Retórica do corte no filme Medéia,
de Pier Paolo Pasolini:
Paisagens antigas e ficções modernas

Ulysses Maciel de Oliveira Neto (UERJ)

 

O filme Medéia, de Pier Paolo Pasolini, estrutura-se em três partes, delimitadas por dois cortes abruptos na narrativa. A primeira parte do filme é o discurso filosófico/ficcional do Centauro. O primeiro corte faz o enredo retroceder do estatuto filosófico, ensinado pelo Centauro, para um lugar primitivo, uma mera paisagem, proporcionada pelo efeito de uma câmera impessoal. Essa segunda parte apresenta, entre os dois cortes, um ritual de iniciação de Medéia, que passa da sua condição mágica para a condição racional, correlativa à cultura de Jasão.O cenário do país de Medéia é anterior, do ponto de vista do pensamento, à filosofia do Centauro. Ocorre então o segundo corte, que é do país de Medéia para Corinto, o país de Jasão, o nosso país. Segue-se a terceira parte, que inicia com um discurso filosófico do Novo Centauro na presença do Antigo Centauro e termina com a apoteose da tragédia. A primeira parte privilegia o verbo; a segunda a imagem; a terceira é o texto fílmico trágico. Os cortes delimitam paisagens e ficções mas, ao mesmo tempo, integram-nas em um discurso que visa estetizar a angústia do homem moderno, relacionando-a com os elementos da incerteza existencial da sociedade primitiva que permanecem no mundo moderno, recalcados pela razão.