Desilusões da verdade
interseções entre filosofia e literatura
Gabriel Cid de Garcia
gcidgarcia@gmail.com
Este trabalho pretende aprofundar os elementos de uma certa filosofia da literatura a partir de três momentos. No primeiro, trata-se de discutir as questões propostas por trechos onde os filósofos Gilles Deleuze e Félix Guattari exemplificam, a partir de Fernando Pessoa, seu pensamento acerca da relação entre arte e filosofia. No segundo momento, estabeleceremos relações entre os conceitos de Exterior e heterotopia, trabalhados pelo filósofo Michel Foucault, e os escritos do heterônimo filósofo e louco de Pessoa, António Mora, para pensar, a partir de uma reflexão sobre a loucura, os desdobramentos da concepção da relação entre arte e filosofia tematizada no primeiro momento. No terceiro momento dialogaremos com elementos pontuais da obra do filósofo Friedrich Nietzsche, como suas reflexões sobre retórica e linguagem. Localizaremos na linguagem o campo de diferenças que possibilita tanto a afirmação da verdade como de seu contrário, a partir de um estudo acerca dos pressupostos ontológicos da escrita fragmentária e sua potência desestabilizadora da idéia de verdade, que não almeja significar ou referir-se às essências universais que reuniriam sentidos identificáveis, mas sim justapor pontos de vista sem remissão a algum significado balizador, a alguma identidade ou rosto por trás das máscaras. Concluiremos com a apresentação de uma teoria implícita da heteronímia pessoana em ressonância com os autores estudados, alçando-a a uma dimensão impessoal do sujeito, um modo pelo qual opera uma tensão da linguagem quando busca expressar aquilo que não se pode ainda dizer, lugar próprio da convergência entre o filosófico e o literário. Trata-se aqui de pensar o esforço, comum aos autores estudados, de se instaurar no limiar entre a significação e a impossibilidade de significar, dissolvendo posturas que ao longo da tradição privilegiaram o afastamento entre pensamento e vida, razão e sensação.