O corvo

O negro porte cismativo e frio
Avulta o corvo do quintal na cerca;
Às vezes desce e a podridão, que esterca
O solo, vira com seu ar sombrio.

De horror e nojo sinto um calefrio ,
Quando o diviso do quintal na cerca ;
Mas se ele voa, sem que no ar o perca,
Alegre sigo-lhe o seu vulto esguio

Quando comparo tua sorte à minha
Na dor cruel que o peito me espezinha,
És mais feliz do que eu, ó corvo imundo...

Se tormentos a terra te depara ,
Tens aos teus flancos duas asas para
Sulcar os ares e fugir do mundo.

Niterói, 09-1923


Calefrio é variante de calafrio – conjunto de pequenas contrações da pele e dos músculos cutâneos ao longo do corpo, muitas vezes com tremores fortes e palidez, que acompanham uma sensação de frio provocada por baixa temperatura, má condição orgânica ou ainda por medo, horror, nojo etc.

Inversão repetida, facilitando a rima: o corvo avulta na cerca do quintal.

A última sílaba de “deparava” foi raspada.

Produção Digital: Silvia Avelar @ 2011