A voz do vento

É noite. O vento lá fora,
Como um mendigo que chora
Sem lar nem abrigo ter,
Solta um ai tão dolorido,
Que soando como um gemido,
No leito me faz tremer.

Que dor é essa incontida,
Que em teu peito acha guarida,
Dor intensa, dor enorme,
Que tu curtes em segredo,
Num silêncio morno, quedo,
Quando a natureza dorme?

E o vento desfere queixas,
Das folhagens as madeixas
Vergastando com ardor;
Investe com fúria as portas,
E seus ais, às horas mortas,
Vêm encher-me de pavor.


Nas quebradas seus gemidos,
Vão morrer como ganidos,
De cão que de fome chora;
E eu transido de espanto,
Não posso dormir, enquanto
O vento geme lá fora...

Niterói, 05-1921

Produção Digital: Silvia Avelar @ 2011