Adeus

À mana Irene

Se a brisa serôdia e ligeira
Os teus loiros cabelos roçar;
Se um canário no pé da mangueira
Dos seus cantos a voz modular;

Se por noite, alta noite, uma nota
Nos espaços gemer, soluçar;
Se arrojada veloz gaivota
Lava as pernas nas ondas do mar;

Se uma flor que se ostenta no galho
Para ti o seu caule inclinar;
Se uma conta, uma gota de orvalho
Uma chispa de sol faz brilhar;

Se um acento de flauta plangente
Dos teus sonhos te vier despertar;
Se a estrela que fulge nitente,
Às ocultas, teus lábios beijar;


Se um grupo de alegres crianças
Da igrejinha o caminho tornar:
São adeuses, saudades, lembranças,
Que te envio nas asas do ar.

Que este adeus o meu Deus não permita
Ser pra sempre, atros anos durar;
Seja a escala do tempo restrita,
Que nos venhas de novo abraçar.

Campelo, 1920


Atros são os de cor negra; figuradamente, os que produzem tristeza; de mau agouro, infaustos, sombrios.
Produção Digital: Silvia Avelar @ 2011