Se eu tenho de morrer...

Imitando Casimiro de Abreu

Se eu tenho de morrer na juventude,
Meu Deus, não seja aqui;
Eu quero ouvir à tarde quando geme
No mato a juriti.

Eu quero ouvir a queda da cascata
Nas horas do sol pôr,
E ver o colibri que louco adeja
De uma à outra flor.

Eu quero ouvir na igrejinha à tarde
O sino respirar,
E a toada do pobre pegureiro
Que o gado vai juntar.

Eu quero ouvir os cantos do aldeão
Voltando do trabalho,
E a passarada que festiva trina
Procurando agasalho.


Se eu tenho de morrer na juventude
Meu Deus, não seja aqui;
Eu quero ouvir a tarde quando geme
No mato a juriti.

Eu quero ver da casa na soleira
Gentil e folgazã
Estender-me os braços carinhosos
Minha bondosa irmã.

Quero ouvir o velho pai, contente,
Falar-me jovial,
Buscando sempre ocasião azada
Pra coisas de moral.

Quero ver este anjo dos meus sonhos,
Amparo do meu lar,
Minha adorada e inesquecível mãe
Nos braços me estreitar.

Embora oh! Deus os seixos do caminho
Me magoem sem dó,
Fazei que inda tranquilo possa um dia
Abraçar minha avó.


Então, Senhor, depois de tal ventura,
No recesso do lar,
Podeis enviar a morte que sorrindo
Morrerei a cantar.

Se eu tenho de morrer na juventude,
Meu Deus, não seja aqui;
Eu quero ouvir à tarde quando geme
No mato a juriti.

Niterói, dezembro 1921

Produção Digital: Silvia Avelar @ 2011