Três embaixadas

Eu vi em sonho três anjinhos louros,
Vestes de cetim,
De garços olhos, faces nacaradas,
Olhos da carmim.

Falavam, com certeza, em cousas lindas
Nos gozos do céu;
Não pude compreendê-los, não obstante,
Todo o esforço meu.

Trescalava o ambiente em grata essência,
De rosa à maneira
Oh! quem dera a sonhar assim passasse
Minha vida inteira!

Adejavam febris sobre o meu corpo,
Asas a ruflar,
Na ansiedade de quem tem um segredo
Para revelar.


Do leito meu
Nem se abeirou,
Ao meu ouvido
Assim falou:

Os filhos eu prendo
Dos pais ao casal.
No mundo me chamam
“Amor filial”.

Eu sei que na festa
Possuo um lugar;
Por isso aqui venho
Agora ocupar.

Cortei longos campos,
Voei sobre mares,
Para ao vosso Bispo
Trazer meus saudades .

Depois... bateu as asas brancas, brancas,
Pelo espaço infindo;
Oh! quem me dera ter constantemente
Num sonho assim lindo!


Mal se obumbrara
Na escuridão
De mim se acerca
A outra visão:

Os homens ingratos
Deploro, lamento
É, pois, o meu nome:
“Reconhecimento”

Por graças, afetos
Meu zelo reparte;
Na festa que fazes
Vim pois tomar parte.

Uma outra embaixada
Ajunta à que tens:
Ao vosso Prelado
Dai meus parabéns.

Depois... moveu as asas brancas, brancas,
Num doce fremir
E a desaparecer vi-o nos ares
A subir, subir.


Mal um trilhara
O seu caminho,
Assim falou-me
O outro anjinho:

Eis que cumprir venho
A minha missão:
De mim não te esqueças
Sou a “gratidão”.

Como reconheces,
Não posso destarte,
Deixar de na festa
Tomar minha parte.

Na terra o meu fado
É prender corações,
Ao vosso prelado
Minhas saudações .

Depois... ruflou as asas brancas, brancas,
Pelo azul sem termo,
Deixando-me desconsolado e triste
Sobre o meu leito ermo.


Despertei-me. No céu se abria o manto
Das alvoradas
E exultei por ser eu, o mensageiro,
Das embaixadas.

Inda mais se avoluma, cresce, aumenta
Minha alegria,
Porque os anjos o corpo representam
Da academia.

Niterói, 28-04-1922


quem dera substitui quem me dera, riscando-se o pronome.

Adejavam – davam pequenos e repetidos voos sem direção definida; esvoaçavam, pairando no ar.

Saudades – cumprimentos amigáveis de quem diz sentir a falta de outrem.

No manuscrito, estes dois últimos versos não foram incluídos com as aspas, o que me pareceu erro de cópia.

Produção Digital: Silvia Avelar @ 2011