O sino

Range o sino da igrejinha,
Em festivo bimbalhar,
Todos vão à ladainha,
Chega a hora de rezar.
Este som assim plangente
Faz até chorar a gente.

Eu ouvi na infância, outrora,
Em tempo que já lá vai,
Gemer ele, como agora,
Pela morte de meu pai.
Era então inda criança,
Tenho bem disto lembrança.

Era eu adolescente,
Quando o ouvi, em tom sombrio,
Soluçar louco, demente,
Pela morte de meu tio,
Sentia dor o coitado,
Soluçar por um finado.


Depois o vi festival,
Tinha em cada sim um riso,
Despertar todo arraial...
Era mesmo um paraíso!
É, que então, nesse momento,
Fazia meu casamento.

Um dia, oh! Que infando dia!
Tocava o pobre mesquinho,
Junto ao meu leito jazia,
Na concha morna do ninho,
Minha esposa. Oh! Cruel sorte!
Entregue aos braços da morte.

Quanta vez, ó sino amigo,
Maldisse teu som nos ares,
Mas hoje, ó sino, comigo
Vem chorar os teus pesares.
É que então do teu destino
Não sabia, ó amigo sino.

Campelo, 1921


Infando é aquilo de que não se deve falar, por ser digno de aversão, algo abominável, execrável, nefando.

A palavra esposa, sem o ponto (.), foi acrescentada entre as palavras Minha e oh!.

Produção Digital: Silvia Avelar @ 2011