Meu relógio

Relógio que andas desfeito
Sempre na mesma canção,
Parece que tens no peito
Latejando um coração.

Mas que ingrato que tu és,
Quando na dor me atormento...
Julgo até que não tens pés,
Pois tu caminhas tão lento...

Nos momentos de prazer,
Com que pressa não te abrasas!
Vão-se as horas a correr...
Parece até que tens asas.

Relógio que andas a jeito
De um autômato que fala,
Ouço que tens no teu peito
Um coração que badala.

Coração? Oh! que ironia!
Coração em pedra achar!...
Se o tivesses, juraria,
Que nas horas de alegria
Lento havias de marchar.

Niterói, 1923


Autômato – aparelho com aparência humana, que reproduz seus movimentos por meios mecânicos ou eletrônicos.
Produção Digital: Silvia Avelar @ 2011