O palhaço (paródia)
(Paródia)
Ontem, viu-se-lhe a esposa quase morta
De pancada e a filhinha tão doente!
Hoje um polícia vai bater-lhe a porta,
Que o delegado o chama impaciente.
À grade em breve surge... Pouco importa
O seu grande infortúnio àquela gente...
E aos golpes do facão que os ares corta,
Salta, chora e soluça amargamente.
Do olhar inquiridor à negra fome,
Oculta o vício enorme, que o consome,
E o seu desejo mais se lhe espicaça...
No entanto, parte o povo zombeteiro...
E quando se vê só com o carcereiro,
Pede chorando um gole de cachaça.
Niterói, julho de 1924
*Ao autor da Flor da maçã
O soneto parodiado, do padre Antônio Tomás (1868-1941), é: Ontem, viu-se-lhe em casa a esposa morta / E a filhinha mais nova, tão doente! / Hoje, o empresário vai bater-lhe à porta, / Que a plateia o reclama, impaciente. // Ao palco, em breve surge... pouco importa / o seu pesar àquela estranha gente... / E ao som das ovações que os ares corta, / trejeita, canta e ri, nervosamente. // Aos aplausos da turba, ele trabalha / para esconder no manto em que se embuça / a cruciante angústia que o retalha. // No entanto, a dor cruel mais se lhe aguça / e enquanto o lábio trêmulo gargalha, / dentro do peito o coração soluça.