Cultura e identidade
linguagem literária e invenção do Brasil

Denise Brasil A. Aguiar

 

A partir de um corpus ficcional de nossa literatura, busca-se discutir a construção da identidade brasileira no campo da linguagem literária. Da imagem paradisíaca, discurso fundador, historicamente transfigurado, às representações de uma crise que se anuncia como global – a do Estado-nação e de seus correlatos, como o indivíduo-cidadão –, faremos uma breve apresentação comparativa de algumas das visões sobre a brasilidade tecidas como linguagem artística, mas, não raro, decodificadas como signos de uma essência, uma espécie de “lugar de memória”, sempre pronto a atestar uma identidade nacional (Orlandi, 2001). Nesse mesmo terreno se inscreve o mito fundador, com seu poder de apagamento das contradições e fraturas, na cristalização de semióforos (Chauí, 2000) que constituem uma miragem de homogeneidade da nação brasileira.

Na abordagem aqui proposta, nação e narração fornecem, uma à outra, condições de existência e consolidação, uma vez que a identidade nacional, nos moldes postos pelo século XIX – período de estabelecimento do Estado-nação brasileiro –, foi também construída pelas representações literárias,  fruto do sentido de missão que, de modo geral, nossos escritores românticos se atribuíram naquele contexto. De uma específica leitura da crise da modernidade, emergem, na narrativa ficcional de fins do século XX, as ruínas desse processo de construção do nacional, já sem lugar confortável depois da revisão crítica dos modernistas e, particularmente, no mundo do capital volátil, do consumo global e da “vida líquida” (Bauman, 2005).