José Morosoli(págs. 57-58):

El agua comenzó a “hacer cantar el grillo”.

El mate era una olla, de grande.

El primer verde pasó sobre el fogón llevado por la mano de Silveira.

Nieves lo sorbía despacio en un saboreo profundo, como mascando el gusto, con una fruición grosera y lenta.

Silveira, que le había hecho, por gentileza, obsequio del primer “cebado”, esperaba con avidez.

- Güeno… ¿áura le tás dando e’mamar?...

Nieves le devolvió el mate y la frase:

- No, hermano. Me está dando e’mamar a mí…

Silveira decía que “uno de los coloraos viejos” le estaba haciendo seña con un ojo e’grasa”.

- Vamo, vamo a prenderle… Toy yeno e’mate…

 

Expressões de registro formal em espanhol.
Um dos expositores do culto ao mate é o escritor uruguaio Fernán Silva Valdés com poesias como:
 
No sé que tiene de rudo,
no sé que tiene de áspero;
no sé que tiene de macho,
el mate amargo.
Él sirve para todo;
para lo bueno, para lo malo;
él lava los dolores del pecho a cada trago,
él es el cúralo todo en la casa del gaucho,
alegra la alegría y destiñe la pena,
el mate amargo.
El es contemporáneo de la bota de potro,
y de las nazarenas y de la guitarra
pero de la guitarra que usaba cintas
-cómo las chinas-
cintas celestes o coloradas.
En el campo
no hay boca masculina que rehuse besarlo,
ni manos callosas que no le hagan un hueco
al mate amargo.
Cómo me siento suyo; cómo lo siento mío
al mate amargo.
Yo lo llevo disuelto en la sangre
como jugo americano.
No sé que tiene de símbolo,
el mate amargo,
por el pico plateado de la bombilla
canta la madrugada como un pájaro gaucho.
 
Mate: palabra de América
nacida en tierras incaicas.
Mate: palabra redonda
igual que la calabaza;
y que ha venido rodando
por eso y porque era gaucha,
hasta los lares criollos
del Uruguay y del Plata.

 

III. Práticas verbais

Tópicos gerais

(Leitura, Escrita, Escuta, Produção Oral e, quando corresponda, de tradução, relacionadas entre si e com as duas dimensões anteriores: I e II):

Prática de escrita relacionada a oficinas de leitura, pesquisa bibliográfica e na Internet e debate oral. Produção verbal sobre um mesmo assunto em registros e gêneros diferentes. Gêneros: descritivo-ensaístico, biografia e autobiografia. Escrita criativa.

 

 

 

 

Tópicos específicos

Realização de oficinas, como as indicadas a seguir, nas quais se partilhem e distribuam atividades, inter-relacionando as práticas verbais de leitura, escrita, escuta e produção oral:

Primeiro momento

i. Aplicar-se-á o seguinte questionário bilíngüe aos alunos na sal de aula de LE.

  1. ¿Toma mate? / Toma mate?
  2. ¿Cómo lo toma? ¿Dulce o amargo? / Como o bebe? Doce ou amargo?
  3. ¿Cuántas veces por día toma mate y en qué horario? / Quantas vezes ao dia o toma e em que horário?
  4. ¿Ud. mismo prepara el mate o se lo hace otra persona? / É você mesmo quem prepara o mate ou outra pessoa o faz para você?
  5. ¿Cómo lo prepara? / Como o prepara?
  6. ¿Y cómo lo ceba? / E como o ceva?
  7. ¿Conoce otras maneras de preparar y cebar el mate? ¿Cuáles? / Conhece outras maneiras de preparar e cevar o mate? Quais?
  8. ¿En su familia quienes toman mate? ¿Sólo Ud.? / Na sua família quem toma mate? Só você?
  9. ¿Toma mate fuera de su casa? / Toma mate fora de casa?
  10. ¿Con quiénes toma mate? / Com quem toma mate?
  11. ¿Ud. siempre tomó mate? ¿Desde cuándo? / Você sempre tomou mate? Desde quando?
  12. ¿Sabe en qué otros países se toma mate y por qué se le llama “mate”? / Sabe em que outros países toma-se mate e por que chama-se “mate”?
  13. ¿Piensa que tomar mate es bueno para la salud? ¿Cuáles son sus beneficios? / Pensa que tomar mate é bom para a saúde? Quais são seus benefícios?
  14. ¿Cree que tomar mate pueda ocasionarle alguna enfermedad? ¿En qué puede perjudicarlo? / Acredita que tomar mate possa lhe - ocasionar alguma doença? Em que pode lhe - prejudicar?
  15. ¿Conoce algún poema, canción, adivinanza o cuento que mencione al mate? ¿Cuál? / Conhece algum poema, canção, adivinhação ou conto que mencione o mate? Qual?

 

 

Segundo momento

ii. Pesquisa feita pelos alunos na Internet sobre o conteúdo das respostas desse questionário.

Terceiro momento

iii. Visita do sítio www.montevideanos.com/elmate.htm e leitura dos ítems 5, 6 e 7 do mesmo.

Quarto momento

iv. Aplicação feita pelos alunos desse questionário bilíngüe na fronteira uruguaio-brasileira do Chuy/Chuí.

 

Sugestão de atividade

   Planeje uma unidade didática que contenha estes três componentes e tente: a) construir com os alunos um ensino/aprendizagem voltado aos seus interesses e às suas necessidades; e b) promover o uso da língua-alvo na sala de aula de língua estrangeira (com poucas interferências da língua materna dos alunos) seguindo um tratamento freireano que desperte a conscientização, por parte dos alunos, das realidades que os cercam.

 

Conclusão

 

                Contemplamos, dentro de uma proposta multidimensional de ensino, o projeto canadense de “currículo multidimensional”, que Richterich (1985) tem chamado de “pedagogia da negociação”[1] e a “eco-metodologia”[2], assim como a didática multipolar[3] e multi-meta[4] de Puren (1994); nós propomos o que denominamos de “pedagogia identitária e de imersão intercultural”, baseados no conhecimento da língua a partir e através das próprias experiências e descobertas individuais e coletivas do educando e o seu contato indireto (através da Internet) ou direto e ativo in situ.

                Partilhamos com Meneghini (2004:156), a idéia de que a linha reflexivo-crítico-temática (problematizadora), é uma das vertentes da grande e multifacetada abordagem comunicativa, na qual se insere a proposta temática de Paulo Freire, por isso crítica-temática e reflexivo, porque, nessa abordagem o professor já atua como reflexivo com relação ao curso que ministra e com relação à sua formação e, por fim, problematizadora se refere a um ensino dialógico, questionador que pode levar ao desenvolvimento da habilidade oral dos alunos compreendida como a construção de um discurso baseado num contexto concreto.

                E acreditamos que é nesse desenvolvimento da comunicação real do aluno, a interlíngua passa a ter um papel importante, por ser um processo intermediário entre a língua materna e a língua estrangeira, neste caso, o espanhol.

                E agora voltando a acessar o jogo educativo do começo deste trabalho. Todos sabem que o jogo cria jogos e do que mais tem que desconfiar o jogador é dos jogos, enquanto não têm sido criados por ele mesmo.

                Vamos tentar aprender a jogar com nossos próprios jogos, tentar romper as regras do jogo; para poder jogar, para poder viver, para poder nos educarmos de verdade.

 

Referências bibliográficas

 

Austin, John Langshaw. Quando dizer é fazer. Palavras e ação. Porto Alegre: Artes    

   Médicas. 1990.

Barretto, Margarita. El mate. Su historia y cultura. Buenos Aires: Ediciones del Sol.

   1996.

Benedetti, Mario. La muerte y otras sorpresas. México: Siglo Veintiuno. 1976:32.

Freire, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1970.

Lopes Neto, J. Simões. Contos gauchescos e lendas do sul. Porto Alegre/Rio de

   Janeiro: Globo. 1981:33.

Meneghini, Carla Mayumi. A abordagem de Paulo Freire no ensino do espanhol como língua estrangeira.Em: Pesquisas em Lingüística Aplicada. São Paulo: UNESP.   

    2004:155-181.

Morosoli, Juan José. Cuentos escogidos. Montevideo : Ed. De la Banda Oriental. 1966:

    54-97.

Patrón, Carina. El mate en la cultura uruguaya.www.montevideanos.com/elmate.htm

Puren, Christian. La didactique des langues étrangères à la croisée des

   méthodes. Essai sur l’eclectisme. Paris: Didier/Crédif. 1994.

Richterich, René. Besoins langagiers et objectifs d’apprentissage. Paris :

   Hachette, coll. F Recherches/Applications. 1985.

Schleppegrell, M. Problem-posing in Teacher Education. TESOL Journal, v. 6, nº 3.  

   1997.

Serrani, Silvana. Discurso e cultura na aula de língua. Currículo – leitura – escrita.

   Campinas, São Paulo: Pontes. 2005.

Vygotsky, Lev Semenovich. A formação social da mente: O desenvolvimento dos

    processos psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes. 1991.

Wallerstein, N. The Teaching Approach of Paulo Freire. In: Oller, J. W., Richard-

   Amato, P. A. (Ed.) Methods that Work. Boston. 1983.

 

http://www4.loscuentos.net/cuentos/link/192/192513/

www.geocities.com/Athens/forum/6413/leyendas/yerba.html

 

ANEXO 1

 

O Mate do João Cardoso

— A LA FRESCA!… que demorou a tal fritada! Vancê reparou?

Quando nos apeamos era a pino do meio-dia... e são três horas, largas!... Cá pra mim esta gente esperou que as franguinhas se pusessem galinhas e depois botassem, para depois apanharem os ovos e só então bater esta fritada encantada, que vai nos atrasar a troteada, obra de duas léguas... de beiço!...

Isto até faz-me lembrar um caso... Vancê nunca ouviu falar do João Cardoso?... Não?... É pena.

O João Cardoso era um sujeito que vivia por aqueles meios do Passo da Maria Gomes; bom velho, muito estimado, mas chalrador como trinta e que dava um dente por dois dedos de prosa, e mui amigo de novidades.

Também... naquele tempo não havia jornais, e o que se ouvia e se contava ia de boca em boca, de ouvido para ouvido. Eu, o primeiro jornal que vi na minha vida foi em Pelotas mesmo, aí por 1851.

Pois, como dizia: não passava andante pela porta ou mais longe ou mais distante, que o velho João Cardoso não chamasse, risonho, e renitente como mosca de ramada; e aí no mais já enxotava a cachorrada, e puxando o pito de detrás da orelha, pigarreava e dizia:

— Olá! Amigo! apeie-se; descanse um pouco! Venha tomar um amargo! É um instantinho.... crioulo?!…

O andante, agradecido à sorte, aceitava… menos algum ressabiado, já se vê. — Então que há de novo? (E para dentro de casa, com uma voz de trovão, ordenava:) Oh! crioulo! Traz mate!

E já se botava na conversa, falava, indagava, pedia as novas, dava as que sabia; ria-se, metia opiniões, aprovava umas cousas, ficava buzina com outras...

E o tempo ia passando. O andante olhava para o cavalo, que já tinha refrescado; olhava para o sol que subia ou descambava… e mexia o corpo para levantar-se.

— Bueno! são horas, seu João Cardoso; vou marchando!…

— Espere, homem! Só um instantinho! Oh! crioulo, olha esse mate!

E retomava a chalra. Nisto o crioulo já calejado e sabido, chegava-se-lhe manhoso e cochichava-lhe no ouvido:

— Sr., não tem mais erva!…

— Traz dessa mesma! Não demores, crioulo!...

E o tempo ia correndo, como água de sanga cheia. Outra vez o andante se aprumava:

— Seu João Cardoso, vou-me tocando… Passe bem!

— Espera, homem de Deus! É enquanto a galinha lambe a orelha!… Oh! crioulo!… olha esse mate, diabo!

E outra vez o negro, no ouvido dele:

— Mas, senhor!… não tem mais erva!

— Traz dessa mesma, bandalho!

E o carvão sumia-se largando sobre o paisano uma riscada do branco dos olhos, como encarnicando...

Por fim o andante não agüentava mais e parava patrulha:

— Passe bem, seu João Cardoso! Agora vou mesmo. Até a vista!

— Ora, patrício, espere! Oh crioulo, olha o mate!

— Não! não mande vir, obrigado! Pra volta!

— Pois sim…, porém dói-me que você se vá sem querer tomar um amargo neste rancho. É um instantinho... oh! crioulo!

Porém o outro já dava de rédea, resolvido à retirada.

E o velho João Cardoso acompanhava-o até a beira da estrada e ainda teimava:

— Quando passar, apeie-se! O chimarrão, aqui, nunca se corta, está sempre pronto! Boa viagem! Se quer esperar... olhe que é um instantinho... Oh! crioulo!…

Mas o embuçalado já tocava a trote largo.

Os mates do João Cardoso criaram fama… A gente daquele tempo, até, quando queria dizer que uma cousa era tardia, demorada, maçante, embrulhona, dizia — está como o mate do João Cardoso!

A verdade é que em muita casa e por muitos motivos, ainda às vezes parece-me escutar o João Cardoso, velho de guerra, repetir ao seu crioulo:

— Traz dessa mesma, diabo, que aqui o Sr. tem pressa!...

— Vancê já não tem topado disso?…

 

ANEXO 2

 

                Esse conto de Lopez Neto tem seu equivalente na tradição hispano-americana. Esta tradição nos conta que a família Morales, que morava no caminho para San Isidro, tinha como costume oferecer aos viajantes que paravam na sua casa para descansar, água e um “matecito”. A água normalmente chegava, mas o mate demorava tanto, que o hóspede decidia continuar o seu caminho sem esperá-lo.

                Além da literatura especificamente referida ao mate, encontramos este como elemento quase onipresente na literatura de ambas as margens do Rio da Prata, inclusive, sem nomeá-lo, aparece implícito em diversas situações. Vejamos um exemplo:

“El recién llegado chupa a conciencia la bombilla. Chupa hasta que la yerba se queja.”

“Está fenómeno –dice, al alcanzarle el mate a Antonio-. Vengo de parte de Matilde” (Benedetti, Mario: Todos los días son domingo, pág. 32).

 

ANEXO 3

            Esto que dejo aquí, no es mío, me lo han mandado amigos, ya que estoy viviendo en Europa y ahora lejos, me sentí identificada, para aquellos que están lejos de su tierra y añoran....esas reuniones de amigos en rueda de "mates". Pero quisiera compartirlo con todos, es una forma de identificarnos como latinos y argentinos (también uruguayos y brasileros), espero que lo disfruten, es una linda forma de identificarnos, y así lo sentí, prometo dejar mis poemas personales próximamente....volando_voy.

De "Lalo Mir" en el programa "Lalo Bla Bla" Radio Mitre...(Argentina-Buenos Aires)

El MATE: no es una bebida. Bueno, sí. Es un líquido y entra por la boca. Pero no es una bebida. En este país nadie toma mate porque tenga sed. Es más bien una costumbre, como rascarse.
El mate es exactamente lo contrario que la televisión: te hace conversar si estás con alguien, y te hace pensar cuando estás solo.
Cuando llega alguien a tu casa la primera frase es "hola" y la segunda... "¿unos mates?".
Esto pasa en todas las casas. En la de los ricos y en la de los pobres. Pasa entre mujeres charlatanas y chismosas, y pasa entre hombres serios o inmaduros.
Pasa entre los viejos de un geriátrico y entre los adolescentes mientras estudian o se drogan.
Es lo único que comparten los padres y los hijos sin discutir ni echarse en cara.
Peronistas y radicales ceban mate sin preguntar.
En verano y en invierno.
Es lo único en lo que nos parecemos las víctimas y los verdugos; los buenos y los malos.
Cuando tenés un hijo, le empezás a dar mate, y cuando te pide.
se lo dás tibiecito, con mucha azúcar, y se sienten grandes.
Sentís un orgullo enorme cuando un esquenuncito de tu sangre empieza a chupar mate.
Se te sale el corazón del cuerpo. Después ellos, con los años, elegirán si tomarlo amargo, dulce, muy caliente, tereré (o sea frío), con cáscara de naranja, con yuyos, con un chorrito de limón.
Cuando conocés a alguien por primera vez, te tomás unos mates.
La gente pregunta, cuando no hay confianza: "¿Dulce o amargo?".
El otro responde: "Como tomes vos".
Los teclados de Argentina tienen las letras llenas de yerba.
La yerba es lo único que hay siempre, en todas las casas.
"Siempre"!!!!. Con inflación, con hambre, con militares, con democracia, con cualquiera de nuestras pestes y maldiciones eternas.
Y si un día no hay yerba, un vecino tiene y te da. La yerba no se le niega a nadie.
Éste es el único país del mundo en donde la decisión de dejar de ser un chico y empezar a ser un hombre ocurre un día en particular. Nada de pantalones largos, circuncisión, universidad o vivir lejos de los padres.
Acá empezamos a ser grandes el día que tenemos la necesidad de tomar por primera vez unos mates, solos. No es casualidad. No es porque sí. El día que un chico pone la pava al fuego y toma su primer mate sin que haya nadie en casa, en ese minuto, es que ha descubierto que tiene alma.
O está muerto de miedo, o está muerto de amor, o algo: pero no es un día cualquiera.
Ninguno de nosotros nos acordamos del día en que tomamos por primera vez un mate solo.
Pero debe haber sido un día importante para cada uno.
Por adentro hay revoluciones.
El sencillo mate es nada más y nada menos que una demostración de valores...
Es la solidaridad de "bancar" (aguantar) esos mates lavados porque la charla es buena. La charla.... no el mate.
Es el respeto por los tiempos para hablar y escuchar, vos hablás mientras el otro toma y es la sinceridad para decir: ¡Basta, cambiá la yerba!".
Es el compañerismo hecho momento.
Es la sensibilidad al agua hirviendo.
Es el cariño para preguntar, estúpidamente, "¿está caliente, no?".
Es la modestia de quien ceba el mejor mate.
Es la generosidad de dar hasta el final.
Es la hospitalidad de la invitación.
Es la justicia de uno por uno.
Es la obligación de decir "gracias", al menos una vez al día.
Es la actitud ética, franca y leal de encontrarse sin mayores pretensiones que compartir.

...¿TE SENTISTE INCLUIDO?.... por eso lo queria compartir con todos uds. ....y vos , si querés y te sentís igual....compartilo con quienes alguna vez.... tomaste un mate.
PARA TODOS UDS. Y AQUELLOS QUE ESTÁN LEJOS DE SUS CASAS....

 

ANEXO 4

Cuentos y leyendas americanas

 

LA YERBA MATE  

(Mito Guaraní - Paraguay)

 

¿Por dónde podré bajar?, se preguntaba la solitaria luna paseándose por el cielo. El inmenso espacio azul le parecía una jaula y su único amigo era el aire. Lo envidiaba por su libertad para desplazarse de un lado a otro jugueteando con las nubes. Su mayor anhelo era pisar esa verde alfombra de las praderas que veía desde arriba, y dejarse resbalar por las colinas que descendían hasta un profundo y misterioso manchón azul.

    -Quiero conocer ese otro cielo que tienen abajo -le contó al aire. 

    No es el cielo, mi amiga -silbó él-, es el mar.

    Se acrecentaron sus deseos y en un ataque de mal genio gritó:

    -¡Quiero bajar! ¡Quiero bajar!

    Una estrella peleadora le dijo:

    -¿Para qué formas berrinche? Eres centinela de la noche y no puedes dejar tu puesto.

    Al verla llorar lágrimas de plata, las nubes se pusieron de acuerdo. Ellas la comprendían, porque en sus viajes siempre admiraron la tierra.

    --Te vamos a ayudar para que no se note tu ausencia -le dijeron-. Cada una de nosotras colgará sutiles gasas de neblina y entre todas formaremos un telón, que dejará la noche más oscura que boca de lobo.

    -¿Qué es eso? -preguntó ingenuamente la luna.

    El arco iris prestó su escala de siete colores, y la luna, con una capa negra, un aderezo de tules y una coronita de estrellas, como una reina, bajó orgullosa. La tierra le abría al fin sus brazos amorosos, sus lagos y sus abanicos de palmera. La primera sensación que experimentó fue la de volar, de ser libre como un pájaro, hasta que sus pies tocaron unas agrestes colinas cubiertas de vegetación, entre las que cantaba el río Paraná. Se volvió niña, fascinada por las flores y los perfumes. Al mirarse en las aguas, su cara redonda le pareció demasiado pálida entre los coloreados frutos. Hubiera querido ponerse trenzas y parecer una campesina.

    -¿Dónde habrá niños? - se preguntaba, sin saber que era este un lugar tropical y muy desierto.

    -Ven a nadar - la invitó el río con un murmullo de cascadas.

    No se hizo de rogar la traviesa luna. Se despojó de su paca y tules y de su coronita de estrellas para sumergirse en las rumororsas aguas que se llenaron de reflejos. En el oleaje aparecía y desaparecía, cual un barco redondo y blanco, y era ella la que miraba el cielo, un tanto oscuro sin su presencia.

    "Ahora -pensaba- que he probado los frutos y conozco eso verde que es el pasto, los helechos y el agua; ahora que he aquietado este deseo de tierra, podré volver a mi sitio y ser para siempre una luz lejana, que alumbre los caminos del mundo y las ventanas de sus casas. Pero, ¡qué bueno fue mirar desde abajo!"

    Ni se acordaba del cielo y lo encontró lindo.

    Con su falta de experiencia olvodóse del jaguar, el temible animal de la selva que en las noches busca siempre alguna víctima para calmar su feroz apetito. Agazapado entre los juncos, vio a la luna, le pareció una gran tortilla de maíz, un tanto cruda tal vez. Cuando quiso abalanzarse a devorarla, el cuchillo de un diestro cazador terminó con su hambre y con su vida. Este hombre con su mujer e hija eran los únicos habitantes de la enmarañada selva; había construido una choza en un claro y hacía tiempo que andaba en busca de liquidar al jaguar que robaba sus animales domésticos.

    -No temas, criatura -le dijo a la luna, que tiritaba de susto, sin saber aún de quien era esa redonda cara pálida-. Yo te llevaré a mi choza, en donde mi familia te atenderá.

    Generoso, como buen campesino, le cocinó la última tortilla de maíz que quedaba; pasarían muchos meses antes de la próxima cosecha. La luna, envuelta en una gran sábana, se sintió feliz y humana entre gente tan amable, hasta que oyó decir a la mujer de su salvador:

    -¿Qué vamos a comer mañana? Se acabó el maíz.

    Con un poco de pena se puso su capa de reina, sus gasas y su coronita maltrecha. Se decidió a partir para volver a tomar su puesto en el firmamento y de paso agradecer su ayuda a las nubes. Nadie se había percatado de su ausencia ni de su viaje a la tierra y el arco iris se afanaba guardando su escala. La luna pensó: "¿qué puedo regalarle a esos campesinos que tan amablemente me acogieron? Algo que los ayude a vivir momentos felices, a olvidarse de la soledad y que los reponga de los duros trabajos que realizan".  Entonces, muy emocionada, dejó caer sus lágrimas de plata que, iluminando la choza de luz y reflejos, regaron los campos.

    Cuando al amanecer el buen hombre salió de la casa, arbustos desconocidos habían brotado por doquier. Entre el verde oscuro de las hojas asomaban blancas florecillas. La mujer, de pura hambre, preparó una infusión con esta yerba nueva y al beberla se sintieron todos mucho mejor y con ánimo.

    El arbusto cundió como maleza por todas partes, y el país se hizo famoso y rico por su yerba mate. Se dice que la hija del campesino fue la depositaria de este regalo, que jamás murió y que va por todas partes repartiendo este don de la luna.


 

[1]  Negociar quanto aos conteúdos e às atividades de aprendizagem entre os aprendizes e também entre os aprendizes e os docentes.

[2] Esta última pensa nas relações existentes ou desejáveis entre o meio ambiente da sala de aula e a metodologia de ensino assim como o processo de aprendizagem. negociar

[3]  Procura o equilíbrio entre, por exemplo, a aprendizagem reflexiva e o treino mecânico.

[4]  No sentido que reabilita as atividades metalingüísticas, culturais e metodológicas do professor e dos alunos.