A minha mana Doca

Quando vires, querida irmãzinha,
Pela tarde a carriça ciscar,
Não te esqueças de mim, eu to peço,
Queiras sempre de mim te lembrar.

Quando o sol o seu manto escarlate
Sobre a terra estender, dilatar,
À memória revoca o exilado,
Queiras sempre de mim te lembrar.

Quando a lua vier na lagoa
O seu belo semblante espelhar,
Quem por ti de saudades se fina
Nunca deixes de sempre lembrar.

Quando o sino da branca igrejinha
Pelos bronzes pulmões respirar,
Não te esqueças do nauta perdido,
Queiras sempre de mim te lembrar.


Quando a brisa os teus meigos cabelos
Descuidosa, indolente roçar,
Teus cismares a mim me consagres,
Queiras sempre de mim te lembrar.

Quando as aves seu canto ameigarem,
Quando a aurora no céu despontar,
Se então já desperta estiveres,
Queiras sempre de mim te lembrar.

Quando um bando veloz de andorinhas
Em folguedo os espaços rasgar,
À memória meu nome revoca,
Nela sempre me queiras gravar.

Na alegria de mim não te esqueças;
Não te esqueças de mim no pesar;
Noite ou dia que vida tiveres,
Queiras sempre de mim te lembrar.

A saudade, irmãzinha querida,
Faz eu velho criança tornar,
Uma vez mais ainda eu te peço,
Queiras sempre de mim te lembrar.

Niterói, 1920


Carriça, garrincha ou cambaxirra é ave passeriforme da família dos trogloditídeos, de coloração parda, avermelhada no crisso e na cauda, listrada de negro no dorso, asas e cauda.

Essa combinação do pronome de segunda e terceira pessoas, nas funções de objeto indireto e direto respectivamente não é comum hoje, apesar de correta; mas ainda era admitida no início do século XX, pelo menos em nível culto.

Produção Digital: Silvia Avelar @ 2011