Em que se constituem, afinal,
os estudos "lingüísticos"?

Hilma Ranauro (UFF e ABRAFIL)

 

Camara Jr. reporta-se a uma pré-lingüística e a uma para-lingüística  nos estudos da língua antes do século XIX. Reconhece que a Lingüística não teria evoluído sem as experiências da pré-lingüística e da para-lingüística. Classifica, contudo, os estudos desses períodos em pré-lingüísticos e paralingüísticos, o que pretendemos discutir. Esses estudos são, na realidade, lingüísticos, posto que tratam da compreensão lingüística, de tipos de estudos da linguagem, de diferenças lingüísticas, de formas lingüísticas.

Uma coisa seria dizer que os estudos dos fatos da língua (lingüísticos, pois) anteriores não configuravam a existência de uma ciência lingüística em si, dedicada ao estudo da língua, o que legitimaria a classificação em pré e para lingüística; outra é considerar os estudos então realizados de pré ou para lingüísticos.

A Lingüística veio a constituir-se como tal a partir do século XIX, período classificado por alguns estudiosos de “científico”. O séc. XIX representa, sim, um corte epistemológico. O campo do saber se fragmenta, diversifica-se. Surgem novas epistemes. Mas não se pode considerar que só então se passou a fazer ciência.

Argumenta-se que só a partir deste século a língua veio a constituir-se um objeto de estudo em si mesma, e não à reboque de outras ciências. Mas a Lingüística nem sempre se apresenta como uma disciplina autônoma, isolada. O debordamento de outras ciências no estudo da linguagem, como a psicologia, a biologia, a antropologia, por ex., é uma constante, como salienta o próprio Câmara Jr.