Rosa
Como eu quisera ser pássaro!
Fugir da terra aos escolhos
Abranger o mundo inteiro
Num simples volver de olhos!
–
Deu-me de rosa a existência
A mão do divino esteta;
Mas como alegre a trocara
Pela tua borboleta!
Borboleta
Quando Deus criou os seres
Muito bem o que fez soube,
Mas ninguém ficou contente
Com a sorte que lhe coube.
–
Eu, por exemplo, te invejo,
Flor mimosa em verde galho,
Onde à noite em leito brando
Calmamente dorme o orvalho.
Rosa
Sempre e sempre o mesmo aspecto,
O mesmo canteiro e fonte...
Quem me dera ver mudado
O meu em outro horizonte!
–
Borboleta, que a beleza
Do inseto à da flor tu casas,
Amiguinha, por instantes
Empresta-me as tuas asas.
Borboleta
A emprestar-tas não me esquivo,
Recebe-as em ti as cola
Assim terás minhas asas,
Eu terei tua corola
–
Quem preza a vil borboleta?
Embora lesta e viçosa?
Encanto de muitos olhos
Na terra é somente a rosa.
–
Esta a delícia da cor
À do olfato em si resume;
A borboleta do campo
É rosa sem ter perfume
Rosa
O mundo é vão julgador.
Tuas graças não anulo.
Comparando-me contigo
Sou borboleta em casulo.
–
Que pois vale a formosura,
Coisa que em mim não apuro
Se muita vez sou colhida
Para ornar um peito impuro?
Borboleta
Amiga, do pão que ingeres
A procura não te aterra
Ao pé de ti tens a vida
Que vem-lhe a seiva da terra.
–
Quanta vez percorro o campo
Na escassez que me consome,
E volto desconsolada
Sem ter com que mate a fome.
Rosa
Haja embora mil tropeços,
Que a sorte ao inseto acarreta
Contudo, ó dita superna ,
Quisera ser borboleta
Dos prados a buliçosa!
Borboleta
Pois eu quisera ser rosa!
Niterói